sexta-feira, 20 de agosto de 2010

URANTIA

DOCUMENTO 88

FETICHES, ENCANTOS E MAGIAS
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O conceito de um espírito entrando em um objeto inanimado, em um animal ou em um ser humano, é uma crença muito antiga e que mereceu muitas honras, tendo prevalecido desde os primórdios da evolução da religião. A doutrina da possessão por um espírito é nada mais nada menos do que fetichismo. O selvagem não adora necessariamente o fetiche; adora e reverencia muito logicamente o espírito que reside nesse fetiche.

88:0:2 9672 A princípio, acreditava-se que o espírito de um fetiche era um fantasma de um homem morto; posteriormente, supunha-se que espíritos mais elevados residiam nos fetiches. E, assim, o culto do fetiche finalmente incorporou todas as idéias primitivas dos fantasmas, das almas, dos espíritos e da possessão demoníaca.

1. A CRENÇA NOS FETICHES


88:1:1 9673 O homem primitivo sempre quis transformar todas as coisas extraordinárias em fetiches; e, por isso, o acaso deu origem a muitos deles. Um homem está doente, algo acontece, e ele fica bem. A mesma coisa é verdadeira sobre a reputação de muitos medicamentos e de métodos ocasionais de tratar a doença. Os objetos ligados aos sonhos podiam ser convertidos em fetiches. Vulcões, mas não as montanhas, transformaram-se em fetiches; cometas, mas não estrelas. O homem primitivo considerava as estrelas cadentes e os meteoros como indicativos da chegada na Terra de espíritos visitantes especiais.

88:1:2 9674 Os primeiros fetiches foram pedregulhos com marcas peculiares, e as “pedras sagradas” têm sido, desde então, buscadas pelo homem; um colar de contas chegou a ser uma coleção de pedras sagradas, uma bateria de amuletos. Muitas tribos tinham pedras fetiches, mas poucas sobreviveram, como a Kaaba e a Pedra de Scone. O fogo e a água estavam também entre os fetiches primitivos, e a adoração do fogo, junto com a crença na água benta, ainda sobrevive.

88:1:3 9675 As árvores fetiches tiveram um desenvolvimento posterior, e, entre algumas tribos, a persistência da adoração da natureza levou à crença em amuletos habitados por alguma espécie de espírito da natureza. Quando as plantas e as frutas tornaram-se fetiches, elas transformaram-se em um tabu, como alimento. A maçã estava entre as primeiras a entrar para essa categoria; nunca foi comida pelos povos do Levante.

88:1:4 9676 Se um animal comia carne humana, ele tornava-se um fetiche. Dessa maneira, o cão tornou-se um animal sagrado para os persas. Se o fetiche é um animal e o fantasma reside permanentemente nele, então o fetichismo pode ter conseqüências para a reencarnação. De muitos modos os selvagens invejavam os animais; eles não se sentiam superiores aos animais e freqüentemente levavam os nomes das suas bestas favoritas.

88:1:5 9677 Quando os animais tornavam-se fetiches, seguia-se o tabu de comer a carne do animal fetiche. Os monos e os símios, por causa da sua semelhança com o homem, tornaram-se animais fetiches muito cedo; posteriormente, as cobras, os pássaros e os suínos foram considerados do mesmo modo. A vaca, em uma certa época, foi um fetiche, o leite sendo tabu, enquanto os seus excrementos eram tidos em alta conta. A serpente foi reverenciada na Palestina, especialmente pelos fenícios, que, junto com os judeus, consideravam-na como sendo porta-voz dos espíritos do mal. Até muitos dos povos modernos acreditam nos poderes de encanto dos répteis. A serpente foi venerada desde a Arábia, passando pela Índia, até a dança da tribo Moqui dos homens vermelhos.

88:1:6 9681 Alguns dias da semana eram fetiches. Durante idades, a sexta-feira tem sido encarada como um dia de má sorte e o número treze como um mau número. Os números de sorte, o três e o sete, vieram de revelações posteriores; o quatro era o número de sorte do homem primitivo e derivava do reconhecimento primitivo dos quatro pontos da bússola. Era considerado de má sorte contar o gado ou outras posses; os antigos sempre se opuseram a fazer os censos, a “numerar o povo”.

88:1:7 9682 O homem primitivo não fazia do sexo um fetiche exagerado; a função reprodutora recebia apenas uma quantidade limitada de atenção. O selvagem tinha a mente natural, nem obscena, nem lasciva.

88:1:8 9683 A saliva era um fetiche poderoso; os demônios poderiam ser retirados se se cuspisse em uma pessoa. Que um ancião ou um superior cuspisse em alguém era o mais alto cumprimento. Algumas partes do corpo humano eram vistas como fetiches potenciais, particularmente o cabelo e as unhas. As longas unhas dos dedos das mãos dos chefes tinham um grande valor, e as aparas delas eram um fetiche poderoso. A crença nos crânios como fetiches é responsável, posteriormente, por grande parte dos caçadores-de-cabeças. O cordão umbilical era um fetiche altamente valorizado; mesmo hoje, ele é visto assim na África. O primeiro brinquedo da humanidade foi um cordão umbilical que se conservou. Ornado de pérolas, como era sempre feito, foi o primeiro colar do homem.

88:1:9 9684 Corcundas e crianças aleijadas eram consideradas como fetiches; acreditava-se que os lunáticos eram tocados pela lua. O homem primitivo não podia distinguir entre o gênio e a insanidade; os idiotas ou eram espancados até a morte ou reverenciados como personalidades fetiches. A histeria confirmava cada vez mais a crença popular na bruxaria; os epiléticos eram sacerdotes e curandeiros freqüentemente. A embriaguez era considerada como uma forma de possessão espiritual; quando um selvagem fazia uma farra, ele colocava uma folha no seu cabelo com o propósito de retirar de si a responsabilidade pelos seus atos. Os venenos e os tóxicos tornaram-se fetiches; considerava-se que eles eram causa de possessão.

88:1:10 9685 Muitos povos encaravam os gênios como personalidades fetiches, possuídas por um espírito sábio. E esses talentosos humanos logo aprenderam a recorrer à fraude e às trapaças para servir aos seus interesses egoístas. Um homem fetiche era considerado como sendo mais do que humano; era divino, e mesmo infalível. E assim é que os chefes, os reis, os sacerdotes, os profetas e os dirigentes de igrejas finalmente acabaram por desfrutar de um grande poder e por exercer uma autoridade sem limites.

2. A EVOLUÇÃO DO FETICHE


88:2:1 9686 Supunha-se haver uma preferência dos fantasmas por residirem em alguns objetos que lhes haviam pertencido quando estavam vivos na carne. Essa crença explica a eficácia de muitas relíquias modernas. Os antigos sempre reverenciavam os ossos dos seus líderes, e os restos do esqueleto de santos e de heróis ainda são considerados com um respeito supersticioso por muitas pessoas. Ainda hoje, as peregrinações são feitas aos túmulos de grandes homens.

88:2:2 9687 A crença em relíquias é uma conseqüência do antigo culto dos fetiches. As relíquias, nas religiões modernas, representam uma tentativa de racionalizar o fetiche do selvagem e assim elevá-lo a um lugar de dignidade e respeitabilidade nos sistemas religiosos modernos. É um ato de paganismo acreditar em fetiches e na magia, mas, supostamente, nada de errado há em aceitar relíquias e milagres.

88:2:3 9691 O fogo – a lareira do lar – tornou-se mais ou menos um fetiche, um lugar sagrado. Os santuários e os templos a princípio eram lugares fetiches, porque os mortos estavam enterrados ali. A cabana-fetiche dos hebreus foi elevada por Moisés ao nível de abrigar um superfetiche, o conceito então existente da lei de Deus. Os israelitas, porém, nunca abandonaram a crença peculiar dos cananeus no altar de pedra: “E esta pedra que eu estabeleci como um pilar será a casa de Deus”. Eles acreditavam verdadeiramente que o espírito do seu Deus residia em tais altares de pedra, que eram fetiches, na realidade.

88:2:4 9692 As primeiras imagens foram feitas para preservar a aparência e a memória dos mortos ilustres; na realidade, eram monumentos. Os ídolos foram um refinamento do fetichismo. Os primitivos acreditavam que uma cerimônia de consagração conduzia o espírito a entrar na imagem; do mesmo modo, quando certos objetos eram abençoados, eles se transformavam em amuletos.

88:2:5 9693 Moisés, quando agregou o segundo mandamento ao antigo código moral da Dalamátia, fez um esforço para controlar a adoração dos fetiches entre os hebreus. Ele indicou cuidadosamente que eles não fizessem espécie alguma de imagem que pudesse ser consagrada como um fetiche. Ele deixou claro: “Não fareis nenhuma imagem gravada ou nenhuma semelhança de qualquer coisa que está no céu acima, nem na terra abaixo, ou nas águas da Terra”. Se bem que esse mandamento haja feito muito para atrasar a arte entre os judeus, ele diminuiu o culto dos fetiches. Moisés, contudo, era sábio demais para tentar desalojar subitamente os antigos fetiches, e, portanto, consentiu que se deixassem certas relíquias, dentro da lei, no altar híbrido de guerra e de templo religioso, que era a arca.

88:2:6 9694 As palavras finalmente tornaram-se fetiches, mais especialmente aquelas que eram consideradas como sendo palavras de Deus; e desse modo os livros sagrados de muitas religiões tornaram-se prisões fetichistas a encarcerar a imaginação espiritual do homem. Os próprios esforços de Moisés contra os fetiches tornaram-se um fetiche supremo; os seus mandamentos, mais tarde, foram usados para estultificar a arte e para retardar o prazer e a adoração do belo.

88:2:7 9695 Nos tempos antigos, a palavra fetiche da autoridade era uma doutrina inspiradora de medo, a mais terrível de todas as tiranias que escravizam os homens. Um fetiche doutrinário conduzirá o homem mortal a trair a si próprio, caindo nas garras da beatice, do fanatismo, da superstição, da intolerância e nas mais atrozes das crueldades bárbaras. O respeito moderno pela sabedoria e pela verdade não é senão uma fuga mais recente à tendência elaboradora de fetiches, levada aos níveis mais altos do pensar e do raciocinar. Quanto aos escritos fetiches acumulados, os quais tantos religiosos têm como livros sagrados, não se acredita apenas que o que está no livro seja verdade, mas também que toda a verdade esteja contida no livro. Se um desses livros sagrados por acaso fala da Terra como sendo plana, então, durante várias gerações, os homens e as mulheres sensatos recusarão a aceitar as evidências positivas de que o planeta é redondo.

88:2:8 9696 A prática de abrir um desses livros sagrados e deixar que os olhos caiam sobre uma passagem que, se colocada em prática, pode determinar importantes decisões de vida ou de projetos, nada mais é do que um completo fetichismo. Fazer um juramento sobre um “livro sagrado”, ou jurar por algum objeto de veneração suprema, é uma forma de fetichismo refinado.

88:2:9 9697 Todavia, de fato, foi um progresso evolucionário real avançar do temor fetichista das lascas de unhas do cacique selvagem, para a adoração de uma esplêndida coleção de cartas, de leis, de lendas, de alegorias, de mitos, de poemas e de crônicas, que refletem afinal a detalhada sabedoria moral de muitos séculos antes do momento e do evento da sua reunião como um “livro sagrado”.

88:2:10 9701 Para transformar-se em fetiches, as palavras tinham de ser consideradas inspiradas, e a invocação de escritos supostamente de inspiração divina levou diretamente ao estabelecimento da autoridade da igreja, enquanto a evolução de formas civis levou ao desabrochamento da autoridade do estado.

3. O TOTEMISMO


88:3:1 9702 O fetichismo impregnou todos os cultos primitivos, desde a crença primitiva em pedras sagradas, passando pela idolatria, pelo canibalismo e pelo culto à natureza, até o totemismo.

88:3:2 9703 O totemismo é uma combinação de observâncias sociais e religiosas. Originalmente, pensou-se que o respeito pelo animal totem de suposta origem biológica assegurava o suprimento de alimento. Os totens eram ao mesmo tempo símbolos do grupo e do seu deus. Esse deus era o clã personificado. O totemismo foi uma fase de tentativa de socialização da religião, que, ao contrário, é pessoal. O totem finalmente evoluiu, transformando-se na bandeira, ou no símbolo nacional dos vários povos modernos.

88:3:3 9704 Uma bolsa fetiche, uma bolsa de medicamentos, era uma sacola contendo um sortimento respeitável de artigos impregnados pelos fantasmas, e o curandeiro de outrora nunca permitia que a sua bolsa, o símbolo do seu poder, tocasse o chão. Os povos civilizados no século vinte cuidam para que as suas bandeiras, emblemas da consciência nacional, do mesmo modo, nunca toquem o chão.

88:3:4 9705 As insígnias dos cargos sacerdotais e reais foram finalmente encaradas como fetiches, e o fetiche do estado supremo passou por muitos estágios de desenvolvimento, dos clãs para as tribos, de suseranias a soberanias, de totens a bandeiras. Os reis fetiches têm reinado por “direito divino”, e muitas outras formas de governo têm prevalecido. Os homens também fizeram da democracia um fetiche, a exaltação e a adoração das idéias do homem comum coletivamente chamadas de “opinião pública”. A opinião de um homem, quando tomada isoladamente em si mesma, não é considerada como tendo muito valor, mas, quando muitos homens funcionam coletivamente como uma democracia, esse mesmo julgamento medíocre é tomado como sendo o árbitro da justiça e o padrão de retidão.

4. A MAGIA


88:4:1 9706 O homem civilizado enfrenta os problemas do meio ambiente real mediante a sua ciência; o homem selvagem tentou resolver os problemas reais de um meio-ambiente-fantasma-ilusório por meio da magia. A magia era a técnica de manipulação de um meio ambiente espiritual conjecturado cujas maquinações explicavam constantemente o inexplicável; era a arte de obter a cooperação espiritual voluntária e de forçar a ajuda espiritual involuntária por meio do uso de fetiches ou de outros espíritos mais poderosos.

88:4:2 9707 O objetivo da magia, da feitiçaria e da necromancia era duplo:

9708 1. Assegurar uma visão sobre o futuro.

9709 2. Influenciar favoravelmente o meio ambiente.

88:4:3 97010 Os objetivos da ciência são idênticos aos da magia. A humanidade está progredindo da magia para a ciência, não por meio da meditação e do raciocínio, mas, sim, por intermédio de uma experiência longa, gradual e dolorosa. O homem avança gradativamente até a verdade, com recuos, começando pelo erro, progredindo no erro, e finalmente alcançando o limiar da verdade. Apenas com o advento do método científico ele voltou o seu olhar para a frente. Contudo, o homem primitivo tinha de experimentar ou perecer.

88:4:4 97011 A fascinação da superstição primitiva foi mãe da curiosidade científica posterior. Havia uma emoção dinâmica progressiva – medo mais curiosidade – nessas superstições primitivas; havia uma força motriz progressiva na magia de outrora. Essas superstições representavam a emergência do desejo humano de conhecer e de controlar o meio ambiente planetário.

88:4:5 9711 A magia ganhou um forte domínio sobre o selvagem, porque não podia compreender o conceito da morte natural. A idéia posterior de um pecado original em muito ajudou a enfraquecer a força da magia sobre a raça, porque ela explicava a morte natural. Numa certa época, não era de todo incomum que dez pessoas inocentes fossem condenadas a morrer pela sua suposta responsabilidade por uma morte natural. Essa é uma razão pela qual as populações dos antigos não aumentavam mais depressa, e isso ainda é verdadeiro para algumas tribos africanas. O indivíduo acusado, em geral, confessava culpa, ainda que tivesse de enfrentar a morte.

88:4:6 9712 A magia é natural para um selvagem. Ele crê que um inimigo pode de fato ser morto pela prática da feitiçaria, com uma mecha do seu cabelo ou com lascas das suas unhas. A fatalidade das mordidas de cobras era atribuída à magia do feiticeiro. A dificuldade de combater a magia vem do fato de que o medo pode matar. Os povos primitivos temiam tanto a magia, que ela de fato matava; e tais resultados eram suficientes para consubstanciar essa crença errônea. No caso de fracasso, havia sempre alguma explicação plausível; a cura para a magia imperfeita era mais magia ainda.

5. OS AMULETOS MÁGICOS


88:5:1 9713 Posto que tudo o que se relacionava ao corpo podia tornar-se um fetiche, a magia mais primitiva tinha a ver com o cabelo e com as unhas. O segredo que cercava as secreções corporais nasceu do temor de que um inimigo pudesse apossar-se de algo que se derivasse do corpo e que empregasse aquilo negativamente em uma magia; toda excreção do corpo era, portanto, cuidadosamente enterrada. Abstinha-se de cuspir em público, em vista do medo de que a saliva pudesse ser usada na magia deletéria; o cuspe era sempre coberto. Mesmo as sobras de comida, de roupa e de ornamentos poderiam transformar-se em instrumentos para a magia. O selvagem nunca deixava nenhum remanescente da sua refeição à mesa. E tudo isso era feito por medo de que os inimigos pudessem usar essas coisas em ritos de magia, não por qualquer apreciação do valor higiênico de tais práticas.

88:5:2 9714 Os amuletos mágicos eram preparados com uma grande variedade de coisas: carne humana, garras de tigre, dentes de crocodilo, sementes de plantas venenosas, veneno de cobra e cabelo humano. Os ossos dos mortos eram muito mágicos. Mesmo o pó das pegadas podia ser usado na magia. Os antigos eram grandes crentes nos amuletos de amor. O sangue e todas as formas de secreções do corpo eram capazes de assegurar a influência mágica do amor.

88:5:3 9715 As imagens eram consideradas como sendo eficazes na magia. Efígies eram feitas, e, quando tratadas, bem ou mal, acreditava-se que os mesmos efeitos recaíam sobre a pessoa real. Quando faziam compras, pessoas supersticiosas mastigavam um pedaço de madeira dura com o fito de amaciar o coração do vendedor.

88:5:4 9716 O leite de uma vaca negra era altamente mágico; e também os gatos negros. Eram mágicos os cetros e as varinhas, e também os tambores, os sinos e os nós. Todos os objetos antigos eram amuletos mágicos. As práticas de uma civilização nova ou mais elevada eram vistas desfavoravelmente, em vista da sua suposta natureza de magia maligna. Durante muito tempo, assim foram consideradas a escrita, a imprensa, as imagens e os retratos.

88:5:5 9717 O homem primitivo acreditava que os nomes deviam ser tratados com respeito, especialmente os nomes dos deuses. O nome era considerado como uma entidade, uma influência distinta da personalidade física; era tido na mesma estima que a alma e a sombra. Os nomes eram empenhados para se obter empréstimos; um homem não podia usar o seu nome até que este fosse redimido com o pagamento de um empréstimo. Atualmente, assina-se o próprio nome em uma nota de débito. O nome de um indivíduo logo se tornou importante para a magia. O selvagem tinha dois nomes; o nome importante era considerado como sagrado demais para ser usado em ocasiões ordinárias, o segundo nome, conseqüentemente, era o nome de todo-dia – um apelido. Ele nunca dizia o seu verdadeiro nome a estranhos. Qualquer experiência de natureza inusitada levava-o a mudar o seu nome; algumas vezes, isso era feito em um esforço para curar doenças e para dar fim à má sorte. O selvagem podia conseguir um novo nome, comprando-o do chefe tribal; os homens ainda investem em títulos e diplomas. Contudo, entre as tribos mais primitivas, tais como os bosquímanos da África, os nomes individuais não existem.

6. A PRÁTICA DA MAGIA


88:6:1 9721 A magia foi praticada com o uso de varas, de rituais de “medicamentos” e de encantamentos, e era costumeiro ao praticante trabalhar despido. Entre os magos primitivos, o número de mulheres era maior do que de homens. Na magia, a palavra “medicina” significa mistério, não tratamento. O selvagem nunca curava a si próprio; ele nunca usava medicamentos a não ser a conselho dos especialistas em magia. E os curandeiros vudus do século vinte são tipicamente como os magos de outrora.

88:6:2 9722 Havia tanto um lado público quanto um lado privado da magia. Aquela que era executada pelos curandeiros, xamãs, ou sacerdotes, era, supunha-se, para o bem de toda a tribo. Feiticeiras, bruxos e magos exerciam a magia privada, pessoal e egoísta, que era empregada como um método coercitivo para trazer o mal aos inimigos. O conceito do espiritismo dual, segundo o qual há bons e maus espíritos, deu origem às crenças posteriores na magia branca e na magia negra. Com a evolução da religião, a magia passou a ser um termo aplicado a operações espirituais feitas fora do próprio culto e também se referia a crenças mais antigas nos fantasmas.

88:6:3 9723 A combinação de palavras, o ritual de cantos e encantamentos, era altamente mágico. Alguns encantamentos primitivos finalmente evoluíram, transformando-se em orações. Em seguida, a magia imitativa era praticada; as orações eram representadas; as danças mágicas nada mais eram do que orações dramatizadas. A prece gradualmente substituiu a magia como associada ao sacrifício.

88:6:4 9724 A expressão gestual, sendo mais antiga do que a fala, era mais santa e mágica, e creditava-se à mímica um forte poder mágico. Os homens vermelhos freqüentemente encenavam uma dança de búfalos, na qual um deles faria o papel de um búfalo, e, ao ser capturado, asseguraria o êxito da caçada que viria. As festividades sexuais do Primeiro de Maio eram simplesmente uma magia imitativa, um apelo sugestivo às paixões sexuais do mundo das plantas. A boneca foi empregada pela primeira vez como um talismã mágico pela esposa estéril.

88:6:5 9725 A magia foi um ramo da árvore religiosa evolucionária que, finalmente, teve como fruto uma era científica. A crença na astrologia levou ao desenvolvimento da astronomia; a crença em uma pedra filosofal levou à mestria com os metais, enquanto a crença em números mágicos fundamentou a ciência da matemática.

88:6:6 9726 No entanto, um mundo tão repleto de encantamentos muito fez para destruir toda a ambição e a iniciativa pessoal. Os frutos do trabalho extra ou da diligência eram vistos como se fossem mágicos. Se um homem tinha mais grãos no seu campo do que o seu vizinho, ele podia ser levado diante do cacique e acusado de haver atraído esses grãos a mais do campo do vizinho indolente. De fato, nos dias da barbárie, era perigoso saber muito; havia sempre uma possibilidade de ser executado como um mago negro.

88:6:7 9727 Gradualmente, a ciência está retirando da vida o elemento do risco. Todavia, se os métodos modernos de educação falharem, haverá quase imediatamente uma reversão de volta às crenças primitivas na magia. Essas superstições ainda perambulam pelas mentes de muitos dos chamados povos civilizados. Os idiomas contêm muitas expressões fossilizadas, palavras que atestam que a raça desde muito tempo tem estado imersa na superstição da magia, tais como: enfeitiçado, de má-estrela, possessão, inspiração, tirar o espírito, ingenuidade, êxtase, pasmo e assombrado. E seres humanos inteligentes ainda acreditam em boa sorte, em mau olhado e em astrologia.

88:6:8 9731 A magia antiga foi o casulo da ciência moderna, indispensável na sua época, no entanto agora em nada mais é útil. E assim os fantasmas da superstição ignorante agitaram as mentes primitivas dos homens, até que os conceitos da ciência pudessem nascer. Hoje, Urântia está no alvorecer da sua evolução intelectual. Metade do mundo está tentando avidamente alcançar a luz da verdade e os fatos das descobertas científicas, enquanto a outra metade está languidamente jogada nos braços da superstição antiga e de uma magia disfarçada apenas de um modo tênue.

88:6:9 9732 [Apresentado por um Brilhante Estrela Vespertino de Nebadon.]

DOCUMENTO 89

PECADO, SACRIFÍCIO E EXPIAÇÃO
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O homem primitivo via a si mesmo como estando em débito com os espíritos, e em necessidade de redenção. Do modo como os selvagens encaravam esse fato, por justiça, os espíritos poderiam enviar-lhes ainda mais má sorte. Com o passar do tempo, esse conceito desenvolveu-se até a doutrina do pecado e da salvação. A alma era encarada como tendo vindo ao mundo possuindo uma falta – o pecado original. A alma deveria ser redimida; um bode-expiatório deveria ser providenciado. O caçador de cabeças, além de praticar o culto da caveira, era capaz de prover um substituto para a sua própria vida: um homem-expiatório.

89:0:2 9742 O selvagem foi, logo nos seus primórdios, possuído pela noção de que os espíritos têm uma satisfação suprema com a visão da miséria, sofrimento e humilhação humana. No princípio, o homem estava preocupado apenas com os pecados cometidos, mais tarde, todavia, ele inquietou-se também com o pecado da omissão. E todo um sistema subseqüente de sacrifícios cresceu em torno dessas duas idéias. Esse novo ritual tinha a ver com a observância das cerimônias de propiciação para o sacrifício. O homem primitivo acreditava que algo especial devia ser feito para conquistar o favorecimento dos deuses; apenas a civilização avançada reconhece um Deus coerentemente equilibrado e benevolente. A propiciação era mais um seguro contra a má sorte imediata do que um investimento na bênção futura. E os rituais do livramento, do exorcismo, da coerção e da propiciação, todos, combinam-se uns com os outros.

1. O TABU


89:1:1 9743 A observância de um tabu era o esforço do homem para evitar a má sorte, para livrar-se de ofender os fantasmas espirituais, evitando alguma coisa. Os tabus inicialmente eram não-religiosos, mas logo adquiriram a aprovação dos fantasmas ou dos espíritos e, quando reforçados assim, transformaram-se nos elaboradores das leis e das instituições. O tabu é a fonte dos padrões dos cerimoniais e o ancestral do autocontrole primitivo. Foi a mais primitiva forma de regulamentação societária e, por um longo período de tempo, a única; é ainda uma unidade básica da estrutura social reguladora.

89:1:2 9744 O respeito que essas proibições inculcavam na mente do selvagem igualava-se exatamente ao medo que ele tinha dos poderes que supunha estar impondo-as. Os tabus inicialmente surgiram em conseqüência da experiência casual com a má sorte; mais tarde foram propostos pelos chefes e xamãs – homens-fetiches que se pensava serem orientados por um fantasma espiritual, ou mesmo por um deus. O medo da punição dos espíritos era tão grande na mente de um homem primitivo que, algumas vezes, ele morria de medo quando violava um tabu, e esse episódio dramático reforçava enormemente o poder do tabu nas mentes daqueles que sobreviviam.

89:1:3 9745 Entre as mais antigas proibições estavam as restrições quanto à apropriação de mulheres e de outras propriedades. À medida que a religião começou a exercer um papel maior na evolução do tabu, o artigo que ficava banido era considerado sujo e, subseqüentemente, profano. Os registros dos hebreus estão cheios de menções a coisas limpas e sujas, santas e profanas, mas as suas crenças nessas direções eram muito menos embaraçosas e amplas que as de muitos outros povos.

89:1:4 9751 Os sete mandamentos da Dalamátia e do Éden, bem como as dez obrigações dos hebreus eram tabus definidos, expressos todos na mesma forma negativa na qual o foram as mais antigas proibições. Mas esses códigos mais novos tiveram uma influência verdadeiramente emancipadora, pois tomaram o lugar de milhares de tabus preexistentes. E, mais do que isso, esses mandamentos mais recentes definitivamente prometiam algo em recompensa pela obediência.

89:1:5 9752 Os tabus primitivos sobre os alimentos originaram-se do fetichismo e do totemismo. Os suínos eram sagrados para os fenícios, a vaca para os hindus. O tabu egípcio sobre a carne de porco foi perpetuado pels fé hebraica e pela fé islâmica. Uma variante do tabu dos alimentos foi a crença de que se uma mulher grávida pensasse muito sobre um determinado alimento, a sua criança, quando nascesse, seria um eco daquele alimento, o qual seria um tabu para a criança.

89:1:6 9753 Os métodos da alimentação logo se tornaram tabu, e assim originaram-se as etiquetas antigas e modernas à mesa. Os sistemas de castas e de níveis sociais são vestígios de antigas proibições. Os tabus eram altamente eficazes para organizar a sociedade, mas eram terrivelmente opressivos; o sistema de proibição negativa não apenas mantinha regulamentações úteis e construtivas como também os tabus obsoletos, antiquados e inúteis.

89:1:7 9754 Não haveria, contudo, nenhuma sociedade civilizada para restringir o homem primitivo a não ser desses tabus bem difundidos e variados; e o tabu nunca teria perdurado, não fossem as próprias sanções das religiões primitivas que os sustentavam. Muitos dos fatores essenciais à evolução do homem têm sido altamente dispendiosos, têm custado vastos tesouros de esforços, de sacrifícios e de renúncias, mas essas realizações no sentido do autocontrole foram os verdadeiros degraus por meio dos quais o homem subiu a escada ascendente da civilização.

2. O CONCEITO DE PECADO


89:2:1 9755 O medo do acaso e o pavor da má sorte dirigiram literalmente o homem à invenção da religião primitiva como um suposto seguro contra as calamidades. Da mágica e dos fantasmas, a religião evoluiu por meio dos espíritos e fetiches, até os tabus. Todas as tribos primitivas tinham a sua árvore da fruta proibida, literalmente a maçã, mas figurativamente consistia de milhares de ramos sobrecarregados de todas as espécies de tabus. E a árvore proibida dizia sempre: “Tu não. . . ”

89:2:2 9756 À medida que a mente selvagem evoluiu até aquele ponto em que podia idealizar os bons e os maus espíritos, e quando o tabu recebeu a sanção solene da religião que evoluía, o cenário preparou-se para o aparecimento da nova concepção de pecado. A idéia do pecado foi universalmente estabelecida no mundo antes que a religião revelada tivesse feito a sua entrada. Apenas por meio do conceito do pecado é que a morte natural tornou-se lógica para a mente primitiva. O pecado era a transgressão do tabu; e a morte, a penalidade para o pecado.

89:2:3 9757 O pecado era ritual, não racional; um ato, não um pensamento. E todo esse conceito de pecado foi fomentado pelas tradições residuais do Dilmun e da época de um pequeno paraíso na Terra. As tradições de Adão e do Jardim do Éden também emprestaram substância ao sonho de uma certa “idade dourada” havida no alvorecer da raça. E tudo isso confirmou as idéias expressas posteriormente na crença de que o homem teve a sua origem em uma criação especial, de que ele começou a sua carreira na perfeição, e de que a transgressão dos tabus – o pecado – levara-o a cair na sua situação dolorosa mais recente.

89:2:4 9761 A violação habitual de um tabu tornou-se um vício; a lei primitiva fez do vício um crime; a religião o transformou em um pecado. Entre as tribos primitivas a violação de um tabu era uma combinação de crime e de pecado. A calamidade da comunidade era considerada sempre como uma punição para o pecado tribal. Para aqueles que acreditavam que a prosperidade e a retidão vão juntas, a prosperidade aparente dos perversos causava tanta preocupação que foi necessário inventar os infernos para punir o violador do tabu; os números desses lugares de punição futura têm variado de um a cinco.

89:2:5 9762 A idéia da confissão e do perdão surgiu muito cedo na religião primitiva. Os homens pediriam o perdão em uma reunião pública pelos pecados que tinham a intenção de cometer na semana vindoura. A confissão era meramente um rito de remissão, e também uma notificação pública de violação, um ritual de gritos: “impuro, impuro!” Então se seguiam todos os esquemas ritualísticos de purificação. Todos os povos antigos praticavam essas cerimônias sem sentido. Muitos costumes aparentemente higiênicos das tribos primitivas haviam vindo, quase sempre, de cerimoniais.

3. A RENÚNCIA E A HUMILHAÇÃO


89:3:1 9763 A renúncia veio como o próximo passo na evolução religiosa; o jejum era uma prática comum. Logo se tornou um costume a abstenção de muitas formas de prazer físico, especialmente os de natureza sexual. O ritual do jejum estava profundamente arraigado em muitas religiões antigas e foi transmitido a praticamente todos os sistemas modernos de pensamento teológico.

89:3:2 9764 Na época em que o homem bárbaro estava exatamente recuperando-se da prática esbanjadora de queimar e de enterrar propriedades junto com os mortos, em um momento em que a estrutura econômica das raças estava começando a tomar forma, essa nova doutrina religiosa da renúncia surgiu, e dezenas de milhares de almas sinceras começaram a cortejar a pobreza. A propriedade foi encarada como uma desvantagem espiritual. Essas noções dos perigos espirituais da posse material eram alimentadas amplamente na época de Filo e de Paulo, e marcadamente influenciaram a filosofia européia desde então.

89:3:3 9765 A pobreza era apenas uma parte do ritual da mortificação da carne, o que, infelizmente, tornou-se incorporado aos escritos e aos ensinamentos de muitas religiões, notadamente, do cristianismo. A penitência é a forma negativa desse ritual, muitas vezes tolo, de renúncia. Mas tudo isso ensinou ao selvagem o autocontrole, o qual foi um avanço que valeu a pena na evolução social. A renúncia, ou a autonegação, e o autocontrole foram dois dos maiores ganhos sociais da religião evolucionária primitiva. O autocontrole deu ao homem uma nova filosofia de vida; ensinou a ele a arte de aumentar a fração que corresponde à sua etapa de vida, diminuindo o denominador das demandas pessoais, em vez de tentar sempre aumentar o numerador da gratificação egoísta.

89:3:4 9766 Essas antigas idéias de autodisciplina abrangiam o autoflagelo e todos os tipos de torturas físicas. Os sacerdotes do culto da mãe estavam especialmente empenhados no ensino da virtude do sofrimento físico, dando o exemplo ao submeterem-se à castração. Os hebreus, os hindus e os budistas eram devotos sinceros dessa doutrina da humilhação física.

89:3:5 9767 Durante toda a antiguidade os homens buscaram, com esses comportamentos de autonegação e renúncia, os créditos extraordinários nos registros dos seus deuses. Era costumeiro, quando sob alguma tensão emocional, fazer votos de renúncia e de autotortura. Com o tempo esses votos assumiram a forma de contratos com os deuses e, nesse sentido, representaram um verdadeiro progresso evolucionário, pois se supunha que os deuses fizessem algo definido como recompensa por essa autotortura e essa mortificação da carne. Os votos eram tanto de negação quanto de afirmação positiva. As promessas dessa natureza extrema e prejudicial são, ainda hoje, bastante observadas em meio a certos grupos da Índia.

89:3:6 9771 Era nada mais do que natural que o culto da renúncia e da humilhação devesse ter dado atenção à gratificação sexual. O culto da continência sexual originou-se como um ritual entre os soldados, antes de entrarem nas batalhas; em dias posteriores tornou-se a prática dos “santos”. Esse culto tolerava o casamento apenas como um mal menor do que a fornicação. Muitas grandes religiões do mundo têm sido influenciadas adversamente por esse culto antigo, mas nenhuma mais marcadamente do que o cristianismo. O apóstolo Paulo era um devoto desse culto, e a sua visão pessoal é refletida nos ensinamentos que ele vinculou à teologia cristã: “É bom para um homem não tocar em uma mulher”. “Gostaria que todos os homens fossem como eu”. “Digo, pois, aos que não são casados e aos viúvos, ser bom para eles permanecerem como eu. ” Paulo sabia muito bem que esses ensinamentos não eram uma parte da boa nova do evangelho de Jesus, e o seu reconhecimento disso é ilustrado por esta declaração sua: “E me permito dizer isso, mas isso não me foi passado como um mandato ou mandamento”. E esse culto levou Paulo a desprezar as mulheres. E o pior de tudo isso é que a sua opinião pessoal vem, há muito, influenciando os ensinamentos de uma grande religião mundial. Se os conselhos do fabricante de tendas e professor tivessem sido obedecidos literal e universalmente, então a raça humana teria chegado a um fim súbito e inglório. Ademais, o envolvimento de uma religião e o antigo culto da continência conduz diretamente a uma guerra contra o casamento e o lar, as verdadeiras fundações da sociedade e as instituições básicas do progresso humano. E não é de admirar-se que todas essas crenças fomentaram a formação de sacerdócios celibatários nas várias religiões de muitos povos.

89:3:7 9772 Algum dia o homem deveria aprender como desfrutar da liberdade sem licença, da nutrição sem a glutoneria e do prazer sem a devassidão. O autocontrole é uma política de regulamentação do comportamento humano melhor do que a renúncia extrema. E Jesus jamais passou aos seus seguidores essas visões pouco razoáveis.

4. AS ORIGENS DO SACRIFÍCIO


89:4:1 9773 O sacrifício como uma parte das devoções religiosas, como muitos outros rituais de adoração, não teve uma origem simples nem única. A tendência de inclinar-se diante do poder e de prostrar-se em adoração na presença do mistério está prognosticada no servilismo do cão diante do seu dono. Um passo apenas separa o impulso da adoração, do ato do sacrifício. O homem primitivo media o valor do seu sacrifício pela dor que sofria. Quando a idéia do sacrifício pela primeira vez ligou-se ao cerimonial religioso, nenhuma oferenda contemplada deixava de produzir a dor. Os primeiros sacrifícios eram atos tais como arrancar os cabelos, cortar a carne, fazer mutilações, arrancar os dentes e cortar fora os dedos. À medida que a civilização avançou, esses conceitos rudes de sacrifício elevaram-se ao nível dos rituais de autoabnegação, ascetismo, jejum, privação e a doutrina cristã mais recente da santificação por meio do pesar, do sofrimento e da mortificação da carne.

89:4:2 9774 Muito cedo, na evolução da religião, existiram duas concepções de sacrifício: a idéia do sacrifício dádiva, que conotava uma atitude de agradecimento, e o sacrifício de débito, que abrangia a idéia de redenção. Mais tarde a noção da substituição foi desenvolvida.

89:4:3 9775 Mais adiante o homem concebeu que o seu sacrifício, de qualquer natureza que fosse, poderia funcionar como um portador de mensagem aos deuses; poderia ser como um doce perfume para as narinas da deidade. Isso trouxe o incenso e outros aspectos estéticos aos rituais de sacrifício que se desenvolveram como festejos de sacrifícios, cada vez mais elaborados e ornados com o passar do tempo.

89:4:4 9781 À medida que a religião evoluiu, os ritos do sacrifício de conciliação e de propiciação substituíram os métodos mais antigos de prevenção, de aplacamento e de exorcismo.

89:4:5 9782 A idéia inicial do sacrifício era a de um imposto de neutralidade, arrecadado pelos espíritos ancestrais; apenas mais tarde a idéia da expiação veio a desenvolver-se. À medida que o homem distanciou-se da noção da origem evolucionária da raça, e à medida que as tradições da época do Príncipe Planetário e da permanência de Adão foram filtrando-se com o passar do tempo, o conceito do pecado e do pecado original foram tornando-se difundidos, de modo que o sacrifício por pecados acidentais e pessoais evoluiu até a doutrina do sacrifício pela expiação do pecado racial. A expiação do sacrifício era um dispositivo de segurança que abrangia até mesmo os ressentimentos e o ciúme de um deus desconhecido.

89:4:6 9783 Rodeado de tantos espíritos sensíveis e de deuses ávidos, o homem primitivo enfrentava uma tal hoste de deidades credoras que requeria todos os sacerdotes, rituais e sacrifícios durante toda uma vida, para isentá-lo de débitos espirituais. A doutrina do pecado original, ou da culpa da raça, fazia com que todas as pessoas começassem já com um sério débito para com os poderes espirituais.

89:4:7 9784 Presentes e subornos são dados aos homens; mas quando se os oferece aos deuses, eles são descritos como sendo dedicados, tornados sagrados ou são chamados de sacrifícios. A renúncia era a forma negativa de propiciação; o sacrifício tornou-se a forma positiva. O ato de propiciação incluía a louvação, a glorificação, a adulação e até mesmo o entretenimento. E são os remanescentes das práticas positivas do velho culto de propiciação que constituem as formas modernas de adoração divina. As formas atuais de adoração são simplesmente a ritualização dessas antigas técnicas de sacrifícios de propiciação positiva.

89:4:8 9785 O sacrifício dos animais significava muito mais para o homem primitivo do que poderia jamais significar para as raças modernas. Esses bárbaros consideravam os animais como parentes verdadeiros e próximos seus. Com o passar do tempo, o homem tornou-se astuto nos seus sacrifícios, parando de oferecer os seus animais de trabalho. A princípio ele sacrificava o melhor de tudo, incluindo os seus animais domesticados.

89:4:9 9786 Não foi uma jactância sem fundamento, que certo dirigente egípcio teve ao declarar que tinha sacrificado 113 433 escravos, 493 386 cabeças de gado, 88 barcos, 2 756 imagens de ouro, 331 702 jarras de mel e de óleo, 228 380 jarras de vinho, 680 714 gansos, 6 744 428 pães e 5 740 352 sacos de moedas. E para fazer isso ele teve de arrecadar até os impostos sofridos dos seus súditos submetidos a um trabalho exaustivo.

89:4:10 9787 A mera necessidade finalmente levou esses semi-selvagens a comer a parte material dos seus sacrifícios, os deuses tendo desfrutado já da alma deles. E esse costume encontrou a sua justificação sob o pretexto do antigo banquete sagrado, um serviço de comunhão de acordo com os usos modernos.

5. OS SACRIFÍCIOS E O CANIBALISMO


89:5:1 9788 As idéias modernas do canibalismo primitivo são inteiramente errôneas; ele era uma parte dos costumes da sociedade primitiva. Do mesmo modo que o canibalismo é tradicionalmente horrível para a civilização moderna, ele era parte da estrutura social e religiosa da sociedade primitiva. Os interesses grupais ditavam a prática do canibalismo. Ele nasceu instigado pela necessidade e perdurou devido à escravidão, à superstição e à ignorância. Era um costume social, econômico, religioso e militar.

89:5:2 9791 O homem primitivo era um canibal; ele gostava da carne humana e, por isso, ele a oferecia como um presente alimentício aos seus espíritos e deuses primitivos. Já que os espíritos fantasmas eram apenas homens modificados, e já que a comida era a maior necessidade humana, então o alimento deveria também ser a maior necessidade de um espírito.

89:5:3 9792 O canibalismo chegou a ser quase universal entre as raças em evolução. Os sangiques eram todos canibais, mas originalmente os andonitas não o eram, nem os noditas, nem os adamitas; nem os anditas o foram até o momento em que se tornaram muito misturados com as raças evolucionárias.

89:5:4 9793 O gosto pela carne humana aumenta. Tendo começado por meio da fome; por amizade, por vingança ou por um ritual religioso, comer a carne humana transforma-se no canibalismo habitual. O canibalismo surgiu por causa da escassez de alimento, embora tenha sido esta, poucas vezes, a razão fundamental. Os esquimós e os andonitas primitivos, entretanto, raramente eram canibais, exceto em épocas de fome. Os homens vermelhos, especialmente na América Central, eram canibais. Chegou a ser uma prática generalizada que as mães primitivas matassem e comessem os seus próprios filhos, para renovar as energias perdidas na concepção, e em Queensland o primeiro filho ainda é assim freqüentemente morto e devorado. Em tempos recentes o canibalismo tem sido deliberadamente adotado por muitas tribos africanas como uma medida de guerra, uma espécie de atrocidade com a qual aterrorizar os vizinhos.

89:5:5 9794 Um certo canibalismo resultou da degeneração de algumas linhagens superiores, mas prevaleceu, sobretudo, em meio às raças evolucionárias. Comer a carne humana começou em uma época em que os homens experimentaram emoções intensas e amargas a respeito dos seus inimigos, e tornou-se uma parte de uma cerimônia solene de vingança; acreditava-se que o fantasma de um inimigo poderia, desse modo, ser destruído ou fundido com aquele de quem comia. Foi uma crença bem difundida a de que os feiticeiros alcançavam os seus poderes comendo carne humana.

89:5:6 9795 Alguns grupos de canibais consumiam apenas os da sua própria tribo, como uma espécie de endogamia pseudo-espiritual que se supunha acentuar a solidariedade tribal. Mas também comiam os inimigos como vingança e com a idéia de apropriar-se da sua força. Era considerado uma honra para a alma de um amigo ou companheiro tribal que o seu corpo fosse comido, e ao mesmo tempo devorar o inimigo nada mais era do que uma punição para com ele. A mente selvagem não tinha pretensões de ser coerente.

89:5:7 9796 Entre algumas tribos os pais idosos buscavam ser comidos pelos seus filhos; entre outras era costumeiro evitar comer parentes próximos e os seus corpos eram vendidos ou trocados pelos de estranhos. Havia um comércio considerável das mulheres e das crianças que tinham sido engordadas para serem abatidas. Quando a doença ou a guerra deixava de exercer o controle da população, o excesso era comido sem cerimônias.

89:5:8 9797 O canibalismo tem desaparecido gradualmente por causa das seguintes influências:

89:5:9 9798 1. Às vezes, assumir responsabilidade coletiva por infligir-se a pena de morte a um companheiro de tribo tornava-se uma cerimônia comunitária. A culpa pelo sangue derramado deixa de ser um crime quando todos participam dela, quando é um ato da sociedade. As últimas manifestações de canibalismo na Ásia foram as de comer criminosos executados.

89:5:10 9799 2. Tornou-se muito cedo um ritual religioso, mas o crescimento do medo do fantasma nem sempre funcionou para reduzir o canibalismo.

89:5:11 97910 3. Finalmente progrediu a um ponto em que apenas certas partes ou órgãos do corpo eram comidos, essas partes supostamente continham a alma ou porções do espírito. Beber o sangue tornou-se comum, e era costumeiro misturar as partes “comíveis” do corpo aos remédios.

89:5:12 9801 4. Tornou-se circunscrito aos homens; as mulheres eram proibidas de comer a carne humana.

89:5:13 9802 5. Em seguida ficou circunscrito aos chefes, sacerdotes e xamãs.

89:5:14 9803 6. Então, tornou-se um tabu entre as tribos superiores. O tabu do canibalismo originou-se na Dalamátia e lentamente disseminou-se pelo mundo. Os noditas encorajavam a cremação como um meio de combater o canibalismo, já que então era uma prática comum desenterrar os corpos e comê-los.

89:5:15 9804 7. O sacrifício humano fez soar o dobrado de morte do canibalismo. A carne humana, tendo tornado-se comida para os homens superiores, os chefes, ficou finalmente reservada aos espíritos ainda superiores; e assim a oferta de sacrifícios humanos efetivamente pôs um fim ao canibalismo, exceto entre as tribos inferiores. Quando o sacrifício humano ficou plenamente estabelecido, o canibalismo tornou-se um tabu; a carne humana era alimento apenas para os deuses; o homem podia comer apenas uma pequena porção cerimonial, como um sacramento.

89:5:16 9805 Finalmente generalizou-se o uso de substitutos animais nos sacrifícios e, mesmo nas tribos mais atrasadas, comiam-se cães, o que reduziu grandemente o canibalismo. O cão foi o primeiro animal domesticado e era tido em grande estima, tanto como amigo, quanto como comida.

6. A EVOLUÇÃO DO SACRIFÍCIO HUMANO


89:6:1 9806 O sacrifício humano foi um resultado indireto do canibalismo, bem como a sua cura. O fato de prover companhia espiritual até o mundo do espírito levou também à diminuição do canibalismo, pois nunca foi costume comer os corpos dos sacrifícios de morte. Nenhuma raça esteve totalmente livre da prática de sacrifício humano de alguma forma e em algum momento, embora os andonitas, os noditas e os adamitas tivessem sido os menos viciados no canibalismo.

89:6:2 9807 O sacrifício humano tem sido virtualmente universal; ele perdurou nos costumes religiosos dos chineses, hindus, egípcios, hebreus, mesopotâmios, gregos, romanos e de muitos outros povos e mesmo até tempos recentes, entre as tribos africanas e australianas atrasadas. Os índios americanos mais recentes tiveram uma civilização que emergiu do canibalismo, sendo portanto repleta de sacrifícios humanos, especialmente na América Central e na América do Sul. Os caldeus estavam entre os primeiros a abandonar o sacrifício humano nas ocasiões comuns, substituindo-o pelo sacrifício de animais. Cerca de dois mil anos atrás um imperador japonês de bom coração introduziu imagens de argila para ocupar o lugar dos humanos sacrificados, mas foi há menos de mil anos que esses sacrifícios terminaram no norte da Europa. Entre algumas tribos retrógradas, o sacrifício humano é ainda efetuado por voluntários, em uma espécie de suicídio ritual religioso. Um xamã certa vez ordenou o sacrifício de um velho homem muito respeitado de uma certa tribo. O povo revoltou-se; e recusaram a obedecê-lo. Então o velho homem fez com que o seu próprio filho o matasse; os antigos realmente acreditavam nesse costume.

89:6:3 9808 Não existe registro de uma experiência mais trágica e patética, e que ilustra as dolorosas contendas entre os costumes religiosos antigos e honrados e as exigências contrárias da civilização em avanço, do que a narrativa hebraica de Jefté e da sua única filha. Como era um costume comum, esse homem bem-intencionado fez um voto tolo, tendo barganhado com o “deus das batalhas”, concordando em pagar um certo preço pela vitória sobre os seus inimigos. E esse preço era sacrificar a primeira pessoa que saísse da sua casa para encontrá-lo quando ele voltasse para o seu lar. Jefté pensou que um dos seus confiáveis escravos estaria à mão para saudá-lo, mas aconteceu que a sua única filha saiu para dar-lhe as boas-vindas ao lar. E assim, mesmo em uma data recente e no meio de um povo supostamente civilizado, essa bela jovem, depois de dois meses lamentado o seu destino, foi de fato oferecida como um sacrifício humano pelo seu pai, e com a aprovação dos seus companheiros de tribo. E tudo isso foi feito enfrentando as rigorosas ordens de Moisés contra a oferenda de sacrifício humano. Os homens e as mulheres, todavia, obstinam-se no vício de fazer votos tolos e desnecessários, e os homens de outrora tinham essas promessas como altamente sagradas.

89:6:4 9811 Nos tempos antigos, quando a construção de um novo prédio de alguma importância era iniciada, era costume matar um ser humano como um “sacrifício à fundação”. Isso provia para que um espírito fantasma vigiasse e protegesse a estrutura. Quando os chineses se preparavam para fundir um sino, o costume decretava o sacrifício de uma jovem ao menos, com o propósito de melhorar o tom do sino; a moça escolhida era jogada viva no metal derretido.

89:6:5 9812 Muitos grupos há muito tinham a prática de incorporar escravos vivos a paredes importantes. Em tempos mais recentes as tribos do norte da Europa passaram a usar a sombra de alguém que passava, nesse costume de incorporar pessoas vivas nas paredes de novos prédios. Os chineses enterravam em uma parede aqueles trabalhadores que morriam enquanto a construíam.

89:6:6 9813 Ao construir as paredes de Jericó, um pequeno rei da Palestina “lançou a fundação sobre Abiram, o seu primogênito, e fez os portões sobre o seu filho mais jovem, Segub”. Naquela data recente, não apenas esse pai pôs dois dos seus filhos vivos nos buracos da fundação dos portões da cidade, mas esse ato é também registrado como estando “de acordo com a palavra do Senhor”. Moisés tinha proibido esses sacrifícios nas fundações, os israelitas, contudo, voltaram a eles pouco depois da sua morte. A cerimônia do século vinte, de depositar berloques e presentes na pedra fundamental de um novo edifício, é uma reminiscência dos sacrifícios primitivos das fundações.

89:6:7 9814 Durante um longo tempo foi costume de muitos povos dedicar os primeiros frutos aos espíritos. E essas observâncias, atualmente mais ou menos simbólicas, são todas reminiscências das cerimônias primitivas que envolviam o sacrifício humano. A idéia de oferecer o primogênito em sacrifício era bem difundida entre os antigos, especialmente entre os fenícios, que foram os últimos a abandoná-la. Usava-se dizer durante o sacrifício, “a vida pela vida”. E, agora, vós dizeis quando da morte, “do pó ao pó”.

89:6:8 9815 O espetáculo de Abraão coagido a sacrificar o seu filho Isaac, ainda que chocante para as suscetibilidades civilizadas, não era uma idéia nova nem estranha para os homens daqueles tempos. Tinha sido uma prática comum que os pais, em tempos de grandes pressões emocionais, sacrificassem os seus filhos primogênitos. Muitos povos têm uma tradição análoga à dessa história, pois certa vez existiu uma crença mundial profunda de que era necessário ofertar um sacrifício humano quando qualquer coisa extraordinária ou inusitada acontecia.

7. AS MODIFICAÇÕES DO SACRIFÍCIO HUMANO


89:7:1 9816 Moisés tentou dar um fim aos sacrifícios humanos inaugurando como substituto o sistema de resgate. Ele estabeleceu um programa sistemático que permitia ao seu povo escapar dos piores resultados dos seus votos imprudentes e tolos. Terras, propriedades e filhos podiam ser redimidos segundo as espórtulas estabelecidas, pagáveis aos sacerdotes. Os grupos que deixaram de sacrificar os seus primogênitos logo estavam em grandes vantagens sobre os vizinhos menos avançados, que continuavam com esses atos de atrocidade. Muitas dessas tribos atrasadas foram não apenas grandemente enfraquecidas pela perda de filhos, como também a sucessão da liderança era freqüentemente interrompida.

89:7:2 9821 Uma conseqüência do sacrifício de filhos, que já passava, foi o costume de lambuzar as ombreiras das portas da casa com sangue para proteger os primogênitos. Isto era freqüentemente feito em uma das festas sagradas do ano, e essa cerimônia existiu na maior parte do mundo, do México ao Egito.

89:7:3 9822 Mesmo depois que a maioria dos grupos tinha cessado a matança ritual de filhos, era costume abandonar um infante na selva ou em um pequeno barco na água. Se a criança sobrevivesse, julgava-se que os deuses tinham intervindo para preservá-la, como nas tradições de Sargon, Moisés, Ciro e Rômulo. Então veio a prática de dedicar os filhos primogênitos considerando-os sagrados ou sacrificatórios, permitindo-lhes crescer e depois os exilando em vez de sacrificá-los; essa foi a origem da colonização. Os romanos aderiram a esse costume no seu esquema de colonização.

89:7:4 9823 Muitas das ligações excêntricas, de libertinagem sexual combinada à adoração primitiva, tiveram a sua origem no sacrifício humano. Nos tempos de outrora, se uma mulher deparava-se com caçadores de cabeças, ela podia salvar a sua vida rendendo-se sexualmente. Posteriormente, uma donzela, consagrada aos deuses em sacrifício, poderia escolher salvar a sua vida dedicando o seu corpo à vida no serviço do sexo sagrado nos templos; e desse modo ela podia ganhar o dinheiro necessário à sua redenção. Os antigos consideravam como sendo altamente elevado ter relações sexuais com uma mulher engajada assim em resgatar a sua vida. A relação com essas donzelas sagradas era uma cerimônia religiosa e, além do que, todo esse ritual proporcionava uma desculpa aceitável para a gratificação sexual comum. Essa era uma espécie sutil de enganar a si próprio, que tanto as donzelas quanto os seus consortes deliciavam-se em praticar entre si. Os costumes estão sempre atrasados em relação aos progressos evolucionários da civilização, e, assim sendo, sancionam as práticas sexuais mais primitivas e mais selvagens das raças em evolução.

89:7:5 9824 A prostituição nos templos finalmente difundiu-se no sul da Europa e na Ásia. O dinheiro ganho pelas prostitutas dos templos era considerado sagrado por todos os povos – uma alta dádiva a ser apresentada aos deuses. Os tipos do mais alto nível de mulheres enchiam os mercados sexuais dos templos, e elas devotavam os seus ganhos a todas as espécies de serviços sagrados e trabalhos de benefício público. Muitas das melhores classes de mulheres coletavam os seus dotes por meio do serviço do sexo temporário nos templos, e a maior parte dos homens preferia ter essas mulheres como esposas.

8. A REDENÇÃO E AS ALIANÇAS


89:8:1 9825 A redenção por meio do sacrifício e a prostituição nos templos, na realidade, foram modificações do sacrifício humano. Em seguida veio o simulacro do sacrifício das filhas. Essa cerimônia consistia em uma sangria, com a dedicação de virgindade vitalícia, e foi uma reação moral à antiga prostituição nos templos. Em tempos mais recentes as virgens dedicavam-se ao serviço de manter os fogos sagrados dos templos.

89:8:2 9826 Os homens finalmente conceberam a idéia de que oferecer alguma parte do corpo poderia tomar o lugar do antigo e completo sacrifício humano. A mutilação física era também considerada como uma substituta aceitável. Cabelos, unhas, sangue e até mesmo os dedos das mãos e dos pés eram sacrificados. O rito posterior, mas também antigo e quase universal, da circuncisão, foi uma conseqüência do culto do sacrifício parcial; acontecia puramente por sacrifício, nenhum pensamento de higiene era ligado a ele. Os homens eram circuncidados; as mulheres tinham as suas orelhas furadas.

89:8:3 9831 Ulteriormente tornou-se costume atar os dedos em vez de cortá-los. Raspar a cabeça, ou cortar o cabelo era também uma forma de devoção religiosa. Fazer eunucos foi, a princípio, uma modificação da idéia do sacrifício humano. Furar o nariz e os lábios ainda é coisa praticada na África, e as tatuagens são uma evolução artística da cicatrização primitiva e crua do corpo.

89:8:4 9832 O costume do sacrifício finalmente tornou-se associado, como resultado dos ensinamentos em avanço, à idéia da aliança. Afinal, concebia-se que os deuses estavam entrando em acordos reais com o homem; e isso foi um grande passo na estabilização da religião. A lei, ou uma aliança, toma o lugar da sorte, do medo e da superstição.

89:8:5 9833 O homem não poderia sequer sonhar em celebrar contratos com a Deidade, antes que o seu conceito de Deus tivesse avançado até o nível em que os controladores do universo fossem considerados confiáveis. E a idéia primitiva que o homem fazia de Deus era tão antropomórfica que ele tornou-se incapaz de conceber uma Deidade confiável até que tivesse, ele próprio, tornado-se relativamente confiável, moral e eticamente.

89:8:6 9834 Mas a idéia de celebrar uma aliança com os deuses finalmente passou a existir. O homem evolucionário finalmente adquiriu uma dignidade moral tal que o fez atrever-se a barganhar com os seus deuses. E assim o tráfico de oferendas de sacrifícios gradualmente desenvolveu-se, chegando ao jogo da barganha filosófica do homem com Deus. E tudo isso representou um novo recurso para fazer o seguro contra a má sorte ou, antes, uma técnica aperfeiçoada para adquirir a prosperidade de modo mais definido. Não deveis nutrir a idéia errônea de que os sacrifícios primitivos tivessem sido uma dádiva livre e gratuita aos deuses, uma oferenda espontânea de gratidão ou agradecimento; não, elas não eram a expressão da verdadeira adoração.

89:8:7 9835 As formas primitivas de oração nada mais eram do que barganhas com os espíritos, um jogo de argumentos com os deuses. Era uma espécie de permuta na qual o pleito e a persuasão foram substituídos por algo mais tangível e precioso. O comércio em desenvolvimento entre as raças tinha inculcado o espírito da troca e tinha desenvolvido a astúcia na permuta; e agora esses aspectos começavam a aparecer nos métodos dos cultos realizados pelo homem. E como alguns homens eram melhores negociantes que outros, desse modo alguns eram considerados como melhores rezadores do que outros. A prece de um homem justo era tida em alta estima. Um homem justo era aquele que havia pagado todas as suas contas aos espíritos, que se tinha desincumbido plenamente de toda obrigação ritual para com os deuses.

89:8:8 9836 A prece primitiva não era adoração; era uma petição em forma de barganha para conseguir-se saúde, riqueza e vida. E, em muitos aspectos, as preces não têm mudado muito com o passar das idades. Elas ainda são lidas em livros, recitadas formalmente e escritas para serem colocadas nas rodas ou para serem dependuradas nas árvores, onde o soprar dos ventos irá poupar ao homem o trabalho de gastar o próprio alento.

9. OS SACRIFÍCIOS E OS SACRAMENTOS


89:9:1 9837 O sacrifício humano, ao longo do curso da evolução dos rituais urantianos, tem avançado das manifestações sangrentas do canibalismo até níveis mais elevados e simbólicos. Os rituais primitivos de sacrifícios deram origem às cerimônias posteriores do sacramento. Em épocas mais recentes apenas o sacerdote compartilharia de um pequeno pedaço do sacrifício canibalesco ou de uma gota do sangue humano, e então todos comeriam do animal substituto. Essas idéias primitivas sobre o resgate, a redenção e as alianças têm evoluído até os serviços dos sacramentos recentes. E toda essa evolução do cerimonial tem exercido uma influência poderosamente socializadora.

89:9:2 9841 Durante o culto da Mãe de Deus, no México e em outros lugares, bolos e vinho foram utilizados finalmente como sacramentos em lugar da carne e do sangue dos antigos sacrifícios humanos. Os hebreus praticaram esse ritual durante muito tempo como parte das suas cerimônias de Páscoa, e foi esse cerimonial que posteriormente deu origem à versão cristã desse tipo de sacramento.

89:9:3 9842 As antigas fraternidades sociais eram baseadas no rito de se beber sangue; a fraternidade judaica primitiva era uma questão de sacrifício de sangue. Paulo começou a construir um novo culto cristão no “sangue da aliança eterna”. E, conquanto ele possa ter sobrecarregado desnecessariamente a cristandade com ensinamentos sobre sangue e sacrifício, de uma vez por todas ele colocou um fim às doutrinas da redenção por intermédio de sacrifícios humanos ou animais. As concessões teológicas feitas por Paulo indicam que mesmo a revelação deve submeter-se ao controle gradativo da evolução. Segundo Paulo, Cristo fez o sacrifício último, e totalmente suficiente por si; o Juiz divino está agora, e para sempre, plenamente satisfeito.

89:9:4 9843 E assim, após longas idades, o culto do sacrifício evoluiu até o culto do sacramento. Assim, os sacramentos das religiões modernas são os sucessores legítimos daquelas cerimônias primitivas chocantes de sacrifício humano e dos ainda mais primitivos rituais canibalescos. Muitos ainda contam depender do sangue para a salvação, mas isso ao menos se tornou figurativo, simbólico e místico.

10. O PERDÃO DO PECADO


89:10:1 9844 O homem da antiguidade apenas alcançou a consciência do favorecimento de Deus por meio do sacrifício. O homem moderno deve desenvolver novas técnicas para alcançar a autoconsciência da salvação. A consciência do pecado perdura na mente dos mortais, mas os padrões dos seus pensamentos sobre a salvação desse pecado entraram em desuso e tornaram-se antiquados. A realidade da necessidade espiritual subsiste, mas o progresso intelectual destruiu os métodos antigos de assegurar a paz e o consolo para a mente e para a alma.

89:10:2 9845 O pecado deve ser redefinido como uma deslealdade deliberada para com a Deidade. E há graus de deslealdade: a lealdade parcial da indecisão; a lealdade dividida do conflito; a lealdade moribunda da indiferença; e a morte da lealdade demonstrada pela devoção a ideais sem Deus.

89:10:3 9846 O sentido ou o sentimento de culpa vem da consciência de ter violado os costumes; o que não é necessariamente um pecado. Não há pecado verdadeiro quando há a ausência de deslealdade consciente à Deidade.

89:10:4 9847 A possibilidade de reconhecimento do sentido de culpa é um sinal de distinção transcendental para a humanidade. Ela não marca o homem como um meio, mas, antes, coloca-o em separado como uma criatura de grandeza potencial e de glória sempre-ascendente. Um tal sentido de indignidade é o estímulo inicial que deveria levar rápida e seguramente até aquela conquista da fé que translada a mente mortal até níveis magníficos de nobreza moral, de discernimento cósmico e do viver espiritual; e assim todos os significados da existência humana mudam do temporal para o eterno, e todos os valores elevam-se do humano para o divino.

89:10:5 9848 A confissão do pecado é um repúdio corajoso à deslealdade, mas de nenhum modo mitiga as conseqüências no espaço-tempo de tal deslealdade. Mas a confissão – o reconhecimento sincero da natureza do pecado – é essencial ao crescimento religioso e ao progresso espiritual.

89:10:6 9851 O perdão do pecado, da parte da Deidade, é a renovação das relações de lealdade que vem em seguida àquele período em que a consciência humana teve um lapso nas suas relações de fidelidade por conseqüência da rebelião consciente. O perdão não tem de ser buscado, apenas recebido, como a consciência do restabelecimento das relações de lealdade entre a criatura e o Criador. E todos os filhos leais de Deus são felizes, amantes do serviço e sempre progridem na ascensão ao Paraíso.

89:10:7 9852 [Apresentado por um Brilhante Estrela Vespertino de Nebadon.]

DOCUMENTO 90

O XAMANISMO – CURANDEIROS E SACERDOTES
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A evolução das observâncias religiosas progrediu do aplacamento, restrição, exorcismo, coerção, conciliação e propiciação até o sacrifício, expiação e redenção. A técnica do ritual religioso passou das formas primitivas de culto aos fetiches até a magia e os milagres; e, à medida que o ritual se tornou mais intrincado, para responder ao conceito cada vez mais complexo que o homem fazia dos reinos supranaturais, ele ficou inevitavelmente dominado pelos curandeiros, xamãs e sacerdotes.

90:0:2 9862 Com o progresso dos conceitos do homem primitivo, o mundo espiritual acabou por ser considerado como não sendo sensível aos mortais comuns. Apenas os seres excepcionais, dentre os humanos, podiam chegar ao ouvido dos deuses; apenas os homens e as mulheres extraordinárias seriam ouvidos pelos espíritos. A religião, assim, entra em uma nova fase, um estágio em que ela gradativamente passa às mãos dos intermediários; sempre um curandeiro, um xamã ou um sacerdote interpõe-se entre o religioso e o objeto da sua adoração. E, hoje, a maioria dos sistemas de crenças religiosas organizadas em Urântia está passando por esse nível de desenvolvimento evolucionário.

90:0:3 9863 A religião evolucionária nasce de um medo simples e Todo-Poderoso, o medo que surge na mente humana quando ela se confronta com o desconhecido, o inexplicável e o incompreensível. A religião finalmente alcança a compreensão profundamente simples de um amor Todo-Poderoso, o amor que invade a alma humana de um modo irresistível, quando ela desperta para a concepção da afeição ilimitada do Pai Universal pelos filhos do universo. Todavia, entre o começo e a consumação da evolução religiosa, interpõe-se a longa era dos xamãs, os quais presumem colocar-se entre o homem e Deus como intermediários, intérpretes e intercessores.

1. OS PRIMEIROS XAMÃS – OS CURANDEIROS


90:1:1 9864 O xamã era o curandeiro mais eminente, o homem fetiche das cerimônias e a personalidade foco de todas as práticas da religião evolucionária. Em muitos grupos, o xamã chegou a ser superior ao chefe guerreiro, assinalando o começo da dominação da igreja sobre o estado. O xamã algumas vezes funcionava como um sacerdote e mesmo como um rei-sacerdote. Algumas das tribos mais recentes possuíam ambos, os primitivos xamãs-curandeiros (videntes) e os xamãs-sacerdotes, que surgiram posteriormente. E, em muitos casos, o ofício do xamã tornou-se hereditário.

90:1:2 9865 Uma vez que nos tempos antigos qualquer coisa de anormal era atribuída à possessão de espíritos, qualquer anormalidade notável, mental ou física, constituía uma qualificação para ser curandeiro. Muitos desses homens eram epilépticos, muitas das mulheres eram histéricas, e esses dois tipos justificam uma boa parte do que se tem como a inspiração antiga, tanto quanto as possessões de espíritos e demônios. Dentre esses sacerdotes primitivos, não eram poucos os que pertenciam a uma classe que tem sido denominada como paranóica.

90:1:3 9871 Embora eles possam haver exercido práticas fraudulentas em questões menores, a grande maioria dos xamãs acreditava no fato da própria possessão espiritual. Mulheres que eram capazes de se lançar em um transe ou em um ataque cataléptico tornaram-se xamãs poderosas; mais tarde, tais mulheres tornaram-se profetas e médiuns espirituais. Os seus transes catalépticos usualmente envolviam as pretensas comunicações com os fantasmas dos mortos. Muitas xamãs eram também dançarinas profissionais.

90:1:4 9872 Contudo, nem todos os xamãs se auto-iludiam; muitos eram trapaceiros astutos e sagazes. Com o desenvolvimento da profissão, exigia-se que um noviço servisse como aprendiz, durante dez anos de provações severas e de renúncia, para qualificar-se como curandeiro. Os xamãs desenvolveram um modo de vestir próprio e simulavam uma conduta misterioso-afetada. Freqüentemente, empregavam drogas para induzir certos estados físicos que impressionavam e mistificavam os companheiros da tribo. Truques de prestidigitadores eram considerados como sobrenaturais pela gente comum, e alguns sacerdotes astutos foram os primeiros a usar o ventriloquismo. Muitos dos antigos xamãs inadvertidamente caíram no hipnotismo; outros induziam a auto-hipnose, por meio de olhar fixamente o próprio umbigo.

90:1:5 9873 Conquanto muitos deles recorressem a esses truques e fraudes, a sua reputação como uma classe, afinal, teve um êxito aparente. Quando um xamã falhava nos seus trabalhos, se ele não pudesse apresentar uma desculpa plausível, ou ele era rebaixado ou matavam-no. Assim os xamãs honestos pereciam logo; apenas os atores astutos sobreviviam.

90:1:6 9874 Foi o xamanismo que tomou o comando exclusivo dos assuntos tribais das mãos dos mais velhos e fortes, entregando-o nas mãos dos astutos, dos espertos e dos perspicazes.

2. AS PRÁTICAS XAMANISTAS


90:2:1 9875 A conjuração de espíritos era um procedimento muito preciso e altamente complicado, comparável aos rituais das igrejas de hoje conduzidos em uma língua antiga. A raça humana muito cedo buscou a ajuda supra-humana para a revelação; e os homens acreditavam que os xamãs recebiam de fato tais revelações. Se bem que os xamãs utilizassem o grande poder da sugestão no seu trabalho, era quase que invariavelmente sugestão negativa; apenas em tempos muito recentes, a técnica de sugestão positiva tem sido empregada. No desenvolvimento inicial da sua profissão, os xamãs começaram a especializar-se em vocações tais como fazer chover, curar doenças e desvendar crimes. Curar as doenças não era, contudo, a função principal de um curandeiro xamanista, e sim conhecer e controlar os riscos da vida.

90:2:2 9876 A magia negra antiga, tanto a religiosa quanto a secular, era chamada de magia branca quando praticada por sacerdotes, videntes, xamãs ou curandeiros. Os praticantes da magia negra eram chamados de feiticeiros, magos, bruxos e bruxas, encantadores, necromantes, conjuradores e adivinhos. Com o passar dos tempos, todos esses supostos contatos com o sobrenatural foram classificados de bruxaria ou xamanismo.

90:2:3 9877 A bruxaria abrangia a magia executada pelos espíritos mais primitivos, irregulares e não reconhecidos; o xamanismo tinha a ver com os milagres realizados pelos espíritos comuns e pelos deuses reconhecidos da tribo. Nos tempos posteriores, as bruxas tornaram-se associadas ao demônio, e assim o cenário ficou pronto para as tantas exibições relativamente recentes de intolerância religiosa. A bruxaria era uma religião para muitas tribos primitivas.

90:2:4 9878 Os xamãs eram grandes crentes na missão do acaso como revelador da vontade dos espíritos; eles freqüentemente tiravam a sorte para tomar decisões. Os resíduos modernos dessa propensão para tirar a sorte são ilustrados, não apenas nos muitos jogos de azar, mas também nas bem conhecidas rimas de “eliminação”. Houve época em que a pessoa sorteada por eliminação devia morrer; agora, apenas em alguns jogos infantis isso acontece. Aquilo que era um assunto sério, para o homem primitivo, sobreviveu como uma diversão da criança moderna.

90:2:5 9881 Os curandeiros depositavam uma grande confiança nos sinais e presságios, tais como: “Quando ouvires um som de sussurro vindo do topo das amoreiras, então trata de agir”. Muito cedo, na história da raça, os xamãs voltaram a sua atenção para as estrelas. A astrologia primitiva foi uma crença e uma prática mundial; a interpretação de sonhos também se tornou difundida. Tudo isso foi logo seguido do aparecimento daquelas mulheres xamãs temperamentais que professavam ser capazes de comunicar-se com os espíritos dos mortos.

90:2:6 9882 Embora de origem antiga, os xamãs que traziam as chuvas, ou xamãs do tempo, perduraram através das idades. Uma seca severa significava a morte para os agricultores primitivos; o controle do tempo foi o objetivo de muita magia antiga. O homem civilizado ainda faz do tempo um tópico usual para a conversa. Os povos antigos todos acreditavam no poder do xamã de trazer a chuva; mas era costumeiro matá-lo quando ele fracassava, a menos que pudesse apresentar uma desculpa plausível à qual atribuir o fracasso.

90:2:7 9883 Várias vezes, os césares baniram os astrólogos, mas eles voltavam invariavelmente por causa da crença popular nos seus poderes. Eles não podiam ser expulsos, e até mesmo no século dezesseis depois de Cristo os dirigentes das igrejas e dos estados do Ocidente foram patronos da astrologia. Milhares de pessoas supostamente inteligentes ainda acreditam que uma pessoa pode nascer sob a regência de uma estrela de boa ou de má sorte; que a justaposição dos corpos celestes determina o resultado de várias aventuras terrenas. Os cartomantes ainda estão sendo freqüentados pelos crédulos.

90:2:8 9884 Os gregos acreditavam na eficácia do aconselhamento dos oráculos, os chineses usavam a magia como proteção contra os demônios; o xamanismo floresceu na Índia e. ainda, perdurou abertamente na Ásia Central. É uma prática apenas recentemente abandonada em boa parte do mundo.

90:2:9 9885 De tempos em tempos, profetas e instrutores verdadeiros surgiram para denunciar e desmascarar o xamanismo. Mesmo o homem vermelho em via de extinção teve um profeta assim nos últimos cem anos, Shawnee Tenskwatawa, que previu o eclipse do sol em 1808 e que denunciou os vícios do homem branco. Muitos verdadeiros instrutores têm surgido entre as várias tribos e raças em todas as longas idades da história evolucionária. E eles continuarão a aparecer para desafiar os xamãs ou os sacerdotes de qualquer época que se oponham à educação geral e que tentem criar obstáculos ao progresso científico.

90:2:10 9886 De muitas maneiras e por métodos tortuosos, os antigos xamãs estabeleceram as suas reputações como vozes de Deus e custódios da providência. Eles aspergiam os recém-nascidos com água, conferiam nomes a eles e praticavam a circuncisão nos homens. Eles presidiam a todas as cerimônias de sepultamento e faziam o devido anúncio da chegada, a salvo, dos mortos na terra dos espíritos.

90:2:11 9887 Os sacerdotes xamanistas e os curandeiros freqüentemente tornavam-se muito ricos com o acúmulo dos seus vários honorários, que eram, segundo alegavam, oferendas aos espíritos. Não raro, um xamã acumulava praticamente toda a riqueza material da sua tribo. Com a morte de um homem rico, era costumeiro dividir as suas propriedades igualmente entre o xamã e alguma empresa pública ou de caridade. Essa prática ainda perdura em algumas partes do Tibete, onde metade da população masculina pertence a essa classe não produtiva.

90:2:12 9891 Os xamãs vestiam-se bem e costumavam ter várias esposas; eles eram a aristocracia original, sendo todos isentos de todas as restrições tribais. Freqüentemente, eram de baixa condição mental e moral. Eliminavam os seus rivais, denominando-os bruxos e feiticeiros, e muito freqüentemente ascendiam a uma posição de tanta influência e poder que eram capazes de dominar os chefes ou os reis.

90:2:13 9892 O homem primitivo considerava o xamã como um mal necessário; ele temia-o, mas não gostava dele. O homem primitivo respeitava o conhecimento; ele honrava e recompensava a sabedoria. O xamã era sobretudo uma fraude, mas a veneração pelo xamanismo ilustra bem o valor conferido à sabedoria na evolução da raça.

3. A TEORIA XAMANISTA DA DOENÇA E DA MORTE


90:3:1 9893 Posto que o homem antigo considerava a si próprio e ao meio ambiente material como sendo diretamente responsáveis pelos caprichos dos fantasmas e das fantasias dos espíritos, não é estranho que a sua religião deva ter estado assim tão exclusivamente preocupada com questões materiais. O homem moderno enfrenta os seus problemas materiais diretamente; ele reconhece que a matéria responde à manipulação inteligente da mente. O homem primitivo, do mesmo modo, desejava modificar e mesmo controlar a vida e as energias dos domínios físicos; e, posto que a sua compreensão limitada do cosmo levou-o à crença de que os fantasmas, espíritos e deuses, pessoal e imediatamente, envolviam-se no controle detalhado da vida e da matéria, ele logicamente dirigiu os seus esforços para conquistar o favorecimento e o apoio desses agentes supra-humanos.

90:3:2 9894 Vista sob essa luz, grande parte daquilo que é inexplicável e irracional nos cultos antigos é compreensível. As cerimônias dos cultos eram uma tentativa primitiva do homem para controlar o mundo material no qual ele se encontrava. E grande parte dos seus esforços era feita no sentido de prolongar a vida e assegurar a saúde. Já que as doenças e a própria morte eram originalmente encaradas como fenômenos espirituais, era inevitável que os xamãs, funcionando como curandeiros e sacerdotes, devessem também ter atuado como médicos e cirurgiões.

90:3:3 9895 A mente primitiva pode ser limitada por falta de dados comprovados, mas a despeito de tudo permanece lógica. Quando alguém que pensa observa a doença e a morte, ele propõe-se a determinar as causas dessas aflições e, de acordo com a sua compreensão, os xamãs e os cientistas têm proposto as seguintes teorias sobre as aflições:

90:3:4 9896 1. Os fantasmas ( as influências espirituais diretas. A primeiríssima hipótese avançada para a explicação da doença e da morte era que os espíritos causassem a doença retirando a alma do corpo; se ela não retornasse, seguia-se a morte. Os antigos temiam tanto a ação malévola dos fantasmas que geravam as doenças, que eles abandonavam freqüentemente os indivíduos doentes até mesmo sem comida e água. A despeito da base errônea para essas crenças, eles isolavam efetivamente os indivíduos afligidos e impediam que as doenças contagiosas se espalhassem.

90:3:5 9897 2. A violência ( causas óbvias. As causas de alguns acidentes e mortes eram tão fáceis de serem identificadas que foram logo retiradas da categoria das ações dos fantasmas. As fatalidades e os ferimentos conseqüentes da guerra, de combate com animais e outras formas prontamente identificáveis eram consideradas como ocorrências naturais. Durante muito tempo, porém, acreditou-se que os espíritos eram ainda responsáveis pelo retardamento da cura ou pela infecção das feridas, ainda que “naturais” pela sua causa. Se nenhum agente observável pudesse ser descoberto, os espíritos fantasmas eram ainda responsabilizados pela doença e pela morte.

90:3:6 9901 Hoje, na África e em outros locais, podem ser encontrados povos primitivos que matam alguém sempre que uma morte não violenta acontece. Os seus curandeiros indicam-lhes os culpados. Se uma mãe morre ao dar a luz, a criança é imediatamente estrangulada ( uma vida por uma vida.

90:3:7 9902 3. A magia( a influência dos inimigos. Achava-se que muitas doenças eram causadas por feitiço, a ação do mau olhado e da varinha mágica. No passado, era realmente perigoso apontar um dedo para qualquer pessoa; apontar ainda é considerado como maus modos. Nos casos de doença obscura e de morte, os antigos costumavam realizar um inquérito formal, dissecar o corpo e apontar alguma coisa achada como a causa da morte; de outro modo, a morte seria atribuída à bruxaria, havendo, assim, a necessidade da execução da bruxa responsável por ela. Esses inquéritos dos antigos médicos legistas salvavam as vidas de muitas supostas bruxas. Entre alguns, acreditava-se que um companheiro de tribo poderia morrer em conseqüência da própria bruxaria e, nesse caso, ninguém seria acusado.

90:3:8 9903 4. O pecado ( a punição pela violação de um tabu. Em épocas relativamente recentes, acreditava-se que a doença fosse uma punição para o pecado, pessoal ou racial. Entre os povos que passavam por esse nível de evolução, a teoria que prevalecia era a de que ninguém poderia ser afligido, a menos que tivesse violado um tabu. Considerar a doença e o sofrimento como “flechas do Todo-Poderoso dentro de si” é típico dessas crendices. Os chineses e os mesopotâmios, durante muito tempo, consideraram a doença como resultado da ação de demônios maus, embora os caldeus também considerassem as estrelas como sendo a causa de sofrimentos. Essa teoria da doença como conseqüência da ira divina ainda prevalece entre muitos grupos de urantianos com reputação de civilizados.

90:3:9 9904 5. As causas naturais. A humanidade tem sido muito lenta em aprender os segredos materiais das inter-relações de causa e de efeito nos domínios físicos da energia, da matéria e da vida. Os gregos antigos, havendo preservado as tradições dos ensinamentos de Adamson, estavam entre os primeiros a reconhecer que toda doença resulta de causas naturais. Lenta e certamente, o desabrochar de uma era científica está destruindo as teorias antigas do homem sobre a doença e a morte. A febre foi uma das primeiras indisposições humanas a serem retiradas da categoria das desordens sobrenaturais e, progressivamente, a era da ciência tem rompido as algemas da ignorância que por tanto tempo aprisionaram a mente humana. Uma compreensão da velhice e do contágio está obliterando gradualmente o medo humano dos fantasmas, de espíritos e de deuses como os perpetradores pessoais da miséria humana e do sofrimento mortal.

90:3:10 9905 A evolução infalivelmente alcança os seus objetivos: ela imbui o homem daquele medo supersticioso do desconhecido e daquele receio do não visível, e estes são um andaime na construção do conceito de Deus. E, havendo testemunhado o nascimento de uma compreensão avançada da Deidade, por meio da ação coordenada da revelação, essa mesma técnica de evolução infalivelmente coloca, então, em movimento, aquelas forças do pensamento que irão destruir inexoravelmente o andaime que já serviu ao seu propósito.

4. A MEDICINA NA ÉPOCA DOS XAMÃS


90:4:1 9906 Toda a vida dos homens antigos tinha o seu centro na profilaxia; a sua religião era, em uma grande medida, uma técnica para a prevenção das doenças. E a despeito do erro nas suas teorias, eles eram sinceros ao colocá-las em prática; eles tinham uma fé ilimitada nos próprios métodos de tratamento e isso era já, por si mesmo, um poderoso remédio.

90:4:2 9911 A fé exigida para que alguém se restabelecesse, sob as ministrações estúpidas de um desses antigos xamãs, não era, afinal, significativamente diferente daquela que é exigida para experimentar-se a cura nas mãos de algum dos seus mais recentes sucessores, que se empenham em tratamentos não científicos de doenças.

90:4:3 9912 As tribos mais primitivas temiam os doentes e, durante longas eras, eles foram cuidadosamente evitados e vergonhosamente negligenciados. Foi um grande avanço humanitário quando a evolução da arte do xamanismo produziu sacerdotes e curandeiros que consentiam no tratamento das doenças. Então, tornou-se costumeiro para todo o clã acotovelar-se na sala dos doentes para assistir ao xamã bramindo para expulsar os fantasmas da doença. Não era incomum que uma mulher xamã fizesse o diagnóstico, enquanto um homem administrava o tratamento. O método comum de diagnosticar a doença era baseado no exame das entranhas de um animal.

90:4:4 9913 A doença era tratada com cantos, bramidos, imposição de mãos, soprando-se no paciente e por meio de muitas outras técnicas. Em tempos mais recentes, ficou mais comum recorrer-se ao sono nos templos, durante o qual a cura supostamente ocorria. Os curandeiros finalmente tentaram a cirurgia real, em conjunto com o sono no templo; entre as primeiras operações, estava a da trepanação da cabeça, para permitir ao espírito da dor de cabeça escapar. Os xamãs aprenderam a tratar das fraturas e dos deslocamentos, a abrir furúnculos e abscessos; as mulheres xamãs tornaram-se parteiras peritas.

90:4:5 9914 Era um método comum de tratamento friccionar alguma coisa mágica em um local infectado ou defeituoso do corpo, jogar o amuleto fora e supor-se que tinha havido uma cura. Se alguém por acaso apanhasse o amuleto jogado fora, acreditava-se que essa pessoa iria imediatamente contrair a infecção ou o defeito. Muito tempo passou-se até que as ervas e outros medicamentos reais fossem introduzidos. A massagem foi desenvolvida em ligação com os encantamentos, friccionando para que o espírito saísse do corpo, e era precedida de esforços para introduzir o medicamento friccionando-o, do mesmo modo que os homens modernos tentam friccionar os linimentos. Acreditava-se que as ventosas e a sucção das partes afetadas, junto com as sangrias, fossem de valia para livrar-se de um espírito que produzia a doença.

90:4:6 9915 Já que a água era um fetiche poderoso, era utilizada no tratamento de muitos males. Durante muito tempo, acreditou-se que o espírito que causa a doença poderia ser eliminado pelo suor. Banhos de vapor eram tidos em alta conta; as fontes naturais de água quente logo floresceram como estâncias primitivas de cura. O homem primitivo descobriu que o calor aliviava a dor; ele usava a luz do sol, órgãos de animais recém-abatidos, argila quente e pedras quentes, e muitos desses métodos ainda são empregados. O ritmo era praticado no esforço de influenciar os espíritos; as batidas tom-tom eram universais.

90:4:7 9916 Entre alguns povos, julgava-se que a doença fosse causada por uma conspiração maldosa entre os espíritos e os animais. Isso deu origem à crença de que existia uma planta benéfica como remédio para todas as doenças cuja causa fosse animal. Os homens vermelhos eram especialmente devotados à teoria de que as plantas fossem remédios universais; eles sempre colocavam uma gota de sangue no buraco deixado pela raiz, quando a planta era arrancada.

90:4:8 9917 O jejum, a dieta e os revulsivos eram usados freqüentemente como medidas medicamentosas. As secreções humanas, sendo definitivamente mágicas, eram tidas como sendo de alto valor; o sangue e a urina estavam assim entre os primeiros remédios e foram logo potencializados pelas raízes e os mais vários sais. Os xamãs acreditavam que os espíritos das doenças podiam ser retirados do corpo por meio de medicamentos malcheirosos e de gosto ruim. A purgação logo se tornou um tratamento de rotina, e os valores do cacau e do quinino crus estavam entre as primeiras descobertas farmacológicas.

90:4:9 9921 Os gregos foram os primeiros a desenvolver métodos realmente racionais de tratamento dos doentes. Tanto os gregos quanto os egípcios receberam os seus conhecimentos médicos do vale do Eufrates. O óleo e o vinho eram medicamentos muito antigos para o tratamento de feridas; o óleo de castor e o ópio eram usados pelos sumérios. Muitos desses remédios secretos antigos e eficazes perderam o seu poder quando se tornaram conhecidos; o segredo tem sempre sido essencial ao êxito da prática da fraude e da superstição. Apenas os fatos e a verdade buscam a luz plena da compreensão e rejubilam-se na iluminação e no esclarecimento trazidos pela pesquisa científica.

5. OS SACERDOTES E OS RITUAIS


90:5:1 9922 A essência do ritual está na perfeição da sua execução; entre os selvagens, deve ser praticado com uma profunda precisão. A cerimônia só tem poder para convencer os espíritos se ela houver sido celebrada com correção. Se o ritual é deficiente, ele apenas provoca a raiva e o ressentimento dos deuses. E por isso, posto que a mente do homem, na sua lenta evolução, concebeu que a técnica do ritual era o fator decisivo para a sua eficácia, foi inevitável que os xamãs primitivos devessem, mais cedo ou mais tarde, evoluir até um sacerdócio treinado, para dirigir a prática meticulosa do ritual. E, assim, durante dezenas de milhares de anos, rituais intermináveis estorvaram a sociedade e maldisseram a civilização, e têm sido um peso intolerável para cada ato de vida, para cada empreendimento da raça.

90:5:2 9923 O ritual é a técnica de santificação do costume; o ritual cria e perpetua os mitos, bem como contribui para a preservação dos costumes sociais e religiosos. E, novamente, o ritual, em si, tem sido engendrado pelos mitos. Os rituais foram freqüentemente sociais a princípio, mas mais tarde tornaram-se econômicos e finalmente adquiriram a santidade e a dignidade de cerimoniais religiosos. O ritual pode ser pessoal ou grupal pela sua prática ( ou ambos –, como ilustrado pela prece, a dança e a dramatização.

90:5:3 9924 As palavras tornam-se uma parte do ritual, como o uso de termos como amém e selá. O hábito de jurar por motivos fúteis, a blasfêmia, representa uma prostituição da repetição ritual anterior de nomes sagrados. Fazer peregrinações a santuários sagrados é um ritual muito antigo. O ritual, em seguida, cresceu, dando origem às cerimônias de purificação, de limpeza e de santificação. As cerimônias de iniciação ao segredo tribal das sociedades primitivas eram, na realidade, um rito religioso tosco. A técnica de adoração dos antigos cultos dos mistérios era apenas uma longa execução de rituais religiosos acumulados. O ritual, finalmente, desenvolveu-se nos tipos modernos de cerimoniais sociais e de cultos religiosos, serviços que abrangem prece, canto, a leitura estimulante e outras devoções espirituais individuais e grupais.

90:5:4 9925 Os sacerdotes evoluíram dos xamãs, passando pelos estágios de oráculos, adivinhadores, cantores, dançarinos, mandachuvas, guardiães de relíquias religiosas, custódios de templos e prognosticadores de acontecimentos, até o status de dirigentes verdadeiros do culto religioso. Finalmente, o ofício tornou-se hereditário; uma casta contínua de sacerdotes surgiu.

90:5:5 9926 Com a evolução da religião, os sacerdotes começaram a especializar-se de acordo com os seus talentos inatos ou predileções especiais. Alguns se tornaram cantores, outros rezadores e outros, ainda, sacrificadores; mais tarde, vieram os oradores ( os pregadores. E, quando a religião se tornou institucionalizada, esses sacerdotes reivindicaram “a guarda das chaves do céu”.

90:5:6 9927 Os sacerdotes têm buscado sempre causar impressão, respeito e temor na gente comum, conduzindo o ritual religioso em uma língua antiga, e por meio de diversos passes mágicos, para assim mistificar os adoradores, aumentando a sua própria piedade e autoridade. O grande perigo de tudo isso é que o ritual tende a tornar-se um substituto da religião.

90:5:7 9931 Os sacerdócios têm feito muito para retardar o desenvolvimento científico e para estorvar o progresso espiritual, mas eles têm contribuído para a estabilização da civilização e para o engrandecimento de alguns tipos de cultura. Contudo, muitos sacerdotes modernos têm cessado de funcionar como dirigentes do ritual de adoração a Deus, tendo voltado a sua atenção para a teologia – a tentativa de definir Deus.

90:5:8 9932 Não se pode negar que os sacerdotes têm sido um peso atado ao pescoço das raças, mas os verdadeiros líderes religiosos têm sido de um valor inestimável para mostrar o caminho para realidades mais elevadas e melhores.

90:5:9 9933 [Apresentado por um Melquisedeque de Nebadon.]

DOCUMENTO 91

A EVOLUÇÃO DA PRECE
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A oração, como uma atividade da religião, evoluiu das expressões anteriores, não religiosas, do monólogo e do diálogo. Quando os homens primitivos atingiram a autoconsciência, ocorreu o corolário inevitável da consciência do outro, o potencial dual de uma resposta social e de reconhecimento de Deus.

91:0:2 9942 As formas iniciais da oração não eram dirigidas à Deidade. Essas expressões eram muito parecidas com aquilo que vós diríeis a um amigo quando vos lançais em um empreendimento importante: “Deseja-me sorte”. O homem primitivo era escravizado pela magia; a sorte, boa e má, entrava em todos os assuntos da vida. A princípio, esses pedidos de sorte eram monólogos – apenas uma espécie de pensamento em voz alta, feito pelo servo da magia. Em seguida, esses crentes da sorte acrescentariam o apoio dos seus amigos e das suas famílias, e logo alguma forma de cerimônia era realizada de modo a incluir todo o clã ou toda a tribo.

91:0:3 9943 Quando os conceitos sobre os fantasmas e os espíritos evoluíram, esses pedidos passaram a ser dirigidos a entidades supra-humanas e, com a consciência dos deuses, essas expressões alcançaram os níveis da genuína oração. Como uma ilustração disso, entre certas tribos australianas, as preces religiosas primitivas antecederam às suas crenças nos espíritos e nas personalidades supra-humanas.

91:0:4 9944 Na Índia, uma tribo de nome Toda, atualmente, observa essa prática de não dirigir a prece a ninguém em particular, exatamente como o faziam os povos primitivos, antes dos tempos da consciência religiosa. Só que, entre os todas, isso representa uma regressão da sua religião, degenerada até esse nível primitivo. Os rituais recentes dos sacerdotes leiteiros dos todas não representam uma cerimônia religiosa, porque essas preces impessoais não contribuem em nada para a conservação, nem para o engrandecimento de quaisquer valores sociais, morais ou espirituais.

91:0:5 9945 A prece pré-religiosa era uma parte das práticas mana dos melanésios das crenças oudah, dos pigmeus africanos e das superstições manitou, dos índios norte-americanos. As tribos Baganda, da África, apenas recentemente emergiram do nível mana de prece. Nessa confusão evolucionária primitiva, os homens dirigiam as suas preces aos deuses – locais e nacionais –, aos fetiches, aos amuletos, aos fantasmas, aos governantes e às pessoas comuns.

1. A PRECE PRIMITIVA


91:1:1 9946 A função da religião evolucionária primitiva é conservar e ampliar os valores sociais, morais e espirituais essenciais que aos poucos vão tomando forma. Essa missão da religião não é conscientemente observada pela humanidade, mas é realizada, principalmente, pela função da oração. A prática da prece representa um esforço involuntário, no entanto pessoal e coletivo, de qualquer grupo para assegurar (para tornar real) essa conservação dos valores mais elevados. Todavia, não fora a salvaguarda proporcionada pela oração, todos os dias sagrados transformar-se-iam rapidamente em meros feriados.

91:1:2 9951 A religião e os seus atos, dos quais o principal é a oração, estão aliados apenas àqueles valores que têm reconhecimento social geral, e a aprovação do grupo. Portanto, quando o homem primitivo tentou gratificar as suas emoções mais basais, ou realizar as suas ambições não disfarçadamente egoístas, ele ficou privado do consolo da religião e da ajuda da oração. Quando o indivíduo buscava realizar qualquer coisa anti-social, ele via-se obrigado a buscar a ajuda da magia não religiosa, a recorrer a feiticeiros, ficando, assim, privado da assistência da prece. A oração, portanto, muito cedo se tornou uma poderosa promotora da evolução social, do progresso moral e da realização espiritual.

91:1:3 9952 Mas a mente primitiva não era nem lógica, nem coerente. Os primeiros homens não percebiam que as coisas materiais não eram do domínio da oração. Essas almas de mentes simples constataram que a comida, o abrigo, a chuva, a caça e outros bens materiais aumentavam o bem-estar social e, assim sendo, começaram a fazer preces para obter essas bênçãos materiais. Ainda que se constituísse em um desvirtuamento da oração, isso encorajava o esforço de realizar esses objetivos materiais por meio de ações sociais e éticas. Essa prostituição da oração, embora aviltasse os valores espirituais de um povo, não obstante elevava diretamente os seus costumes econômicos, sociais e éticos.

91:1:4 9953 A prece é apenas um monólogo, para o tipo mais primitivo de mente. Muito cedo se transforma em um diálogo e rapidamente se expande ao nível do culto grupal. A prece significa que os encantamentos pré-mágicos da religião primitiva evoluíram até aquele nível no qual a mente humana reconhece a realidade dos poderes benéficos ou dos seres capazes de elevar os valores sociais e de ampliar os ideais morais e, além disso, significa que essas influências são supra-humanas e distintas do ego do ser humano autoconsciente e do ego dos seus semelhantes mortais. A oração verdadeira, portanto, não surge antes que a ação da ministração religiosa seja visualizada como pessoal.

91:1:5 9954 A prece tem pouca ligação com o animismo, mas essa crença – as formas da natureza tendo uma alma – pode existir paralelamente aos sentimentos religiosos que emergem. Muitas vezes, a religião e o animismo tiveram origens totalmente diversas.

91:1:6 9955 Para aqueles mortais que não se libertaram das algemas primitivas do medo, há o perigo real de que toda a prece possa levar a uma sensação mórbida de pecado, a convicções injustificadas de culpa, reais ou fantasiosas. Mas, nos tempos modernos, não é provável que tantos gastem tanto tempo em preces, a ponto de que isso os leve a reflexões nocivas sobre a própria indignidade ou culpabilidade. Os perigos que se relacionam à distorção e à deturpação da oração vêm mais da ignorância, da superstição, da cristalização, da desvitalização, do materialismo e do fanatismo.

2. A PRECE EM EVOLUÇÃO


91:2:1 9956 As primeiras preces eram meramente desejos verbalizados, a expressão de desejos sinceros. Em seguida, a prece tornou-se uma técnica de obter a cooperação dos espíritos. E, então, atingiu uma função mais elevada, a de ajudar a religião na conservação de todos os valores dignos de serem preservados.

91:2:2 9957 Tanto as preces quanto a magia surgiram como fruto das reações de ajustamento do homem ao meio ambiente urantiano. Mas, à parte essa relação generalizada, pouco têm em comum. A prece sempre indicou uma ação positiva da parte do ego que a pronuncia; tem sido sempre psíquica e algumas vezes espiritual. Via de regra, a magia tem significado uma tentativa de manipular a realidade, sem afetar o ego do manipulador, do executor da magia. Apesar das suas origens independentes, a magia e a prece têm sido freqüentemente inter-relacionadas nos seus estágios avançados de desenvolvimento. Partindo de fórmulas e passando por rituais e encantamentos, a magia elevou-se algumas vezes, chegando ao umbral da verdadeira prece. E a prece, algumas vezes, tem se tornado tão materialista que chegou a degenerar-se em uma técnica pseudomágica de evitar o uso dos esforços, os quais são os requisitos mesmos para a solução dos problemas urantianos.

91:2:3 9961 Quando o homem aprendeu que a prece não podia coagir os deuses, ela transformou-se mais em um pedido, em uma busca de favores. Mas a oração mais verdadeira é, na realidade, uma comunhão entre o homem e o seu Criador.

91:2:4 9962 O surgimento da idéia do sacrifício, em qualquer religião, diminui infalivelmente o alto potencial de eficácia da verdadeira prece; no sentido de que os homens substituem a oferenda da consagração da sua própria vontade de cumprir a vontade de Deus, pelas oferendas de posses materiais.

91:2:5 9963 Quando a religião está desprovida de um Deus pessoal, as preces transladam-se para os níveis da teologia e da filosofia. Quando o conceito mais elevado de Deus, em uma religião, é o de uma Deidade impessoal, como no idealismo panteísta, embora forneça a base para certas formas de comunhão mística, isso se demonstra fatal à potência da oração verdadeira, que representa sempre a comunhão do homem com um ser pessoal e superior.

91:2:6 9964 Durante os tempos primitivos da evolução racial e até mesmo nos tempos presentes, na experiência cotidiana do mortal mediano, a prece é algo muito próximo do fenômeno do contato feito pelo homem com o seu próprio subconsciente. Mas há também um domínio da prece no qual o indivíduo, intelectualmente alerta e em progresso espiritual, alcança um contato maior ou menor com os níveis supraconscientes da mente humana, domínio esse que é do Ajustador do Pensamento residente. Além disso, há uma parte espiritual, definida, na oração verdadeira, que está ligada à recepção e ao reconhecimento dessa oração, por parte das forças espirituais do universo, e que é inteiramente distinta de qualquer associação intelectual feita pelo ser humano.

91:2:7 9965 A oração contribui grandemente para o desenvolvimento do sentimento religioso de uma mente humana em evolução. É uma influência poderosa que opera impedindo o isolamento da personalidade.

91:2:8 9966 A prece representa uma técnica associada às religiões naturais da evolução da raça, e forma também uma parte dos valores experienciais das religiões mais elevadas em excelência ética, as religiões da revelação.

3. A PRECE E O ALTEREGO


91:3:1 9967 As crianças, quando começam a aprender a fazer uso da linguagem, têm a propensão de pensar em voz alta, de expressar os seus pensamentos em palavras, mesmo quando não há ninguém por perto para ouvi-las. Com o alvorecer da imaginação criativa, elas evidenciam uma tendência de conversar com companheiros imaginários. Desse modo, um ego que se forma, busca manter a comunhão com um alterego fictício. Por meio dessa técnica, a criança aprende muito cedo a converter o seu monólogo em um diálogo fictício, no qual esse alterego responde ao seu pensamento verbal e à expressão dos seus desejos. Boa parte dos pensamentos dos adultos é mentalmente construída na forma de conversas.

91:3:2 9968 A forma primitiva de prece assemelhava-se muito às recitações semimágicas da tribo Toda, nos dias atuais, preces que não eram dirigidas a ninguém em particular. Mas tais técnicas de prece tendem a evoluir para o tipo de comunicação na forma de diálogo, pela emergência da idéia de um alterego. Com o tempo, o conceito do alterego alcança um status superior de dignidade divina e, então, a prece terá surgido como um ato de religião. Esse tipo primitivo de prece foi levado a evoluir, por intermédio de muitas fases, e durante longas idades, antes de atingir o nível da oração inteligente e verdadeiramente ética.

91:3:3 9971 Como é concebido pelas gerações sucessivas de mortais a fazer suas preces, o alterego evolui, passando pelos fantasmas, fetiches e espíritos, até os deuses politeístas, e, finalmente até o Deus Único, um ser divino que incorpora os ideais mais elevados e as aspirações mais sublimes do ego em prece. E, assim, a prece funciona como a atitude mais poderosa da religião, na conservação dos valores e ideais mais elevados daqueles que oram. Desde o momento da concepção de um alterego até o aparecimento do conceito de um Pai divino e celeste, a prece é uma prática sempre socializadora, moralizadora e espiritualizadora.

91:3:4 9972 A simples prece da fé evidencia uma evolução poderosa na experiência humana, por meio da qual as conversações dos antigos com o símbolo fictício do alterego, da religião primitiva, tornaram-se elevadas até o nível da comunhão com o espírito do Infinito e até aquela consciência sincera da realidade do Deus eterno e do Pai, do Paraíso, de toda a criação inteligente.

91:3:5 9973 À parte tudo o que é o substrato supra-humano do eu, na experiência da oração, deveríamos lembrar-nos de que a prece com ética é um modo esplêndido de elevar o próprio ego e de reforçar o eu para uma vida melhor e para realizações mais elevadas. A prece induz o ego humano a buscar ajuda por ambos os modos: a ajuda material, pelo reservatório subconsciente da experiência mortal; e a ajuda da inspiração e do guiamento, às fronteiras supraconscientes do contato do material com o espiritual, provida pelo Monitor Misterioso.

91:3:6 9974 A prece tem sido e será sempre uma experiência humana dupla: um procedimento psicológico interassociado a uma técnica espiritual. E essas duas funções da prece não poderão nunca ser totalmente separadas.

91:3:7 9975 A prece iluminada deve reconhecer não apenas um Deus externo e pessoal, mas também uma Divindade interna e impessoal, o Ajustador do Pensamento residente. É inteiramente apropriado, quando faz uma prece, que o homem se esforce para captar o conceito do Pai Universal no Paraíso. Mas a técnica mais eficaz, para os propósitos mais práticos, será retornar ao conceito de um alterego próximo, exatamente como a mente primitiva tinha o hábito de fazer, e então reconhecer que a idéia desse alterego evoluiu de uma mera ficção até a verdade, que é Deus, residindo no homem mortal, por meio da presença factual do Ajustador, de um modo tal que o homem pode colocar-se face a face com Ele, como se fosse um alterego real, genuíno e divino, que reside nele e que é a própria presença e a essência do Deus vivo, o Pai Universal.

4. ORAR COM ÉTICA


91:4:1 9976 Nenhuma prece pode ser ética quando o suplicante busca uma vantagem egoísta sobre os seus semelhantes. A prece egoísta e materialista é incompatível com as religiões éticas, que estão fundadas sobre o amor não egoísta e divino. As preces desprovidas de ética retroagem até os níveis primitivos da pseudomagia e são indignas das civilizações avançadas e das religiões esclarecidas. A prece egoísta transgride o espírito de toda a ética baseada na justiça do amor.

91:4:2 9977 A prece nunca deve ser prostituída a ponto de tornar-se uma substituta para a ação. Toda prece dentro da ética é um estímulo à ação e um guia para os esforços progressivos na direção das metas idealistas de realização do supra-eu.

91:4:3 9981 Em todas as vossas preces sede equânimes; não espereis que Deus demonstre parcialidade, que ame a vós mais do que aos Seus outros filhos, os vossos amigos, vizinhos e até mesmo inimigos. Mas a prece das religiões naturais, ou das religiões que evoluíram, a princípio não tem ética, como tem a oração nas religiões posteriores reveladas. Toda prece, seja individual, seja comunitária, pode ser egoísta ou altruísta. Isto é, a prece pode estar centrada no eu ou nos outros. Quando a oração não busca nada para quem a faz nem para os seus semelhantes, então, tal atitude da alma tende para o nível da verdadeira adoração. As preces egoístas envolvem confissões e súplicas e, freqüentemente, consistem em pedidos de favores materiais. A prece torna-se um tanto mais ética quando lida com o perdão e busca a sabedoria para uma mestria mais elevada de si próprio.

91:4:4 9982 Enquanto o tipo não egoísta de prece é fortalecedor e confortador, a prece materialista está fadada a desapontar e a desiludir, pois até mesmo as descobertas científicas avançadas demonstram que o homem vive em um universo físico de lei e de ordem. A infância de um indivíduo, ou de uma raça, é caracterizada pela prece primitiva, egoísta e materialista. E, em uma certa medida, todas as preces de pedidos são eficazes, no sentido de que invariavelmente conduzem aos esforços e ao exercício daquilo que contribuirá para a realização das respostas a essas preces. A prece real da fé contribui sempre para aumentar a técnica de viver, ainda que os pedidos não sejam dignos de um reconhecimento espiritual. A pessoa espiritualmente avançada, no entanto, deve ter um grande cuidado ao tentar desencorajar uma mente primária ou imatura a respeito desse tipo de prece.

91:4:5 9983 Lembrai-vos, pois, ainda que a prece não mude Deus, muito freqüentemente ela efetua grandes e perduráveis mudanças naquele que a realiza com fé e expectativa confiantes. A prece tem engendrado muita paz nas mentes e muita alegria, calma, coragem, mestria sobre si próprio e equanimidade mental nos homens e nas mulheres das raças em evolução.

5. AS REPERCUSSÕES SOCIAIS DA PRECE


91:5:1 9984 No culto aos ancestrais, a prece leva ao cultivo dos ideais ancestrais. Mas a prece, enquanto aspecto de adoração da Deidade, transcende todas as outras práticas dessa ordem, pois leva ao cultivo de ideais divinos. Assim como o conceito do alterego, na prece, torna-se supremo e divino; nessa mesma medida os ideais meramente humanos são elevados a níveis supernos e divinos, e o resultado de toda essa oração é, assim, uma elevação do caráter humano e uma unificação profunda da personalidade humana.

91:5:2 9985 A prece, contudo, não tem de ser sempre individual. A prece grupal ou congregacional é muito eficiente, pois é altamente socializante nas suas repercussões. Quando um grupo se empenha em uma prece comunitária para o enaltecimento moral e para a elevação espiritual, tais devoções atuam sobre os indivíduos que compõem o grupo e todos se tornam melhores em conseqüência da participação. Até mesmo toda uma cidade ou uma nação inteira podem ser ajudadas pelas preces devocionais. A confissão, o arrependimento e a prece têm conduzido indivíduos, cidades, nações e raças inteiras a esforços poderosos de reforma e até a atos corajosos para realizações de muito valor.

91:5:3 9986 Se vós realmente desejais vencer o hábito de criticar algum amigo, o meio mais rápido de realizar essa mudança de atitude é estabelecer o hábito de orar por essa pessoa a cada dia de vossa vida. Mas as repercussões sociais de tais preces dependem, sobretudo, de duas condições:

91:5:4 9987 1. A pessoa por quem se faz a prece deve saber que se está orando por ela.

91:5:5 9991 2. A pessoa que ora deve entrar em contato social íntimo com a pessoa por quem está orando.

91:5:6 9992 A prece é a técnica pela qual, mais cedo ou mais tarde, toda religião torna-se institucionalizada. E, com o tempo, a prece torna-se associada a inúmeras agências e agentes secundários, alguns que ajudam, e outros que são decididamente deletérios, tais como os sacerdotes, os livros sagrados, os rituais e cerimoniais de adoração.

91:5:7 9993 As mentes de maior iluminação espiritual devem, todavia, ser pacientes e tolerantes com os intelectos menos dotados, aqueles que ardentemente almejam um simbolismo para que o seu fraco discernimento espiritual seja mobilizado. Os fortes não devem encarar os fracos com desdém. Aqueles que são cientes de Deus, sem simbolismos, não devem negar a ministração da graça do símbolo àqueles que encontram dificuldade em adorar a Deidade e em reverenciar a verdade, a beleza e a bondade, sem formas nem rituais. Na prece de adoração, a maioria dos mortais visualiza algum símbolo, como meta e objeto para as suas devoções.

6. A ABRANGÊNCIA DA PRECE


91:6:1 9994 A prece, a menos que esteja em ligação com a vontade, com as ações das forças espirituais pessoais e com os supervisores materiais de um reino, não pode ter nenhum efeito direto sobre o vosso próprio meio ambiente físico. Ainda que haja limites bem definidos para a abrangência dos pedidos da prece, tais limites não se aplicam da mesma maneira à fé daqueles que oram.

91:6:2 9995 A prece não é uma técnica de cura para doenças reais e orgânicas, mas tem contribuído enormemente para o gozo de saúde abundante e a cura de inúmeros males mentais, emocionais e nervosos. E, mesmo no caso de doenças causadas por bactérias reais, a prece muitas vezes tem aumentado a eficácia dos remédios empregados. A prece tem transformado muitos seres inválidos, irritadiços e queixosos, em paradigmas de paciência, e tem feito deles uma inspiração para todos os outros indivíduos humanos sofredores.

91:6:3 9996 Não importa quão difícil possa ser conciliar a dúvida científica sobre a eficácia da prece com a necessidade sempre premente de buscar ajuda e orientação nas fontes divinas, nunca vos esqueçais de que a prece sincera da fé é uma força poderosa na promoção da felicidade pessoal, no autocontrole individual, na harmonia social, no progresso moral e na conquista espiritual.

91:6:4 9997 A prece, mesmo como uma prática puramente humana, como um diálogo com o próprio alterego, constitui uma técnica de abordagem, a mais eficiente, para colocar em ação aquela reserva de forças, da natureza humana, que está armazenada e conservada nos reinos inconscientes da mente humana. A prece é uma prática psicológica saudável, independentemente das suas implicações religiosas e da sua significação espiritual. É um fato na experiência humana que a maior parte das pessoas, quando pressionada tão duramente quanto necessário, irá orar, de algum modo, para alguma fonte de ajuda.

91:6:5 9998 Não sejais tão ociosos a ponto de pedir a Deus que resolva todas as vossas dificuldades, mas nunca hesiteis em pedir a Ele a sabedoria e a força espiritual para guiar-vos e sustentar-vos, enquanto vós próprios estiverdes enfrentando, corajosa e resolutamente os problemas que forem surgindo.

91:6:6 9999 A prece tem sido um fator indispensável ao progresso e à preservação de uma civilização religiosa e tem ainda a dar poderosas contribuições ao futuro crescimento e à espiritualização da sociedade, se aqueles que oram, apenas o fizerem à luz dos fatos científicos, da sabedoria filosófica, da sinceridade intelectual e da fé espiritual. Orai como Jesus ensinou aos seus discípulos – honestamente, sem egoísmo, com equanimidade e sem duvidar.

91:6:7 10001 Mas a eficácia da oração na experiência espiritual pessoal daquele que ora não é, de modo algum, dependente do seu entendimento intelectual, da sua acuidade filosófica, do seu nível social, do status cultural nem de outras aquisições suas na vida mortal. Os sucedâneos psíquicos e espirituais de quem ora com fé são imediatos, pessoais e experienciais. Não há outra técnica por meio da qual qualquer homem, a despeito de todos os seus outros feitos mortais, possa, tão efetiva e imediatamente, aproximar-se do umbral do reino no qual ele pode comunicar-se com Aquele que o criou, no qual a criatura entra em contato com a realidade do Criador, com o Ajustador do Pensamento residente.

7. MISTICISMO, ÊXTASE E INSPIRAÇÃO


91:7:1 10002 O misticismo, como técnica para o cultivo da consciência da presença de Deus, é, em si, totalmente louvável, mas, quando leva ao isolamento social e culmina em fanatismo religioso, tal prática não é senão repreensível. E, muito freqüentemente, aquilo que os místicos superexaltados consideram inspiração divina, não passa das exaltações do profundo da sua própria mente. O contato da mente mortal com o Ajustador residente, ainda que freqüentemente favorecido pela meditação devotada, é, com mais freqüência, facilitado pelo serviço sincero, e de coração, da ministração não egoísta aos nossos semelhantes.

91:7:2 10003 Os grandes educadores religiosos e os profetas das idades passadas não eram místicos extremados; eram homens e mulheres conscientes de Deus, que serviram melhor ao seu Deus pelo serviço não egoísta aos seus semelhantes mortais. Jesus freqüentemente levava os seus apóstolos para longe, por curtos períodos, para que meditassem e orassem; mas durante a maior parte do tempo ele os mantinha no serviço e no contato com as multidões. A alma do homem requer exercício espiritual tanto quanto alimento espiritual.

91:7:3 10004 O êxtase religioso é permissível quando resulta de antecedentes sadios, mas essa experiência é, mais freqüentemente, o produto de influências mais puramente emocionais do que de uma manifestação de caráter espiritual profundo. As pessoas religiosas não devem considerar todos os pressentimentos psicológicos vívidos, nem todas as experiências emocionais intensas, como revelações divinas nem como comunicações espirituais. O êxtase espiritual genuíno vem associado, em geral, a uma grande calma externa e a um controle emocional quase perfeito. E a verdadeira visão profética é um pressentimento supra-psicológico. Essas graças não são pseudo-alucinações, nem êxtases em forma de transe.

91:7:4 10005 A mente humana pode atuar em resposta à chamada inspiração, quando é sensível, seja às exaltações do subconsciente, seja aos estímulos do supraconsciente. Nos dois casos, parece ao indivíduo que tais ampliações do conteúdo do consciente são mais ou menos alheias ao próprio controle. O entusiasmo místico incontido e o êxtase religioso desenfreado não são as credenciais de nenhuma inspiração, nem credenciais supostamente divinas.

91:7:5 10006 O teste prático de todas essas estranhas experiências religiosas de misticismo, de êxtase e de inspiração, é o de observar se esses fenômenos levam um indivíduo:

10007 1. A gozar de uma saúde física melhor e mais completa.

10008 2. A funcionar mais eficiente e praticamente na sua vida mental.

10009 3. A socializar mais plenamente e mais alegremente a sua experiência religiosa.

100010 4. A espiritualizar mais completamente a sua vida no cotidiano e a desempenhar-se fielmente dos deveres comuns da existência mortal rotineira.

10011 5. A aumentar o seu amor e a sua apreciação da verdade, da beleza e da bondade.

10012 6. A conservar os valores sociais, morais, éticos e espirituais normalmente reconhecidos.

10013 7. A ter mais discernimento espiritual interior – a consciência de Deus.

91:7:6 10014 A prece, todavia, não tem nenhuma ligação real com as experiências religiosas excepcionais. Quando a oração torna-se estética demais, quando ela consiste quase que exclusivamente em uma contemplação da beleza e da bênção paradisíacas da divindade, ela perde muito da sua influência socializante e tende para o misticismo e para o isolamento dos seus devotos. Há um certo perigo ligado ao excesso de preces solitárias, o qual é corrigido e prevenido pela oração grupal, por devoções comunitárias.

8. A PRECE COMO UMA EXPERIÊNCIA PESSOAL


91:8:1 10015 Há um aspecto da oração verdadeiramente espontâneo, pois o homem primitivo viu-se orando muito antes de ter qualquer conceito claro de um Deus. O homem primitivo tinha o hábito da prece, em duas situações diversas: quando em grande necessidade, ele experimentava o impulso de tatear, buscando ajuda; e quando em júbilo, ele deixava-se levar pela expressão impulsiva da alegria.

91:8:2 10016 A prece não é uma evolução da magia; as duas surgiram independentemente. A magia era uma tentativa de ajustar a Deidade às circunstâncias; a prece é um esforço de ajustar a personalidade à vontade da Deidade. A verdadeira prece é tanto moral, quanto religiosa; a magia não é nem moral, nem religiosa.

91:8:3 10017 A prece pode tornar-se um costume estabelecido; muitas pessoas oram porque outras o fazem. Outros, ainda, oram porque temem que alguma coisa terrível aconteça, caso não ofereçam as suas súplicas de sempre.

91:8:4 10018 Para alguns indivíduos, a prece é a expressão tranqüila da gratidão; para outros, uma expressão grupal de louvação, de devoções sociais. Algumas vezes, é a imitação da religião de uma outra pessoa. Ao passo que a verdadeira oração é uma comunicação, sincera e confiante, da natureza espiritual da criatura com a onipresença do espírito do Criador.

91:8:5 10019 A prece pode ser uma expressão espontânea da consciência que se tem de Deus ou pode ser uma recitação, sem sentido, de fórmulas teológicas. Pode ser a louvação em êxtase de uma alma que conhece a Deus ou a obediência servil de um mortal tomado pelo temor. Algumas vezes é a expressão patética de um anseio espiritual e outras vezes um clamor esbravejante de frases pias. A prece pode ser um louvor jubiloso, ou um humilde pedido de perdão.

91:8:6 100110 A prece pode ser uma solicitação infantil, de algo impossível, ou uma súplica madura, de crescimento moral e força espiritual. Uma súplica pode consistir em um pedido do pão de cada dia, ou incorporar um anseio sincero de encontrar Deus e de fazer a Sua vontade. Pode ser uma solicitação puramente egoísta ou um gesto verdadeiro e magnífico, na direção da realização de uma irmanação generosa.

91:8:7 100111 A prece pode ser um grito enraivecido de vingança ou um interceder misericordioso pelos inimigos. Pode ser a expressão da esperança de mudar a Deus ou a técnica poderosa de mudar a si próprio. Pode ser o pleito obsequioso de um pecador perdido, diante de um Juiz supostamente severo, ou a expressão jubilosa de um filho liberado pelo Pai celeste, vivo e misericordioso.

91:8:8 100112 O homem moderno fica perplexo com o pensamento de conversar com Deus de um modo puramente pessoal. Muitos abandonaram a oração de sempre, apenas oram quando sob uma pressão inusitada – nas emergências. O homem deveria falar a Deus com destemor; todavia apenas um ser infantil espiritualmente assumiria persuadir ou presumiria muda-Lo.

91:8:9 10021 A prece real certamente alcança a realidade. Até mesmo quando as correntes de ar estão ascendentes, pássaro algum pode planar, a não ser de asas bem abertas. A prece eleva o homem porque é uma técnica para se progredir, por meio da utilização das correntes espirituais ascendentes do universo.

91:8:10 10022 A prece genuína aumenta o crescimento espiritual, modifica as atitudes e produz aquela satisfação que vem da comunhão com a divindade. É um transbordamento espontâneo da consciência de Deus.

91:8:11 10023 Deus responde à prece do homem dando a ele uma revelação acrescida da verdade, uma apreciação revalorizada da beleza e uma concepção ampliada da bondade. A prece é um gesto subjetivo que, todavia, leva ao contato com poderosas realidades objetivas nos níveis espirituais da experiência humana; é uma tentativa significativa, do ser humano, para alcançar valores supra-humanos. É o estímulo mais potente para o crescimento espiritual.

91:8:12 10024 As palavras da oração são irrelevantes; elas são meramente o canal intelectual pelo qual o rio da súplica espiritual tem a oportunidade de fluir. O valor das palavras, em uma prece, é puramente auto-sugestivo, dentro das devoções íntimas, e sócio-sugestivo, nas devoções grupais. Deus responde à atitude da alma, não às palavras.

91:8:13 10025 A prece não é uma técnica para se escapar do conflito, é antes um estímulo ao crescimento em face desse mesmo conflito. Orai apenas pelos valores, não pelas coisas; pelo crescimento, não pela gratificação.

9. AS CONDIÇÕES PARA UMA PRECE EFICIENTE


91:9:1 10026 Se quiserdes chegar a fazer uma prece eficaz, deveríeis ter em mente as leis sob as quais os pedidos prevalecem:

91:9:2 10027 1. Deveis qualificar-vos para uma prece poderosa encarando com sinceridade e coragem os problemas da realidade do universo. Deveis possuir o vigor cósmico.

91:9:3 10028 2. Deveis ter exaurido, honestamente, toda a capacidade inerentemente humana de ajustamento. Deveis ser industriosos.

91:9:4 10029 3. Deveis entregar e abandonar todo desejo da mente, e toda aspiração da alma, ao abraço transformador do crescimento espiritual. Deveis ter experimentado um enaltecimento dos significados e uma elevação dos valores.

91:9:5 100210 4. É preciso escolher, de todo coração, a vontade divina. É preciso anular o centro morto da indecisão.

91:9:6 100211 5. Não apenas deveis reconhecer a vontade do Pai e escolher cumpri-la, mas deveis fazer uma consagração sem reservas e uma dedicação dinâmica para, de fato, cumprir a vontade do Pai.

91:9:7 100212 6. A vossa oração será dirigida exclusivamente à sabedoria divina, para que ela resolva os problemas humanos específicos que encontrardes na ascensão ao Paraíso – a realização da perfeição divina.

91:9:8 100213 7. E deveis ter fé – uma fé viva.

91:9:9 100214 [Apresentado pelo Dirigente das Criaturas Intermediárias de Urântia.]

DOCUMENTO 92

A EVOLUÇÃO POSTERIOR DA RELIGIÃO
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O homem possuiu uma religião de origem natural, como parte da sua experiência evolucionária, muito antes que fossem feitas quaisquer revelações sistemáticas em Urântia. Mas essa religião de origem natural, em si mesma, foi um produto dos dons supra-animais do homem. A religião evolucionária tomou corpo devagar, através dos milênios, na carreira de experiência da humanidade, por intermédio da ministração das seguintes influências, operando interiormente ou impingindo-se, do exterior, sobre o homem selvagem, o bárbaro e o civilizado:

92:0:2 10032 1 . O ajudante da adoração – o surgimento, na consciência animal, de potenciais supra-animais para a percepção da realidade. Isso poderia ser denominado o instinto humano primordial na direção da Deidade.

92:0:3 10033 2. O ajudante da sabedoria – a manifestação, em uma mente adoradora, da tendência de dirigir a sua adoração para canais mais elevados de expressão e na direção de conceitos sempre em expansão da realidade da Deidade.

92:0:4 10034 3. O Espírito Santo – essa é a dotação inicial da supramente e, infalivelmente, aparece em todas as personalidades humanas de boa fé. Essa ministração, para uma mente que almeja a adoração e que deseja a sabedoria, cria a capacidade da auto-realização dentro do postulado da sobrevivência humana, tanto no seu conceito teológico quanto como uma experiência real e factual da personalidade.

92:0:5 10035 O funcionamento coordenado dessas três ministrações divinas é totalmente suficiente para iniciar e fazer prosseguir o crescimento da religião evolucionária. Essas influências, mais tarde, são ampliadas pelos Ajustadores do Pensamento, pelos serafins e pelo Espírito da Verdade, que aceleram, todos eles, o grau do desenvolvimento religioso. Essas agências vêm, há muito, atuando em Urântia e continuarão aqui, enquanto este planeta continuar sendo uma esfera habitada. Grande parte do potencial desses agentes divinos não teve ainda uma oportunidade de expressão; e muito será revelado nas idades que virão, à medida que a religião dos mortais elevar-se, nível após nível, na direção das alturas supernas dos valores moronciais e da verdade do espírito.

1. A NATUREZA EVOLUCIONÁRIA DA RELIGIÃO


92:1:1 10036 A evolução da religião tem sido traçada, desde o medo primitivo e a crença em fantasmas, por muitos dos sucessivos estágios de desenvolvimento, incluindo os esforços para, primeiro, coagir os espíritos e para bajulá-los, depois. Os fetiches tribais transformaram-se em totens e em deuses tribais; as fórmulas mágicas transformaram-se nas preces modernas. A circuncisão, inicialmente um sacrifício, transformou-se em um procedimento de higiene.

92:1:2 10037 A religião progrediu, desde a infância selvagem das raças, da adoração da natureza ao fetichismo, passando pela adoração dos fantasmas. Com a aurora da civilização, a raça humana adotou crenças mais místicas e simbólicas, ao passo que, agora, se aproximando da maturidade, a humanidade está ficando pronta para o reconhecimento da verdadeira religião e, mesmo, para um começo da revelação da verdade em si.

92:1:3 10041 A religião surge como uma reação biológica da mente às crenças espirituais e ao meio ambiente; é a última coisa a perecer ou a mudar em uma raça. A religião é uma adaptação da sociedade, em qualquer idade, àquilo que é misterioso. Como instituição social, a religião abrange ritos, símbolos, cultos, escrituras, altares, santuários e templos. A água benta, as relíquias, os fetiches, os encantos, os ornamentos, os sinos, os tambores e o sacerdócio são comuns a todas as religiões. E é impossível distinguir a religião que haja evoluído, puramente, por meio da magia ou da feitiçaria.

92:1:4 10042 O mistério e o poder têm sempre estimulado os sentimentos e os temores religiosos, enquanto a emoção tem funcionado sempre como um fator condicionante poderoso do seu desenvolvimento. O temor tem sido sempre o estímulo religioso básico. O medo molda os deuses da religião evolucionária, motivando o ritual religioso dos crentes primitivos. À medida que a civilização avança, o medo é modificado pela reverência, admiração, respeito e simpatia e, então, é condicionado ainda pelo remorso e pelo arrependimento.

92:1:5 10043 Um povo asiático ensinava que “Deus é um grande temor”; sendo isso um resultado da religião puramente evolucionária. Jesus, a revelação do mais elevado tipo de vida religiosa, proclamou que “Deus é amor”.

2. A RELIGIÃO E OS COSTUMES


92:2:1 10044 A religião é a mais rígida e a mais inflexível de todas as instituições humanas, e só tardiamente ela se adapta à sociedade em mudança. Finalmente, a religião evolucionária reflete a mudança dos costumes que, por sua vez, podem ter sido afetados pela religião revelada. Gradativa e seguramente, mas com uma certa resistência, a religião (o culto) caminha devagar na esteira da sabedoria ??conhecimento dirigido pela razão experiencial e iluminado pela revelação divina.

92:2:2 10045 A religião adere aos costumes; aquilo que foi é, antiga e supostamente, sagrado. Por essa razão e por nenhuma outra, os utensílios de pedra perduraram ainda por muito tempo na idade do bronze e do ferro. Os registros contêm a seguinte afirmação: “E se vós fizerdes um altar de pedra para mim, vós não o construireis de pedra talhada, pois, se usardes as vossas ferramentas para fazê-lo, vós o tereis profanado”. Mesmo hoje, os hindus acendem os fogos nos seus altares usando uma broca primitiva. No curso da religião evolucionária, a novidade tem sido sempre encarada como um sacrilégio. O sacramento deve consistir não de alimento novo e manufaturado, mas da mais primitiva das carnes: “A carne fresca, tostada no fogo, e o pão sem levedura, servido com ervas amargas”. Todos os tipos de uso social, e mesmo os procedimentos legais estão aferrados às velhas formas.

92:2:3 10046 Quando o homem moderno surpreende-se de que as escrituras de diferentes religiões apresentem tantas passagens que poderiam ser consideradas como obscenas, ele deveria refletir e observar que as gerações passadas temeram eliminar aquilo que os seus ancestrais consideravam santo e sagrado. Grande parte daquilo que uma geração poderia considerar obsceno, as gerações precedentes consideraram como parte de seus costumes aceitos e, mesmo, como rituais religiosos aprovados. Um número considerável de controvérsias religiosas tem sido ocasionado pelas tentativas, sem fim, de reconciliar práticas antigas, mas repreensíveis, com o novo avanço da razão, para encontrar teorias plausíveis para justificar as crenças que se perpetuam em costumes vetustos e ultrapassados.

92:2:4 10047 Mas seria apenas uma tolice esperar uma aceleração súbita demais na evolução religiosa. Uma raça ou uma nação pode assimilar, de qualquer religião avançada, apenas aquilo que é razoavelmente consistente e compatível com o seu status evolucionário momentâneo, e com o seu talento para a adaptação. As condições sociais, climáticas, políticas e econômicas são, todas, de muita influência na determinação do curso e do progresso da evolução religiosa. A moralidade social não é determinada pela religião, ou seja, pela religião evolucionária; antes, são as formas da religião que são ditadas pela moralidade da raça.

92:2:5 10051 As raças humanas apenas superficialmente aceitam uma religião estranha e nova; de fato, elas ajustam-nas aos seus velhos costumes e modos de crer. Isso é bem ilustrado pelo exemplo de uma certa tribo da Nova Zelândia, cujos sacerdotes, depois de aceitar nominalmente o cristianismo, professaram ter recebido revelações diretas de Gabriel, no sentido de que essa mesma tribo havia-se tornado o povo escolhido de Deus e que, portanto, podia entregar-se às suas relações sexuais livres e a numerosos outros dos seus costumes velhos e repreensíveis. Imediatamente todos os novos cristãos aderiram a essa versão nova e menos severa de cristianismo.

92:2:6 10052 Em dado momento ou em outro, a religião sancionou todas as espécies de comportamentos incoerentes ou contrários a si e, em certa época, aprovou praticamente tudo o que hoje é considerado como imoral ou pecaminoso. A consciência, sem o ensinamento da experiência e sem o auxílio da razão, nunca foi e nunca poderá ser um guia seguro e sem erros para a conduta humana. A consciência não é uma voz divina, falando à alma humana. É, meramente, a soma total do conteúdo moral e ético dos costumes de determinada etapa da existência; e representa, simplesmente, o ideal, humanamente concebido, de reação a um conjunto qualquer de circunstâncias dadas.

3. A NATUREZA DA RELIGIÃO EVOLUCIONÁRIA


92:3:1 10053 O estudo da religião humana é o exame da fossilização dos substratos sociais das idades passadas. Os costumes dos deuses antropomórficos são um reflexo verdadeiro da moral dos homens que inicialmente conceberam tais deidades. As religiões antigas e a mitologia retratam fielmente as crenças e as tradições dos povos, perdidas há muito na obscuridade. Essas antigas práticas de culto perduram junto com os novos costumes econômicos e as evoluções sociais e, claro está, parecem grosseiramente incoerentes. Os remanescentes do culto apresentam um verdadeiro quadro das religiões raciais do passado. Lembrai-vos sempre de que os cultos não são formados para descobrir a verdade, mas para promulgar as crenças dessa verdade.

92:3:2 10054 A religião tem sido sempre, antes de tudo, uma questão de ritos, rituais, observâncias, cerimônias e dogmas. Geralmente ela se encontra contaminada por aquele erro que provoca discórdias persistentes: a ilusão do povo escolhido. As idéias religiosas cardinais ? encantamento, inspiração, revelação, propiciação, arrependimento, expiação, intercessão, sacrifício, prece, confissão, adoração, sobrevivência pós-morte, sacramento, ritual, resgate, salvação, redenção, aliança, impureza, purificação, profecia, pecado original ? remontam todas aos tempos iniciais do temor primordial dos fantasmas.

92:3:3 10055 A religião primitiva é nada mais e nada menos do que um prolongamento da luta pela existência material, estendida para além-túmulo. Assim, a observância de um credo representou a extensão da luta pela automanutenção, no domínio de um mundo imaginado, de espíritos-fantasmas. Mas, quando fordes tentados a criticar a religião evolucionária, sede cuidadosos. Lembrai-vos de que isso é o que aconteceu; é um fato histórico. Lembrai-vos, ainda, de que o poder de qualquer idéia repousa não na sua certeza ou verdade, mas na força da sua sedução sobre os homens.

92:3:4 10061 A religião evolucionária não toma providências para assegurar as mudanças ou a revisão; diferentemente da ciência, ela não se prepara para a sua própria correção progressiva. A religião que evoluiu impõe respeito, porque os seus seguidores acreditam que ela seja A Verdade; ”a fé que uma vez foi entregue aos santos” deve, em teoria, ser tanto definitiva quanto infalível. O culto resiste ao desenvolvimento, porque é certo que o progresso verdadeiro irá modificar, ou destruir, o próprio culto. Portanto, a sua revisão deve sempre ser imposta.

92:3:5 10062 Apenas duas influências podem modificar e elevar os dogmas da religião natural: a pressão dos costumes que mudam lentamente e a iluminação periódica feita pelas revelações feitas para toda uma época. Não é estranho que o progresso tenha sido lento, pois, outrora, ser progressista ou inventivo significava ser levado à morte como feiticeiro. O culto avança lentamente, em gerações históricas e ciclos que duram idades, mas continua sempre indo para a frente. A crença evolucionária em fantasmas lançou as bases para uma filosofia de religião revelada que, finalmente, irá destruir a superstição que é parte da sua origem.

92:3:6 10063 A religião tem limitado o desenvolvimento social de muitas maneiras, mas, sem a religião, não teria havido uma moralidade e uma ética duradouras, nem uma civilização que valesse a pena. A religião foi a mãe de grande parte da cultura não religiosa: a escultura originou-se na moldagem dos ídolos, a arquitetura, na construção dos templos, a poesia, nos encantamentos, a música, nos cânticos para os cultos, o drama, nos ritos para se guiar os espíritos, e a dança, nos festivais sazonais de adoração.

92:3:7 10064 Contudo, ao mesmo tempo em que se chama a atenção para o fato de que a religião foi essencial para o desenvolvimento e a preservação da civilização, deveria ficar registrado que a religião natural tem contribuído em muito para limitar e paralisar essa mesma civilização que, por outro lado, ela fomentou e manteve. A religião tem estorvado as atividades industriais e o desenvolvimento econômico; tem sido imprevidente quanto ao trabalho e tem desperdiçado o capital. Ela não tem sido sempre útil à família; não tem fomentado adequadamente a paz e a boa vontade; algumas vezes, negligenciou a educação e atrasou a ciência; tem empobrecido, indevidamente, a vida, pretendendo enriquecer a morte. De fato, a religião evolucionária, de origem humana, tem sido culpada por todos esses erros e por muitas outras faltas e desacertos; todavia, ela manteve a ética cultural, a moralidade civilizada e a coerência social, e tornou possível à futura religião revelada compensar muitas dessas imperfeições evolucionárias.

92:3:8 10065 A religião evolucionária tem sido a instituição mais dispendiosa do homem, mas é incomparavelmente a mais eficaz. A religião humana pode ser justificada apenas à luz de uma evolução da civilização. Se o homem não fosse um produto ascendente, de evolução animal, então esse curso seguido pelo desenvolvimento religioso não teria a menor justificativa.

92:3:9 10066 A religião facilitou a acumulação do capital e fomentou algumas espécies de trabalho. O lazer dos sacerdotes promoveu a arte e o conhecimento. E toda a raça, afinal, ganhou muito em conseqüência de todos esses erros iniciais da técnica ética. Os xamãs, honestos e desonestos, foram terrivelmente dispendiosos, mas eles valeram tudo o que custaram. As profissões eruditas e a própria ciência emergiram de sacerdócios parasitas. A religião fomentou a civilização e assegurou a continuidade da sociedade; tem sido a força de policiamento moral de todos os tempos. A religião cuidou para que a disciplina humana e o autocontrole tornassem a sabedoria possível. A religião é o açoite eficiente da evolução, que retira impiedosamente a humanidade indolente e sofredora do seu estado natural de inércia intelectual, impelindo-a para a frente e para cima, elevando-a até os níveis mais altos de razão e sabedoria.

92:3:10 10067 Como herança sagrada de ascendência animal, a religião evolucionária deve continuar a ser sempre enobrecida pela censura constante da religião revelada, e deve ser sempre refinada no crisol abrasador da ciência genuína.

4. A DÁDIVA DA REVELAÇÃO


92:4:1 10071 A revelação é evolucionária, mas é sempre progressiva. Ao longo das idades da história de um mundo, as revelações da religião estão sempre em expansão e são, sucessivamente, sempre mais elucidativas. É missão da revelação selecionar e censurar as religiões sucessivas da evolução. Mas, se a revelação deve exaltar e elevar as religiões da evolução, então essas visitações divinas devem retratar ensinamentos que não estejam muito distanciados do pensamento e das reações da época na qual elas são apresentadas. Assim, a revelação deve manter-se sempre em contato com a evolução, e assim ela o faz. A religião da revelação deve sempre ser limitada pela capacidade do homem para recebê-la.

92:4:2 10072 Mas, a despeito das relações ou das suas origens aparentes, as religiões de revelação são sempre caracterizadas por uma crença em alguma Deidade de valor final e em algum conceito da sobrevivência da identidade da personalidade, depois da morte.

92:4:3 10073 A religião evolucionária é sentimental, não é lógica. A reação do homem é acreditar em um mundo hipotético de espíritos-fantasmas – é o reflexo da crença do homem, excitado pela percepção e pelo medo do desconhecido. A religião reveladora é proposta pelo verdadeiro mundo espiritual; é a resposta do cosmo supra-intelectual à sede dos mortais de acreditar nas Deidades universais e de contar com elas. A religião evolucionária é o retrato do caminhar em círculos viciosos que a humanidade faz para a busca da verdade; a religião reveladora é essa verdade em si mesma.

92:4:4 10074 Houve muitos acontecimentos de revelação religiosa, mas apenas cinco deles foram de significação para toda uma época. As revelações epocais foram as seguintes:

92:4:5 10075 1. Os ensinamentos Dalamatianos. O verdadeiro conceito da Primeira Fonte e Centro foi promulgado em Urântia, pela primeira vez, pelos cem membros da assessoria corpórea do Príncipe Caligástia. Essa revelação expandida da Deidade persistiu por mais de trezentos mil anos, até que foi subitamente interrompida pela secessão planetária e pela ruptura do regime de ensino. Exceto pelo trabalho de Van, a influência da revelação Dalamatiana ficou praticamente perdida para todo o mundo. Até os noditas haviam esquecido essa verdade, já na época da chegada de Adão. Entre todos os que receberam os ensinamentos vindos dos cem, os homens vermelhos foram aqueles que os conservaram por mais tempo; mas a idéia do Grande Espírito não era senão uma concepção nebulosa, na religião ameríndia, quando o contato com o cristianismo clarificou-a e reforçou-a consideravelmente.

92:4:6 10076 2. Os ensinamentos Edênicos. Adão e Eva retrataram, uma vez mais, o conceito do Pai de todos aos povos evolucionários. A dissolução do primeiro Éden interrompeu o curso da revelação Adâmica, antes que ela tivesse começado de fato. Mas os ensinamentos abortados de Adão foram continuados pelos sacerdotes setitas, e algumas dessas verdades nunca foram inteiramente perdidas para o mundo. Toda a tendência da evolução religiosa do levante foi modificada pelos ensinamentos dos setitas. Mas, por volta de 2500 a. C. , a humanidade tinha perdido de vista, em grande parte, a revelação promovida à época do Éden.

92:4:7 10077 3. Melquisedeque de Salém. Este Filho emergencial de Nebadon inaugurou a terceira revelação da verdade em Urântia. Os preceitos cardinais dos seus ensinamentos foram: confiança e fé. Ele ensinou a confiança na beneficência onipotente de Deus e proclamou a fé como o ato por meio do qual os homens ganham o favorecimento de Deus. Os seus ensinamentos gradualmente misturaram-se às crenças e práticas de várias religiões evolucionárias e, finalmente, resultaram naqueles sistemas teológicos presentes em Urântia quando da abertura do primeiro milênio depois de Cristo.

92:4:8 10081 4. Jesus de Nazaré. Cristo Michael apresentou, pela quarta vez, em Urântia, o conceito de Deus como o Pai Universal; e esse ensinamento perdurou, em geral, desde então. A essência do seu ensinamento foi amor e serviço, a adoração amorosa que um filho criatura dá voluntariamente em reconhecimento e em retorno à ministração do amor de Deus, o seu Pai; o serviço que tais filhos criaturas oferecem, de vontade espontânea, aos seus irmãos, em uma alegre compreensão de que, nesse serviço, eles estão servindo, do mesmo modo, a Deus, o Pai.

92:4:9 10082 5. Os Documentos de Urântia. Os documentos, dos quais este é um deles, constituem a mais recente apresentação da verdade aos mortais de Urântia. Esses documentos diferem de todas as revelações anteriores, pois não são um trabalho de uma única personalidade do universo; são, sim, uma apresentação composta, feita por muitos seres. Nenhuma revelação, todavia, pode jamais ser completa, antes de se alcançar o Pai Universal. Todas as outras ministrações celestes não são mais do que parciais, transitórias e praticamente adaptadas às condições locais de tempo e de espaço. É possível que, ao admitir tudo isso, possamos esvaziar a força imediata e a autoridade de todas as revelações, mas é chegado o tempo em Urântia, em que é aconselhável fazer essa declaração franca, ainda que correndo o risco de enfraquecer a influência futura e a autoridade desta obra, que é a mais recente das revelações da verdade às raças mortais de Urântia.

5. OS GRANDES LÍDERES RELIGIOSOS


92:5:1 10083 Na religião evolucionária, os deuses são concebidos para existir à semelhança da imagem do homem; na religião reveladora, é ensinado aos homens que eles são filhos de Deus – feitos, mesmo, à imagem finita da divindade. Nas crenças sintetizadas compostas dos ensinamentos da revelação e dos produtos da evolução, o conceito de Deus é uma combinação entre:

10084 1. As idéias preexistentes dos cultos evolucionários.

10085 2. Os ideais sublimes da religião revelada.

10086 3. Os pontos de vista pessoais dos grandes líderes religiosos, os profetas e mestres da humanidade.

92:5:2 10087 A maioria das grandes épocas religiosas foi inaugurada pela vida e ensinamentos de alguma personalidade proeminente; a liderança originou a maioria dos movimentos morais dignos de nota da história. E os homens sempre tiveram a tendência para venerar um líder, ainda que seja às custas dos seus ensinamentos; de reverenciar a sua personalidade, ainda que percam de vista as verdades que ele proclamou. E isso não acontece sem motivo: há um desejo instintivo no coração do homem evolucionário, de receber ajuda de cima e do além. Esse anseio antecipou o aparecimento, na Terra, do Príncipe Planetário e, posteriormente, dos Filhos Materiais. Em Urântia, o homem tem sido privado de líderes e governantes supra-humanos e, por isso, constantemente ele procura compensar essa perda, envolvendo os seus líderes humanos em lendas que estabelecem origens sobrenaturais e carreiras miraculosas para eles.

92:5:3 10088 Muitas raças têm concebido os seus líderes como tendo nascido de virgens; as suas carreiras são generosamente pontuadas por episódios miraculosos, e o retorno desses líderes é sempre aguardado pelos seus respectivos grupos. Na Ásia central, os homens das tribos ainda aguardam pelo retorno de Gengis Khan; no Tibete, na China e na Índia, de Buda; no islamismo, de Maomé; entre os ameríndios, de Hesunanin Onamonalonton; com os hebreus foi, em geral, o retorno de Adão como o governante material. Na Babilônia, o deus Marduk foi uma perpetuação da lenda de Adão, da idéia do filho de Deus, do elo entre o homem e Deus. Em seguida ao aparecimento de Adão na Terra, os assim chamados filhos de Deus eram comuns entre as raças do mundo.

92:5:4 10091 Todavia, independentemente do respeito supersticioso que freqüentemente os envolveu, ainda permanece como fato que esses mestres foram as personalidades temporais de apoio, das quais dependeram as alavancas da verdade revelada, para fazerem avançar a moralidade, a filosofia e a religião da humanidade.

92:5:5 10092 Houve centenas e centenas de líderes religiosos, na história milenar de Urântia, desde Onagar, ao Guru Nanak. Durante esse tempo, houve muitas cheias e vazantes, na maré da verdade religiosa e da fé espiritual, e cada renascimento da religião urantiana tem sido, no passado, identificado com a vida e os ensinamentos de algum líder religioso. Considerando os instrutores dos tempos recentes, pode ser útil agrupá-los em sete épocas religiosas maiores, da Urântia pós-Adâmica:

92:5:6 10093 1. O período Setita. Os sacerdotes Setitas, regenerados sob a liderança de Amosad, tornaram-se os grandes instrutores pós-Adâmicos. Eles ensinaram nas terras dos anditas, e a sua influência perdurou por mais tempo entre os gregos, sumérios e indianos. Entre estes últimos, a sua influência continuou até o tempo presente, como entre os brâmanes de fé indiana. Os setitas e os seus seguidores nunca se perderam inteiramente do conceito da Trindade, revelado por Adão.

92:5:7 10094 2. A era dos missionários de Melquisedeque. A religião de Urântia foi regenerada, em grande medida, pelos esforços daqueles instrutores que saíram em comissões formadas por Maquiventa Melquisedeque, quando viveu e ensinou em Salém, quase dois mil anos antes de Cristo. Esses missionários proclamaram a fé como o preço para o favorecimento de Deus, e os seus ensinamentos, ainda que improdutivos, para o aparecimento imediato de qualquer religião, formaram, contudo, as fundações sobre as quais os instrutores posteriores da verdade iriam construir as religiões de Urântia.

92:5:8 10095 3. A era pós-Melquisedeque. Embora Amenemope e Iknaton tivessem, ambos, ensinado neste período, o gênio religioso mais notável da era pós-Melquisedeque foi o líder de um grupo de beduínos do levante, o fundador da religião hebraica ? Moisés. Moisés ensinou o monoteísmo. Disse ele: “Escutai, ó Israel, o Senhor nosso Deus é um só Deus”. “O Senhor é Deus. Não há outro além Dele. ”E, persistentemente, buscou ele desarraigar as remanescências do culto aos fantasmas junto ao seu povo, prescrevendo até a pena de morte para os seus praticantes. O monoteísmo de Moisés foi adulterado pelos seus sucessores, mas, em tempos posteriores, eles retornaram a muitos dos seus ensinamentos. A grandeza de Moisés repousa na sua sabedoria e sagacidade. Outros homens tiveram conceitos mais elevados de Deus, mas nenhum homem teve jamais tanto êxito em induzir grandes números de pessoas a adotar crenças tão avançadas.

92:5:9 10096 4. O sexto século antes de Cristo. Muitos homens surgiram para proclamar a verdade neste século, que foi um dos séculos mais marcantes de um despertar religioso jamais visto em Urântia. Entre esses devem ser lembrados Gautama, Confúcio, Lao-tsé, Zoroastro e os mestres jainistas. Os ensinamentos de Gautama tornaram-se bastante difundidos na Ásia, e ele é reverenciado por milhões, como o Buda. Confúcio foi, para a moralidade dos chineses, o que Platão foi para a filosofia grega e, mesmo tendo havido repercussões religiosas para os ensinamentos de ambos, nenhum dos dois foi, estritamente falando, um mestre religioso; Lao-tsé teve uma visualização maior de Deus, no Tao, do que Confúcio no campo das humanidades, ou Platão no idealismo. Zoroastro, se bem que muito influenciado pelo conceito de um espiritualismo predominantemente dualista, ou seja, que aceita espíritos bons e maus, ao mesmo tempo exaltou definitivamente a idéia de uma Deidade eterna, e da vitória última da luz sobre as trevas.

92:5:10 10101 5. O primeiro século depois de Cristo. Como mestre religioso, Jesus de Nazaré partiu do culto que tinha sido estabelecido por João Batista e progrediu até onde pôde, libertando aquele culto das amarras e das formalidades. Além de Jesus, Paulo de Tarso e Filo de Alexandria foram os maiores mestres dessa era. Os conceitos deles, dentro da religião, exerceram um papel dominante na evolução da fé que traz o nome de Cristo.

92:5:11 10102 6. O sexto século depois de Cristo. Maomé fundou uma religião que foi superior a muitos dos credos desta época. Ela foi um protesto contra as exigências sociais das religiões estrangeiras e contra a incoerência da vida religiosa do seu próprio povo.

92:5:12 10103 7. O décimo quinto século depois de Cristo. Este período testemunhou dois movimentos religiosos: a ruptura da unidade do cristianismo no Ocidente, e a síntese de uma nova religião no Oriente. Na Europa, a cristandade institucionalizada tinha atingido aquele grau de inflexibilidade que tornou qualquer crescimento posterior incompatível com a unidade. No Oriente, os ensinamentos combinados do islamismo, do hinduísmo e do budismo foram sintetizados por Nanak e pelos seus seguidores no sikismo, uma das mais avançadas religiões da Ásia.

92:5:13 10104 O futuro de Urântia, sem dúvida, será caracterizado pelo aparecimento de educadores da verdade religiosa – a Paternidade de Deus e a fraternidade de todas as criaturas. Mas é de se esperar que os esforços sinceros e ardentes dos profetas futuros sejam dirigidos menos para o fortalecimento de barreiras inter-religiosas e mais para o aumento da irmandade religiosa de culto espiritual, entre os muitos seguidores das diferentes teologias intelectuais tão características da Urântia de Satânia.

6. AS RELIGIÕES COMPOSTAS


92:6:1 10105 As religiões do século vinte, em Urântia, oferecem um interessante quadro da evolução social da tendência humana para a adoração. Muitas fés pouco progrediram desde os dias do culto dos fantasmas. Os pigmeus da África não têm nenhuma reação religiosa, como classe, embora alguns deles acreditem vagamente em um meio ambiente com espíritos. Eles estão, hoje, exatamente onde o homem primitivo estava, quando a evolução da religião começou. A crença básica da religião primitiva era a de sobrevivência depois da morte. A idéia de adorar um Deus pessoal indica um desenvolvimento evolucionário avançado, e mesmo o primeiro estágio da revelação. Os Diaks desenvolveram apenas as práticas religiosas mais primitivas. Os esquimós e os ameríndios, relativamente recentes, tinham um conceito muito estreito de Deus; eles acreditavam em fantasmas e tinham, ainda que indefinida, uma idéia sobre alguma espécie de sobrevivência depois da morte. Os nativos australianos dos dias atuais têm apenas medo de fantasmas, um temor do escuro e uma veneração rudimentar pelos ancestrais. Os zulus só agora estão desenvolvendo uma religião de medo de fantasmas e de sacrifícios. Muitas tribos africanas, a não ser pelo trabalho missionário dos cristãos e maometanos, ainda não passam do estágio do fetiche, na sua evolução religiosa. Mas alguns grupos vêm mantendo, há muito, a idéia do monoteísmo, como os trácios de outrora, que acreditavam também na imortalidade.

92:6:2 10106 Em Urântia, a religião evolucionária e a religião reveladora estão progredindo lado a lado, e, ao mesmo tempo, amalgamando-se e fundindo-se nos sistemas teológicos diversificados, encontrados no mundo à época da elaboração destes documentos. Essas religiões, as religiões da Urântia do século vinte, podem ser enumeradas como a seguir.

10111 1. O hinduísmo – a mais antiga.

10112 2. A religião hebraica.

10113 3. O budismo.

10114 4. Os ensinamentos de Confúcio.

10115 5. As crenças taoístas.

10116 6. O zoroastrismo.

10117 7. O xintoísmo.

10118 8. O jainismo.

10119 9. O cristianismo.

101110 10. O islamismo.

101111 11. O sikismo – a mais recente.

92:6:3 101112 As religiões mais avançadas dos tempos antigos foram o judaísmo e o hinduísmo, e cada uma havia influenciado em grande parte o curso do desenvolvimento religioso, respectivamente, no Oriente e no Ocidente. Ambos, hindus e hebreus acreditaram que as suas religiões foram inspiradas e reveladas, e acreditavam que todas as outras eram formas decadentes da fé única e verdadeira.

92:6:4 101113 A Índia está dividida entre as religiões hindu, sikista, maometana e jainista, cada uma delas retratando Deus, o homem e o universo, segundo a sua própria concepção. A China segue os ensinamentos taoístas e confucionistas; o xintoísmo é reverenciado no Japão.

92:6:5 101114 As grandes crenças internacionais e inter-raciais são a hebraica, a budista, a cristã e a islâmica. O budismo estende-se do Ceilão e Birmânia até o Tibete, e da China ao Japão. Ele tem demonstrado uma capacidade de adaptação aos costumes de tantos povos, que tem sido igualada apenas pelo cristianismo.

92:6:6 101115 A religião hebraica abrange a transição filosófica do politeísmo ao monoteísmo; é um elo evolucionário entre as religiões de evolução e as religiões de revelação. Os hebreus foram o único povo do Ocidente a seguir a evolução dos seus deuses evolucionários primitivos até o Deus da revelação. Mas essa verdade nunca se tornou amplamente aceita até os dias de Isaías que, uma vez mais, ensinou uma idéia mista de uma deidade da raça, conjugada com a do Criador Universal: “Ó Senhor das Hostes, Deus de Israel, sois Deus, e apenas vós; vós criastes o céu e a Terra”. Num certo momento, a esperança da sobrevivência, na civilização ocidental, repousa nos conceitos hebraicos sublimes da bondade e nos conceitos helênicos avançados da beleza.

92:6:7 101116 A religião cristã é a religião sobre a vida e os ensinamentos de Cristo, baseados na teologia do judaísmo, modificados posteriormente por meio da assimilação de certos ensinamentos zoroastrianos e da filosofia grega, e formulados primariamente por três indivíduos: Filo, Pedro e Paulo. Ela passou por muitas fases de evolução, desde o tempo de Paulo; e tornou-se tão completamente ocidentalizada que muitos povos não europeus, muito naturalmente, consideram o cristianismo uma estranha revelação, de um Deus estranho, destinada a estrangeiros.

92:6:8 101117 O islamismo é a conexão religioso-cultural entre a África do norte, o Levante, e o sudoeste da Ásia. Foi a teologia judaica, em ligação com os ensinamentos posteriores do cristianismo, que tornou o islamismo monoteísta. Os seguidores de Maomé tropeçaram nos ensinamentos avançados da Trindade; eles não podiam compreender uma doutrina de três personalidades divinas e uma Deidade. É sempre difícil induzir as mentes evolucionárias a aceitarem, subitamente, uma verdade superior revelada. O homem é uma criatura evolucionária e deve adquirir a sua religião principalmente por técnicas evolucionárias.

92:6:9 10121 A adoração dos antepassados, em uma determinada época, constituiu um avanço incontestável na evolução religiosa, mas é tão surpreendente quanto lamentável que esse conceito primitivo sobreviva na China, no Japão e na Índia, em meio a tantas coisas relativamente tão mais avançadas, tais como o budismo e o hinduísmo. No Ocidente, o culto dos antepassados desenvolveu-se na veneração de deuses nacionais e no respeito pelos heróis da raça. No século vinte, essa religião nacionalista, de veneração de heróis, faz sua aparição nos vários secularismos e nacionalismos radicais que caracterizam muitas raças e nações do Ocidente. Grande parte dessa mesma atitude é também encontrada nas grandes universidades e nas comunidades industriais maiores, dos povos de língua inglesa. Não muito diferente desses conceitos é a idéia de que a religião não é senão “uma busca compartilhada do lado bom da vida”. As “religiões nacionais” nada mais são do que uma reversão ao culto primevo do imperador romano, e ao xintoísmo ? a adoração do estado, na família imperial.

7. A EVOLUÇÃO ULTERIOR DA RELIGIÃO


92:7:1 10122 A religião não pode nunca se tornar um fato científico. A filosofia pode, verdadeiramente, repousar em uma base científica, mas a religião permanecerá, para sempre, evolucionária, ou reveladora, ou uma combinação possível de ambas, como ela é no mundo de hoje.

92:7:2 10123 Novas religiões não podem ser inventadas; ou são a conseqüência de uma evolução ou são subitamente reveladas. Todas as religiões evolucionárias novas são meras expressões avançadas de velhas crenças, em novas adaptações e ajustamentos. O velho não deixa de existir; ele funde-se com o novo, como no caso do sikismo, que cresceu e floresceu do solo e das formas do hinduísmo, do budismo, do islamismo e de outros cultos contemporâneos. A religião primitiva era muito democrática; o selvagem tomava emprestado e emprestava facilmente. Apenas com a religião revelada apareceu o egotismo teológico, autocrático e intolerante.

92:7:3 10124 As inúmeras religiões de Urântia são todas boas, na medida em que todas levam o homem até Deus e trazem até o homem a compreensão do Pai. É uma falácia, para qualquer grupo de religiosos, conceber o seu credo como a Verdade; tal atitude denota mais arrogância teológica do que certeza de fé. Todas as religiões de Urântia tirariam proveito do estudo e da assimilação do que há de melhor nas verdades contidas em qualquer outra fé, pois todas contêm verdades. Os religiosos fariam melhor em tomar emprestado o que há de mais profundo na fé espiritual viva do vizinho, do que em denunciar o que nela há de pior, nas suas superstições remanescentes e nos rituais sem valor.

92:7:4 10125 Todas essas religiões surgiram como resultado das respostas intelectuais variáveis dos homens a uma mesma e idêntica condução espiritual. E não podem, elas, nunca esperar atingir uma uniformidade de credos, dogmas e rituais, pois estes são intelectuais. Mas podem realizar, e algum dia o farão, uma unidade na adoração verdadeira do Pai de todos, pois esta é espiritual, e é para sempre verdadeiro que, no espírito, todos os homens são iguais.

92:7:5 10126 A religião primitiva foi, em grande parte, uma conscientização no nível dos valores materiais, mas a civilização eleva os valores religiosos, pois a verdadeira religião é a devoção do eu a serviço de valores com significado supremo. À medida que a religião evolui, a ética transforma-se na filosofia das morais, e a moralidade transforma-se na disciplina do eu, segundo os critérios mais elevados e supremos de valor – os ideais espirituais e divinos. A religião converte-se, assim, em uma devoção espontânea e rara, a experiência viva da lealdade do amor.

92:7:6 10131 O que indica a qualidade de uma religião é:

10132 1. O nível dos seus valores – as suas lealdades.

10133 2. A profundidade dos seus significados – a sensibilização dos indivíduos à apreciação idealista desses valores mais elevados.

10134 3. A intensidade da consagração – o grau de devoção a esses valores divinos.

10135 4. O progresso sem entraves da personalidade nesse caminho cósmico de vida espiritual idealista, a compreensão da filiação a Deus e o progredir sem fim na cidadania do universo.

92:7:7 10136 Os significados religiosos progridem em autoconsciência, quando a criança transfere as suas idéias de onipotência dos seus progenitores para Deus. E toda a experiência religiosa dessa criança depende muito do que predominou na relação pai-filho: se o medo, ou se o amor. Os escravos têm experimentado sempre uma grande dificuldade de transferir o medo dos seus donos para os conceitos do amor a Deus. A civilização, a ciência e as religiões avançadas devem libertar a humanidade desses medos nascidos do horror aos fenômenos naturais. E, assim, um esclarecimento maior deveria livrar os mortais educados de toda a dependência de intermediários na comunhão com a Deidade.

92:7:8 10137 Esses estágios intermediários de hesitação idólatra na transferência da veneração do humano e do visível para o divino e o invisível são inevitáveis; mas deveriam ser abreviados pela consciência da ministração facilitadora do espírito residente divino. Entretanto, o homem tem sido profundamente influenciado, não apenas pelos seus conceitos da Deidade, mas também pelo caráter dos heróis que ele escolheu para honrar. É uma infelicidade grande que aqueles que chegaram a venerar o Cristo divino, e ressuscitado, tivessem negligenciado o homem ? o valente e corajoso herói ? Joshua ben José.

92:7:9 10138 O homem moderno está autoconsciente da religião, de um modo adequado, mas o hábito que tem de adoração está confuso, deixando-o em descrença, devido à metamorfose social acelerada e aos desenvolvimentos científicos sem precedentes. Os homens e as mulheres pensantes, querem que a religião seja redefinida, e essa exigência irá levar a religião a reavaliar a si própria.

92:7:10 10139 O homem moderno depara-se com a tarefa de fazer, em uma única geração, mais re-adequações dos valores humanos do que as que têm sido feitas em dois mil anos. E tudo isso influencia a atitude social para com a religião, pois a religião é um modo de vida, tanto quanto uma técnica de pensar.

92:7:11 101310 A verdadeira religião deve, sempre e simultaneamente, ser o fundamento eterno e a estrela guia de todas as civilizações duradouras.

92:7:12 101311 [Apresentado por Melquisedeque de Nebadon.]

DOCUMENTO 93

MAQUIVENTA MELQUISEDEQUE
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Os Melquisedeques são amplamente conhecidos como Filhos das emergências, pois eles se engajam em atividades de uma variedade incrível nos mundos de um universo local. Quando surge um problema extraordinário qualquer, ou quando algo inusitado está para ser realizado, é quase sempre um Melquisedeque que aceita a missão. A capacidade dos Filhos Melquisedeques de funcionar em emergências e em níveis muito diversificados do universo, até no nível físico da manifestação da personalidade, é peculiar à sua ordem. Apenas os Portadores da Vida compartilham, em qualquer grau, desse extenso metamorfismo nas funções de personalidade.

93:0:2 10142 A ordem Melquisedeque de filiação do universo tem estado extremamente ativa em Urântia. Um corpo de doze deles serviu em conjunto com os Portadores da Vida. Outro corpo de doze Melquisedeques posteriormente tornou-se administrador do vosso mundo, pouco depois da secessão de Caligástia, e continuou com autoridade até os tempos de Adão e Eva. Esses doze Melquisedeques retornaram a Urântia, quando da falta de Adão e Eva, e continuaram, daí em diante, como administradores planetários, até o dia em que Jesus de Nazaré, como o Filho do Homem, tornou-se o Príncipe Planetário titular de Urântia.

1. A ENCARNAÇÃO DE MAQUIVENTA


93:1:1 10143 A verdade revelada esteve ameaçada de extinção durante os milênios que seguiram o não-cumprimento da missão Adâmica, em Urântia. Ainda que fazendo progressos intelectuais, as raças humanas, aos poucos, estavam perdendo terreno espiritualmente. Por volta de 3 000 a. C. , o conceito de Deus havia-se tornado muito nebuloso nas mentes dos homens.

93:1:2 10144 Os doze administradores Melquisedeques sabiam da iminente auto-outorga de Michael neste planeta, mas não sabiam quão imediatamente ocorreria; e, por isso eles reuniram-se em conselho solene e pediram aos Altíssimos de Edêntia que alguma providência fosse tomada, para manter a luz da verdade em Urântia. Esse pedido foi invalidado pelo mandato de que “a condução dos assuntos no 606 de Satânia está plenamente nas mãos dos custódios Melquisedeques”. Estes administradores então apelaram à ajuda do Pai Melquisedeque, mas apenas receberam a resposta de que deveriam continuar a manter a verdade da maneira que eles próprios escolhessem “até a chegada de um Filho de auto-outorga”, que “iria resgatar, da negligência e da incerteza, os títulos planetários”.

93:1:3 10145 E foi em conseqüência de terem sido deixados tão completamente por conta dos próprios recursos que Maquiventa Melquisedeque, um dos doze administradores planetários, tornou-se voluntário para fazer o que tinha sido feito apenas por seis vezes em toda a história de Nebadon: personalizar temporariamente na Terra um homem deste reino, auto-outorgando a si próprio como um Filho emergencial para prestar ministração a este mundo. A permissão para essa aventura foi concedida pelas autoridades de Salvington, e a encarnação factual de Maquiventa Melquisedeque foi consumada nas proximidades do local que estava destinado a se tornar a cidade de Salém, na Palestina. Toda a transação da materialização desse Filho Melquisedeque foi executada pelos administradores planetários, com a cooperação dos Portadores da Vida, alguns dos Mestres Controladores Físicos e outras personalidades celestes residentes em Urântia.

2. O SÁBIO DE SALÉM


93:2:1 10151 Maquiventa auto-outorgou-se às raças humanas de Urântia 1 973 anos antes do nascimento de Jesus. A sua vinda não foi espetacular; a sua materialização não foi testemunhada por olhos humanos. Ele foi visto pelo homem mortal pela primeira vez naquele dia memorável em que entrou na tenda de Andon, um pastor caldeu de origem suméria. E a proclamação da sua missão ficou corporificada em uma simples afirmação que ele fez a esse pastor: “Eu sou Melquisedeque, sacerdote de El Elyon, o Altíssimo, o único Deus”.

93:2:2 10152 Quando o pastor se recobrou do seu espanto, e depois de haver feito muitas perguntas ao estranho, convidou Melquisedeque para cear com ele; e essa foi a primeira vez, na sua longa carreira no universo, que Maquiventa comeu comida material, o alimento que iria sustentá-lo durante os seus noventa e cinco anos de vida como um ser material.

93:2:3 10153 E, naquela noite, enquanto eles conversavam sob as estrelas, Melquisedeque começou a sua missão de revelação da verdade da realidade de Deus, quando, com um movimento circular de seu braço, ele disse a Andon: “El Elyon, o Altíssimo, é o divino criador das estrelas do firmamento e desta Terra mesma, na qual vivemos, e ele é também o supremo Deus do céu”.

93:2:4 10154 Dentro de uns poucos anos, Melquisedeque havia reunido em torno de si um grupo de alunos, discípulos e crentes, que formaram o núcleo da futura comunidade de Salém. Ele ficou logo conhecido na Palestina como o sacerdote de El Elyon, o Altíssimo, e como o sábio de Salém. Algumas das tribos da vizinhança sempre se referiam a ele como o xeique, ou o rei, de Salém. Salém era o local que, depois do desaparecimento de Melquisedeque, transformou-se na cidade de Jébus, sendo posteriormente chamada Jerusalém.

93:2:5 10155 Na aparência pessoal, Melquisedeque assemelhava-se aos povos noditas e sumérios, então mesclados, tendo quase um metro e oitenta de altura e possuindo uma presença imponente. Falava o caldeu e uma meia dúzia de outras línguas. Vestia-se de um modo bem semelhante aos sacerdotes cananeus, exceto que usava no peito um emblema com três círculos concêntricos, o símbolo, em Satânia, da Trindade do Paraíso. Com o decorrer do seu ministério, a insígnia dos três círculos concêntricos veio a ser considerada tão sagrada pelos seus seguidores que eles nunca ousaram usá-la, e foi logo esquecida com o passar de umas poucas gerações.

93:2:6 10156 Embora Maquiventa houvesse vivido à maneira dos homens deste reino, ele nunca se casou, nem poderia ter deixado prole na Terra. O seu corpo físico, conquanto fosse semelhante ao de um ser humano masculino, era, na realidade, da ordem daqueles corpos especialmente construídos, usados pelos cem membros materializados da assessoria do Príncipe Caligástia, exceto que não trazia o plasma da vida de nenhuma raça humana. Nem havia mais em Urântia uma árvore da vida disponível. Houvesse Maquiventa permanecido por algum tempo mais longo na Terra e o seu mecanismo físico haver-se-ia gradativamente deteriorado; o que sucedeu foi que ele completou a sua missão de auto-outorga em noventa e quatro anos, muito antes que o seu corpo material houvesse começado a desfazer-se.

93:2:7 10161 Esse Melquisedeque encarnado recebeu um Ajustador do Pensamento, que residiu na sua personalidade supra-humana, como monitor do tempo e mentor da carne, adquirindo, assim, certa experiência e recebendo uma introdução prática aos problemas de Urântia e da técnica de residir um Filho encarnado, que capacitou esse espírito do Pai a funcionar tão valentemente na mente humana do Filho de Deus, Michael, quando mais tarde ele apareceu na Terra à semelhança de um mortal na carne. E este é o único Ajustador do Pensamento a ter funcionado em duas mentes em Urântia, e ambas as mentes sendo tanto divinas quanto humanas.

93:2:8 10162 Durante a encarnação na carne, Maquiventa manteve pleno contato com os seus onze companheiros do corpo dos custódios planetários, mas ele não podia comunicar-se com outras ordens de personalidades celestes. À parte os administradores Melquisedeques, ele não tinha nenhum contato mais com outras inteligências supra-humanas do que tem um ser humano.

3. OS ENSINAMENTOS DE MELQUISEDEQUE


93:3:1 10163 Passada uma década, Melquisedeque organizou as suas escolas em Salém, dando a elas o padrão do antigo sistema que havia sido desenvolvido pelos primeiros sacerdotes setitas do segundo Éden. Mesmo a idéia do sistema do dízimo, introduzida por Abraão, posteriormente convertido por Melquisedeque, também derivou das tradições remanescentes dos métodos dos antigos setitas.

93:3:2 10164 Melquisedeque ensinou o conceito de um só Deus, de uma Deidade universal, mas permitiu ao povo associar esse ensinamento ao Pai da Constelação de Norlatiadeque, a quem ele chamava de El Elyon – o Altíssimo. Melquisedeque manteve-se em silêncio quanto ao status de Lúcifer e quanto ao estado de coisas em Jerusém. Lanaforge, o Soberano do Sistema, pouco tinha a ver com Urântia, antes do término da auto-outorga de Michael. Para uma maioria dos estudantes de Salém, Edêntia era o céu e o Altíssimo era Deus.

93:3:3 10165 A maioria das pessoas interpretava o símbolo com os três círculos concêntricos que Melquisedeque adotou como insígnia da sua outorga, como representando três reinos, o dos homens, o dos anjos e o de Deus. E a todos foi permitido continuarem com essa crença; pouquíssimos dentre os seus seguidores chegaram a saber que os três círculos eram um símbolo da infinitude, um emblema da eternidade e da universalidade da Trindade do Paraíso, a divina mantenedora e diretora; mesmo Abraão considerava esse símbolo como sendo o dos três Altíssimos de Edêntia, pois havia sido instruído a ele que os três Altíssimos funcionavam como um. Quando Melquisedeque ensinava o conceito da Trindade, simbolizado pela sua insígnia, geralmente ele o associava aos três governantes Vorondadeques, da constelação de Norlatiadeque.

93:3:4 10166 Para o grosso dos seus seguidores, ele não fez nenhum esforço de apresentar ensinamentos para além do fato do governo dos Altíssimos de Edêntia – os Deuses para Urântia. Para alguns, porém, Melquisedeque ensinou a verdade avançada, abrangendo a condução e a organização do universo local; enquanto que, para o seu brilhante discípulo Nordan, o quenita, e para a sua turma de estudantes empenhados, ele ensinou a verdade do superuniverso e mesmo de Havona.

93:3:5 10167 Os membros da família de Katro, com quem Melquisedeque viveu por mais de trinta anos, conheciam muitas dessas verdades mais elevadas e as perpetuaram por muito tempo na própria família, até os dias mesmo do seu ilustre descendente Moisés, que, desse modo, teve acesso a uma imponente tradição dos dias de Melquisedeque, trazida pelo lado do seu pai, bem como por meio de outras fontes, pelo lado da sua mãe.

93:3:6 10168 Melquisedeque ensinou aos seus seguidores tudo o que eles tiveram capacidade para receber e assimilar. E mesmo muitas idéias religiosas modernas, sobre o céu e a Terra, o homem, e os anjos, não estão tão afastadas desses ensinamentos de Melquisedeque. Contudo, esse grande instrutor subordinou tudo à doutrina de um único Deus, uma Deidade universal, um Criador celeste, um Pai divino. Esse ensinamento foi enfatizado, com o propósito de atrair a adoração do homem e preparar o caminho para a vinda posterior de Michael, como o Filho deste mesmo Pai Universal.

93:3:7 10171 Melquisedeque ensinou que, em algum tempo futuro, outro Filho de Deus viria na carne como ele havia vindo, mas que nasceria de uma mulher; e foi por isso que inúmeros instrutores, posteriormente, sustentaram que Jesus era um sacerdote, ou um ministro, “para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque”.

93:3:8 10172 E assim Melquisedeque preparou o caminho, estabelecendo no mundo o estágio de tendência monoteísta, apropriado para a auto-outorga de um verdadeiro Filho do Paraíso do único Deus de fato, a quem ele tão vividamente retratou como sendo o Pai de todos, e a quem ele representou para Abraão como um Deus que aceitaria o homem nos termos simples da fé pessoal. E Michael, quando apareceu na Terra, confirmou tudo o que Melquisedeque havia ensinado a respeito do Pai do Paraíso.

4. A RELIGIÃO DE SALÉM


93:4:1 10173 As cerimônias da adoração em Salém eram muito simples. Todas as pessoas que assinavam ou que faziam marcas nas listas das tábuas de argila na igreja de Melquisedeque comprometiam-se a memorizar e seguiam a seguinte crença:

93:4:2 10174 1. Eu acredito em El Elyon, o Deus Altíssimo, o único Pai Universal e Criador de todas as coisas.

93:4:3 10175 2. Eu aceito a aliança de Melquisedeque com o Altíssimo, que confere o favor de Deus à minha fé; sem sacrifícios, nem holocaustos.

93:4:4 10176 3. Eu prometo obedecer aos sete mandamentos de Melquisedeque e contar as boas novas dessa aliança com o Altíssimo a todos os homens.

93:4:5 10177 E esse era todo o credo da colônia de Salém. Todavia, mesmo essa curta e simples declaração de fé foi excessiva e avançada demais para os homens daqueles dias. Eles simplesmente não podiam entender a idéia de obter o favor divino por nada – pela fé. Eles estavam muito profundamente imbuídos da crença de que o homem nascia em débito com os deuses. Por tempo demais e com uma sinceridade intensa e excessiva, haviam eles feito sacrifícios e dádivas, aos sacerdotes, para serem capazes de compreender as boas-novas de que a salvação, o favor divino, era um dom dado de graça a todos os que acreditassem na aliança com Melquisedeque. Contudo, Abraão acreditou de modo indeciso e ainda assim isso foi “recebido como um ato de retidão”.

93:4:6 10178 Os sete mandamentos promulgados por Melquisedeque foram modelados ao longo das linhas da suprema lei da Dalamátia e em muito se assemelhavam aos sete mandamentos ensinados no primeiro e no segundo Édens. Esses mandamentos da religião de Salém foram:

93:4:7 10179 1. Não servirás a nenhum Deus, senão ao Criador Altíssimo do Céu e da Terra.

93:4:8 101710 2. Não duvidarás de que a fé é a única condição necessária para a salvação eterna.

93:4:9 101711 3. Não darás falso testemunho.

93:4:10 101712 4. Não matarás.

93:4:11 101713 5. Não furtarás.

93:4:12 10181 6. Não cometerás adultério.

93:4:13 10182 7. Não mostrarás desrespeito pelos teus pais, nem pelos mais velhos.

93:4:14 10183 Se bem que nenhum sacrifício fosse permitido na colônia, Melquisedeque bem sabia quão difícil é desenraizar subitamente os costumes há muito já estabelecidos e, por isso, sabiamente, ofereceu a esse povo o sacramento do pão e do vinho como substituto do sacrifício mais antigo da carne e do sangue. Está registrado: “Melquisedeque, rei de Salém, instituiu o pão e o vinho”. Mas mesmo essa inovação cautelosa não teve um êxito total; as várias tribos mantinham, todas, centros auxiliares nos arredores de Salém, onde ofereciam sacrifícios e holocaustos. Mesmo Abraão recorreu a essa prática bárbara, depois das suas vitórias sobre Quedorlaomer; ele simplesmente não se sentiu totalmente à vontade até que houvesse oferecido um sacrifício convencional. E Melquisedeque nunca teve êxito em erradicar totalmente essa tendência aos sacrifícios nas práticas religiosas dos seus seguidores, nem mesmo nas de Abraão.

93:4:15 10184 Como Jesus, Melquisedeque aplicou-se estritamente ao cumprimento da missão da sua auto-outorga. Ele não tentou reformar os costumes, nem mudar os hábitos do mundo, nem mesmo promulgar práticas sanitárias avançadas, nem verdades científicas. Ele veio para realizar duas missões: manter viva, na Terra, a verdade de um único Deus e preparar o caminho para a outorga mortal subseqüente de um Filho do Paraíso deste Pai Universal.

93:4:16 10185 Melquisedeque ensinou a verdade elementar revelada, em Salém, durante noventa e quatro anos e, durante esse tempo, Abraão freqüentou a escola de Salém por três vezes diferentes. Ele, finalmente, tornou-se um convertido aos ensinamentos de Salém, tornando-se um dos alunos mais brilhantes e um dos principais esteios de Melquisedeque.

5. A ESCOLHA DE ABRAÃO


93:5:1 10186 Embora possa ser um erro falar de “povo eleito”, não é um erro referir-nos a Abraão como um indivíduo escolhido. Melquisedeque deu a Abraão a responsabilidade de manter viva a verdade de um Deus, distinguindo-a da crença, que prevalecia, em deidades múltiplas.

93:5:2 10187 A escolha da Palestina como local para as atividades de Maquiventa foi, em parte, baseada no desejo de estabelecer contato com alguma família humana que corporificasse os potenciais da liderança. Na época da encarnação de Melquisedeque, havia muitas famílias na Terra igualmente bem preparadas para receber a doutrina de Salém, tanto quanto a de Abraão. Havia famílias igualmente dotadas entre os homens vermelhos, os homens amarelos e os descendentes dos anditas, a oeste e ao norte. De novo, porém, nenhuma dessas localidades era tão bem situada, para o aparecimento subseqüente de Michael na Terra, quanto a costa oriental do mar Mediterrâneo. A missão de Melquisedeque na Palestina e o posterior aparecimento de Michael, em meio ao povo hebreu, foram, em grande parte, determinadas pela geografia, pelo fato de que a Palestina estava centralmente localizada com relação ao comércio, às vias de comunicação existentes e à civilização do mundo de então.

93:5:3 10188 Por algum tempo, os administradores Melquisedeques haviam estado observando os ancestrais de Abraão e, confiantes, esperavam que surgissem, em uma certa geração, filhos que seriam caracterizados pela inteligência, pela iniciativa, pela sagacidade e pela sinceridade. Os filhos de Terah, pai de Abraão, em todos os sentidos, satisfaziam a essas expectativas. A possibilidade de contato com esses versáteis filhos de Terah tinha bastante a ver com o aparecimento de Maquiventa, em Salém, em vez de no Egito, China, Índia, ou entre as tribos do norte.

93:5:4 10191 Terah e toda sua família eram convertidos pouco sinceros à religião de Salém, que havia sido pregada na Caldéia; eles souberam de Melquisedeque por meio da pregação de Ovídio, um instrutor fenício que proclamava as doutrinas de Salém em Ur. Eles deixaram Ur com a intenção de ir diretamente para Salém, mas Nahor, irmão de Abraão, não tendo estado com Melquisedeque, não estava entusiasmado e persuadiu-os a permanecerem em Haran. Muito tempo passou, depois de haverem chegado à Palestina, antes que se dispusessem a destruir todos os deuses caseiros que haviam trazido consigo; eles foram lentos em renunciar aos muitos deuses da Mesopotâmia, em favor do Deus único de Salém.

93:5:5 10192 Umas poucas semanas depois da morte de Terah, pai de Abraão, Melquisedeque enviou um dos seus estudantes, Jaram, o hitita, para tornar seu convite extensivo tanto a Abraão quanto a Nahor: “Vinde a Salém, onde ireis ouvir os nossos ensinamentos sobre a verdade do Criador eterno e, na descendência esclarecida dos irmãos que vós sois, todo o mundo será abençoado”. E Nahor não havia ainda aceitado totalmente o ensinamento de Melquisedeque; ele permaneceu atrás e construiu uma forte cidade-estado que levou o seu nome; mas Lot, sobrinho de Abraão, decidiu ir com o tio para Salém.

93:5:6 10193 Ao chegar em Salém, Abraão e Lot escolheram um forte nas colinas, próximo da cidade, onde eles poderiam defender-se contra os múltiplos ataques de surpresa dos invasores do norte. Nessa época, os hititas, assírios, filisteus e outros grupos estavam constantemente pilhando as tribos na parte central e sulina da Palestina. Do seu abrigo fortalecido nas colinas, Abraão e Lot fizeram freqüentes peregrinações a Salém.

93:5:7 10194 Não muito depois de se haverem estabelecido perto de Salém, Abraão e Lot foram pelo vale do Nilo, para obter suprimentos alimentares, pois havia, então, uma seca na Palestina. Durante essa breve permanência no Egito, Abraão encontrou um parente distante no trono egípcio, e serviu de comandante em duas expedições militares de muito êxito para esse rei. Durante a última parte da sua permanência no Nilo, ele e a sua esposa, Sara, viveram na corte e, ao deixar o Egito, ele recebeu uma parte dos despojos das suas campanhas militares.

93:5:8 10195 Foi necessária muita determinação a Abraão para renunciar às honras da corte egípcia e voltar-se para o trabalho mais espiritual promovido por Maquiventa. Mas Melquisedeque era reverenciado até mesmo no Egito, e quando toda a situação foi apresentada ao Faraó, ele veementemente instou Abraão a voltar para cumprir o seu voto à causa de Salém.

93:5:9 10196 Abraão tinha ambições de ser rei e, no seu retorno do Egito, expôs a Lot o seu plano de subjugar toda a Canaã e de colocar o seu povo sob o governo de Salém. Lot inclinava-se mais pelos negócios; assim, depois de um desacordo posterior, ele foi para Sodoma, para dedicar-se a fazer comércio e à criação de animais. Lot não gostava nem da vida militar, nem da vida de pastor.

93:5:10 10197 Ao retornar com a sua família para Salém, Abraão começou a amadurecer os seus projetos militares. Foi logo reconhecido como governante civil do território de Salém e tinha, sob a sua liderança, sete tribos vizinhas confederadas. Foi com grande dificuldade que Melquisedeque de fato conseguiu conter Abraão, que estava inflamado de entusiasmo para conquistar as tribos vizinhas, na ponta da espada, para que elas fossem assim mais rapidamente tornadas conhecedoras das verdades de Salém.

93:5:11 10198 Melquisedeque mantinha relações pacíficas com todas as tribos vizinhas; ele não era militarista e nunca havia sido atacado por qualquer dos exércitos durante as suas idas e vindas por ali. Ele estava inteiramente de acordo com a idéia de que Abraão devesse formular e adotar uma política defensiva para Salém, do modo como foi posteriormente levada a efeito, mas não aprovava os esquemas ambiciosos de conquistas do seu aluno; desse modo, aconteceu um distanciamento amigável na relação, Abraão indo para Hebron para estabelecer a sua capital militar.

93:5:12 10201 Em vista das suas estreitas relações com o ilustre Melquisedeque, Abraão possuía uma grande vantagem sobre os pequenos reis da vizinhança; todos eles reverenciavam Melquisedeque e, indevidamente, temiam a Abraão. Abraão sabia desse medo e apenas aguardava uma ocasião oportuna para atacar os seus vizinhos, e a desculpa para fazê-lo veio quando alguns desses governantes tiveram a presunção de invadir a propriedade do seu sobrinho Lot, que morava em Sodoma. Ao saber disso, Abraão, na chefia das suas sete tribos confederadas, marchou sobre o inimigo. A sua própria guarda pessoal de 318 homens dirigiu o exército, que tinha mais de 4 000 integrantes, que se lançaram, então, ao ataque.

93:5:13 10202 Quando Melquisedeque ouviu sobre a declaração de guerra feita por Abraão, partiu para dissuadi-lo, mas apenas alcançou o seu antigo discípulo quando ele retornava vitorioso da batalha. Abraão insistiu que o Deus de Salém havia dado a ele a vitória sobre os seus inimigos e persistiu em dar um décimo dos seus despojos para o tesouro de Salém. Os outros noventa por cento ele levou para a sua capital, em Hebron.

93:5:14 10203 Após essa batalha de Sidim, Abraão tornou-se o líder de uma segunda confederação de onze tribos, e não sós pagava o dízimo a Melquisedeque, mas fazia com que todos os outros na vizinhança fizessem o mesmo. As suas tratativas diplomáticas com o rei de Sodoma, aliadas ao medo que ele geralmente inspirava, tiveram como resultado que o rei de Sodoma e outros se uniram a Hebron em confederação militar; Abraão estava indo realmente bem no sentido de estabelecer um estado poderoso na Palestina.

6. A ALIANÇA DE MELQUISEDEQUE COM ABRAÃO


93:6:1 10204 Abraão tinha em vista a conquista de toda a Canaã. A sua determinação era enfraquecida apenas pelo fato de que Melquisedeque não iria aprovar esse empreendimento. Abraão, porém, já havia praticamente decidido embarcar nele quando o pensamento de que não tinha nenhum filho para sucedê-lo como governante desse reino proposto começou a preocupá-lo. Arranjou uma outra conversa com Melquisedeque; e foi no curso dessa entrevista que o sacerdote de Salém, o Filho visível de Deus, persuadiu Abraão a abandonar o seu esquema de conquista material e de governo temporal, em favor do conceito espiritual do Reino do céu.

93:6:2 10205 Melquisedeque explicou a Abraão sobre a inutilidade de contendas contra a confederação dos amoritas, mas fê-lo também compreender que esses clãs atrasados estavam certamente cometendo o suicídio nas suas práticas tolas, pois, em poucas gerações, eles estariam tão enfraquecidos que os descendentes de Abraão, nesse meio tempo grandemente aumentados, poderiam facilmente dominá-los.

93:6:3 10206 E Melquisedeque fez uma aliança formal com Abraão, em Salém. Ele disse a Abraão: “Olha agora para os céus e conta as estrelas, se fores capaz; pois assim tão numerosa a tua semente será”. E Abraão acreditou em Melquisedeque, “e isso foi atribuído a ele como retidão”. E então Melquisedeque contou a Abraão sobre a futura ocupação de Canaã pela sua descendência, depois da permanência deles no Egito.

93:6:4 10207 Essa aliança entre Melquisedeque e Abraão representa o grande acordo urantiano entre a divindade e a humanidade, por meio do qual Deus concorda em fazer tudo; o homem apenas concorda em acreditar nas promessas de Deus e em seguir as suas instruções. Até esse momento, havia-se acreditado que a salvação poderia ser assegurada apenas por obras – sacrifícios e oferendas; e, agora, Melquisedeque novamente trazia a Urântia as boas-novas de que a salvação, o favorecimento de Deus, deve ser conquistado pela fé. Mas esse evangelho de simples fé em Deus era muito avançado; os homens das tribos semitas posteriormente preferiram retomar os sacrifícios antigos de expiação dos pecados, por meio do derramamento de sangue.

93:6:5 10211 Pouco tempo depois do estabelecimento dessa aliança, Isaac, o filho de Abraão, nasceu, conforme a promessa de Melquisedeque. Depois do nascimento de Isaac, Abraão teve uma atitude muito solene para com essa aliança com Melquisedeque, e foi a Salém para vê-la confirmada por escrito. Foi nessa aceitação pública e formal da aliança que ele então mudou o seu nome, de Abram para Abraão.

93:6:6 10212 A maioria dos crentes de Salém havia praticado a circuncisão, ainda que Melquisedeque nunca a houvesse tornado obrigatória. E Abraão, que havia feito sempre oposição à circuncisão, nessa ocasião decidiu tornar o evento solene, e aceitou formalmente esse rito em sinal da ratificação da aliança de Salém.

93:6:7 10213 A essa rendição pública e real das suas ambições pessoais em favor dos planos maiores de Melquisedeque, seguiu-se a aparição dos três seres celestes para ele, nas planícies de Manré. Essa aparição aconteceu de fato, não obstante a sua associação com narrativas posteriormente fabricadas, relativas à destruição, que foi natural, de Sodoma e Gomorra. E essas lendas sobre os acontecimentos daqueles dias indicam quão atrasadas eram a moral e a ética até mesmo em épocas relativamente recentes.

93:6:8 10214 Com a consumação da aliança solene, a reconciliação entre Abraão e Melquisedeque tornou-se completa. Abraão assumiu novamente a liderança civil e militar da colônia de Salém, a qual, no seu apogeu, teve mais de cem mil pagadores regulares de dízimos, nas listas da irmandade de Melquisedeque. Abraão fez grandes melhorias no templo de Salém e forneceu novas tendas para toda a escola. Não apenas estendeu o sistema de dízimos, como também instituiu métodos aperfeiçoados de conduzir os negócios da escola, além de contribuir grandemente para um melhor direcionamento dos assuntos ligados à disseminação missionária. Ele também fez muito para promover melhorias para os rebanhos e reorganizar os projetos para os produtos leiteiros de Salém. Abraão era um sagaz e eficiente homem de negócios, um homem rico para a sua época; ele não era excessivamente pio, mas era profundamente sincero, e acreditava em Maquiventa Melquisedeque.

7. OS MISSIONÁRIOS MELQUISEDEQUES


93:7:1 10215 Melquisedeque continuou, por alguns anos, instruindo os seus estudantes e treinando os missionários de Salém, que penetravam em todas as tribos vizinhas, especialmente no Egito, Mesopotâmia e Ásia Menor. E, à medida que passavam as décadas, esses educadores viajavam cada vez para mais longe de Salém, levando consigo o ensinamento de Maquiventa sobre a crença e a fé em Deus.

93:7:2 10216 Os descendentes de Adamson, agrupados em torno das margens do lago de Van, eram ouvintes dispostos dos educadores hititas do culto de Salém. Desse antigo centro andita, os educadores eram despachados para regiões longínquas, não apenas da Europa, como da Ásia. Os missionários de Salém penetraram em toda a Europa, até mesmo nas Ilhas Britânicas. Um grupo foi, pelas Ilhas Faroe, até os andonitas da Islândia; enquanto outro atravessou a China e alcançou os japoneses das ilhas orientais. As vidas e as experiências dos homens e mulheres que se aventuraram a sair de Salém, Mesopotâmia e lago de Van, para esclarecer as tribos do hemisfério oriental, representam um capítulo heróico nos anais da raça humana.

93:7:3 10221 Contudo, as tribos eram tão atrasadas e a tarefa era tão grande que os resultados foram vagos e indefinidos. De uma geração para outra, o ensinamento de Salém encontrou lugar aqui e ali, mas, exceção feita à Palestina, nunca a idéia de um único Deus foi capaz de conseguir a lealdade continuada de uma tribo ou raça inteira. Muito antes da vinda de Jesus, os ensinamentos dos primeiros missionários de Salém haviam já submergido, em geral, nas superstições e crenças mais antigas e mais difundidas. O ensinamento Melquisedeque original havia sido quase totalmente absorvido pelas crenças na Grande Mãe, no Sol, e em outros cultos antigos.

93:7:4 10222 Vós, que hoje desfrutais das vantagens da arte da imprensa, não sabeis quão difícil foi perpetuar a verdade durante esses tempos primitivos; tão fácil era perder de vista uma nova doutrina, de uma geração para outra. Havia sempre uma tendência de que a nova doutrina fosse absorvida no corpo mais antigo de ensinamentos religiosos e práticas de magia. Uma nova revelação é sempre contaminada pelas crenças evolucionárias mais antigas.

8. A PARTIDA DE MELQUISEDEQUE


93:8:1 10223 Foi pouco depois da destruição de Sodoma e Gomorra que Maquiventa decidiu terminar a sua auto-outorga de emergência em Urântia. A decisão de Melquisedeque de dar fim à sua estada na carne foi influenciada por inúmeras condições, a principal delas sendo a tendência crescente das tribos vizinhas, e mesmo dos seus parceiros imediatos, de considerá-lo um semideus, de vê-lo como um ser sobrenatural, o que de fato ele era; mas eles estavam começando a reverenciá-lo de modo indevido e com um medo altamente supersticioso. Além dessas razões, Melquisedeque queria deixar a cena das suas atividades terrenas um tempo suficiente antes da morte de Abraão, para assegurar que a verdade de um Deus e um só Deus pudesse tornar-se estabelecida de modo firme nas mentes dos seus seguidores. E, desse modo, Maquiventa retirou-se, certa noite, para a sua tenda, em Salém, tendo dito boa-noite aos seus companheiros humanos, e quando eles foram chamá-lo na manhã seguinte, ele não estava lá, pois os seus companheiros o haviam levado.

9. APÓS A PARTIDA DE MELQUISEDEQUE


93:9:1 10224 O desaparecimento tão súbito de Melquisedeque foi uma grande provação para Abraão. Se bem que Melquisedeque houvesse advertido abertamente aos seus seguidores de que deveria, em algum tempo, partir do modo como havia chegado, eles não se conformaram com a perda do seu maravilhoso líder. A grande organização montada em Salém quase desapareceu, embora tenha sido sobre as tradições daqueles dias que Moisés se haja apoiado, quando levou os escravos hebreus para fora do Egito.

93:9:2 10225 A perda de Melquisedeque produziu, no coração de Abraão, uma tristeza que ele nunca superou completamente. Ele havia abandonado Hebron, quando desistira da ambição de edificar um reino material; e agora, com a perda do seu inspirador, na construção do Reino espiritual, ele partiu de Salém, indo para o sul, para viver próximo dos seus interesses em Gerar.

93:9:3 10226 Abraão tornou-se amedrontado e tímido, imediatamente depois do desaparecimento de Melquisedeque. Ele escondeu a sua identidade ao chegar em Gerar, tanto assim que Abimelec tomou-lhe a esposa. (Pouco depois do seu casamento com Sara, uma noite Abraão tinha ouvido sobre um complô para assassiná-lo, para tirar-lhe a sua brilhante esposa. E esse temor transformou-se em um terror para aquele líder tão bravo e ousado em tantas outras coisas; durante toda a sua vida, ele temera que alguém o matasse secretamente para ficar com Sara. E isso explica por que, em três ocasiões diferentes, esse bravo homem demonstrou uma verdadeira covardia. )

93:9:4 10231 Mas Abraão não ficou por muito tempo impedido de cumprir a sua missão como sucessor de Melquisedeque. Logo, ele fez conversões em meio aos filisteus e junto ao povo de Abimelec; fez um tratado com eles e, em troca, tornou-se contaminado por muitas das superstições deles, particularmente pela prática do sacrifício de primogênitos. Assim, de novo, Abraão tornou-se um grande líder na Palestina. Ele foi reverenciado por todos os grupos e honrado por todos os reis. Ele era o líder espiritual de todas as tribos vizinhas, e a sua influência continuou por algum tempo depois da sua morte. Durante os últimos anos da sua vida, uma vez mais ele retornou a Hebron, cenário das suas primeiras atividades e local onde havia trabalhado junto com Melquisedeque. O último ato de Abraão foi enviar serviçais de confiança à cidade do seu irmão, Nahor, na fronteira com a Mesopotâmia, para assegurar que uma mulher do seu próprio povo fosse a esposa do seu filho Isaac. Há muito o casamento entre primos havia sido um costume do povo de Abraão. E Abraão morreu confiante naquela fé em Deus que ele havia aprendido de Melquisedeque nas escolas desaparecidas de Salém.

93:9:5 10232 Para a geração seguinte, foi difícil compreender a história de Melquisedeque; passados quinhentos anos, muitos consideraram toda a narrativa como um mito. Isaac manteve-se bastante próximo dos ensinamentos do seu pai e manteve a crença da colônia de Salém, mas, para Jacó, foi mais difícil compreender o significado dessas tradições. José foi um crente firme em Melquisedeque e, um tanto por causa disso, foi encarado pelos seus irmãos como um sonhador. As honrarias concedidas a José, no Egito, o foram principalmente devido à memória do seu bisavô Abraão. A José foi oferecido o comando militar dos exércitos egípcios, mas, sendo um crente tão firme nas tradições de Melquisedeque e nos ensinamentos posteriores de Abraão e Isaac, ele escolheu servir como administrador civil, acreditando que poderia, assim, trabalhar melhor para o avanço do Reino dos céus.

93:9:6 10233 O ensinamento de Melquisedeque foi pleno e completo, mas os registros desses dias pareceram impossíveis e fantásticos para os sacerdotes hebreus posteriores, embora muitos tivessem alguma compreensão daqueles acontecimentos, pelo menos até a época em que os registros do Antigo Testamento foram revisados em massa na Babilônia.

93:9:7 10234 O que o Antigo Testamento registra como conversas entre Abraão e Deus, na realidade, aconteceu entre Abraão e Melquisedeque. Posteriormente, os escribas encararam o termo Melquisedeque como sinônimo de Deus. Os registros de tantos contatos de Abraão e Sara com “o anjo do Senhor” referem-se às suas numerosas entrevistas com Melquisedeque.

93:9:8 10235 As narrativas hebraicas sobre Isaac, Jacó e José são muito mais confiáveis do que aquelas sobre Abraão, se bem que elas também contenham muitos pontos divergentes do que é factual, devido a alterações feitas intencionalmente e não intencionalmente na época da compilação desses registros pelos sacerdotes hebreus, durante o cativeiro na Babilônia. Quetura não foi esposa de Abraão; como Agar, ela foi meramente uma concubina. Todas as propriedades de Abraão foram para Isaac, o filho de Sara, que tinha status de esposa. Abraão não era tão velho quanto o registro indica e a sua esposa era muito mais nova. Essas idades foram deliberadamente alteradas, com o fito de prover um subseqüente nascimento de Isaac, pretendido como miraculoso.

93:9:9 10236 O ego nacional dos judeus ficou tremendamente deprimido durante o cativeiro da Babilônia. Na sua reação contra a inferioridade nacional, eles oscilaram para o outro extremo do egotismo nacional e racial e, nisso, distorceram e perverteram as suas tradições para exaltar-se, colocando a si próprios acima de todas as raças, como povo escolhido de Deus; e assim, eles cuidadosamente refizeram todos os registros com o propósito de colocar Abraão e os seus outros líderes nacionais muito acima de todas as outras pessoas, não excetuando o próprio Melquisedeque. Os escribas hebreus destruíram, pois, todos os anais que puderam encontrar dessas épocas memoráveis, preservando apenas a narrativa do encontro de Abraão e Melquisedeque depois da batalha de Sidim, encontro que fazia refletir uma grande honra sobre Abraão.

93:9:10 10241 E assim, ao perder Melquisedeque de vista, eles também perderam o ensinamento desse Filho emergencial a respeito da missão espiritual de auto-outorga do Filho prometido. Perderam de vista tão plena e completamente a natureza dessa missão, que poucos da sua progênie puderam ou quiseram reconhecer e receber Michael, quando ele apareceu na Terra e na carne, como Maquiventa havia predito.

93:9:11 10242 Todavia, um dos escritores do Livro dos Hebreus compreendeu a missão de Melquisedeque, pois está escrito: “Esse Melquisedeque, sacerdote do Altíssimo, também foi o rei da paz; sem pai, sem mãe, sem genealogia, não tendo nem início de dias nem fim de vida, mas feito como um Filho de Deus, ele permanece para sempre como um sacerdote”. Esse escritor definiu Melquisedeque como um ser do tipo auto-outorgado, como posteriormente o foi Michael, afirmando que Jesus era “um ministro para sempre da ordem de Melquisedeque”. Ainda que essa comparação não seja de todo feliz, foi literalmente verdadeiro que Cristo recebeu um título provisório em Urântia, “segundo as ordens dos doze administradores Melquisedeques” em exercício, na época da sua auto-outorga neste mundo.

10. O STATUS ATUAL DE MAQUIVENTA MELQUISEDEQUE


93:10:1 10243 Durante os anos da encarnação de Maquiventa, os administradores Melquisedeques de Urântia funcionaram em número de onze. Quando Maquiventa considerou que a sua missão, como um Filho emergencial, estava acabada, ele indicou esse fato aos seus onze coligados, e eles imediatamente colocaram à disposição dele a técnica por meio da qual deveria ser liberado da carne e devolvido a salvo ao seu status original, de Filho Melquisedeque. E, ao terceiro dia depois do seu desaparecimento de Salém, ele apareceu em meio aos seus onze companheiros na missão em Urântia e reassumiu a sua carreira interrompida como um dos administradores planetários do 606 de Satânia.

93:10:2 10244 Maquiventa terminou a sua auto-outorga como uma criatura de carne e sangue, tão sem cerimônia e tão subitamente quanto a havia começado. Nem o seu aparecimento nem a partida foram acompanhados de qualquer anúncio inusitado ou demonstração; nem uma lista de chamada de ressurreição, nem um fim de dispensação planetária marcaram o seu aparecimento em Urântia; a sua outorga foi de emergência. Maquiventa, porém, não terminou a sua temporada na carne dos seres humanos antes de haver sido devidamente liberado pelo Pai Melquisedeque e não antes de haver sido informado de que a sua outorga emergencial havia recebido a aprovação do dirigente executivo de Nebadon, Gabriel de Salvington.

93:10:3 10245 Maquiventa Melquisedeque continuou a manter um grande interesse pelos assuntos dos descendentes daqueles homens que haviam acreditado nos seus ensinamentos, quando ele estava na carne. Contudo, a progênie de Abraão, por intermédio de Isaac, na linha de intercasamento com os quenitas, era a única linhagem que por um longo tempo continuou a manter algum conceito claro dos ensinamentos de Salém.

93:10:4 10246 Esse mesmo Melquisedeque continuou a colaborar, durante os dezenove séculos seguintes, com muitos profetas e videntes, tratando assim de manter vivas as verdades de Salém até que se completasse o tempo da vinda de Michael à Terra.

93:10:5 10251 Maquiventa continuou como administrador planetário até os tempos do triunfo de Michael em Urântia. Depois disso, ele ficou ligado ao serviço de Urântia, em Jerusém, como um dos vinte e quatro diretores, tendo sido, apenas recentemente, elevado à posição de embaixador pessoal do Filho Criador em Jerusém, com o título de Príncipe Planetário Vice-Regente de Urântia. Acreditamos que, enquanto Urântia permanecer como planeta habitado, Maquiventa Melquisedeque não retornará totalmente aos deveres da sua ordem de filiação e permanecerá, em termos de tempo, para sempre como ministro planetário, representando Cristo Michael.

93:10:6 10252 Como a sua outorga em Urântia foi de emergência, não consta nos anais qual possa ser o futuro de Maquiventa. Pode acontecer que o corpo Melquisedeque de Nebadon haja sofrido a perda permanente de um dos do seu número. Ordens recentes, vindas dos Altíssimos de Edêntia e, mais tarde, confirmadas pelos Anciães dos Dias de Uversa, sugerem, com ênfase, que esse Melquisedeque de auto-outorga esteja destinado a tomar o lugar do Príncipe Planetário caído, Caligástia. Se as nossas conjecturas a esse respeito estiverem corretas, é bastante possível que Maquiventa Melquisedeque possa novamente aparecer pessoalmente em Urântia e, de algum modo diferente, reassumir o papel do Príncipe Planetário destronado, ou, então, aparecer na Terra para funcionar como Príncipe Planetário Vice-Regente, representando Cristo Michael, que é, agora, quem de fato detém o título de Príncipe Planetário de Urântia. Ainda que esteja longe de parecer claro, para nós, qual possa ser o destino de Maquiventa, contudo, acontecimentos recentes sugerem enfaticamente que as conjecturas anteriores provavelmente não estejam muito distantes da verdade.

93:10:7 10253 Nós compreendemos muito bem como, pelo seu triunfo em Urântia, Michael tornou-se o sucessor não só de Caligástia e de Adão; como também tornou-se o Príncipe Planetário da Paz e o segundo Adão. E, agora, vemos ser conferido a esse Melquisedeque o título de Príncipe Planetário Vice-Regente de Urântia. Será ele também constituído como Filho Material Vice-Regente de Urântia? Ou haverá a possibilidade de que um evento inesperado e sem precedentes ocorra, tal como o retorno ao planeta, a qualquer momento, de Adão e Eva, ou de alguns dos seus descendentes como representantes de Michael, com os títulos de Vice-Regentes do segundo Adão de Urântia?

93:10:8 10254 E todas essas especulações, associadas à certeza dos aparecimentos futuros tanto de Filhos Magisteriais, quanto de Filhos Instrutores da Trindade, em conjunção com a promessa explícita do Filho Criador de retornar em algum momento, fazem de Urântia um planeta de futuro imprevisto e tornam-no uma das mais interessantes e misteriosas esferas em todo o universo de Nebadon. É mesmo possível que, em alguma era futura, quando Urântia se estiver aproximando da era de luz e vida, depois que os casos da rebelião de Lúcifer e da secessão de Caligástia houverem sido finalmente julgados, possamos testemunhar as presenças em Urântia, simultaneamente, de Maquiventa, Adão, Eva e Cristo Michael, bem como a de um Filho Magisterial ou mesmo de Filhos Instrutores da Trindade.

93:10:9 10255 Há muito, a opinião da nossa ordem tem sido de que a presença de Maquiventa no corpo de diretores de Urântia em Jerusém, junto aos vinte e quatro conselheiros, é evidência suficiente para garantir a crença de que ele está destinado a seguir adiante, com os mortais de Urântia, no esquema de progressão e ascensão do universo até mesmo ao Corpo de Finalidade do Paraíso. Sabemos que Adão e Eva estão destinados a acompanhar os seus companheiros da Terra na aventura até o Paraíso, quando Urântia estiver estabelecida em luz e vida.

93:10:10 10256 Há menos de mil anos, este mesmo Maquiventa Melquisedeque, outrora o sábio de Salém, esteve presente invisivelmente em Urântia por um período de cem anos, atuando como governador-geral residente do planeta; e se o sistema atual de direção dos assuntos planetários continuar, ele deverá retornar em pouco mais de mil anos e retomar a mesma função.

93:10:11 10261 Tal é a história de Maquiventa Melquisedeque, um dos personagens mais singulares de todos os que já estiveram ligados à história de Urântia, e uma personalidade que pode estar destinada a desempenhar um importante papel na experiência futura do vosso irregular e inusitado mundo.

93:10:12 10262 [Apresentado por um Melquisedeque de Nebadon.]

DOCUMENTO 94

OS ENSINAMENTOS DE MELQUISEDEQUE NO ORIENTE
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Os primeiros instrutores da religião de Salém penetraram até as tribos mais remotas da África e da Eurásia, pregando sempre o evangelho de Maquiventa, da fé e da confiança que deve o homem ter em um Deus universal, como o único preço para obter o favor divino. A aliança de Melquisedeque com Abraão foi o modelo para toda a propaganda inicial que saiu de Salém e de outros centros. Urântia nunca teve missionários mais entusiasmados e motivados de qualquer religião do que esses homens e mulheres nobres que levaram os ensinamentos de Melquisedeque por todo o Hemisfério Oriental. Esses missionários foram recrutados em meio a muitos povos e raças, e espalharam amplamente os seus ensinamentos por meio dos nativos convertidos. Eles estabeleceram centros de aperfeiçoamento em partes diferentes do mundo, onde ensinavam aos nativos a religião de Salém e, então, encarregavam esses alunos de funcionarem como instrutores entre os do seu próprio povo.

1. OS ENSINAMENTOS DE SALÉM NA ÍNDIA VÉDICA


94:1:1 10272 Nos dias de Melquisedeque, a Índia era um país cosmopolita, que recentemente havia caído sob o domínio político e religioso dos invasores arianos-anditas do norte e do oeste. Nessa época, apenas as partes setentrionais e ocidentais da península estavam permeadas, em larga escala, pelos arianos. Esses recém-chegados vedas haviam trazido consigo as suas muitas deidades tribais. As suas formas religiosas de adoração seguiam de perto as práticas cerimoniais dos seus antigos ancestrais anditas, em que o pai ainda funcionava como um sacerdote, e a mãe como uma sacerdotisa, e a lareira da família ainda era utilizada como um altar.

94:1:2 10273 O culto védico estava, então, em processo de crescimento e de metamorfose, sob a direção da casta brâmane de sacerdotes-educadores, que estava assumindo gradativamente o controle do ritual da adoração, o qual estava em expansão. A fusão das trinta e três deidades arianas do passado estava já bem a caminho quando os missionários de Salém penetraram no norte da Índia.

94:1:3 10274 O politeísmo desses arianos representava uma degeneração do seu monoteísmo anterior, ocasionada pela sua separação em unidades tribais, cada tribo tendo o seu deus venerado. Essa degenerescência do monoteísmo e do trinitarismo, originais da Mesopotâmia andita, estava em processo de ressintetização, nos primeiros séculos do segundo milênio antes de Cristo. Os vários deuses estavam organizados em um panteão, sob a liderança trina de Dyaus pitar, o senhor dos céus; Indra, o tempestuoso senhor da atmosfera; e Agni, o deus tricéfalo do fogo, o senhor da Terra e o vestígio simbólico de um antigo conceito da Trindade.

94:1:4 10275 Desenvolvimentos claramente henoteístas estavam preparando o caminho para um monoteísmo evoluído. Agni, a deidade mais antiga, era sempre exaltada como o pai-chefe do panteão inteiro. O princípio da deidade-pai, algumas vezes chamada de Prajapati e, algumas vezes, de Brama, esteve submerso na batalha teológica que os sacerdotes brâmanes mais tarde travaram com os instrutores de Salém. O Braman era concebido como o princípio de divindade-energética que ativava todo o panteão védico.

94:1:5 10281 Os missionários de Salém pregaram o Deus único de Melquisedeque, o Altíssimo dos céus. Essa descrição não era de todo desarmônica com o conceito emergente do Pai-Brama como a fonte de todos os deuses, mas a doutrina de Salém era não ritualista e, pois, ia diretamente contra os dogmas, as tradições, e os ensinamentos do sacerdócio bramanista. Nunca os sacerdotes brâmanes aceitariam a pregação de Salém, de uma salvação por meio da fé, do favorecimento de Deus independentemente das observâncias ritualísticas e dos cerimoniais com sacrifícios.

94:1:6 10282 A rejeição do evangelho de Melquisedeque, de confiança em Deus e de salvação por meio da fé, foi um marco vital de mudança para a Índia. Os missionários de Salém muito haviam contribuído para a perda da fé em todos os deuses vedas antigos, mas os líderes, os sacerdotes do vedismo, recusaram-se a aceitar o ensinamento de Melquisedeque de um Deus e de uma fé simples e única.

94:1:7 10283 Os brâmanes colecionaram os escritos sagrados daqueles dias em um esforço para combater os instrutores de Salém, e essa compilação, mais tarde revisada, chegou até os tempos modernos como o Rig-Veda, um dos mais antigos livros sagrados. Os segundos, os terceiros e os quartos Vedas vieram à medida que os brâmanes buscavam cristalizar, formalizar e impor os seus rituais de adoração e sacrifício aos povos daqueles dias. Pelo que têm de melhor, esses escritos são equivalentes a qualquer outro conjunto de caráter similar, em beleza de conceito e verdade de discernimento. Contudo, como essa religião superior tornou-se contaminada pelos milhares e milhares de superstições, de cultos e rituais da parte sulina da Índia, progressivamente, ela metamorfoseou-se no sistema mais variado de teologia já desenvolvido pelo homem mortal. Um estudo dos Vedas fará com que se descubram alguns conceitos da Deidade, entre os mais elevados, e, outros, entre os mais baixos a serem jamais concebidos.

2. O BRAMANISMO


94:2:1 10284 À medida que os missionários de Salém penetraram na direção sul, rumo ao Decã dravidiano, eles encontraram um sistema mais intenso de castas, o esquema ariano de impedir a perda de identidade racial em face de uma maré crescente de povos sangiques secundários. Desde que a casta dos sacerdotes brâmanes era a essência mesma desse sistema, essa ordem social retardou, em muito, o progresso dos educadores de Salém. Esse sistema de castas não teve êxito em salvar a raça ariana, mas teve sucesso na perpetuação dos brâmanes, que, por sua vez, têm mantido a sua hegemonia religiosa na Índia até os dias atuais.

94:2:2 10285 E agora, com o enfraquecimento do vedismo pela sua rejeição da verdade mais elevada, o culto dos arianos tornou-se sujeito a intromissões cada vez maiores do Decã. Num esforço desesperado para estancar o fluxo da extinção racial e da obliteração religiosa, a casta brâmane buscou exaltar a si própria acima de tudo o mais. Os brâmanes ensinaram que o sacrifício à deidade, em si mesmo, era tão plenamente eficaz, que conseguia dela tudo com a sua força. E proclamaram que, dos dois princípios divinos essenciais do universo, um era Braman, a deidade, e o outro era o sacerdócio brâmane. Em meio a nenhum outro povo de Urântia, os sacerdotes presumiram exaltar a si próprios acima mesmo dos seus deuses, a atribuir a si próprios as honras devidas aos seus deuses. Eles, porém, foram tão absurdamente longe, nessas presunçosas reivindicações, que todo o precário sistema entrou em colapso diante dos cultos aviltantes que afluíram das civilizações circundantes, menos avançadas. O vasto sacerdócio védico, ele próprio, atrapalhou-se e afundou sob a maré negra da inércia e do pessimismo que a sua própria presunção egoísta e pouco sábia havia trazido a toda a Índia.

94:2:3 10291 A concentração indevida no ego conduziu certamente a um temor da perpetuação não evolucionária do ego, em um círculo sem fim de sucessivas encarnações como homem, besta, ou ervas daninhas. E de todas as crenças contaminadoras que poderiam ter aderido àquilo que possa ter sido um monoteísmo emergente, nenhuma foi mais estupidificante do que a crença na transmigração – a doutrina da reencarnação das almas –, que veio do Decã dravidiano. Essa crença, em um círculo fastidioso e monótono de repetidas transmigrações, roubou dos mortais em luta a sua esperança havia muito acalentada de encontrar a libertação e o avanço espiritual na morte, que havia sido uma parte da fé anterior védica.

94:2:4 10292 Esse ensinamento filosoficamente debilitador foi logo seguido da invenção da doutrina segundo a qual se escapa eternamente do eu pela submersão no repouso e na paz universal da união absoluta com Braman, a superalma de toda a criação. O desejo mortal e a ambição humana foram efetivamente arrebatados e virtualmente destruídos. Por mais de dois mil anos, as melhores mentes da Índia procuraram escapar de todo desejo e, assim, a porta ficou toda aberta para a entrada daqueles cultos e ensinamentos posteriores que agrilhoaram virtualmente as almas de muitos povos indianos nas correntes da desesperança espiritual. De todas as civilizações, a védico-ariana foi a que pagou o preço mais terrível pela sua rejeição ao evangelho de Salém.

94:2:5 10293 Apenas a organização em castas não poderia perpetuar o sistema religioso-cultural ariano e, enquanto as religiões inferiores do Decã infiltravam-se ao norte, desenvolveu-se uma idade de desespero e falta de esperança. Foi durante esses dias escuros que surgiu o culto de não se tirar a vida de nenhuma criatura, o qual tem perdurado desde então. Muitos dos novos cultos eram francamente ateístas, argumentando que a salvação que fosse acessível poderia vir apenas pelos esforços humanos, sem ajuda externa. Contudo, por meio de boa parte dessa filosofia infeliz podem ser percebidos alguns remanescentes distorcidos dos ensinamentos de Melquisedeque, e mesmo dos de Adão.

94:2:6 10294 Esses foram os tempos da compilação das últimas escrituras da fé indiana, as Brâmanas e os Upanishades. Havendo rejeitado os ensinamentos da religião pessoal pela experiência da fé pessoal com o único Deus, e tendo-se contaminado na inundação dos cultos e crendices aviltantes e debilitadores provenientes do Decã, com os seus antropomorfismos e reencarnações, o sacerdócio brâmane experimentou uma reação violenta contra essas crenças viciantes; houve um esforço claro de buscar e de encontrar a verdadeira realidade. Os brâmanes puseram-se a desantropomorfizar o conceito hindu da deidade, mas, ao fazer isso, eles tropeçaram no grave erro de despersonalizar o conceito de Deus, e emergiram, não com um ideal sublime e espiritual do Pai do Paraíso, mas com uma idéia distante e metafísica de um Absoluto que a tudo engloba.

94:2:7 10295 Nos seus esforços de autopreservação, os brâmanes haviam rejeitado o único Deus de Melquisedeque, e agora se viam diante da hipótese de Braman, aquele eu filosófico indefinido e ilusório, aquele isso impessoal e impotente que deixou a vida espiritual da Índia desamparada e prostrada desde aqueles dias infelizes até o século vinte.

94:2:8 10296 Foi durante os tempos em que os Upanishades estavam sendo escritos que o budismo surgiu na Índia. Apesar, porém, do seu êxito de mil anos, não pôde concorrer com o hinduísmo que viria depois; apesar da sua moralidade mais elevada, a descrição inicial que fazia de Deus era ainda mais indefinida do que a do hinduísmo, que providenciou deidades menores e pessoais. O budismo, finalmente, foi afastado, no norte da Índia, pelos ataques de um Islã militante, com o seu conceito claro de Alá como o Deus supremo do universo.

3. A FILOSOFIA BRAMANISTA


94:3:1 10301 Se bem que a fase superior do bramanismo dificilmente haja sido uma religião, foi, na verdade, um dos esforços mais nobres da mente mortal de penetrar nos domínios da filosofia e da metafísica. Tendo partido para a descoberta da realidade final, a mente indiana não parou até que houvesse especulado sobre quase todos os aspectos da teologia, excetuando-se o conceito dual essencial da religião: a existência do Pai Universal de todas as criaturas do universo e o fato da experiência ascendente, no universo, dessas mesmas criaturas que buscam alcançar o Pai eterno, o qual comandou-lhes que fossem perfeitas, como Ele próprio é perfeito.

94:3:2 10302 No conceito de Braman, as mentes daqueles dias captaram verdadeiramente a idéia de algum Absoluto impregnando a tudo, pois elas identificavam esse postulado, simultaneamente, com a energia criativa e com a reação cósmica. Braman era concebido como estando além de qualquer definição, capaz de ser compreendido apenas pela negação sucessiva de todas as qualidades finitas. Era claramente a crença em um ser absoluto e mesmo infinito; mas, em grande parte, esse conceito era desprovido dos atributos de personalidade e, portanto, não era experienciável pelo indivíduo religioso.

94:3:3 10303 Braman-Narayana foi concebido como o Absoluto, O QUE É infinito, a potência primordial criativa do cosmo potencial, o Eu Universal existindo estática e potencialmente durante toda a eternidade. Tivessem os filósofos daqueles dias sido capazes de dar o próximo passo na concepção da deidade, tivessem eles sido capazes de conceber o Braman como associativo e criativo, como uma personalidade abordável pelos seres criados e em evolução, então, talvez, esse ensinamento pudesse haver-se transformado na mais avançada apresentação da Deidade em Urântia, posto que teria abrangido os cinco primeiros níveis da função total da deidade e já que, possivelmente, poderia haver visualizado os dois restantes.

94:3:4 10304 Em certas fases, o conceito da Superalma Universal Única, como totalidade e soma das existências de todas as criaturas, conduziu os filósofos indianos até muito perto da verdade do Ser Supremo, mas essa verdade não lhes valeu de nada, porque eles fracassaram ao desenvolver qualquer abordagem ou método de aproximação pessoal razoável ou racional para alcançar a sua meta teórica monoteísta de Braman-Narayana.

94:3:5 10305 O princípio cármico da continuidade causal chega, novamente, até bem próximo da verdade de que todas as ações no espaço-tempo repercutem em uma síntese na presença da Deidade do Supremo; mas esse postulado nunca deu elementos para que o indivíduo religioso chegasse a um alcance pessoal coordenado da Deidade. Apenas forneceu elementos para que se pensasse que toda a personalidade entrará em um engolfamento último dentro da Supra-alma Universal.

94:3:6 10306 A filosofia do bramanismo também chegou muito perto da compreensão da presença residente dos Ajustadores do Pensamento, mas deixou-se perverter por causa de um conceito falso da verdade. O ensinamento de que a alma é a presença residente de Braman teria preparado o caminho para uma religião avançada, caso esse conceito não houvesse sido completamente viciado pela crença de que não há nenhuma individualidade humana, à parte essa presença do Um universal.

94:3:7 10307 Na doutrina pela qual a alma individual se funde na Superalma, os teólogos da Índia deixaram de prover elementos para a sobrevivência de alguma coisa humana, de algo novo e único, algo nascido da união da vontade do homem com a vontade de Deus. O ensinamento do retorno da alma para Braman é, muito de perto, paralelo à verdade do retorno do Ajustador para o seio do Pai Universal, mas alguma coisa além do Ajustador há que sobrevive, também, e esta é a contraparte moroncial da personalidade mortal. E esse conceito vital esteve ausente de modo fatal na filosofia bramanista.

94:3:8 10311 A filosofia brâmane conseguiu uma boa aproximação de muitos dos fatos do universo e abordou bem inúmeras verdades cósmicas, mas também por muitas vezes foi vítima do erro de deixar de diferenciar entre os vários níveis da realidade, tais como o absoluto, o transcendental e o finito. Deixou de levar em conta que aquilo que pode ser um finito-ilusório, no nível absoluto, pode ser absolutamente real, no nível finito. E também não tomou conhecimento da personalidade essencial do Pai Universal, a quem se pode contatar pessoalmente em todos os níveis, desde o da experiência limitada da criatura evolucionária com Deus, até a experiência ilimitada do Filho Eterno com o Pai do Paraíso.

4. A RELIGIÃO HINDU


94:4:1 10312 Com o passar dos séculos, na Índia, a população retornou, em uma certa medida, aos rituais antigos dos Vedas, do modo como haviam sido modificados pelos ensinamentos dos missionários de Melquisedeque e cristalizados pelo sacerdócio brâmane ulterior. Essa religião, a mais antiga e mais cosmopolita do mundo, passou por novas mudanças em resposta ao budismo e ao jainismo, e devido às influências mais recentes do maometismo e do cristianismo. Todavia, na época em que os ensinamentos de Jesus chegaram, já se haviam tornado ocidentalizados, a ponto de serem uma “religião do homem branco” e, portanto, insólita e estrangeira para a mente indiana.

94:4:2 10313 A teologia hindu, no presente, ilustra quatro níveis descendentes de deidade e de divindade:

94:4:3 10314 1. O Braman, o absoluto, o Um Infinito, o QUE É.

94:4:4 10315 2. A Trimurti, a suprema trindade do hinduísmo. Nessa associação, Brama, o primeiro membro, é concebido como sendo criado por si próprio a partir de Braman – a infinitude. Não estivesse ele em estreita identificação com o Um Infinito panteísta, Brama poderia constituir-se no fundamento para um conceito do Pai Universal. Brama é também identificado com o destino.

94:4:5 10316 A adoração de Shiva e Vishnu, o segundo e terceiro membros, surgiu no primeiro milênio depois de Cristo. Shiva é o senhor da vida e da morte, o deus da fertilidade e o mestre da destruição. Vishnu é extremamente popular, devido à crença de que ele se encarna periodicamente na forma humana. Desse modo, Vishnu torna-se real e vivo na imaginação dos indianos. Shiva e Vishnu são considerados, por alguns, como supremos, acima de todos.

94:4:6 10317 3. As deidades védicas e pós-védicas. Muitos dos antigos deuses dos arianos, tais como Agni, Indra e Soma, persistiram como secundários em relação aos três membros da Trimurti. Numerosos outros deuses têm surgido desde os dias iniciais da Índia védica, e eles também foram incorporados ao panteão hindu.

94:4:7 10318 4. Os semideuses : super-homens, semideuses, heróis, demônios, fantasmas, espíritos maus, duendes, monstros, diabretes e santos de cultos mais recentes.

94:4:8 10319 Embora o hinduísmo não venha tendo êxito em vivificar o povo indiano, tem sido, ao mesmo tempo, uma religião tolerante em geral. A sua grande força repousa no fato de que tem provado ser a mais adaptável e a mais amorfa das religiões a aparecerem em Urântia. É capaz de mudanças quase ilimitadas e possui uma capacidade pouco habitual de ajuste flexível, desde as especulações elevadas e semimonoteístas dos brâmanes intelectuais até o fetichismo flagrante e as práticas de cultos primitivos das classes desprivilegiadas e aviltadas de crentes ignorantes.

94:4:9 10321 O hinduísmo tem sobrevivido porque é essencialmente uma parte integral do tecido social básico da Índia. Não está postado em nenhuma grande hierarquia, para que possa ser perturbado ou destruído; está entrelaçado aos padrões de vida do povo. Tem uma adaptabilidade às condições mutantes que excede a de quaisquer outros cultos, e tem uma atitude tolerante de adoção para com muitas outras religiões; Gautama Buda e mesmo o próprio Cristo foram considerados encarnações de Vishnu.

94:4:10 10322 Hoje, na Índia, há uma grande necessidade da apresentação do evangelho de Jesus – a Paternidade de Deus e a filiação e a conseqüente irmandade de todos os homens, que é realizada pessoalmente na ministração do amor e do serviço social. Na Índia, existe um quadro filosófico, a estrutura do culto está presente; tudo o que se faz necessário é a chama vitalizante do amor dinâmico retratado no evangelho original do Filho do Homem, despojado dos dogmas e doutrinas ocidentais que trouxeram a tendência de fazer da vida auto-outorgada de Michael uma religião de homens brancos.

5. A LUTA PELA VERDADE NA CHINA


94:5:1 10323 Enquanto os missionários de Salém percorriam a Ásia, disseminando a doutrina do Deus Altíssimo e da salvação pela fé, eles absorveram muito da filosofia e do pensamento religioso dos vários países que atravessavam. Contudo, os instrutores encarregados por Melquisedeque e os seus sucessores não falharam na sua missão; eles tiveram penetração entre todos os povos do continente eurasiano; e foi no meio do segundo milênio antes de Cristo que eles chegaram à China. Durante mais de cem anos, os salemitas mantiveram a sua sede em Si Fuch, treinando ali os instrutores chineses que ensinaram em todos os locais de domínio da raça amarela.

94:5:2 10324 Foi em conseqüência direta desse ensinamento que surgiu, na China, a forma inicial de taoísmo, uma religião totalmente diferente da que leva esse nome hoje. O taoísmo inicial ou o proto-taoísmo era um composto dos fatores seguintes:

94:5:3 10325 1. Os ensinamentos remanescentes de Singlangton, que persistiram na concepção de Shang-ti, o Deus dos Céus. Nos tempos de Singlangton, o povo chinês tornou-se virtualmente monoteísta; concentrou a sua adoração na Verdade Única, mais tarde conhecida como o Espírito do Céu, o governante do universo. E a raça amarela nunca se perdeu totalmente dessa concepção inicial da Deidade, se bem que, nos séculos posteriores, muitos deuses e espíritos subordinados hajam se infiltrado sub-repticiamente na sua religião.

94:5:4 10326 2. A religião de Salém, com uma Deidade Altíssima Criadora, que outorgaria o seu favorecimento à humanidade em resposta à fé do homem. Todavia, é também muito verdadeiro que, à época em que os missionários de Melquisedeque haviam penetrado nas terras da raça amarela, a sua mensagem original havia-se distanciado consideravelmente das doutrinas simples de Salém dos dias de Maquiventa.

94:5:5 10327 3. O conceito do Braman-Absoluto dos filósofos indianos, somado aos desejos de escapar de todo o mal. Talvez a maior influência externa para a disseminação da religião de Salém até o leste, haja sido exercida pelos educadores indianos da fé védica, que injetaram a sua concepção do Braman – o Absoluto – no pensamento salvacionista dos salemitas.

94:5:6 10331 Essa crença composta espalhou-se pelas terras da raça amarela e das raças morenas, como uma influência subjacente no pensamento religioso-filosófico. No Japão, esse proto-taoísmo ficou conhecido como xintoísmo e nesse país, muito distante de Salém da Palestina, os povos aprenderam sobre a encarnação de Maquiventa Melquisedeque, que habitou na terra para que a humanidade não se esquecesse de Deus.

94:5:7 10332 Na China, todas essas crenças, mais tarde, foram confundidas e se compuseram com o culto sempre em crescimento da adoração dos ancestrais. Contudo, desde a época de Singlangton, os chineses nunca mais caíram em uma escravidão desamparada aos rituais sacerdotais. A raça amarela foi a primeira a emergir da servidão bárbara e a entrar na civilização da ordem organizada, porque foi a primeira a alcançar, em alguma medida, a liberdade do medo abjeto dos deuses, não temendo nem mesmo os fantasmas dos mortos, como outras raças temeram. A China encontrou a sua derrota, porque ela não teve êxito em progredir para além da sua primeira emancipação dos sacerdotes; e caiu em um erro igualmente calamitoso, a adoração dos ancestrais.

94:5:8 10333 Entretanto, os salemitas não trabalharam em vão. Foi sobre os fundamentos do seu evangelho que os grandes filósofos da China do sexto século elaboraram os seus ensinamentos. A atmosfera moral e os sentimentos espirituais dos tempos de Lao-Tsé e de Confúcio vieram a partir dos ensinamentos dos missionários de Salém de uma idade anterior.

6. LAO-TSÉ E CONFÚCIO


94:6:1 10334 Cerca de seiscentos anos antes da chegada de Michael, Melquisedeque, que há muito já havia partido da vida na carne, teve a impressão de que a pureza do seu ensinamento na Terra estava sendo perigosamente ameaçada pela absorção geral nas crenças antigas de Urântia. Pareceu, por um tempo, que a sua missão como precursor de Michael poderia estar em perigo de falhar. E, no sexto século antes de Cristo, por intermédio de uma coordenação excepcional de agentes espirituais, dos quais nem todos são compreendidos mesmo pelos supervisores planetários, Urântia presenciou uma apresentação muito inusitada de verdades religiosas sob formas múltiplas. Por meio da atuação de vários educadores humanos, o evangelho de Salém foi reafirmado e revitalizado e, como foi então apresentado, grande parte sobreviveu até os tempos destes documentos atuais.

94:6:2 10335 Esse século singular de progresso espiritual foi caracterizado por grandes educadores religiosos, morais e filosóficos em todo o mundo civilizado. Na China, os dois instrutores de maior destaque foram Lao-Tsé e Confúcio.

94:6:3 10336 Lao-Tsé edificou o seu pensamento diretamente sobre os conceitos das tradições de Salém, quando declarou que o Tao era a Causa Primeira Una de toda a criação. Lao era um homem de grande visão espiritual. Ele ensinou que “o destino eterno do homem era a união perpétua com o Tao, o Deus Supremo e Rei Universal”. A sua compreensão da causação última foi muito profunda, pois escreveu: “A Unidade surge do Tao Absoluto, e da Unidade surge a Dualidade cósmica e, dessa Dualidade, a Trindade vem à existência, e a Trindade é a fonte primordial de toda a realidade”. “Toda a realidade equilibra-se sempre entre os potenciais e os factuais do cosmo, e estes estão eternamente harmonizados pelo espírito da divindade. ”

94:6:4 10337 Lao-Tsé também foi um dos primeiros a apresentar a doutrina do fazer o bem em retribuição ao mal: “A bondade engendra a bondade, mas, para aquele que é verdadeiramente bom, o mal também gera a bondade”.

94:6:5 10338 Ele ensinou que a criatura retorna ao Criador e descreveu a vida como a emergência de uma personalidade a partir dos potenciais cósmicos, enquanto a morte equivalia ao retorno para o lar da personalidade dessa criatura. O seu conceito da verdadeira fé era incomum, e ele também a comparava à “atitude de uma criancinha”.

94:6:6 10341 A sua compreensão do propósito eterno de Deus era clara, pois ele disse: “A Deidade Absoluta não se esforça em lutas, contudo, é sempre vitoriosa; não força a humanidade, mas permanece sempre pronta para responder aos seus desejos verdadeiros; a vontade de Deus é eterna em paciência e perene na inevitabilidade da sua expressão”. E, sobre o verdadeiro religioso, ele disse, expressando a verdade de que dar é mais abençoado do que receber: “O homem bom procura não reter a verdade para si próprio, antes, ele intenta passar essas riquezas aos seus semelhantes, pois isso é a realização da verdade. A vontade do Deus Absoluto sempre beneficia, nunca destrói; o propósito do verdadeiro crente é sempre agir, e nunca coagir”.

94:6:7 10342 Lao ensinou a não-resistência; e a distinção que fez entre a ação e a coerção mais tarde perverteu-se nas crenças que defendem “nada ver, nada fazer e nada pensar”. Lao, porém, nunca ensinou esse erro, embora a sua apresentação da não-resistência haja sido um fator para o desenvolvimento posterior das predileções pacíficas dos povos chineses.

94:6:8 10343 Contudo, o popular taoísmo do século vinte, em Urântia, pouco tem em comum com os sentimentos sublimes e os conceitos cósmicos do antigo filósofo, que ensinou a verdade como ele a percebia, e que era: a fé no Deus Absoluto é a fonte da energia divina que irá reconstruir o mundo, e com a qual o homem ascende até a união espiritual com o Tao, a Deidade Eterna e o Criador Absoluto dos universos.

94:6:9 10344 Confúcio (Kung Fu-tze) foi um contemporâneo mais jovem de Lao, na China do sexto século. Confúcio baseou as suas doutrinas nas melhores tradições morais da longa história da raça amarela e foi influenciado também, de um certo modo, pelo remanescente das tradições dos missionários de Salém. O seu trabalho principal consistiu na compilação do que diziam sabiamente os antigos filósofos. Ele foi um instrutor rejeitado durante o tempo em que viveu, mas os seus ensinamentos e escritos, desde então, exerceram uma grande influência na China e no Japão. Confúcio estabeleceu uma nova atitude para os xamãs, quando ele colocou a moralidade no lugar da magia. Todavia, ele construiu demasiado bem; fez da ordem um novo fetiche e instituiu um respeito pela conduta ancestral, que era ainda venerada pelos chineses na época em que estes documentos estavam sendo escritos.

94:6:10 10345 Confúcio pregava sobre a moralidade, baseado na teoria de que o caminho terrestre era a sombra distorcida do caminho celeste; de que o modelo verdadeiro da civilização temporal é a imagem refletida da ordem celeste eterna. O conceito potencial de Deus, no confucionismo, era quase completamente subordinado à ênfase colocada no Caminho Celeste, o arquétipo do cosmo.

94:6:11 10346 Os ensinamentos de Lao foram perdidos por todos, exceto por uns poucos no Oriente, mas os escritos de Confúcio têm-se constituído sempre, desde então, na base do contexto moral da cultura de quase uma terça parte dos urantianos. Esses preceitos de Confúcio, que perpetuam o melhor do passado, foram, de algum modo, inimigos da própria natureza chinesa de indagação mental, que havia já realizado tantos e tão venerados feitos. A influência dessas doutrinas foi combatida sem êxito, tanto pelos esforços imperiais de Chin Shih Huang Ti, quanto pelos ensinamentos de Mo Ti, que proclamaram uma irmandade fundada não no dever ético, mas no amor de Deus. Ele procurou reestimular a antiga busca pela nova verdade, mas os seus ensinamentos fracassaram diante da oposição vigorosa dos discípulos de Confúcio.

94:6:12 10347 Como muitos outros instrutores morais e espirituais, tanto Confúcio quanto Lao-Tsé foram finalmente deificados pelos seus seguidores, naquelas épocas de trevas espirituais na China, as quais ocorreram entre o declínio e o desvirtuamento da fé taoísta e a vinda dos missionários budistas da Índia. Durante esses séculos, espiritualmente decadentes, a religião da raça amarela degenerou-se em uma teologia lamentável, em que formigavam diabos, dragões e espíritos malignos, todos denotando o retorno dos temores da mente mortal não iluminada. E a China, que estivera à frente da sociedade humana por causa de uma religião avançada, caiu então para a retaguarda, por causa de uma incapacidade temporária de progredir no caminho verdadeiro do desenvolvimento daquela consciência de Deus, indispensável ao verdadeiro progresso, não apenas do indivíduo mortal, mas também das civilizações intrincadas e complexas, típicas do avanço da cultura e da sociedade em um planeta evolucionário do tempo e do espaço.

7. GAUTAMA SIDARTA


94:7:1 10351 Outro grande instrutor da verdade surgiu na Índia, contemporâneo de Lao-Tsé e de Confúcio na China. Gautama Sidarta nasceu no sexto século antes de Cristo, na província do Nepal, no norte da Índia. Os seus seguidores, mais tarde, fizeram transparecer que ele era o filho de um governante fabulosamente rico, mas, na verdade, ele era o aparente herdeiro ao trono do chefe de uma pequena tribo e que, por tolerância desta, governava um pequeno e recluso vale nas montanhas ao sul do Himalaia.

94:7:2 10352 Gautama, depois de seis anos de práticas inúteis de ioga, formulou aquelas teorias que se transformaram na filosofia do budismo. Sidarta travou uma luta determinada, mas infrutífera, contra o sistema de castas que crescia. Havia uma sinceridade sublime e uma singular ausência de egoísmo nesse jovem príncipe profeta, que foi de grande apelo para os homens daqueles dias. Ele refreou a prática da busca individual da salvação por meio das aflições físicas e da dor pessoal. E exortou os seus seguidores a levar o seu evangelho a todo o mundo.

94:7:3 10353 Em meio à confusão e às práticas extremas, nos cultos da Índia, os ensinamentos mais sadios e moderados de Gautama vieram como um bálsamo de alívio. Ele denunciou deuses, sacerdotes e os seus sacrifícios, mas também ele não percebeu a personalidade do Um Universal. Não acreditando na existência de almas individuais humanas, Gautama travou, por isso, uma luta valente contra a crença, tradicionalmente honrada, na transmigração da alma. Fez um esforço nobre para libertar os homens do medo, para fazê-los sentirem-se com segurança e conforto e em casa, no grande universo, mas, novamente, ele não conseguiu mostrar-lhes o caminho daquele lar real e superno dos mortais ascendentes – o Paraíso – e do serviço crescente a ser feito na existência eterna.

94:7:4 10354 Gautama foi um verdadeiro profeta e, houvesse ele dado atenção às instruções do eremita Godad, teria podido elevar toda a Índia pela inspiração do renascimento do evangelho de Salém de salvação pela fé. Godad descendia de uma família que nunca havia perdido de vista as tradições dos missionários de Melquisedeque.

94:7:5 10355 Gautama fundou a sua escola em Benares e, durante o seu segundo ano, um aluno, Bautan, transmitiu ao seu mestre as tradições dos missionários de Salém, sobre a aliança de Melquisedeque com Abraão; e, se bem que Sidarta não tivesse tido um conceito muito claro sobre o Pai Universal, ele adotou uma posição avançada sobre a salvação por meio da fé – a simples crença. Ele assumiu-a perante os seus seguidores e começou a enviar os seus alunos, em grupos de sessenta, para proclamar ao povo da Índia “as boas-novas da salvação livre; e de que todos os homens, humildes ou elevados, podem alcançar a bênção por meio da fé na retidão e na justiça”.

94:7:6 10356 A esposa de Gautama acreditava no evangelho do seu marido e foi a fundadora de uma ordem de freiras. O seu filho tornou-se o seu sucessor e difundiu em muito o culto; ele captou a nova idéia da salvação por meio da fé, mas, nos seus últimos anos, ele hesitou com respeito ao evangelho de Salém, de que o favor divino vem por meio da fé em si, e, na velhice, as suas palavras, ao morrer, foram: “Sede vós próprios os artesãos da vossa salvação”.

94:7:7 10361 O evangelho de Gautama, para a salvação universal, quando proclamado pelo que tem de melhor, livre de sacrifícios, de tortura, de rituais e de sacerdotes, foi uma doutrina revolucionária e surpreendente para o seu tempo. E chegou incrivelmente próximo de representar um renascimento do evangelho de Salém. Socorreu a milhões de almas em desespero e, apesar das alterações grotescas que sofreu nos últimos séculos, ainda persiste como a esperança de milhões de seres humanos.

94:7:8 10362 Sidarta ensinou muito mais sobre a verdade do que aquilo que sobreviveu nos cultos modernos que levam o seu nome. O budismo moderno não representa os ensinamentos de Gautama Sidarta mais do que o cristianismo representa os ensinamentos de Jesus de Nazaré.

8. A FÉ BUDISTA


94:8:1 10363 Para tornar-se um budista, fazia-se apenas uma profissão pública de fé recitando o Refúgio: “Refugio-me no Buda; tenho o meu refúgio na Doutrina; tomo o meu refúgio na Fraternidade”.

94:8:2 10364 O budismo teve a sua origem em uma pessoa histórica, não em um mito. Os seguidores de Gautama chamavam-no de Sasta, significando mestre ou professor. Ainda que ele não tivesse pretensões supra-humanas, fosse para si próprio, fosse para os seus ensinamentos, os seus discípulos começaram logo a chamá-lo de o iluminado, o Buda; e, mais tarde, de Sakyamuni Buda.

94:8:3 10365 O evangelho original de Gautama baseava-se nas quatro grandes verdades nobres:

10366 1. As nobres verdades do sofrimento.

10367 2. As origens do sofrimento.

10368 3. A destruição do sofrimento.

10369 4. O caminho da destruição do sofrimento.

94:8:4 103610 Estreitamente ligada à doutrina sobre o sofrimento, e ao modo de escapar dele, estava a filosofia da Senda Óctupla: as visões certas, as aspirações justas, as palavras, as condutas, as vivências, o esforço, o raciocínio e a contemplação certos. A intenção de Gautama não foi tentar destruir todo o esforço, o desejo e o afeto para escapar do sofrimento; o seu ensinamento era mais destinado a traçar, para o homem mortal, um quadro da futilidade que é colocar todas as esperanças e aspirações inteiramente em metas temporais e em objetivos materiais. Não se tratava tanto de evitar o amor do semelhante, mas de que o verdadeiro crente devesse também ver as realidades, para além das ligações desse mundo material, no futuro eterno.

94:8:5 103611 Os mandamentos morais da pregação de Gautama foram cinco:

94:8:6 103612 1. Não matarás.

94:8:7 103613 2. Não roubarás.

94:8:8 103614 3. Não quebrarás a castidade.

94:8:9 103615 4. Não mentirás.

94:8:10 103616 5. Não tomarás bebidas intoxicantes.

94:8:11 103617 Havia vários mandamentos adicionais ou secundários, cuja observância era opcional para os crentes.

94:8:12 103618 Sidarta não acreditava na imortalidade da personalidade humana; a sua filosofia apenas indicava uma espécie de continuidade funcional. Ele nunca definiu claramente o que ele iria incluir na doutrina do Nirvana. O fato de que o Nirvana poderia teoricamente ser experienciado durante a existência mortal indicaria que não era visto como um estado de aniquilação completa. Implicava uma condição de iluminação suprema e de bem-aventurança superna, em que todas as correntes que prendem o homem ao mundo material teriam sido rompidas; havia a libertação dos desejos da vida mortal e a libertação de qualquer ameaça de jamais voltar a experienciar a encarnação.

94:8:13 10371 Segundo os ensinamentos originais de Gautama, a salvação é alcançada pelo esforço humano, independentemente da ajuda divina; não há lugar para a fé salvadora nem para as preces aos poderes supra-humanos. Na sua tentativa de minimizar as superstições na Índia, Gautama tratou de afastar os homens dos apelos espalhafatosos de uma salvação mágica. E, ao fazer esse esforço, ele deixou bem aberta a porta para que os seus sucessores interpretassem mal os seus ensinamentos e proclamassem que todos os esforços humanos para se obter o êxito são desagradáveis e dolorosos. Os seus seguidores negligenciaram o fato de que a mais alta felicidade está ligada à busca inteligente e entusiasta de metas dignas, e que essas realizações constituem um verdadeiro progresso na auto-realização cósmica.

94:8:14 10372 A grande verdade do ensinamento de Sidarta foi a sua proclamação de um universo de justiça absoluta. Ele ensinou a melhor filosofia, sem Deus, jamais antes inventada pelo homem mortal, ensinou o humanismo ideal que, de um modo eficaz, arrancou toda a base das superstições, dos rituais de magia e do medo de fantasmas e demônios.

94:8:15 10373 A grande fragilidade do evangelho original do budismo foi não ter produzido uma religião de serviço social sem egoísmo. Durante um longo tempo, a fraternidade budista não foi uma irmandade de crentes, mas uma comunidade de estudantes-mestres. Gautama proibiu-os de receberem dinheiro e buscou, com isso, impedir o crescimento de tendências hierárquicas. Gautama foi, ele próprio, altamente social; de fato, a sua vida foi muito maior do que a sua pregação.

9. A DIFUSÃO DO BUDISMO


94:9:1 10374 O budismo prosperou porque ofereceu a salvação por meio da crença em Buda, o iluminado. Foi mais representativo das verdades de Melquisedeque do que qualquer outro sistema religioso praticado na Ásia Oriental. Contudo, o budismo não se tornou difundido, mesmo, como uma religião, antes que um monarca de casta baixa, Asoka, o houvesse adotado como autoproteção; depois de Iknaton, no Egito, Asoka foi um dos mais notáveis governantes civis da época entre Melquisedeque e a vinda de Michael. Asoka construiu um grande império indiano, graças à propaganda dos seus missionários budistas. Durante um período de vinte e cinco anos, ele treinou e enviou mais de dezessete mil missionários às fronteiras mais distantes de todo o mundo conhecido. Durante o período de uma geração, ele fez do budismo a religião dominante em metade do mundo. Logo estava estabelecido no Tibete, em Kashmir, no Ceilão, na Birmânia, em Java, na Tailândia, na Coréia, na China e no Japão. E, de modo geral, era uma religião muito superior àquelas as quais suplantou ou melhorou.

94:9:2 10375 A difusão do budismo, do seu lar na Índia até toda a Ásia, é uma das histórias mais palpitantes de devoção espiritual e de persistência missionária de religiosos sinceros. Aqueles que ensinavam o evangelho de Gautama, não apenas desbravaram os perigos dos caminhos terrestres das caravanas, como enfrentaram os perigos dos mares da China, ao prosseguirem na sua missão no continente asiático, trazendo a todos os povos a mensagem da sua fé. Mas esse budismo não era mais a doutrina simples de Gautama; era o evangelho tornado miraculoso que fez dele um deus. E, quanto mais o budismo distanciava-se do seu berço, nas terras altas da Índia, mais diferente dos ensinamentos de Gautama ele ficava e, cada vez mais, assemelhava-se às religiões que suplantava.

94:9:3 10381 O budismo, mais tarde, foi muito afetado pelo taoísmo, na China, pelo xintoísmo, no Japão, e pelo cristianismo, no Tibete. Após mil anos, o budismo, na Índia, simplesmente definhou e expirou. Tornou-se bramanizado e rendeu-se de modo abjeto ao Islã, enquanto, em grande parte do resto do Oriente, ele degenerou em um ritual que Gautama Sidarta jamais reconheceria.

94:9:4 10382 No sul, o estereótipo fundamentalista dos ensinamentos de Sidarta continuou no Ceilão, na Birmânia e na pensínsula da Indochina. Essa é a divisão Hinayana do budismo, que se atém mais à doutrina inicial ou associal.

94:9:5 10383 Contudo, mesmo antes do seu colapso na Índia, os grupos chineses e norte-indianos de seguidores de Gautama haviam começado o desenvolvimento do ensinamento Mahayana do “Grande Caminho” da salvação, em contraste com os puristas do sul, que se mantiveram no Hinayana, ou no “Caminho Menor”. E esses mahayanistas desprenderam-se das limitações sociais inerentes à doutrina budista, e, desde então, essa divisão do budismo do norte continuou a evoluir na China e no Japão.

94:9:6 10384 O budismo é uma religião viva e em crescimento hoje, porque tem êxito em conservar muitos dos valores morais mais elevados dos que aderiram a ela. Proporciona calma e autocontrole, aumenta a serenidade e a felicidade e faz muito para impedir a tristeza e a aflição. Aqueles que acreditam nessa filosofia vivem vidas melhores do que muitos que não crêem nela.

10. A RELIGIÃO NO TIBETE


94:10:1 10385 No Tibete, pode ser encontrada a mais estranha associação de ensinamentos de Melquisedeque, combinados com o budismo, o hinduísmo, o taoísmo e o cristianismo. Quando os missionários budistas entraram no Tibete, eles encontraram um estado de selvageria primitiva muito similar àquele que os primeiros missionários cristãos encontraram nas tribos nórdicas da Europa.

94:10:2 10386 Esses tibetanos de mente simples não queriam abandonar completamente a sua antiga magia e os seus encantos. Um estudo dos cerimoniais religiosos dos rituais tibetanos atuais revela a existência de uma irmandade exageradamente numerosa de sacerdotes com cabeças raspadas, que praticam um ritual elaborado, que abrange sinos, cantos, incenso, procissões, rosários, imagens, encantamentos, figuras, água benta, vestes vistosas e coros elaborados. Eles têm dogmas rígidos e credos cristalizados, rituais místicos e jejuns especiais. A sua hierarquia abrange monges, freiras, abades e o Grande Lama. Eles rezam para os anjos, os santos, uma Mãe Sagrada e para os deuses. Praticam a confissão e acreditam no purgatório. Os seus monastérios são extensos e as suas catedrais, magníficas. Eles mantêm uma repetição sem fim de rituais sagrados e acreditam que essas cerimônias conferem a salvação. As suas preces são amarradas a uma roda que, quando gira, todos acreditam que os seus pedidos tornam-se eficazes. Junto a nenhum outro povo dos tempos modernos pode ser encontrada a observância de tantas coisas, de tantas religiões; e é inevitável que uma liturgia de um tal modo cumulativa se torne exageradamente embaraçosa e intoleravelmente pesada.

94:10:3 10387 Os tibetanos têm algo de todas as religiões principais do mundo, exceto os ensinamentos simples do evangelho de Jesus: a filiação a Deus, e a irmandade dos homens, e a cidadania sempre ascendente no universo eterno.

11. A FILOSOFIA BUDISTA


94:11:1 10388 O budismo entrou na China no primeiro milênio depois de Cristo, e adaptou-se bem aos costumes religiosos da raça amarela. Nos seus cultos aos ancestrais, os chineses há muito faziam preces de pedidos aos mortos; agora podiam também orar para o bem deles. O budismo logo se fundiu com as práticas rituais que eram remanescentes do taoísmo em desintegração. Essa nova religião sintética, com os seus templos de adoração e cerimoniais religiosos definidos, logo se tornou o culto em geral aceito dos povos da China, da Coréia e do Japão.

94:11:2 10391 Ainda que seja um infortúnio, sob alguns pontos de vista, que o budismo haja sido levado ao mundo só depois que os seguidores de Gautama tenham pervertido as tradições e os ensinamentos do culto, a ponto de fazer dele um ser divino, no entanto, o mito da sua vida humana, embelezado como foi por uma multidão de milagres, revelou-se muito sedutor para os ouvintes do evangelho do budismo do norte, ou Mahayana.

94:11:3 10392 Alguns dos seus seguidores ulteriores ensinaram que o espírito do Buda Sakyamuni retornava periodicamente à terra, como um Buda vivo, abrindo, assim, o caminho para uma perpetuação indefinida de imagens do Buda, de templos, rituais e “Budas vivos” impostores. Assim, a religião do grande protestador indiano finalmente acabou, ela própria, algemada com aquelas mesmas práticas cerimoniais e encantamentos ritualísticos contra os quais ele havia lutado tão destemidamente e que havia denunciado tão valentemente.

94:11:4 10393 O grande avanço feito pela filosofia budista consistiu na compreensão que teve da relatividade de toda a verdade. Por meio do mecanismo dessa hipótese, os budistas têm estado habilitados para reconciliar e correlacionar as divergências dentro das suas próprias escrituras religiosas, bem como as diferenças entre estas e muitas outras. Assim é que se ensinava que a pequena verdade era para as mentes pequenas, e a verdade grande, para as grandes mentes.

94:11:5 10394 Essa filosofia também sustentava que a natureza do Buda (divina) residia em todos os homens; que o homem, por meio dos próprios esforços, poderia alcançar a realização da sua divindade interior. E esse ensinamento é uma das apresentações mais claras da verdade dos Ajustadores residentes jamais feita por uma religião de Urântia.

94:11:6 10395 Todavia, uma grande limitação no evangelho original de Sidarta, tal como ele foi interpretado pelos seus seguidores, foi que ele intentava a liberação completa do eu humano de todas as limitações da natureza mortal, pela técnica de isolar o eu da realidade objetiva. A verdadeira auto-realização cósmica resulta da identificação com a realidade cósmica e com o cosmo finito da energia, da mente e do espírito, limitado pelo espaço e condicionado pelo tempo.

94:11:7 10396 Ainda, porém, que as cerimônias e observâncias externas do budismo se tenham tornado grosseiramente contaminadas por aquelas das terras para as quais ele viajava, essa degeneração não foi, de todo, o que aconteceu na vida filosófica dos grandes pensadores que, de tempos em tempos, abraçaram esse sistema de pensamento e crença. Durante mais de dois mil anos, muitas das melhores mentes da Ásia concentraram-se no problema de averiguar a verdade absoluta e a verdade do Absoluto.

94:11:8 10397 A evolução de um conceito elevado do Absoluto foi realizada por meio de muitos canais de pensamento e por modos tortuosos de raciocinar. A ascensão dessa doutrina da infinitude não foi definida muito claramente como o foi a evolução do conceito de Deus na teologia hebraica. Entretanto, as mentes budistas alcançaram certos níveis amplos, sobre os quais elas descansaram e pelos quais passaram, em seu caminho de visualização da Fonte Primordial dos universos:

94:11:9 10398 1. A lenda de Gautama. Na base do conceito, estava o fato histórico da vida e dos ensinamentos de Sidarta, o príncipe profeta da Índia. Essa lenda transformou-se em um mito, à medida que viajou pelos séculos e através dos vastos países da Ásia, até que ultrapassou o status da idéia de Gautama como o iluminado, e começou a receber atributos adicionais.

94:11:10 10401 2. Os muitos Budas. O raciocínio era tal que, se Gautama tinha vindo aos povos da Índia, então, no passado remoto e no futuro remoto, as raças da humanidade devem ter sido, e sem dúvida ainda seriam, abençoadas com outros instrutores da verdade. Isso deu origem ao ensinamento de que houve muitos Budas, um número ilimitado e infinito, e mesmo que qualquer um podia aspirar a tornar-se um Buda – a alcançar a divindade de um Buda.

94:11:11 10402 3. O Buda Absoluto. Quando o número de Budas estava se aproximando da infinidade, tornou-se necessário que as mentes daqueles dias reunificassem esse conceito de manipulação difícil. Desse modo, começou a ser ensinado que todos os Budas não eram senão manifestações de alguma essência mais elevada, daquele Um Eterno, de existência infinita e não qualificável, de alguma Fonte Absoluta de toda a realidade. E, daí em diante, o conceito da Deidade do budismo, na sua mais alta forma, tornou-se divorciado da pessoa humana de Gautama Sidarta e rejeitou as limitações antropomórficas nas quais havia estado enclausurado. Essa concepção final do Buda Eterno pode bem ser identificada como sendo o Absoluto, algumas vezes mesmo com o infinito EU SOU.

94:11:12 10403 Embora essa idéia da Deidade Absoluta nunca tenha tido maior aprovação do povo; em meio aos povos da Ásia ,ela capacitou os intelectuais dessas terras a unificar a sua filosofia e a harmonizar a sua cosmologia. O conceito do Buda Absoluto é, às vezes, quase pessoal, às vezes, totalmente impessoal – mesmo uma força criativa infinita. Tais conceitos, se bem que úteis à filosofia, não são vitais para o desenvolvimento da religião. Mesmo um Yavé antropomórfico é de um valor religioso maior do que aquele Absoluto infinitamente longínquo, do budismo ou do bramanismo.

94:11:13 10404 Algumas vezes, acreditou-se mesmo que o Absoluto pudesse estar contido no infinito EU SOU. Todavia, essas especulações não eram senão um conforto gelado para a multidão faminta dos que desejavam escutar palavras de promessa, escutar o evangelho simples de Salém, de que a fé em Deus asseguraria o favor divino e a sobrevivência eterna.

12. O CONCEITO DE DEUS NO BUDISMO


94:12:1 10405 A cosmologia do budismo tinha dois pontos fracos: a sua contaminação pelas muitas superstições da Índia e da China, e a sublimação que fez de Gautama, primeiro, o iluminado, e, depois, o Eterno Buda. Do mesmo modo que o cristianismo sofreu com a absorção de muitas coisas errôneas da filosofia humana, o budismo também traz a sua marca humana. Contudo, os ensinamentos de Gautama continuaram a evoluir durante os últimos dois milênios e meio. O conceito de Buda, para um budista esclarecido, não representa mais a personalidade humana de Gautama do que, para um cristão esclarecido, o conceito de Jeová é idêntico ao espírito demoníaco de Horeb. A pobreza da terminologia, junto com a manutenção sentimental de uma nomenclatura antiga, impede muitas vezes de compreender o verdadeiro significado da evolução dos conceitos religiosos.

94:12:2 10406 Gradualmente, o conceito de Deus, como um contraste do Absoluto, começou a aparecer no budismo. As suas fontes remontam aos primeiros tempos em que os seguidores do Caminho Menor diferenciaram-se dos do Caminho Maior. Foi em meio a essa última divisão do budismo que a concepção dual de Deus e do Absoluto finalmente amadureceu. Passo a passo, século após século, o conceito de Deus evoluiu, com os ensinamentos de Ryonin, Honen Shonin, e Shinran no Japão, até que esse conceito finalmente veio a frutificar na crença de Amida Buda.

94:12:3 10411 Entre esses crentes, é ensinado que a alma, ao experimentar a morte, pode escolher desfrutar de uma estada no Paraíso antes de entrar no Nirvana, o estado último da existência. Proclama-se que essa nova salvação é alcançada pela fé nas misericórdias divinas e por meio do cuidado amoroso de Amida, Deus do Paraíso, no Ocidente. Na sua filosofia, os amidistas atêm-se a uma Realidade Infinita que está além de toda a compreensão finita dos mortais; na sua religião, eles aderem à fé no todo-misericordioso Amida, que ama o mundo a ponto de não suportar que nenhum mortal, que faça um apelo ao seu nome com uma fé sincera e com um coração puro, deixe de obter a felicidade superna do Paraíso.

94:12:4 10412 A grande força do budismo vem do fato de que aqueles que aderem a ele estão livres para escolher a verdade de todas as religiões; essa liberdade de escolha raramente caracterizou qualquer fé urantiana. A seita Shin, do Japão, quanto a isso, tornou-se um dos grupos religiosos mais progressistas no mundo; ela reviveu o antigo espírito missionário dos seguidores de Gautama e começou a enviar instrutores até outros povos. Essa vontade de adotar a verdade de toda e qualquer fonte é, de fato, uma tendência recomendável que surge entre os crentes religiosos durante a primeira metade do século vinte após Cristo.

94:12:5 10413 O próprio budismo está passando por um renascimento no século vinte. Por meio do contato com o cristianismo, os aspectos sociais do budismo foram muito engrandecidos. O desejo de aprender voltou aos corações dos monges da irmandade, e a difusão da educação, nessa comunidade de fé, irá certamente provocar novos avanços na evolução religiosa.

94:12:6 10414 No momento em que este documento foi escrito, uma grande parte da Ásia mantinha as suas esperanças no budismo. Irá essa nobre fé, que tão valentemente perdurou atravessando as idades das trevas no passado, receber, uma vez mais, a verdade das realidades cósmicas expandidas, tal como os discípulos do grande educador da Índia, certa vez, ouviram a sua proclamação da nova verdade? Essa fé antiga, uma vez mais, responderá ao estímulo revigorante da apresentação dos novos conceitos de Deus e do Absoluto, pelos quais procurou por tanto tempo?

94:12:7 10415 Toda a Urântia aguarda a proclamação da mensagem enobrecedora de Michael, livre das doutrinas e dos dogmas acumulados por dezenove séculos de contato com as religiões de origem evolucionária. É chegada a hora de apresentar ao budismo, ao cristianismo, ao hinduísmo, e a todos os povos de todas as fés, não mais um evangelho sobre Jesus, mas a realidade viva e espiritual do evangelho de Jesus.

94:12:8 10416 [Apresentado por um Melquisedeque de Nebadon.]


DOCUMENTO 95

OS ENSINAMENTOS DE MELQUISEDEQUE NO LEVANTE
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Do mesmo modo que a Índia deu origem a muitas religiões e filosofias da Ásia Oriental, também o Levante foi o berço das fés do mundo ocidental. Os missionários de Salém espalharam-se por todo o sudoeste da Ásia, pela Palestina, Mesopotâmia, Egito, Irã e Arábia, proclamando, em toda parte, as boas-novas do evangelho de Maquiventa Melquisedeque. Em algumas dessas terras, os seus ensinamentos deram fruto; em outras, obtiveram êxitos diferentes. Algumas vezes, os seus fracassos foram devidos à falta de sabedoria; outras, a circunstâncias além do seu controle.

1. A RELIGIÃO DE SALÉM NA MESOPOTÂMIA


95:1:1 10422 Por volta de 2 000 a. C. , as religiões da Mesopotâmia estavam quase inteiramente perdidas dos ensinamentos dos setitas e sob uma ampla influência das crenças primitivas de dois grupos de invasores: o dos semitas beduínos, que se haviam infiltrado, vindos do deserto ocidental, e o dos cavaleiros bárbaros, que haviam descido do norte.

95:1:2 10423 Contudo, o costume dos primeiros povos adamitas de honrar o sétimo dia da semana nunca desapareceu completamente na Mesopotâmia. Apenas, durante a era de Melquisedeque, o sétimo dia era considerado o pior para a má sorte; e, sendo dominado pelos tabus, era fora da lei sair em uma viagem, cozinhar ou fazer uma fogueira, nesse funesto sétimo dia. Os judeus levaram para a Palestina muitos dos tabus da Mesopotâmia, que eles haviam encontrado na Babilônia, sobre a observância do sétimo dia, o sábado.

95:1:3 10424 Embora os educadores de Salém hajam feito muito para refinar e para elevar as religiões da Mesopotâmia, eles não tiveram êxito em levar os vários povos ao reconhecimento permanente do Deus único. Esse ensinamento ganhou ascendência por mais de cento e cinqüenta anos, e então, gradualmente, cedeu lugar à crença mais antiga em uma multiplicidade de deidades.

95:1:4 10425 Os educadores de Salém reduziram, em muito, o número de deuses da Mesopotâmia, reduzindo, ao mesmo tempo, as deidades principais a sete: Bel, Shamash, Nabu, Anu, Ea, Marduk e Sin. No auge do novo ensinamento, eles haviam exaltado três desses deuses em supremacia sobre todos os outros, a tríade da Babilônia: Bel, Ea, e Anu, deuses da terra, do mar e do céu. Outras tríades ainda surgiram em localidades diferentes, todas remanescentes dos ensinamentos dos anditas e dos sumérios sobre a trindade e baseadas na crença dos salemitas na insígnia dos três círculos de Melquisedeque.

95:1:5 10426 Os educadores de Salém nunca superaram totalmente a popularidade de Ishtar, a mãe dos deuses e o espírito da fertilidade sexual. Muito fizeram para refinar a adoração dessa deusa, mas os babilônios e os seus vizinhos nunca haviam abandonado completamente as suas formas disfarçadas de culto do sexo. Havia-se tornado uma prática universal, em toda a Mesopotâmia, para todas as mulheres, submeter-se, pelo menos uma vez, na sua juventude, ao abraço de estranhos; isso era considerado uma devoção requerida por Ishtar, e acreditava-se que a fertilidade dependia muito desse sacrifício sexual.

95:1:6 10431 O progresso inicial do ensinamento de Melquisedeque foi altamente gratificante, até que Nabodad, o líder da escola em Kish, decidiu realizar um ataque organizado às práticas prevalecentes de prostituição nos templos. Os missionários de Salém, no entanto, viram fracassarem os seus esforços de fazer essa reforma social e, nos destroços desse fracasso, os mais importantes de todos os seus ensinamentos espirituais e filosóficos também caíram derrotados.

95:1:7 10432 Essa derrota do evangelho de Salém foi seguida imediatamente de um grande aumento do culto de Ishtar, um ritual que já havia invadido a Palestina, sob o nome de Ashtoreth, o Egito, sob o de Ísis, a Grécia, sob o de Afrodite, e as tribos do norte, sob o nome de Astarte. E foi em conseqüência desse recrudescimento da adoração de Ishtar que os sacerdotes babilônios voltaram novamente a sondar as estrelas; a Astrologia experimentou o seu grande renascimento na Mesopotâmia, a leitura da sorte voltou à voga e, durante séculos, o sacerdócio deteriorou-se cada vez mais.

95:1:8 10433 Melquisedeque havia prevenido os seus seguidores para que ensinassem sobre o único Deus, o Pai e Criador de tudo, e para que pregassem apenas o evangelho do favorecimento divino, por intermédio exclusivamente da fé. Todavia, freqüentemente, foi um erro dos instrutores da nova verdade tentar ir muito adiante e suplantar a lenta evolução pela revolução súbita. Os missionários de Melquisedeque na Mesopotâmia elevaram o padrão moral a um ponto alto demais para o povo; eles foram longe demais, e a sua nobre causa foi derrotada. Eles tinham por missão pregar um evangelho definido, proclamar a verdade da realidade do Pai Universal, mas eles enredaram-se na causa aparentemente meritória de reformar os costumes e, assim, a sua grande missão desviou-se e perdeu-se na frustração e no esquecimento.

95:1:9 10434 Em apenas uma geração, a sede de Salém em Kish chegou ao fim, e a propaganda da crença em um único Deus cessou virtualmente em toda a Mesopotâmia. No entanto, os remanescentes das escolas de Salém sobreviveram. Pequenos grupos espalhados aqui e ali continuaram a sua crença no criador único e lutaram contra a idolatria e a imoralidade dos sacerdotes da Mesopotâmia.

95:1:10 10435 Foram os missionários de Salém, do período seguinte à rejeição dos seus ensinamentos, que escreveram muitos dos salmos do Antigo Testamento, inscrevendo-os na pedra, onde posteriormente os sacerdotes hebreus os encontraram, durante o seu cativeiro, e incorporaram-nos subseqüentemente à coleção de hinos atribuídos a autores judeus. Esses belos salmos da Babilônia não foram escritos nos templos de Bel-Marduk; foram o trabalho dos descendentes dos primeiros missionários de Salém e fizeram um violento contraste com as conglomerações de magia dos sacerdotes babilônios. O Livro de Jó é um reflexo bastante bom dos ensinamentos da escola de Salém em Kish e em toda a Mesopotâmia.

95:1:11 10436 Boa parte da cultura religiosa da Mesopotâmia encontrou o seu caminho para a literatura e para a liturgia hebraica por meio dos trabalhos de Amenemope e de Iknaton, no Egito. Os egípcios preservaram, de um modo notável, os ensinamentos sobre as obrigações sociais, derivados dos primeiros anditas mesopotâmicos, e perdidos, de um modo tão amplo, pelos babilônios posteriores que ocuparam o vale do Eufrates.

2. A RELIGIÃO EGÍPCIA PRIMITIVA


95:2:1 10437 Os ensinamentos originais de Melquisedeque realmente tiveram a sua raiz mais profunda no Egito, de onde se espalharam, posteriormente, para a Europa. A religião evolucionária do vale do Nilo foi periodicamente reforçada pela chegada de linhagens superiores dos povos noditas, adamitas e, mais tarde, dos povos anditas do vale do Eufrates. De tempos em tempos, muitos dos administradores civis egípcios foram sumérios. Do mesmo modo que a Índia, naquela época, abrigava a mais elevada mistura das raças do mundo, o Egito cultivava o tipo de filosofia religiosa mais amplamente amalgamada que podia ser encontrada em Urântia, e, do vale do Nilo, ela espalhou-se para muitas partes do mundo. Os judeus receberam dos babilônios grande parte das suas idéias sobre a criação do mundo, mas eles apropriaram-se do conceito da Providência divina, tomando-o dos egípcios.

95:2:2 10441 Eram políticas e morais, mais do que filosóficas ou religiosas, as tendências que tornaram o Egito mais do que a Mesopotâmia, favorável ao ensinamento de Salém. Cada líder tribal no Egito, após lutar para conquistar o trono, buscava perpetuar a sua dinastia proclamando o seu deus tribal como a deidade original criadora de todos os outros deuses. Desse modo, os egípcios acostumaram-se gradativamente com a idéia de um superdeus, que era um degrau para a doutrina de uma Deidade criadora universal. A idéia do monoteísmo oscilou para a frente e para trás, no Egito, durante muitos séculos; a crença em um único Deus sempre ganhando terreno, mas nunca dominando inteiramente os conceitos em evolução do politeísmo.

95:2:3 10442 Durante idades, os povos egípcios haviam sido dados à adoração de deuses da natureza; mais particularmente, cada uma das cerca de quarenta tribos separadas tinha um grupo especial de deuses, uma adorando o touro, outra, o leão, uma terceira, o carneiro, e assim por diante. Anteriormente ainda, eles formavam tribos totêmicas, muito semelhantes às dos ameríndios.

95:2:4 10443 Com o tempo, os egípcios observaram que os corpos colocados nas sepulturas sem tijolos eram conservados ? embalsamados ? pela ação da areia impregnada de soda, enquanto os que eram enterrados em sepulturas de tijolos degradavam-se. Tais observações conduziram aos experimentos que resultaram na prática posterior de embalsamar os mortos. Os egípcios acreditavam que a preservação do corpo facilitava a passagem de alguém para a vida futura. Para que o indivíduo pudesse ser identificado, com mais propriedade, no futuro distante, depois da decadência do corpo, eles colocavam uma estátua funerária na tumba, junto com o corpo, esculpindo o morto no esquife. A confecção dessas estátuas mortuárias levou a arte egípcia a um grande desenvolvimento.

95:2:5 10444 Durante séculos, os egípcios colocaram a sua fé nas tumbas como uma salvaguarda do corpo, para uma conseqüente sobrevivência agradável depois da morte. A posterior evolução das práticas da magia, ainda que estas fossem um peso para a vida, desde o berço até o túmulo, de um modo muito eficaz liberou-os da religião das tumbas. Os sacerdotes fariam inscrições nos ataúdes com textos mágicos que se acreditava serem a proteção contra “um homem ter o próprio coração roubado, no mundo inferior”. Em breve, foi feita uma coleção de diversos desses textos mágicos e conservada como o Livro dos Mortos. No vale do Nilo, porém, o ritual de magia envolveu-se logo com os reinos da consciência e do caráter, em um grau não muitas vezes alcançado pelos rituais daqueles dias. E, subseqüentemente, dependia-se desses ideais morais e éticos, mais do que de túmulos elaborados, para se conseguir a salvação.

95:2:6 10445 As superstições daqueles tempos são bem ilustradas pela crença geral na eficácia da saliva como um agente curativo, uma idéia que teve a sua origem no Egito e que se espalhou dali para a Arábia e a Mesopotâmia. Na legendária batalha de Horus contra Set, o jovem deus perdeu o seu olho, mas, depois que Set foi vencido, esse olho foi restaurado pelo sábio deus Tot, que cuspiu sobre a ferida, curando-a.

95:2:7 10446 Os egípcios acreditaram durante muito tempo que as estrelas cintilantes no céu noturno representavam a sobrevivência das almas dos mortos merecedores; quanto a outros sobreviventes, eles acreditavam serem absorvidos pelo Sol. Durante um certo período, a veneração ao Sol transformou-se em uma espécie de adoração aos ancestrais. A passagem inclinada na entrada da grande pirâmide apontava diretamente para a Estrela Polar, de modo que a alma do rei, quando emergisse da tumba, poderia ir diretamente para as constelações estacionárias e estabelecidas das estrelas fixas, a suposta morada dos reis.

95:2:8 10451 Quando os raios oblíquos do Sol foram observados penetrando a terra por uma abertura nas nuvens, acreditou-se que eles indicavam o abaixamento de uma escada celeste pela qual o rei e outras almas justas poderiam ascender. “O Rei Pepi fez o seu resplendor abaixar-se, como uma escada a seus pés, por onde ascender até a sua mãe. ”

95:2:9 10452 Quando Melquisedeque surgiu na carne, os egípcios tinham uma religião muito superior àquela dos povos vizinhos. Eles acreditavam que uma alma desincorporada, se propriamente equipada de fórmulas mágicas, poderia escapar dos maus espíritos que interferiam no seu caminho e continuar adiante até a sala de julgamento de Osíris, onde, se inocente de “assassinato, roubo, falsidade, adultério, furto e egoísmo”, ela seria admitida aos reinos da bênção. Se essa alma fosse pesada nas balanças e se estivesse em débito, seria consignada ao inferno, à Devoradora. E este era, relativamente, um conceito avançado de uma vida futura, em comparação com as crenças de muitos dos povos vizinhos.

95:2:10 10453 O conceito de julgamento, no lado de lá, para os pecados da vida de um indivíduo na carne e na Terra, foi levado do Egito para a teologia hebraica. A palavra julgamento aparece apenas uma vez em todo o Livro dos Salmos hebreu, e esse salmo em particular foi escrito por um egípcio.

3. A EVOLUÇÃO DOS CONCEITOS MORAIS


95:3:1 10454 Embora a cultura e a religião do Egito se derivassem principalmente da Mesopotâmia dos anditas e houvessem transmitido-se amplamente às civilizações subseqüentes, por intermédio dos hebreus e dos gregos, uma grande parte, imensa mesmo, do idealismo social e ético dos egípcios surgiu no vale do Nilo, como um desenvolvimento puramente evolucionário. Não obstante a origem da importação de grande parte da verdade e da cultura ser andita, no Egito, um volume maior de cultura moral evoluiu mais por meio de um desenvolvimento puramente humano, do que o fez, por técnicas naturais semelhantes, em qualquer outra área circunscrita, antes da outorga de Michael.

95:3:2 10455 A evolução moral não é totalmente dependente da revelação. Os conceitos morais elevados podem derivar da própria experiência humana. O homem pode desenvolver até valores espirituais e conseguir o discernimento cósmico por meio da sua vida experiencial pessoal, porque um espírito divino reside nele. Tais evoluções naturais da consciência e do caráter também foram incrementadas pela chegada periódica de instrutores da verdade, nos tempos antigos, desde o segundo Éden e, mais tarde, a partir da sede de Melquisedeque em Salém.

95:3:3 10456 Milhares de anos antes de o evangelho de Salém penetrar no Egito, os seus líderes morais ensinaram que se devia agir com justiça, com equanimidade, e que a avareza devia ser evitada. Três mil anos antes que fossem elaboradas as escrituras dos hebreus, a máxima dos egípcios era: “Amadurecido é o homem que tem por modelo a retidão e que caminha de acordo com ela”. Eles ensinavam a doçura, a moderação, a discrição. A mensagem de um dos grandes instrutores dessa época foi: “Age com retidão e trata justamente a todos”. A tríade egípcia dessa idade era Verdade-Justiça-Retidão. De todas as religiões puramente humanas de Urântia, nenhuma jamais ultrapassou os ideais sociais e a grandeza moral desse humanismo de outrora do vale do Nilo.

95:3:4 10457 No solo dessas idéias éticas e ideais morais em evolução, as doutrinas sobreviventes da religião de Salém floresceram. Os conceitos do bem e do mal encontraram pronta resposta nos corações de um povo que acreditava que “a vida é dada ao pacífico e a morte ao culpado”. “O pacífico é aquele que faz o que é amado; e o culpado é aquele que faz o que é odiado. ” Por séculos, os habitantes do vale do Nilo haviam vivido sob esses padrões éticos e morais emergentes, antes que alimentassem os conceitos posteriores do certo e do errado – do bom e do mau.

95:3:5 10461 O Egito era intelectual e moral, mas não tanto espiritual. Em seis mil anos, apenas quatro grandes profetas surgiram entre os egípcios. A Amenemope eles seguiram durante uma temporada; a Okhban, eles assassinaram; a Iknaton, eles não aceitaram senão de coração fechado e por uma curta geração; a Moisés, eles rejeitaram. Novamente, foram mais políticas do que religiosas as circunstâncias que tornaram fácil para Abraão e, mais tarde, para José exercerem uma grande influência sobre todo o Egito, em nome dos ensinamentos de um único Deus, vindos de Salém. Quando, porém, os missionários de Salém entraram no Egito pela primeira vez, eles encontraram essa cultura de evolução altamente ética misturada aos padrões morais modificados dos imigrantes da Mesopotâmia. Esses instrutores iniciais do vale do Nilo foram os primeiros a proclamar a consciência como um mandato de Deus, a voz da Deidade.

4. OS ENSINAMENTOS DE AMENEMOPE


95:4:1 10462 No devido tempo, cresceu no Egito um mestre chamado por muitos de “filho do homem” e, por outros, de Amenemope. Esse vidente exaltou a consciência até o seu mais elevado pináculo, a ponto de fazer dela o árbitro entre o certo e o errado; ensinou a punição para o pecado e proclamou a salvação mediante o chamamento da deidade solar.

95:4:2 10463 Amenemope ensinou que a riqueza e a fortuna eram dádivas de Deus, e esse conceito coloriu profundamente a filosofia dos hebreus, que surgiria mais tarde. Esse nobre instrutor acreditava que a consciência de Deus era o fator determinante em toda a conduta; que cada momento deveria ser vivido na compreensão da presença de Deus e na responsabilidade para com Ele. Os ensinamentos desse sábio foram subseqüentemente traduzidos para o hebraico e tornaram-se o livro sagrado daquele povo muito antes que o Antigo Testamento fosse reduzido a palavras escritas. A pregação principal desse bom homem tinha a ver com a instrução do seu filho na probidade e na honestidade, quando em posições governamentais de confiança; e esses nobres sentimentos de muito tempo atrás honrariam qualquer estadista moderno.

95:4:3 10464 Esse homem sábio do Nilo ensinou que “as riquezas criam asas e voam” – que todas as coisas terrenas são evanescentes. A sua grande prece era para que fosse “salvo do medo”. Ele exortou a todos para que fugissem “das palavras dos homens”, indo para “os atos de Deus”. Em resumo, ele ensinou: o homem propõe, mas Deus dispõe. Os seus ensinamentos, traduzidos para o hebraico, determinaram a filosofia do Livro de Provérbios do Antigo Testamento. Traduzidos para o grego, eles deram cor a toda a filosofia religiosa helênica subseqüente. O filósofo alexandrino Filo, de dias posteriores, possuía uma cópia do Livro da Sabedoria.

95:4:4 10465 Amenemope trabalhou para conservar a ética da evolução e a moral da revelação e, nos seus escritos, passou-as tanto aos hebreus quanto aos gregos. Ele não foi o maior dos mestres religiosos dessa época, mas foi o mais influente, no sentido de colorir posteriormente o pensamento de dois elos vitais para o crescimento da civilização ocidental ? os hebreus, entre os quais a fé religiosa ocidental desenvolveu-se até o seu apogeu, e os gregos, que desenvolveram o pensamento filosófico puro, que atingiu o seu mais alto ápice na Europa.

95:4:5 10466 No Livro dos Provérbios hebreu, os capítulos quinze, dezessete, vinte e, ainda, o capítulo vinte e dois, do versículo dezessete, até o capítulo vinte e quatro, versículo vinte e dois, são tirados, quase palavra por palavra do Livro da Sabedoria de Amenemope. O primeiro salmo do Livro dos Salmos hebreu foi escrito por Amenemope e é o âmago dos ensinamentos de Iknaton.

5. O NOTÁVEL IKNATON


95:5:1 10471 Os ensinamentos de Amenemope aos poucos estavam perdendo a sua atuação sobre a mente egípcia, quando, por intermédio da influência de um médico egípcio salemita, uma mulher da família real adotou os ensinamentos de Melquisedeque. Essa mulher convenceu o seu filho, Iknaton, faraó do Egito, a aceitar essas doutrinas de um Deus único.

95:5:2 10472 Desde o desaparecimento de Melquisedeque na carne, nenhum ser humano, até aquele tempo, havia elaborado um conceito tão espantosamente claro da religião revelada de Salém quanto Iknaton. Sob certos aspectos, esse jovem rei egípcio é uma das pessoas mais notáveis da história humana. Durante essa época de depressão espiritual crescente na Mesopotâmia, ele conservou viva a doutrina de El Elyon, o único Deus, no Egito, mantendo assim o canal filosófico monoteísta; e isso foi vital para o suporte religioso da então futura auto-outorga de Michael. E foi em reconhecimento a essa bravura, entre outras razões, que o Jesus criança foi levado para o Egito, onde alguns dos sucessores espirituais de Iknaton o viram e, em uma certa medida, compreenderam algumas etapas da sua missão divina em Urântia.

95:5:3 10473 Moisés, a maior figura que surgiu entre Melquisedeque e Jesus, foi uma dádiva conjunta ao mundo da raça hebraica e da família real egípcia; e houvesse Iknaton possuído a versatilidade e a habilidade de Moisés, houvesse ele manifestado um gênio político à altura da sua surpreendente liderança religiosa, e o Egito se teria transformado na grande nação monoteísta daquela idade; e se isso houvesse acontecido, é bem possível que Jesus pudesse ter vivido a maior parte da sua vida mortal no Egito.

95:5:4 10474 Nunca, em toda a história, qualquer rei conseguiu metodicamente levar uma nação inteira do politeísmo ao monoteísmo, como o fez este extraordinário Iknaton. Com uma determinação espantosa, esse jovem governante rompeu com o passado, mudou o seu nome, abandonou a sua capital, construiu uma cidade inteiramente nova e criou uma nova arte e uma nova literatura para todo um povo. Mas ele andou depressa demais; ele construiu demais, mais do que podiam suportar, quando ele fosse embora. E de novo, ele fracassou em prover a estabilidade material e a prosperidade do seu povo, o qual reagiu desfavoravelmente contra os seus ensinamentos religiosos, quando as ondas subseqüentes de adversidade e de opressão abateram-se sobre os egípcios.

95:5:5 10475 Tivesse esse homem de visão surpreendentemente clara, e extraordinariamente concentrado em um único propósito, a sagacidade política de Moisés, e teria ele mudado toda a história da evolução da religião e da revelação da verdade no mundo ocidental. Durante a sua vida, ele foi capaz de refrear as atividades dos sacerdotes, dos quais ele desacreditava em geral, mas eles mantiveram os seus cultos secretamente e se lançaram à ação tão logo o jovem rei faleceu, deixando o poder; e então não tardaram em atribuir todos os problemas subseqüentes do Egito ao estabelecimento do monoteísmo durante o seu reino.

95:5:6 10476 Iknaton procurou, muito sabiamente, estabelecer o monoteísmo sob a aparência do deus-sol. Essa decisão de colocar a adoração do Pai Universal abrangendo todos os deuses na adoração do Sol deveu-se ao conselho do médico salemita. Iknaton pegou as doutrinas generalizadas da crença então existente em Aton, a respeito da paternidade e da maternidade da Deidade, e criou uma religião que reconhecia uma relação íntima de adoração entre o homem e Deus.

95:5:7 10481 Iknaton era sábio o suficiente para manter a adoração exterior de Aton, o deus-sol, enquanto conduzia os súditos à adoração disfarçada do Único Deus, criador de Aton e Pai supremo de todos. Esse jovem instrutor-rei foi um escritor prolífico, sendo o autor da exposição intitulada “O Único Deus”, um livro de trinta e um capítulos, que os sacerdotes, quando voltaram ao poder, destruíram totalmente. Iknaton também escreveu cento e trinta e sete hinos, doze dos quais estão agora preservados no Livro dos Salmos do Antigo Testamento, de autoria creditada aos hebreus.

95:5:8 10482 A suprema palavra da religião de Iknaton, na vida diária, era “a retidão”, e ele expandiu rapidamente o conceito do reto proceder, de modo a abranger tanto a ética internacional quanto a ética nacional. Essa foi uma geração de uma piedade pessoal surpreendente e foi caracterizada por uma genuína aspiração, entre os homens e as mulheres mais inteligentes, de encontrar Deus e de conhecê-lo. Naqueles dias, a posição social ou a riqueza não davam ao egípcio quaisquer vantagens aos olhos da lei. A vida da família no Egito muito fez para preservar e aumentar a cultura moral e foi inspiração para a magnífica vida familiar posterior dos judeus na Palestina.

95:5:9 10483 A fraqueza fatal da pregação de Iknaton foi a sua maior verdade, o ensinamento de que Aton era não apenas o criador do Egito, mas também do “mundo inteiro, dos homens e das bestas, e de todas as terras estrangeiras, mesmo da Síria e do Kush, além da terra do Egito. Ele coloca a todos nos seus lugares e provê a todos segundo as suas necessidades”. Esses conceitos da Deidade eram superiores e elevados, mas não eram nacionalistas. Tais sentimentos de internacionalidade na religião fracassaram em aumentar o moral do exército egípcio no campo de batalha, mas deram aos sacerdotes armas eficientes para serem usadas contra o jovem rei e a sua nova religião. Ele tinha um conceito da Deidade muito mais elevado do que o dos hebreus posteriores, mas era por demais avançado para servir aos propósitos do edificador de uma nação.

95:5:10 10484 Embora o ideal monoteísta tenha sofrido com o desaparecimento de Iknaton, a idéia de um Deus Único perdurou nas mentes de muitos grupos. O genro de Iknaton voltou, junto com os sacerdotes, à adoração dos velhos deuses, e mudou o seu nome para Tutancâmon. A capital voltou para Tebas, e os sacerdotes enriqueceram com a terra, ganhando finalmente a posse de um sétimo de todo o Egito; e pouco depois, um deles, dessa mesma ordem de sacerdotes, ousou tomar a coroa.

95:5:11 10485 Todavia, os sacerdotes não puderam vencer totalmente a onda monoteísta. Cada vez mais eles foram compelidos a combinar e a escrever hifenizando os nomes hebreu dos seus deuses; e cada vez mais a família dos deuses diminuía. Iknaton havia associado o disco em chamas dos céus ao Deus criador, e essa idéia continuou a inflamar-se nos corações dos homens, e mesmo nos dos sacerdotes, muito tempo depois do passamento do jovem reformador. Nunca o conceito do monoteísmo morreu nos corações dos homens, no Egito e no mundo. Ele persistiu, mesmo, até à chegada do Filho Criador daquele mesmo Pai divino, o Deus único, a quem Iknaton havia proclamado com tanto zelo para a adoração de todo o Egito.

95:5:12 10486 A fragilidade da doutrina de Iknaton repousa no fato de que ele propôs uma religião tão avançada que apenas os egípcios educados poderiam compreender totalmente os seus ensinamentos. A massa dos trabalhadores da agricultura nunca realmente alcançou os seus ensinamentos e estava, por isso, pronta para retornar, com os sacerdotes, à adoração antiga de Ísis e do seu consorte Osíris, que se supunha haver miraculosamente ressuscitado de uma morte cruel nas mãos de Set, o deus da escuridão e do pecado.

95:5:13 10491 O ensinamento da imortalidade de todos os homens era por demais avançado para os egípcios. Apenas aos reis e aos ricos era prometida uma ressurreição; por isso, eles embalsamavam e conservavam tão cuidadosamente os seus corpos em tumbas, para o dia do julgamento. Contudo, a democracia da salvação e da ressurreição ensinada por Iknaton finalmente prevaleceu, em uma extensão tal que os egípcios, mais tarde, acreditaram na sobrevivência até de animais irracionais.

95:5:14 10492 Embora o esforço desse governante egípcio para impor a adoração de um único Deus ao seu povo pareça haver fracassado, deve ficar registrado que as repercussões do seu trabalho perduraram por séculos, tanto na Palestina como na Grécia, e que o Egito tornou-se, assim, o agente da transmissão da cultura evolucionária combinada do Nilo e da religião reveladora do Eufrates, para todos os povos ulteriores do Ocidente.

95:5:15 10493 A glória dessa grande era de desenvolvimento moral e de crescimento espiritual, no vale do Nilo, estava em vias de um rápido desaparecimento, na época em que a vida nacional dos hebreus estava começando, e, em conseqüência da sua permanência no Egito, esses beduínos levaram consigo grande parte desses ensinamentos e perpetuaram grande parte da doutrina de Iknaton na sua religião racial.

6. AS DOUTRINAS DE SALÉM NO IRÃ


95:6:1 10494 Da Palestina, alguns dos missionários Melquisedeques atravessaram a Mesopotâmia e o grande planalto iraniano. Por mais de quinhentos anos, os instrutores de Salém progrediram no Irã, e toda a nação estava se voltando para a religião Melquisedeque, quando uma mudança de governantes precipitou uma perseguição amarga que praticamente acabou com os ensinamentos monoteístas do culto de Salém. A doutrina da aliança com Abraão estava virtualmente extinta na Pérsia, quando, naquele grande século de renascimento moral, o sexto antes de Cristo, Zoroastro apareceu para reviver a chama quase extinta dos ensinamentos de Salém.

95:6:2 10495 Esse fundador de uma nova religião foi um jovem viril e aventureiro que, na sua primeira peregrinação a Ur, na Mesopotâmia, havia aprendido sobre as tradições da rebelião de Caligástia e de Lúcifer – bem como sobre muitas outras tradições –, todas as quais exerceram um forte apelo sobre a sua natureza religiosa. E assim, como resultado de um sonho, enquanto estava em Ur, ele estabeleceu o programa de retornar à sua casa ao norte e de realizar a remodelação da religião do seu povo. Ele havia assimilado a idéia hebraica de um Deus de justiça, o conceito mosaico da divindade. A idéia de um Deus supremo estava clara na sua mente e ele rebaixou todos os outros deuses à categoria de diabos, alinhando-os nas fileiras dos demônios dos quais ele havia ouvido falar na Mesopotâmia. Ele havia aprendido sobre a história dos Sete Espíritos Mestres, pois esta tradição ainda pairava em Ur, e, desse modo, ele criou uma galáxia de sete deuses supremos, com Ahura-Mazda à frente. A esses deuses subordinados, ele associou a idealização da Lei da Retidão, do Bom Pensamento, do Nobre Governo, do Santo Caráter, da Saúde e da Imortalidade.

95:6:3 10496 E essa nova religião era de ação – de trabalho –, não de preces e de rituais. O seu Deus era um ser de suprema sabedoria e o patrono da civilização; era uma filosofia religiosa militante que ousava enfrentar o mal, a inação e o atraso.

95:6:4 10497 Zoroastro não ensinou a adoração do fogo, mas procurou utilizar a chama como um símbolo do Espírito puro e sábio da dominação universal e suprema. (É bem verdade que os seus seguidores, posteriormente, não apenas reverenciaram esse fogo simbólico, mas adoraram-no. ) Finalmente, com a conversão de um príncipe iraniano, essa nova religião espalhou-se por meio da espada. E Zoroastro heroicamente morreu em uma batalha por tudo aquilo em que ele acreditava ser a “verdade do Senhor da Luz”.

95:6:5 10501 O zoroastrismo é o único credo urantiano que perpetua os ensinamentos dalamatianos e edênicos sobre os Sete Espíritos Mestres. Embora haja fracassado em fazer com que o conceito da Trindade evoluísse, de um certo modo, aproximou-se do conceito de Deus, o Sétuplo. O zoroastrismo original não era um dualismo puro; embora os ensinamentos iniciais pintassem o mal como uma coordenada temporal da bondade, estava ele submerso definitivamente na eternidade da realidade última do bem. Apenas em tempos posteriores é que a crença de que o mal e o bem lutavam em termos iguais ganhou crédito.

95:6:6 10502 As tradições judaicas do céu e do inferno, e a doutrina dos demônios, do modo como é registrada nas escrituras hebraicas, ainda que fundada nas tradições correntes de Lúcifer e de Caligástia, derivaram principalmente dos zoroastrianos, durante os tempos em que os judeus estavam sob o domínio político e cultural dos persas. Zoroastro, como os egípcios, ensinava sobre o “dia do julgamento”, no entanto, ele ligava esse evento ao fim do mundo.

95:6:7 10503 Mesmo a religião que sucedeu ao zoroastrismo na Pérsia foi influenciada por ele de um modo marcante. Quando os sacerdotes iranianos tentaram derrubar os ensinamentos de Zoroastro, eles fizeram por ressuscitar a antiga adoração de Mitra. E o mitraísmo espalhou-se por todo o Levante e pelas regiões mediterrâneas, sendo, por algum tempo, um contemporâneo tanto do judaísmo quanto do cristianismo. Os ensinamentos de Zoroastro, assim, chegaram a imprimir a sua influência sucessivamente sobre três grandes religiões: o judaísmo, o cristianismo e, por meio destes, o islamismo.

95:6:8 10504 No entanto, há uma grande distância entre os ensinamentos elevados e os salmos nobres de Zoroastro e as perversões modernas do seu ensinamento, feitas pelos persas, com o seu grande medo dos mortos, somado ao seu gosto das crenças nos sofismas, o qual Zoroastro jamais se dignou sequer a considerar.

95:6:9 10505 Este grande homem foi um dos daquele grupo único que surgiu no sexto século antes de Cristo e que impediu que a luz de Salém fosse total e finalmente extinta, pois ela brilhava parcamente demais para mostrar ao homem, no seu mundo obscurecido, o caminho da luz que leva à vida eterna.

7. OS ENSINAMENTOS DE SALÉM NA ARÁBIA


95:7:1 10506 Os ensinamentos de Melquisedeque, de um único Deus, estabeleceram-se no deserto da Arábia, em uma data relativamente recente. Na Grécia como na Arábia, os missionários de Salém fracassaram por causa da sua má compreensão das instruções de Maquiventa a respeito de um excesso de organização. Contudo, não foram impedidos, do mesmo modo, pela interpretação que fizeram da sua admoestação contra os esforços de expandir os ensinamentos por meio da força militar ou por obrigação imposta pelo governo civil.

95:7:2 10507 Nem mesmo na China ou em Roma os ensinamentos de Melquisedeque fracassaram mais completamente do que nessa região desértica tão próxima da própria Salém. Muito depois que a maioria dos povos do Oriente e do Ocidente havia-se transformado respectivamente em budistas e cristãos, o deserto da Arábia continuava como estivera por milhares de anos. Cada tribo adorava os seus antigos fetiches, e muitas famílias separadamente tinham os seus próprios deuses domésticos. Por muito tempo, a luta continuou entre a Ishtar babilônica, o Yavé hebreu, o Ahura iraniano e o Pai do Senhor Jesus Cristo dos cristãos. Nunca um desses conceitos foi capaz de desalojar totalmente os outros.

95:7:3 10511 Aqui e acolá, em toda a Arábia, havia famílias e clãs que se atinham à vaga idéia de um único Deus. Esses grupos prezavam muito as tradições de Melquisedeque, de Abraão, de Moisés e de Zoroastro. Havia numerosos centros que poderiam sensibilizar-se com o evangelho de Jesus, mas os missionários cristãos das terras do deserto eram grupos austeros e inflexíveis demais, ao contrário dos missionários inovadores que funcionavam nos países do Mediterrâneo e que aceitavam mais facilmente as concessões. Se os seguidores de Jesus tivessem levado mais a sério a exortação feita por ele: “ide a todo o mundo e pregai o evangelho”, e tivessem eles sido mais afáveis naquelas pregações, menos restritivos nas exigências sociais paralelas inventadas por eles próprios, e, então, muitas terras teriam recebido com entusiasmo e alegria o evangelho simples do filho do carpinteiro, e a Arábia estaria entre elas.

95:7:4 10512 A despeito do fato de que os grandes monoteísmos do Oriente tivessem falhado em deixar raízes na Arábia, essa terra desértica foi capaz de produzir uma fé que, apesar de menos exigente nos seus quesitos sociais, era, contudo, monoteísta.

95:7:5 10513 Havia apenas um fator de natureza tribal, racial ou nacional nas crenças primitivas e desorganizadas do deserto, e que foi o respeito peculiar e geral que quase todas as tribos árabes gostavam de prestar ao fetiche de uma certa pedra negra, em um certo templo, em Meca. Esse ponto comum de contato e de reverência, subseqüentemente, levou ao estabelecimento da religião islâmica. O que Yavé, o espírito do vulcão, era para os semitas judeus, a pedra de Kaaba tornou-se para os seus primos árabes.

95:7:6 10514 A força do Islã tem sido a sua apresentação clara e bem definida de Alá como a sua e a única Deidade; a sua fraqueza é o uso da força militar para a sua difusão e promulgação, junto com a degradação da mulher. Mas essa fé tem sido fiel à sua apresentação de uma Única Deidade Universal entre todas, aquele “que conhece o invisível e o visível; Ele que é o misericordioso e cheio de compaixão”. “Verdadeiramente Deus é generoso e abundante na sua bondade para com todos os homens. ” “E, quando estou doente, é ele que me cura. ” “Pois, quando três homens falam juntos, Deus está presente como um quarto”, pois não é ele “o primeiro e o último, e também o aparente e o oculto”?

95:7:7 10515 [Apresentado por um Melquisedeque de Nebadon.]

DOCUMENTO 96

YAVÉ – O DEUS DOS HEBREUS
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Ao conceber a Deidade, o homem primeiro inclui todos os deuses, em seguida ele subordina todos os deuses estrangeiros à sua deidade tribal, e finalmente elimina todos, exceto aquele Deus de valor supremo e final. Os judeus sintetizaram todos os deuses no seu conceito mais sublime do Senhor Deus de Israel. Do mesmo modo, os indianos combinaram as suas deidades múltiplas “em uma espiritualidade única dos deuses”, retratada no Rig-Veda, ao passo que os mesopotâmios reduziram os seus deuses ao conceito mais centralizado de Bel-Marduk. Essas idéias do monoteísmo amadureceram em todo o mundo, não muito depois do aparecimento de Maquiventa Melquisedeque em Salém, na Palestina. Todavia, o conceito da Deidade, feito por Melquisedeque, era diferente daquele conceito tecido por inclusão, por subordinação e por exclusão, da filosofia evolucionária; era baseado exclusivamente no poder criador, e logo influenciou os conceitos mais elevados de deidade da Mesopotâmia, da Índia e do Egito.

96:0:2 10522 A religião de Salém foi reverenciada como uma tradição pelos quenitas e por várias outras tribos de cananeus. E este foi um dos intuitos da encarnação de Melquisedeque: que a religião de um só Deus fosse cultivada, como preparação para o caminho da auto-outorga, na Terra, de um Filho daquele Deus único. Michael dificilmente poderia vir a Urântia sem que existissem povos acreditando no Pai Universal, entre os quais ele pudesse surgir.

96:0:3 10523 A religião de Salém sobreviveu como uma crença entre os quenitas, na Palestina, e essa religião, do modo como foi posteriormente adotada pelos hebreus, foi influenciada inicialmente pelos ensinamentos morais egípcios; mais tarde, pelo pensamento teológico da Babilônia; e, finalmente, pelas concepções iranianas do bem e do mal. De fato, a religião dos hebreus fundamenta-se na aliança entre Abraão e Maquiventa Melquisedeque, mas, sendo evolucionária, ela cresceu de muitas circunstâncias devidas a situações singulares, e, culturalmente, apropriou-se livremente das religiões, da moralidade e da filosofia de todo o Levante. É por intermédio da religião dos hebreus que grande parte da moralidade e do pensamento religioso do Egito, da Mesopotâmia e do Irã foi transmitida aos povos ocidentais.

1. OS CONCEITOS DA DEIDADE ENTRE OS SEMITAS


96:1:1 10524 Os semitas, nos seus primórdios, consideravam tudo como sendo residido por um espírito. Havia espíritos do mundo animal e do mundo vegetal; o espírito anual, o senhor da progênie; espíritos do fogo, da água e do ar; um verdadeiro panteão de espíritos a serem temidos e adorados. E os ensinamentos de Melquisedeque a respeito de um Criador Universal nunca destruíram completamente a crença nesses espíritos subalternos, ou deuses da natureza.

96:1:2 10525 O progresso que os hebreus fizeram desde o politeísmo, passando pelo henoteísmo, até o monoteísmo, não foi um desenvolvimento ininterrupto e contínuo de conceitos. Eles experimentaram muitos retrocessos na evolução dos seus conceitos da Deidade, enquanto, ao mesmo tempo, em uma mesma época, havia idéias sobre Deus que variavam entre os grupos diferentes de crentes semitas. De tempos em tempos, numerosos termos foram usados na sua conceituação de Deus e, com o intuito de impedir a confusão, esses vários títulos dados à Deidade serão definidos do modo como dizem respeito à evolução da teologia judaica:

96:1:3 10531 1. Yavé era o deus das tribos da Palestina do sul, as quais associavam esse conceito de deidade com o monte Horeb, o vulcão de Sinai. Yavé era meramente um, entre as centenas e milhares de deuses da natureza que atraíam a atenção e clamavam a adoração das tribos e dos povos semitas.

96:1:4 10532 2. El Elyon. Durante séculos, depois da passagem de Melquisedeque por Salém, a sua doutrina da Deidade sobreviveu sob várias versões, mas era geralmente indicada pelo termo El Elyon, o Deus Altíssimo dos céus. Muitos semitas, incluindo os descendentes imediatos de Abraão, por várias vezes adoraram a ambos, a Yavé e a El Elyon.

96:1:5 10533 3. El Shadai. É difícil explicar o que El Shadai representava. Essa idéia de Deus era um composto derivado dos ensinamentos do Livro da Sabedoria de Amenemope, modificado pela doutrina de Aton, feita por Iknaton, e posteriormente, influenciado pelos ensinamentos de Melquisedeque incorporados ao conceito de El Elyon. À medida, porém, que o conceito de El Shadai impregnou a mente dos hebreus, ele coloriu-se totalmente pelas crenças no Yavé do deserto.

96:1:6 10534 Uma das idéias dominantes da religião dessa época foi o conceito egípcio da Providência divina, o ensinamento de que a prosperidade material era uma recompensa dada por servir a El Shadai.

96:1:7 10535 4 . El. Em meio a toda essa confusão, na terminologia, e à imprecisão de conceito, muitos crentes fervorosos esforçaram-se sinceramente para adorar a todas essas idéias em evolução da divindade, e adveio a prática de referir-se a essa Deidade composta como sendo El. E esse termo incluía, ainda, outros dos deuses beduínos da natureza.

96:1:8 10536 5 . Eloim. Em Kish e em Ur, durante muito tempo, perduraram grupos de sumérios-caldeus que ensinavam um conceito de um Deus três-em-um, fundamentado nas tradições dos dias de Adão e de Melquisedeque. Essa doutrina foi levada para o Egito, onde essa Trindade foi adorada sob o nome de Eloim, ou, no singular, como Eloá. Os círculos filosóficos do Egito e, mais tarde, dos professores alexandrinos, de extração hebraica, ensinaram essa unidade de Deuses pluralísticos; e muitos dos conselheiros de Moisés, na época do êxodo, acreditavam nessa Trindade. Contudo, o conceito do Eloim trinitário só tornou-se realmente parte da teologia dos hebreus depois que eles passaram para a influência política dos babilônios.

96:1:9 10537 6. Vários nomes. Os semitas não gostavam de falar o nome da sua Deidade, e, por isso, eles recorriam a numerosos nomes, que variavam de tempos em tempos, tais como: O Espírito de Deus, O Senhor, O Anjo do Senhor, O Todo-Poderoso, O Santo, O Mais Alto, Adonai, O Ancião dos Dias, O Senhor Deus de Israel, O Criador do Céu e da Terra, Kírios, Jah, O Senhor das Hostes e O Pai do Céu.

96:1:10 10538 Jeová é um termo que, em épocas mais recentes, tem sido usado para designar o conceito finalmente evoluído e concluído de Yavé, depois da longa experiência dos hebreus. Todavia, o nome Jeová não veio a ser usado senão depois de mil e quinhentos anos da época de Jesus.

96:1:11 10541 Até por volta do ano 2000 a. C. , o monte Sinai foi ativo intermitentemente como vulcão; as mais recentes erupções ocasionais ocorreram na época dos israelitas nessa região. O fogo e a fumaça, junto com as explosões estrondosas e as erupções dessa montanha vulcânica, imprimiam medo aos beduínos das regiões vizinhas e levavam-nos a ter um grande temor de Yavé. Esse espírito do monte Horeb, mais tarde, tornou-se o deus dos semitas hebreus, e eles finalmente acreditaram ser ele o supremo entre todos os outros deuses.

96:1:12 10542 Os cananeus haviam já, desde muito tempo, reverenciado Yavé, e, embora muitos dos quenitas acreditassem de um certo modo em El Elyon, o superdeus da religião de Salém, a maioria dos cananeus mantinha-se vagamente na adoração das deidades tribais antigas. Dificilmente estavam dispostos a abandonar as suas deidades nacionais, em favor de um deus internacional, para não dizer, interplanetário. Eles não tinham a mentalidade aberta para uma deidade universal e, por isso, essas tribos continuaram a adorar as suas deidades tribais, incluindo Yavé e os bezerros de prata e ouro, que simbolizavam o conceito do espírito do vulcão do Sinai dos pastores beduínos.

96:1:13 10543 Os sírios, ainda que adorando os seus deuses, também acreditavam no Yavé dos hebreus, pois os seus profetas disseram ao rei sírio: “Os seus deuses são deuses das montanhas; por isso, eles eram mais fortes do que nós; mas lutemos contra eles nas planícies, e certamente seremos mais fortes do que eles”.

96:1:14 10544 À medida que o homem progride na cultura, os deuses menores são submetidos a uma deidade suprema; o grande Júpiter persiste apenas como uma exclamação. Os monoteístas mantêm os seus deuses subordinados como espíritos, demônios, fados, nereidas, fadas, duendes, gnomos e o mau-olhado. Os hebreus passaram pelo monoteísmo através do henoteísmo e, durante muito tempo, acreditaram na existência de outros deuses além de Yavé, mas sustentavam cada vez mais que essas deidades estrangeiras estavam todas subordinadas a Yavé. Eles admitiam a realidade de Chemosh, deus dos amoritas, mas sustentavam que ele era subordinado a Yavé.

96:1:15 10545 A idéia de Yavé submeteu-se ao desenvolvimento mais profundo de todas as teorias mortais de Deus. A sua evolução progressiva pode apenas ser comparada à metamorfose do conceito de Buda na Ásia, que no final leva ao conceito do Absoluto Universal, do mesmo modo que o conceito de Yavé finalmente leva à idéia do Pai Universal. Todavia, por uma questão histórica, deve ser entendido que, enquanto os judeus mudavam, assim, a sua visão da Deidade, do deus tribal do monte Horeb, para o Pai Criador cheio de amor e misericórdia dos tempos mais recentes, eles não mudaram o seu nome; eles continuaram todo o tempo a chamar, a esse conceito da Deidade assim em evolução, de Yavé.

2. OS POVOS SEMÍTICOS


96:2:1 10546 Os semitas do leste eram cavaleiros bem organizados e bem dirigidos que invadiram as regiões orientais do crescente fértil e ali se uniram aos babilônios. Os caldeus, de perto de Ur, estavam entre os mais avançados dos semitas orientais. Os fenícios eram um grupo superior e bem organizado de semitas miscigenados que ocupava o setor oeste da Palestina, ao longo da costa do Mediterrâneo. Racialmente, os semitas estavam entre os mais misturados dos povos de Urântia, contendo fatores hereditários de quase todas as nove raças do mundo.

96:2:2 10547 Por várias vezes, os semitas árabes guerrearam para abrir o seu caminho até o norte da Terra Prometida, a terra em que “fluíam o leite e o mel”, mas, todas as vezes, foram expelidos pelos mais bem organizados e mais altamente civilizados semitas do norte e pelos hititas. Mais tarde, durante um período inusitadamente severo de fome, esses beduínos errantes entraram no Egito, em grandes números, como trabalhadores contratados nas obras públicas egípcias, mas apenas se submeteram a uma amarga experiência de escravização, na pesada lida diária dos trabalhadores comuns e explorados do vale do Nilo.

96:2:3 10551 Apenas depois dos dias de Maquiventa Melquisedeque e de Abraão é que algumas tribos de semitas, por causa das suas crenças religiosas peculiares, foram chamadas de filhos de Israel e, mais tarde, de hebreus, judeus, e de o “povo escolhido”. Abraão não foi o pai racial de todos os hebreus; ele não era nem mesmo o progenitor de todos os semitas beduínos que foram mantidos presos no Egito. É bem verdade, a sua progênie, vinda do Egito, formou o núcleo do povo que mais tarde seria o dos judeus, mas a grande maioria dos homens e mulheres que se incorporara aos clãs de Israel nunca havia vivido no Egito. Eles eram meramente companheiros nômades que escolheram seguir a liderança de Moisés quando os filhos de Abraão e os seus parceiros semitas do Egito viajaram, cruzando o norte da Arábia.

96:2:4 10552 O ensinamento de Melquisedeque a respeito de El Elyon, o Altíssimo, e a aliança de favor divino por intermédio da fé haviam sido totalmente esquecidos na época da escravização, no Egito, dos povos semitas, os quais, em breve, iriam formar a nação dos hebreus. No entanto, durante esse período de cativeiro, esses nômades da Arábia continuaram a apegar-se à sua crença tradicional em Yavé, como a sua deidade racial.

96:2:5 10553 Yavé era adorado por mais de cem tribos na Arábia e, exceto pelo aspecto do conceito de El Elyon, de Melquisedeque, que persistiu entre as classes mais educadas do Egito, incluindo as de sangue hebreu misturado e as egípcias, a religião da massa dos hebreus escravizados era uma versão modificada do velho ritual de Yavé, com magia e sacrifícios.

3. O INCOMPARÁVEL MOISÉS


96:3:1 10554 O alvorecer da evolução dos conceitos e dos ideais hebraicos, para um Criador Supremo, data da partida dos semitas do Egito, com Moisés, o seu grande líder, instrutor e organizador. Sua mãe era da família real do Egito e seu pai era um oficial semita de ligação entre o governo e os beduínos no cativeiro. Moisés possuía, portanto, as qualidades que derivavam de fontes raciais superiores; a sua ascendência era tão altamente miscigenada, que é impossível classificá-lo em qualquer grupo racial. Não houvesse ele vindo desse tipo misturado, e não iria nunca ter dado mostras daquela versatilidade e adaptabilidade inusitadas que o tornaram capaz de administrar a horda diversificada que finalmente acabou interligada a esses beduínos semitas que fugiram do Egito para o deserto da Arábia sob a sua liderança.

96:3:2 10555 A despeito da sedução da cultura do reino do Nilo, Moisés escolheu participar da sorte do povo do seu pai. Na época, esse grande organizador estava formulando os seus planos para a libertação final do povo do seu pai. Os beduínos no cativeiro dificilmente tinham uma religião digna do nome; estavam virtualmente sem um conceito verdadeiro de Deus e sem esperanças no mundo.

96:3:3 10556 Nenhum líder jamais tomou a si a tarefa de reformar e de elevar um grupo de seres humanos tão digno de pena, tão deprimido e desencorajado, e tão ignorante. Esses escravos, porém, tinham possibilidades latentes de desenvolvimento nas suas linhagens hereditárias, e havia um número suficiente de líderes instruídos que haviam sido treinados por Moisés, como preparação para o dia da revolta e da mobilização pela liberdade, para constituir um corpo de organizadores eficazes. Esses homens superiores haviam sido empregados como supervisores nativos do seu povo; haviam recebido alguma instrução por causa da influência de Moisés junto aos governantes egípcios.

96:3:4 10561 Moisés esforçou-se para negociar diplomaticamente a liberdade dos seus companheiros semitas. Ele e o seu irmão entraram em um pacto com o rei do Egito, por meio do qual a eles seria dada a permissão de deixar pacificamente o vale do Nilo, pelo deserto da Arábia. Eles estavam para receber um pagamento modesto em dinheiro e em mercadorias, como pagamento da sua longa jornada de serviço no Egito. Os hebreus, por sua vez, entraram em um acordo de manter relações amistosas com os Faraós e de não se juntar a nenhuma aliança contra o Egito. Todavia, posteriormente, o rei julgou adequado repudiar esse tratado, dando como motivo a desculpa de que os seus espiões haviam descoberto deslealdades entre os escravos beduínos. Assim, alegou que os judeus buscavam a liberdade com o propósito de ir para o deserto e de organizar os nômades contra o Egito.

96:3:5 10562 Moisés, entretanto, não se desencorajou; esperou a sua hora e, em menos de um ano, quando as forças militares egípcias estavam totalmente ocupadas em resistir aos assaltos simultâneos de um forte ímpeto líbio ao sul e de uma invasão naval grega ao norte, esse intrépido organizador conduziu os seus compatriotas para fora do Egito, em uma fuga noturna espetacular. Essa evasão para a liberdade foi cuidadosamente planejada e habilmente executada. E eles tiveram êxito, não obstante houvessem sido calorosamente perseguidos pelo Faraó e um pequeno corpo de egípcios, que se dispersaram todos diante da defesa dos fugitivos, abandonando muitas pilhagens, as quais foram aumentadas ainda pelos saques que essas hordas de escravos fizeram ao escapar na marcha para o seu lar desértico ancestral.

4. A PROCLAMAÇÃO DE YAVÉ


96:4:1 10563 A evolução e a elevação dos ensinamentos mosaicos têm influenciado quase metade de todo o mundo e ainda influenciam, mesmo no século vinte. Se bem que Moisés haja compreendido a filosofia religiosa mais avançada dos egípcios, os escravos beduínos pouco sabiam sobre tais ensinamentos, mas eles nunca haviam esquecido totalmente o deus do monte Horeb, a quem os seus ancestrais denominavam Yavé.

96:4:2 10564 Moisés ouvira falar sobre os ensinamentos de Maquiventa Melquisedeque, tanto do seu pai quanto da sua mãe; sendo que a comunhão de crença religiosa entre eles havia sido a explicação para uma união tão inusitada entre uma mulher de sangue real e um homem cuja raça estava no cativeiro. O sogro de Moisés era um quenita adorador de El Elyon, mas os pais do emancipador eram crentes de El Shadai. Moisés foi, assim, educado como um el-shadaísta; mediante a influência do seu sogro, ele tornou-se um el-elionista, e, na época do acampamento hebreu no monte Sinai, depois da retirada do Egito, ele havia formulado um conceito novo e ampliado da Deidade (derivado de todas as suas crenças anteriores), que ele sabiamente decidira proclamar ao seu povo, como sendo um conceito expandido do seu velho deus tribal, Yavé.

96:4:3 10565 Moisés havia-se esforçado para ensinar a esses beduínos a idéia de El Elyon, mas, antes de deixar o Egito, ele estava convencido de que nunca iriam compreender totalmente essa doutrina. E, assim, deliberadamente, ele determinou para si o compromisso de adotar o deus tribal do deserto como o único deus dos seus seguidores. Moisés não ensinou especificamente que outros povos e nações não poderiam ter outros deuses, mas sustentou absolutamente que Yavé estava sobre todos e acima de todos, especialmente para os hebreus. Contudo, ele sempre viveu importunado pela situação desajeitada de tentar apresentar a sua idéia nova e mais elevada da Deidade, a esses escravos ignorantes, sob o disfarce do antigo termo Yavé, que havia sido sempre simbolizado pelo bezerro de ouro das tribos beduínas.

96:4:4 10566 O fato de que Yavé fosse o deus dos hebreus em fuga explica por que eles permaneceram tanto tempo diante da montanha sagrada do Sinai, e por que ali eles receberam os Dez Mandamentos, que Moisés promulgou em nome de Yavé, o deus do Horeb. Durante essa longa permanência diante do Sinai, os cerimoniais religiosos dessa adoração dos hebreus, de evolução tão recente, ficaram ainda mais aperfeiçoados.

96:4:5 10571 Não parece que Moisés chegaria a ter êxito no estabelecimento do seu cerimonial, de um certo modo avançado, de adoração, nem em manter o grupo dos seus seguidores intacto por um quarto de século, não fora pela erupção violenta do Horeb, durante a terceira semana da permanência deles, em adoração, na sua base. “A montanha de Yavé foi consumida em fogo, a fumaça subiu como se fosse de um forno e toda a montanha tremeu muito”. Em vista desse cataclismo, não é surpreendente que Moisés pudesse ter imprimido aos seus irmãos o ensinamento de que o Deus deles era “poderoso e terrível, um fogo devorador, temível e Todo-Poderoso”.

96:4:6 10572 Moisés proclamou que Yavé era o Senhor Deus de Israel, que havia escolhido os hebreus como o seu povo escolhido; ele estava construindo uma nova nação e, sabiamente, nacionalizava os seus ensinamentos religiosos, dizendo aos seus seguidores que Yavé era um duro mestre de obras, um “Deus ciumento”. No entanto ele procurou ampliar o seu conceito da divindade quando lhes ensinou que Yavé era o “Deus dos espíritos de toda a carne” e quando disse: “O Deus eterno é o vosso refúgio e ele tem os seus braços eternos por debaixo de vós”. Moisés ensinou que Yavé era um Deus que manteria a sua aliança; que ele “não vos abandonará, nem vos destruirá, nem esquecerá a aliança dos vossos pais, porque o Senhor vos ama e não esquecerá o juramento que fez aos vossos pais”.

96:4:7 10573 Moisés fez um esforço heróico para elevar Yavé à dignidade de uma Deidade suprema, quando o apresentou como o “Deus da verdade e sem iniqüidade, justo e reto em todos os seus caminhos”. Entretanto, apesar desse ensinamento elevado, o entendimento limitado dos seus seguidores fez com que fosse necessário falar de Deus como sendo uma imagem do homem, como estando sujeito a ataques de cólera, de ira e severidade, e que fosse até mesmo vingativo e facilmente influenciável pela conduta do homem.

96:4:8 10574 Sob os ensinamentos de Moisés, esse deus de natureza tribal, Yavé, tornou-se o Senhor Deus de Israel, que os seguiu no deserto e até mesmo no exílio, onde ele de fato foi concebido como o Deus de todos os povos. O cativeiro posterior, que escravizou os judeus na Babilônia, finalmente liberou o conceito em evolução de Yavé para que assumisse o papel monoteísta do Deus de todas as nações.

96:4:9 10575 O aspecto mais singular e espantoso da história religiosa dos hebreus diz respeito a essa contínua evolução do conceito da Deidade, desde o deus primitivo do monte Horeb até os ensinamentos dos seus sucessivos líderes espirituais e ao alto nível de desenvolvimento descrito nas doutrinas sobre a Deidade dos dois Isaías, que proclamaram aquele conceito magnífico de um Pai Criador cheio de amor e de misericórdia.

5. OS ENSINAMENTOS DE MOISÉS


96:5:1 10576 Moisés foi uma combinação extraordinária de líder militar, de organizador social e de instrutor religioso. Ele foi o mais importante dos instrutores e líderes individuais mundiais entre a época de Maquiventa e a de Jesus. Moisés intentou introduzir muitas reformas em Israel, das quais não há nenhum registro. No tempo de uma vida, ele livrou a horda poliglota dos chamados hebreus da escravidão e da perambulação incivilizada, ao mesmo tempo em que lançou a fundação para o nascimento posterior de uma nação e a perpetuação de uma raça.

96:5:2 10581 Há pouca coisa registrada sobre o grande trabalho de Moisés, porque os hebreus não tinham nenhuma língua escrita na época do êxodo. O registro dos tempos e dos feitos de Moisés derivou-se das tradições, que perduraram mais de mil anos depois da morte do grande líder.

96:5:3 10582 Muitos dos avanços que Moisés realizou, indo além da religião dos egípcios e das tribos levantinas vizinhas, foram devidos às tradições dos quenitas do tempo de Melquisedeque. Sem o ensinamento de Maquiventa a Abraão e aos seus contemporâneos, os hebreus teriam saído do Egito em trevas desesperadoras. Moisés e o seu sogro, Jetro, reuniram os resíduos das tradições dos dias de Melquisedeque, e, tais ensinamentos, junto com a ciência dos egípcios, guiaram Moisés na criação da religião aperfeiçoada e dos rituais dos israelitas. Moisés foi um organizador; ele selecionou o melhor da religião e dos costumes do Egito e da Palestina, e, associando essas práticas às tradições dos ensinamentos de Melquisedeque, organizou o sistema cerimonial hebreu de adoração.

96:5:4 10583 Moisés era um crente da Providência; ele havia-se deixado influenciar profundamente pelas doutrinas do Egito a respeito do controle sobrenatural do Nilo e de outros elementos da natureza. Tinha uma grande visão de Deus, e foi profundamente sincero quando ensinou aos hebreus que, se obedecerem a Deus, “Ele vos amará, vos abençoará e vos multiplicará. Ele multiplicará os frutos do vosso ventre e o fruto da vossa terra – o milho, a uva, o azeite e os vossos rebanhos. Vós sereis enriquecidos acima de todos os povos, e o Senhor vosso Deus tirará de vós todas as doenças e não porá nenhuma das doenças más, do Egito, sobre vós”. Ele mesmo disse: “Lembrai-vos do Senhor vosso Deus, pois é ele quem vos dá o poder de obter as riquezas”. “Vós emprestareis a muitas nações, mas não tomareis nada emprestado. Vós reinareis sobre muitas nações, mas elas não reinarão sobre vós. ”

96:5:5 10584 No entanto, foi realmente uma pena observar a grande mente de Moisés tentando adaptar o seu conceito sublime de El Elyon, o Altíssimo, para que a compreensão dos ignorantes e iletrados hebreus o alcançasse. Aos seus líderes reunidos, ele dizia, com a sua voz tonitruante: “o Senhor vosso Deus é o único Deus; não há outro além dele”; enquanto que, à multidão misturada, ele declarava: “Quem é como o vosso Deus, entre todos os deuses?” Moisés voltou-se contra os fetiches e a idolatria, fazendo uma brava frente contra eles e conseguiu um sucesso parcial, declarando: “Vós não vistes nenhuma figura no dia em que o vosso Deus vos falou em Horeb, do meio do fogo”. Ele também proibiu que se fizessem imagens de qualquer espécie.

96:5:6 10585 Moisés temia proclamar a misericórdia de Yavé, preferindo assustar o seu povo com o temor da justiça de Deus, dizendo: “O Senhor vosso Deus é o Deus dos Deuses, e o Senhor dos Senhores, um grande Deus, um Deus poderoso e terrível que não faz acepção de pessoas”. E, novamente, ele procurou controlar os clãs turbulentos, ao declarar que “o vosso Deus mata quando o desobedeceis; ele vos cura e vos dá a vida quando O obedeceis”. Todavia, Moisés ensinou a essas tribos que eles se transformariam no povo escolhido de Deus apenas sob a condição de que “guardassem todos os seus mandamentos e obedecessem a todos os seus estatutos”.

96:5:7 10586 Da misericórdia de Deus pouquíssimo foi ensinado aos hebreus, durante esses tempos primitivos. Eles aprenderam que Deus era o “Todo-Poderoso; o Senhor é um guerreiro, o Deus das batalhas, glorioso em poder, que reduz os seus inimigos a pedaços”. “O Senhor vosso Deus caminha em meio ao vosso acampamento, para libertar-vos. ” Os israelitas imaginavam o seu Deus como um Deus que os amava, mas que também havia “endurecido o coração do Faraó” e “amaldiçoado os seus inimigos”.

96:5:8 10587 Conquanto Moisés apresentasse visões fugazes de uma Deidade universal e beneficente aos filhos de Israel, no todo, o conceito cotidiano de Yavé para eles era o de um Deus apenas um pouco melhor do que os deuses tribais dos povos vizinhos. O conceito que tinham de Deus era primitivo, rudimentar e antropomórfico. Quando Moisés morreu, essas tribos de beduínos voltaram rapidamente às idéias semibárbaras dos seus velhos deuses do Horeb e do deserto. A visão ampliada e mais sublime de Deus, que Moisés apresentava, de quando em quando, aos seus líderes, foi logo perdida de vista, pois a maioria do povo voltou-se para a adoração do seu fetiche de bezerros dourados, o símbolo de Yavé para um pastor palestino.

96:5:9 10591 Quando Moisés entregou o comando dos hebreus a Joshua, ele já havia reunido milhares de descendentes colaterais de Abraão, Nahor, Lot e outros das tribos aparentadas, e, à força, já as havia disciplinado em uma nação de guerreiros pastoris, que se auto-sustentava e parcialmente se auto-regulamentava.

6. O CONCEITO DE DEUS DEPOIS DA MORTE DE MOISÉS


96:6:1 10592 Com a morte de Moisés, o seu conceito grandioso de Yavé rapidamente deteriorou-se. Joshua e os líderes de Israel continuaram a abrigar as tradições mosaicas do Deus absolutamente sábio, beneficente e Todo-Poderoso; mas o povo comum voltou rapidamente para as idéias antigas do Yavé do deserto. E essa volta para trás, no conceito da Deidade, continuou a crescer sob o governo sucessivo de vários xeiques tribais, os chamados juízes.

96:6:2 10593 O encanto da personalidade extraordinária de Moisés havia mantido viva, nos corações dos seus seguidores, a inspiração de um conceito de Deus crescentemente ampliado; uma vez, porém, que eles alcançaram as terras férteis da Palestina, eles evoluíram rapidamente, passando de pastores nômades a agricultores estabelecidos e bastante sossegados. E essa evolução, na prática da vida, e essa mudança de ponto de vista religioso demandaram uma quase completa mudança no caráter da sua concepção sobre a natureza do seu Deus, Yavé. Durante os tempos do início da transmutação do austero, rudimentar, exigente e tonitruante deus do deserto, e do Sinai, naquele conceito que surgiu mais tarde, de um Deus de amor, de justiça e de misericórdia, os hebreus quase perderam de vista os ensinamentos elevados de Moisés. Eles chegaram bem perto de separar-se, por inteiro, do conceito do monoteísmo; quase perderam a oportunidade de tornar-se o povo que serviria de elo vital na evolução espiritual de Urântia, de ser o grupo que conservaria os ensinamentos de Melquisedeque, de um único Deus, até os tempos da encarnação outorgada de um Filho daquele Pai de todos.

96:6:3 10594 Desesperadamente, Joshua procurou manter o conceito de um Yavé supremo nas mentes dos homens das tribos, fazendo com que fosse proclamado: “Do mesmo modo que estive com Moisés, também estarei convosco; não vos faltarei nem vos abandonarei”. Joshua julgou necessário pregar com uma palavra rigorosa ao seu povo que desacreditava, um povo que estava muito desejoso de acreditar na sua velha religião nativa e que não estava disposto a ir adiante na religião da fé e da retidão. A ênfase do ensinamento de Joshua passou a ser: “Yavé é um Deus santo; e é um Deus ciumento; ele não perdoará as vossas transgressões nem os vossos pecados”. O conceito mais elevado dessa época pintava Yavé como um “Deus de poder, de julgamento e justiça”.

96:6:4 10595 Mesmo, porém, nessa idade obscura, de quando em quando, um instrutor solitário surgia, proclamando o conceito mosaico da divindade: “Vós, filhos do mal, não podeis servir ao Senhor, pois ele é um Deus santo”. “Pode o homem mortal ser mais justo do que Deus? Pode um homem ser mais puro do que Aquele que o fez?” “Podeis achar Deus, se o buscardes? Podereis descobrir o Todo-Poderoso na sua perfeição? Olhai, Deus é grande, e nós não O conhecemos. Tocando o Todo-Poderoso, nós não podemos encontrá-Lo”.

7. OS SALMOS E O LIVRO DE JÓ


96:7:1 10601 Sob a liderança dos seus xeiques e sacerdotes, os hebreus tornaram-se estabelecidos na Palestina de um modo vago. Logo, porém, eles se voltaram para as crenças pouco iluminadas do deserto, tornando-se contaminados pelas práticas menos avançadas dos cananeus. Transformaram-se em idólatras licenciosos, e a sua idéia da Deidade caiu até muito abaixo dos conceitos egípcio e mesopotâmico de Deus, os quais estavam sendo respeitados por certos grupos sobreviventes de Salém e que estão registrados em alguns dos Salmos e no chamado Livro de Jó.

96:7:2 10602 Os salmos são o trabalho de cerca de vinte autores ou mais; muitos foram escritos por instrutores egípcios e mesopotâmios. Durante esses tempos, enquanto o Levante adorava os deuses da natureza, havia ainda um bom número de pessoas que acreditava na supremacia de El Elyon, o Altíssimo.

96:7:3 10603 Nenhuma coleção de escritos religiosos exprime uma tal riqueza de devoção e de idéias inspiradoras sobre Deus, como o faz o Livro dos Salmos. E seria muito útil se, ao examinar essa maravilhosa coleção de literatura para a adoração, fossem levadas em consideração a fonte e a cronologia de cada hino de louvor e adoração em separado, tendo-se em mente que nenhuma única coleção cobre períodos de tempo tão longos e diversos. Esse Livro dos Salmos é o memorial dos vários conceitos de Deus, nutridos pelos crentes da religião de Salém em todo o Levante, e abrange todo um grande período, desde Amenemope até Isaías. Nos Salmos, Deus é descrito em todas as fases da sua concepção, da idéia rudimentar de uma deidade tribal ao ideal grandemente expandido dos hebreus de um momento posterior, em que Yavé é retratado como um governante amoroso e um misericordioso Pai.

96:7:4 10604 E, quando assim considerado, esse conjunto de Salmos constitui a mais valiosa e útil coleta de sentimentos devocionais que jamais foi reunida pelo homem até os tempos do século vinte. O espírito adorador dessa coleção de hinos transcende o de todos os outros livros sagrados do mundo.

96:7:5 10605 O retrato variegado da Deidade apresentado no Livro de Jó foi o produto de mais de vinte instrutores religiosos da Mesopotâmia, cujo trabalho perdurou ainda por um período de quase trezentos anos. E, quando vós tiverdes acesso ao conceito sublime da divindade, como é encontrado nessa compilação da crença da Mesopotâmia, reconhecereis que na vizinhança de Ur, na Caldéia, é que a idéia de um Deus real foi mais bem preservada durante os dias de obscuridade na Palestina.

96:7:6 10606 Na Palestina, a sabedoria e a onipresença de Deus eram quase sempre compreendidas, mas o seu amor e a sua misericórdia raramente o foram. O Yavé daqueles tempos “envia espíritos maus para dominar as almas dos seus inimigos”; faz prosperar os seus próprios filhos obedientes, enquanto maldiz todos os outros e lhes lança o seu julgamento. “Ele frustra os desígnios dos perversos; e prende os sábios nos seus próprios enganos. ”

96:7:7 10607 Somente em Ur uma voz se levantou, em um brado de defesa da misericórdia de Deus, dizendo: “Aquele que orar a Deus receberá o favorecimento dele e, em júbilo, verá a sua face, pois Deus dará ao homem a dádiva da divina retidão”. Assim é que, de Ur, é pregada a salvação, o favorecimento divino, pela fé: “Ele é cheio de graças para com o arrependido, dizendo-lhe:‘livrai-o de descer ao fundo do precipício, pois lhe encontrei um resgate. ’ Se alguém diz: ‘Eu pequei e perverti aquilo que era o direito, e isso não me foi de nenhum proveito’, Deus libertará a sua alma de ir para o fundo, e ele verá a luz”. Desde os tempos de Melquisedeque, que o mundo do Levante não escutava uma mensagem tão ressonante e encorajadora de salvação humana, como esse ensinamento extraordinário de Eliu, o profeta de Ur e sacerdote dos crentes de Salém, isto é, o remanescente daquela que foi a colônia de Melquisedeque na Mesopotâmia.

96:7:8 10611 E assim, pois, os remanescentes dos missionários de Salém, na Mesopotâmia, conservaram a luz da verdade durante o período de desorganização dos povos hebreus até o aparecimento do primeiro daquela longa linhagem de instrutores de Israel; instrutores que nunca pararam na sua elaboração, conceito após conceito, até que houvessem chegado à realização do ideal sobre o Pai Universal e Criador de todos, o apogeu da evolução do conceito de Yavé.

96:7:9 10612 [Apresentado por um Melquisedeque de Nebadon.]

DOCUMENTO 97

A EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE DEUS ENTRE OS HEBREUS
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Os líderes espirituais dos hebreus realizaram o que outros antes deles jamais tinham tido êxito em fazer – eles desantropomorfizaram o seu conceito de Deus sem convertê-lo em uma abstração da Deidade, compreensível apenas para os filósofos. Até mesmo a gente comum era capaz de considerar o conceito amadurecido de Yavé com um Pai, se não do indivíduo, pelo menos da raça.

97:0:2 10622 O conceito da personalidade de Deus, como claramente ensinado em Salém na época de Melquisedeque, era já vago e nebuloso na época da fuga do Egito e só evoluiu gradualmente na mente hebraica, de geração para geração, como uma resposta ao ensinamento dos líderes espirituais. A percepção da personalidade de Yavé foi muito mais contínua na sua evolução progressiva do que o foi a de muitos outros atributos da Deidade. Desde Moisés a Malaquias, ocorreu um crescimento ideacional quase contínuo da personalidade de Deus na mente hebraica, e esse conceito foi finalmente elevado e glorificado pelos ensinamentos de Jesus sobre o Pai no céu.

1. SAMUEL – O PRIMEIRO DOS PROFETAS HEBREUS


97:1:1 10623 As pressões hostis dos povos vizinhos na Palestina logo ensinaram aos xeiques hebreus que eles não poderiam esperar sobreviver a menos que confederassem as suas organizações tribais em um governo central. E essa centralização da autoridade administrativa permitiu uma oportunidade melhor para que Samuel funcionasse como um instrutor e reformador.

97:1:2 10624 Samuel vinha de uma longa linhagem de instrutores de Salém, que haviam persistido em manter as verdades de Melquisedeque como uma parte das suas formas de adoração. Esse instrutor era um homem vigoroso e resoluto. Só a sua grande devoção, combinada à sua extraordinária determinação, capacitou-o a suportar a oposição quase universal que encontrou quando ele começou a fazer quase toda Israel voltar à adoração do supremo Yavé dos tempos mosaicos. E, mesmo então, teve um êxito apenas parcial; ganhou de volta para o serviço do conceito mais elevado de Yavé apenas a metade mais inteligente dos hebreus; a outra metade continuou na adoração dos deuses tribais do país e atida aos conceitos mais baixos de Yavé.

97:1:3 10625 Samuel era um tipo de homem rústico, um reformador prático que podia sair com os seus companheiros em um dia e destruir uma série de locais reservados a Baal. O progresso que fez foi puramente pela força da coação; ele fez pouca pregação, e menos ainda deu ensinamentos, mas agia. Num dia zombava do sacerdote de Baal; no dia seguinte, partia em pedaços um rei aprisionado. Ele acreditava devotamente em um único Deus, e tinha um conceito claro desse único Deus como criador do céu e da Terra: “Os pilares da Terra são do Senhor, e Ele colocou o mundo sobre eles”.

97:1:4 10631 Mas a grande contribuição que Samuel deu ao desenvolvimento do conceito da Deidade foi o seu pronunciamento retumbante de que Yavé era imutável, para sempre a mesma corporificação de perfeição infalível e divindade. Nessa época Yavé fora concebido para ser um Deus de humores vacilantes, de acessos de ciúme, sempre lamentando que tinha feito assim e assado; mas agora, pela primeira vez desde que os hebreus haviam fugido do Egito, eles ouviam estas palavras surpreendentes: “A força de Israel não mentirá nem se arrependerá, pois ele não é um homem para poder se arrepender”. A estabilidade ao lidar-se com a Divindade estava proclamada. Samuel reiterou a aliança feita por Melquisedeque com Abraão e declarou que o Senhor Deus de Israel era a fonte de toda a verdade, estabilidade e constância. Os hebreus tinham sempre visto o seu Deus como um homem, um super-homem, um espírito elevado de origem desconhecida; mas agora eles ouviam o espírito antigo de Horeb, exaltado como um Deus imutável de perfeição criadora. Samuel estava ajudando o conceito em evolução de Deus a ascender a alturas acima do estado mutante da mente do homem e das vicissitudes da existência mortal. Sob esse ensinamento, o Deus dos hebreus começava, de uma idéia gerada na ordem dos deuses tribais, a ascender até o ideal de um Criador Todo-Poderoso e imutável, o Supervisor de toda a criação.

97:1:5 10632 E, de novo, ele pregou a história da sinceridade de Deus, da aliança com Ele, e da confiança que se podia ter de que manteria essa aliança. Samuel disse: “O Senhor não abandonará o seu povo”. “Ele fez conosco uma aliança eterna, ordenada e segura em todas as coisas. ” E assim, em toda a Palestina soou o chamado para a adoração do supremo Yavé. E esse instrutor cheio de energia proclamou para sempre: “Tu és grande, Ó Senhor Deus, e não há nenhum como Tu, e não há nenhum Deus além de Ti”.

97:1:6 10633 Até então os hebreus tinham considerado o favorecimento de Yavé principalmente em termos de prosperidade material. Foi um grande choque para Israel e quase custou a Samuel a sua vida quando ele ousou proclamar: “O Senhor enriquece e empobrece; ele rebaixa e exalta. Ele tira o pobre do pó e eleva os mendigos e os coloca junto de príncipes para fazê-los herdar o trono da glória”. Jamais, desde Moisés, tais promessas confortantes aos humildes e aos menos afortunados foram proclamadas, e milhares de desesperados entre os pobres começaram a ter esperança de que podiam melhorar o seu status espiritual.

97:1:7 10634 Mas Samuel não progrediu até muito longe com o conceito de um deus tribal. Ele proclamou um Yavé que criou todos os homens, mas que se ocupava principalmente dos hebreus, o seu povo escolhido. Ainda assim, como nos dias de Moisés, uma vez mais o conceito de Deus retratava uma Deidade que é santa e justa. “Não há quem seja santo como o Senhor. Quem pode ser comparado a esse santo Senhor Deus?”

97:1:8 10635 Com o passar dos anos, o velho e grisalho líder progrediu na compreensão de Deus, pois declarou: “O Senhor é um Deus de conhecimento, e as ações são pesadas por Ele. O Senhor julgará os confins da Terra, demonstrando misericórdia aos misericordiosos, e com o homem reto Ele será também reto”. Aqui mesmo está a alvorada da misericórdia, se bem que ela seja limitada àqueles que são misericordiosos. Mais tarde foi um passo mais adiante quando, na sua adversidade, exortou o seu povo: “Que caiamos agora nas mãos do Senhor, pois as suas misericórdias são grandes”. “Nada coíbe o Senhor de salvar muitos ou poucos. ”

97:1:9 10636 E esse desenvolvimento gradual do conceito do caráter de Yavé continuou sob a ministração dos sucessores de Samuel. Eles tentaram apresentar Yavé como um Deus cumpridor de alianças, mas não avançaram até onde Samuel tinha chegado; eles falharam ao desenvolver a idéia da misericórdia de Deus como Samuel a tinha posteriormente concebido. Houve um recuo nítido no sentido de reconhecer outros deuses, a despeito da conservação do ponto de que Yavé estava acima de todos. “Teu é o Reino, ó Senhor, e és exaltado como o principal, acima de todos. ”

97:1:10 10641 O poder divino foi a tônica dessa era; os profetas dessa idade pregaram uma religião destinada a fortalecer o rei no trono hebreu. “Teus, ó Senhor, são a grandeza, o poder, a glória e a vitória e a majestade. Na Tua mão está a força e o poder, e és capaz de engrandecer a tudo e de dar força a todos. ” E esse era o status do conceito de Deus durante a época de Samuel e seus sucessores imediatos.

2. ELIAS E ELIZEU


97:2:1 10642 No século dez antes de Cristo, a nação hebraica dividiu-se em dois reinos. Em ambas as divisões políticas, vários buscadores da verdade tentaram estancar a maré retrógrada de decadência espiritual que se desencadeara, e que prosseguiu desastrosamente depois da guerra de separação. Mas esses esforços para avançar a religião hebraica não tiveram efeito até que Elias, um guerreiro determinado e destemido da retidão, começou os seus ensinamentos. Elias restaurou, para o reino do norte, um conceito de Deus comparável àquele mantido nos dias de Samuel. Elias teve pouca oportunidade de apresentar um conceito avançado de Deus; ele se manteve ocupado, como Samuel tinha estado, antes dele, em destruir os altares de Baal e em demolir os ídolos dos falsos deuses. E levou adiante as suas reformas, fazendo frente à oposição de um monarca idólatra; a sua tarefa foi até mesmo mais gigantesca e difícil do que aquela enfrentada por Samuel.

97:2:2 10643 Quando Elias foi chamado a deixar a Terra, Elizeu, o seu fiel companheiro, tomou a sua obra e, com a valiosa ajuda do pouco conhecido Micaías, manteve viva a luz da verdade na Palestina.

97:2:3 10644 Mas esses não eram tempos de progresso para o conceito da Deidade. Os hebreus não tinham ainda ascendido nem mesmo ao ideal mosaico. A era de Elias e Elizeu fechou-se com as classes melhores, voltando à adoração do Yavé supremo, e testemunhou a restauração, até o ponto em que Samuel a tinha deixado, da idéia do Criador Universal.

3. YAVÉ E BAAL


97:3:1 10645 A prolongada controvérsia entre os crentes de Yavé e os seguidores de Baal foi um conflito socioeconômico de ideologias mais do que uma diferença entre crenças religiosas.

97:3:2 10646 Os habitantes da Palestina diferiam pela sua atitude para com a propriedade privada de terras. As tribos sulinas ou de árabes nômades (os Yavéitas) consideravam a terra como inalienável – como uma dádiva da Deidade ao clã. Eles sustentavam que a terra não podia ser vendida nem hipotecada. “Yavé falou, dizendo: ‘A terra não será vendida, pois a terra é minha’”.

97:3:3 10647 Os cananeus do norte, mais estabelecidos (os baalitas), compravam livremente, vendiam e hipotecavam as suas terras. A palavra Baal significa proprietário. O culto de Baal foi baseado em duas doutrinas maiores: a primeira, a validação do intercâmbio da propriedade, contratos e pactos – o direito de comprar e de vender a terra. E a segunda, supunha-se que Baal devia mandar a chuva – ele era um deus da fertilidade do solo. As boas colheitas dependiam do favorecimento de Baal. O seu culto preocupava-se amplamente com a terra, a sua propriedade e fertilidade.

97:3:4 10651 Em geral, os baalitas possuíam casas, terras e escravos. Eles eram os proprietários aristocráticos e viviam nas cidades. Cada Baal tinha um local sagrado, um sacerdócio e as “mulheres sagradas”, as prostitutas rituais.

97:3:5 10652 Dessa diferença básica de pontos de vista sobre a terra, evoluíram os antagonismos amargos, nas atitudes sociais, econômicas, morais e religiosas tomadas pelos cananeus e pelos hebreus. Essa controvérsia socioeconômica não se tornou uma questão religiosa definida até os tempos de Elias. Desde a época desse agressivo profeta, a questão era disputada em linhas mais estritamente religiosas – Yavé versus Baal – e terminou com o triunfo de Yavé e com o subseqüente avanço até o monoteísmo.

97:3:6 10653 Elias transladou a controvésia entre Yavé e Baal, da questão da terra, para o aspecto religioso das ideologias dos hebreus e dos cananeus. Quando Acab assassinou os Nabots por causa da intriga na posse da terra, Elias transformou os antigos costumes sobre a terra em uma questão moral, e deslanchou a sua vigorosa campanha contra os baalitas. Essa foi também uma luta do povo do campo contra a dominação das cidades. E, sobretudo, foi sob a influência de Elias que Yavé transformou-se em Eloim. O profeta começou como um reformador agrário e terminou exaltando a Deidade. Os Baalitas eram muitos, Yavé era um – o monoteísmo sobrepondo-se ao politeísmo.

4. AMOS E OSÉIAS


97:4:1 10654 Um grande passo na transição do deus tribal – o deus a quem se tinha servido já há tanto tempo com sacrifícios e cerimônias, o Yavé dos hebreus mais primitivos – até um Deus que puniria o crime e a imoralidade, até mesmo entre os do seu próprio povo, foi dado por Amós, que surgiu de entre as colinas do sul para denunciar a criminalidade, a embriaguez, a opressão e a imoralidade das tribos do norte. Desde os tempos de Moisés que essas verdades ressoantes não eram proclamadas na Palestina.

97:4:2 10655 Amós não se limitou meramente a restaurar ou a reformar; ele era um descobridor dos novos conceitos da Deidade. Ele proclamou, sobre Deus, muito daquilo que tinha sido anunciado pelos seus predecessores e, corajosamente, investiu contra a crença em um Ser Divino que toleraria o pecado entre aqueles do chamado povo escolhido. Pela primeira vez, desde os tempos de Melquisedeque, os ouvidos do homem ouviam a denúncia da duplicidade de padrão da justiça e da moralidade nacional. Pela primeira vez na sua história os ouvidos hebreus escutaram que o seu próprio Deus, Yavé, não toleraria o crime e o pecado nas vidas deles, mais do que ele os tolerava junto a qualquer outro povo. Amós visualizou o Deus austero e justo de Samuel e Elias, mas ele também viu um Deus que não via os hebreus de modo diferente de qualquer outra nação quando se tratava da punição ao procedimento incorreto. Isso era um ataque direto à doutrina egoísta do “povo escolhido”, e muitos hebreus daquela época ressentiram-se amargamente disso.

97:4:3 10656 Disse Amós: “Buscai aquele que fez as montanhas e criou o vento, que formou as sete estrelas e Órion, que transforma a sombra da morte na manhã e faz o dia escurecer na noite”. E, ao denunciar os seus companheiros de meia religião, de oportunistas, e algumas vezes, até de imorais, ele buscava retratar a justiça inexorável de um Yavé imutável, quando ele disse aos malfeitores: “Ainda que eles penetrem no inferno, de lá Eu tirá-los-ei; ainda que eles subam ao céu, de lá Eu farei com que desçam”. “E ainda que eles caiam em cativeiro diante dos seus inimigos, até lá Eu conduzirei a espada da justiça e ela matá-los-á. ” Amós surpreendeu ainda mais aos seus ouvintes quando, apontando um dedo de reprovação e de acusação para eles, declarou em nome de Yavé: “Com certeza nunca me esquecerei de nenhum dos vossos feitos”. “E passarei no crivo a casa de Israel, junto com todas as nações, como o trigo tem de ser passado na peneira. ”

97:4:4 10661 Amós proclamou Yavé o “Deus de todas as nações” e advertiu aos israelitas, de que o ritual não deve tomar o lugar da retidão. E antes que esse corajoso instrutor fosse apedrejado até a morte, ele tinha já espalhado suficientemente o fermento da verdade para salvar a doutrina do supremo Yavé; ele assegurara a continuidade da evolução da revelação de Melquisedeque.

97:4:5 10662 Oséias veio depois de Amós, com a sua doutrina de um Deus universal de justiça por meio da ressurreição do conceito mosaico de um Deus de amor. Oséias pregou o perdão por meio do arrependimento, não pelo sacrifício. Ele proclamou um evangelho de amor-bondade e a divina misericórdia dizendo: “Eu te desposarei para sempre; sim, eu me unirei a ti na retidão e no julgamento e no amor-bondade das misericórdias. Eu desposar-te-ei mesmo na fé”. “Eu amá-lo-ei livremente, pois a minha ira foi-se embora. ”

97:4:6 10663 Oséias continuou fielmente com as advertências morais de Amós, dizendo de Deus: “É do meu desejo que eu os castigue”. Mas os israelitas consideraram como uma crueldade que beirava a traição quando ele disse: “Eu direi àqueles que não eram do meu povo: ‘vós sois o meu povo’; e eles dirão: ‘Tu és o nosso Deus’”. Ele continuou a pregar o arrependimento e o perdão, dizendo: “Eu curarei a apostasia deles; e amá-los-ei livremente, pois a minha ira terminou”. Oséias sempre proclamou a esperança e o perdão. A carga da sua mensagem foi sempre: “Eu terei misericórdia para com o meu povo. Eles não conhecerão outro Deus além de Mim, pois não há outro salvador além de Mim”.

97:4:7 10664 Amós vivificou a consciência nacional dos hebreus para o reconhecimento de que Yavé não iria fechar os olhos para o crime e o pecado entre eles, porque supostamente eles eram o povo escolhido, enquanto Oséias tocou as notas de abertura nas cordas misericordiosas posteriores da compaixão e do amor-bondade divinos, que foram tão extraordinariamente cantadas por Isaías e pelos seus agregados.

5. O PRIMEIRO ISAÍAS


97:5:1 10665 Esses eram os tempos em que alguns estavam proclamando ameaças de punição contra os pecados pessoais e o crime nacional entre os clãs do norte; enquanto outros prediziam a calamidade em recompensa pelas transgressões do reino do sul. Foi na aurora desse despertar de consciência e conhecimento das nações hebraicas que o primeiro Isaías surgiu.

97:5:2 10666 Isaías pregou a natureza eterna de Deus, sua sabedoria infinita, sua perfeição imutável de confiabilidade. Ele representou o Deus de Israel quando disse: “Ajustarei o juízo na linha e no prumo da retidão”. “O Senhor dar-vos-á descanso para a vossa tristeza e para o vosso medo e para a dura escravidão em que o homem foi levado a servir. ”“E os vossos ouvidos ouvirão uma palavra atrás de vós, dizendo: ‘este é o caminho, vá por ele’”. “Eis que Deus é a minha salvação; eu confiarei e não terei medo, pois o Senhor é a minha força e a minha canção. ” “‘Vinde agora e raciocinemos juntos’, diz o Senhor, ‘embora os vossos pecados sejam tão escarlates, eles ficarão brancos como a neve; embora sejam vermelhos como o carmesim, eles ficarão como a lã’”.

97:5:3 10667 Falando aos hebreus, tomados pelo medo e famintos de alma, esse profeta disse: “Levantai-vos e resplandecei, pois a vossa luz chegou, e a glória do Senhor nasceu para vós”. “O espírito do Senhor está sobre mim, pois Ele me ungiu para pregar as boas-novas aos mansos; Ele enviou-me para curar aqueles que estão de coração partido, para proclamar a liberdade aos cativos e a abertura da prisão para os acorrentados. ” “Eu me rejubilarei grandemente no meu Senhor, a minha alma ficará jubilosa no meu Deus, pois Ele cobriu-me com as vestes da salvação e cobriu-me com o Seu manto de retidão”. “Junto com todas as Suas aflições Ele esteve aflito, e o anjo da Sua presença salvou-os. No Seu amor e na Sua piedade Ele os redimiu. ”

97:5:4 10671 Isaías foi seguido por Micas e por Abdias, que confirmaram e deram beleza ao seu evangelho que satisfazia à alma. E esses dois mensageiros valentes denunciaram ousadamente que o ritual dos hebreus era limitado pelos sacerdotes e destemidamente atacaram todo o sistema de sacrifícios.

97:5:5 10672 Micas denunciou “os governantes que decidem segundo as recompensas e os sacerdotes que ensinam por um salário e os profetas que adivinham por dinheiro”. Ele ensinou sobre um dia em que viria a liberdade da superstição e do sacerdócio, dizendo: “Mas cada homem assentar-se-á na sua própria vinha, e ninguém o amedrontará, pois todo o povo viverá, cada um de acordo com o seu entendimento de Deus”.

97:5:6 10673 E a ênfase da mensagem de Micas foi: “Devo estar diante de Deus oferecendo holocaustos? O Senhor ficará contente com mil carneiros ou com dez mil rios de óleo? Devo dar o meu primogênito pela minha transgressão, o fruto do meu corpo pelo pecado da minha alma? Ele mostrou-me, ó homens, o que é bom; e o que o Senhor espera de vós, senão agirdes com justiça e amardes a misericórdia, e que caminheis humildemente como o vosso Deus”. E foi uma grande idade; foram de fato tempos apaixonantes em que o homem mortal ouviu as mensagens emancipadoras, e alguns até mesmo acreditaram nelas, há mais de dois milênios e meio atrás. E não fora a resistência obstinada dos sacerdotes, esses instrutores teriam posto abaixo todo o cerimonial de sangue do ritual hebreu de adoração.

6. JEREMIAS, O DESTEMIDO


97:6:1 10674 Embora vários instrutores continuassem a expor o evangelho de Isaías, coube a Jeremias ousar dar o próximo passo para a internacionalização de Yavé, o Deus dos hebreus.

97:6:2 10675 Jeremias declarou sem medo que Yavé não estava do lado dos hebreus nas suas lutas militares contra outras nações. Ele afirmou que Yavé era o Deus de toda a Terra, de todas as nações e de todos os povos. Os ensinamentos de Jeremias causaram um crescendo na onda da internacionalização do Deus de Israel; esse pregador intrépido proclamou finalmente, e para sempre, que Yavé era o Deus de todas as nações, e que não havia Osíris para os egípcios, nem Bel para os babilônios, Assur para os Assírios ou Dagon para os filisteus. E, assim, nessa época e depois dela, a religião dos hebreus participou da renascença do monoteísmo em todo o mundo; afinal, o conceito de Yavé tinha elevado-se ao nível de uma Deidade planetária e mesmo da dignidade cósmica. Mas muitos dos condiscípulos de Jeremias acharam difícil conceber Yavé fora da nação hebraica.

97:6:3 10676 Jeremias também pregou sobre o Deus justo e amoroso descrito por Isaías, declarando: “Sim, eu amei-vos com um amor eterno; com isso eu vos atraí com amor e bondade”. “E, pois, Ele não aflige propositalmente os filhos dos homens. ”

97:6:4 10677 Disse o destemido profeta: “Justo é o nosso Senhor, grande pelos seus conselhos e poderoso pela sua obra. Os seus olhos estão abertos sobre todos os caminhos de todos os filhos dos homens, para dar misericórdia a cada um de acordo com o seu caminho e de acordo com o fruto da sua obra”. Mas foi considerado como uma traição blasfema quando, durante o cerco de Jerusalém, ele disse: “E agora eu coloquei essas terras nas mãos de Nabucodonossor, rei da Babilônia, meu servo”. E, quando Jeremias aconselhou que a cidade se rendesse, os sacerdotes e os governantes civis jogaram-no no fosso lamacento de uma masmorra sombria.

7. O SEGUNDO ISAÍAS


97:7:1 10681 A destruição da nação dos hebreus e o seu cativeiro na Mesopotâmia teriam causado grandes benefícios à sua teologia em expansão, não fora a ação limitada do seu sacerdócio. A sua nação tinha caído diante dos exércitos da Babilônia, e o seu Yavé nacionalista sofria com as pregações internacionais dos líderes espirituais. Foi o ressentimento pela perda do seu Deus nacional que levou os sacerdotes judeus a irem tão longe na invenção de fábulas e na multiplicação de eventos aparentemente miraculosos na história do povo hebreu, num esforço para restaurar os judeus como o povo escolhido, até mesmo sob o aspecto de terem uma idéia expandida de um Deus internacionalizado e de todas as nações.

97:7:2 10682 Durante o cativeiro, os judeus foram muito influenciados pelas tradições e lendas babilônicas, se bem que deva ser notado que eles certamente aprimoraram o tônus moral e a significação espiritual das histórias caldéias que adotaram; não obstante terem eles distorcido invariavelmente essas lendas, de modo a refletirem honra e glória sobre a ascendência e a história de Israel.

97:7:3 10683 Esses sacerdotes e escribas hebreus tinham uma só idéia nas suas mentes, e esta era a reabilitação da nação judaica, a glorificação das tradições hebraicas e a exaltação da sua história racial. Caso haja algum ressentimento pelo fato de esses sacerdotes terem amarrado as suas idéias errôneas a uma parte tão grande do mundo ocidental, deveria ser lembrado que eles não o fizeram intencionalmente; eles não pretenderam estar escrevendo sob nenhuma inspiração; eles não professaram estar escrevendo um livro sagrado. Estavam meramente preparando um manual destinado a reanimar a coragem que definhava, nos seus companheiros de cativeiro. Eles tinham a intenção clara de melhorar o espírito nacional e a moral dos seus compatriotas. Aos homens que viessem mais tarde, cabia reunir esses e outros escritos em um livro-guia de ensinamentos supostamente sem falhas.

97:7:4 10684 O sacerdócio judeu fez um uso indiscriminado desses escritos depois do cativeiro, mas foi bastante estorvado na sua influência sobre os seus companheiros no cativeiro pela presença de um profeta jovem e indômito, Isaías, o segundo, que tinha sido plenamente convertido ao Deus de justiça, de amor, de retidão e misericórdia, do Isaías anterior. Como Jeremias ele também acreditava que Yavé tinha transformado-se no Deus de todas as nações. Ele pregava essas teorias sobre a natureza de Deus com uma narrativa de tais repercussões, que fez conversões tanto de judeus como dos seus captores. E esse jovem pregador deixou por escrito os seus ensinamentos, os quais os sacerdotes hostis e impiedosos tentaram dissociar dele de todos os modos, embora o respeito puro pela sua beleza e grandeza tenha levado à sua incorporação aos escritos do primeiro Isaías. E assim os escritos desse segundo Isaías podem ser encontrados no livro que leva o seu nome, e abrangem desde o capítulo quarenta até o cinqüenta e cinco, inclusive.

97:7:5 10685 Nenhum profeta ou líder religioso desde Maquiventa até a época de Jesus alcançou o elevado conceito de Deus que o segundo Isaías proclamou durante esses dias do cativeiro. O que esse líder espiritual proclamou não foi nenhum Deus pequeno, antropomórfico e elaborado pelo homem. “Vede, ele carrega ilhas como se fossem coisas muito pequenas. ” “E como os céus estão mais no alto do que as terras, também os meus caminhos são mais elevados que os vossos caminhos e os meus pensamentos mais elevados do que os vossos pensamentos. ”

97:7:6 10691 Maquiventa Melquisedeque podia enfim ver instrutores humanos proclamando um Deus real ao homem mortal. Como Isaías, o primeiro, esse líder pregou o Deus da criação universal e da sustentação universal. “Eu fiz a Terra e coloquei o homem nela. Não a criei em vão; formei-a para ser habitada. ”“Sou o primeiro e o último; não há Deus além de mim. ” Falando pelo Senhor Deus de Israel, esse novo profeta disse: “Os céus podem desaparecer e a Terra envelhecer, mas a minha retidão subsistirá para sempre e a minha salvação durará de geração a geração”. “Não temais, pois estou contigo; não vos desanimeis, pois sou o vosso Deus. ” “Não há Deus além de Mim – um Deus justo e um Salvador. ”

97:7:7 10692 E os judeus prisioneiros foram reconfortados, como milhares e milhares de homens o foram desde então, ao ouvir palavras como: “Assim diz o Senhor: ‘Eu vos criei, Eu vos redimi, Eu vos chamei pelo vosso nome; vós sois meus’”. “Quando atravessardes as águas, Eu estarei convosco, pois sois preciosos para a minha vista. ” “Pode uma mulher esquecer de amamentar a sua criança e não ter compaixão do seu filho? Sim, ela pode esquecer, mas Eu não esquecerei dos meus filhos, pois, vede, Eu gravei os nomes deles na palma da minha mão; e os cobri mesmo com a sombra das minhas mãos. ”“Que os perversos abandonem os seus caminhos e que o iníquo abandone os seus pensamentos, e que retornem ao Senhor e a Deus e Ele terá misericórdia deles, pois Ele os perdoará abundantemente. ”

97:7:8 10693 Ouvi novamente ao evangelho dessa nova revelação do Deus de Salém: “Ele alimentará o seu rebanho como um pastor; Ele reunirá as ovelhas nos seus braços e carregá-las-á no seu peito. Ele dá força aos abatidos, e àqueles que não têm poder Ele dá mais força. Aqueles que esperam o Senhor renovarão as suas forças; eles subirão com asas como águias; correrão e não se cansarão; caminharão e não se enfraquecerão”.

97:7:9 10694 Esse Isaías conduziu uma vasta propaganda evangélica do conceito ampliado de um Yavé supremo. Ele rivalizava-se com Moisés, pela eloqüência com a qual retratava o Senhor Deus de Israel, como o Criador Universal. Era poético na sua descrição dos atributos infinitos do Pai Universal. Nenhuma afirmação mais bela sobre o Pai celeste jamais foi feita. Como os salmos, os escritos de Isaías estão entre as apresentações mais sublimes e verdadeiras do conceito espiritual de Deus a serem acolhidas pelos ouvidos do homem mortal antes da chegada de Michael em Urântia. Ouvi esta descrição que ele faz da Deidade: “Eu sou o elevado e sublime que habita a eternidade”. “Sou o Primeiro e o Último, e além de mim não há outro Deus. ”“E a mão do Senhor não é curta a ponto de não poder salvar, nem o seu ouvido tão grosseiro a ponto de não ouvir. ” E uma nova doutrina surgiu no mundo judeu quando esse profeta benigno, mas cheio de autoridade, persistiu na pregação da constância divina, a fidelidade de Deus. Ele declarou que “Deus não esqueceria nem abandonaria”.

97:7:10 10695 Esse ousado instrutor proclamou que o homem estava muito estreitamente relacionado a Deus, dizendo: “Eu criei para a minha glória todo aquele que chama o meu nome, e eles proclamarão a minha louvação. E sim, Eu próprio, sou Aquele que ameniza as suas transgressões, para o meu próprio bem, e Eu não me lembrarei dos seus pecados”.

97:7:11 10696 Ouvi esse grande hebreu colocar abaixo o conceito de um Deus nacional enquanto na glória ele proclama a divindade do Pai Universal, de quem ele diz: “Os céus são o meu trono, e a Terra onde ponho os pés”. E o Deus de Isaías não era menos santo, majestático, justo e insondável. O conceito do Yavé irado, vingativo e ciumento dos beduínos do deserto quase desapareceu. Um novo conceito do Yavé supremo e universal surgiu na mente do homem mortal para não mais ser perdido da vista humana. A realização da justiça divina começou a anular a magia primitiva e o medo biológico. Afinal, o homem se vê inserido em um universo de lei e de ordem e é apresentado a um Deus universal de atributos confiáveis e definitivos.

97:7:12 10701 E esse homem que pregou sobre um Deus superno nunca cessou de proclamar esse Deus de amor. “Resido em um lugar elevado e santo, e também com aquele que é de um espírito contrito e humilde. ” E mais palavras de conforto esse grande instrutor disse aos seus contemporâneos: “E o Senhor te guiará continuamente e satisfará a tua alma. Tu serás como um jardim bem regado e como uma fonte cujas águas não falham. E, caso o inimigo venha como uma inundação, o espírito do Senhor levantará uma defesa contra ele”. E uma vez mais o evangelho de Melquisedeque, destruidor de medos, e a religião de Salém, gerando confiança, brilharam para abençoar a humanidade.

97:7:13 10702 O clarividente e corajoso Isaías definitivamente eclipsou o Yavé nacionalista com a sua descrição sublime da onipotência e da majestade universal do Yavé supremo, Deus de amor, soberano do universo, e pai afetuoso de toda a humanidade. Desde esses dias memoráveis que o conceito mais elevado de Deus, no Ocidente, tem englobado a justiça universal, a misericórdia divina e a retidão eterna. Com uma linguagem magnífica e com uma incomparável graça, esse grande educador descreveu o Criador Todo-Poderoso como o Pai pleno de amor.

97:7:14 10703 Esse profeta do tempo do cativeiro pregou ao seu povo e aos homens de muitas nações, os quais o ouviram no rio, na Babilônia. E esse segundo Isaías muito fez para neutralizar os muitos conceitos errados e racialmente egoístas sobre a missão do Messias prometido. Todavia ele não foi totalmente bem sucedido. Caso os sacerdotes não se tivessem dedicado à obra de edificar um nacionalismo errôneo, os ensinamentos dos dois Isaías teriam preparado o caminho para o reconhecimento e o acolhimento do Messias prometido.

8. A HISTÓRIA SAGRADA E A HISTÓRIA PROFANA


97:8:1 10704 O hábito de consultar o registro das experiências dos hebreus como uma história sagrada e às transações do resto do mundo como história profana é responsável por muitas das confusões existentes na mente humana quanto à interpretação da história. E essa dificuldade surge porque não há uma história secular dos judeus. Depois que os sacerdotes exilados na Babilônia prepararam o seu novo registro dos procedimentos supostamente miraculosos de Deus, para com os hebreus, a história sagrada de Israel, retratada no Antigo Testamento, eles destruíram meticulosa e completamente os registros existentes dos assuntos hebreus – livros como “Os atos dos Reis de Israel” e “Os atos dos Reis de Judá”, junto com vários outros arquivos mais ou menos acurados da história dos hebreus.

97:8:2 10705 No intuito de compreender como a pressão devastadora e a coerção inescapável da história secular aterrorizaram tanto os judeus prisioneiros, e governados por outros povos, a ponto de eles tentarem reescrever e remodelar completamente a sua história, é que deveríamos pesquisar rapidamente os arquivos da sua desconcertante experiência nacional. Deve ser lembrado que os judeus não tiveram êxito em fazer evoluir uma filosofia não teológica adequada para a vida. Eles lutaram contra o seu conceito original e egípcio das recompensas divinas pela retidão, combinadas às severas punições para o pecado. O drama de Jó foi algo como um protesto contra essa filosofia errônea. O evidente pessimismo do Eclesiastes foi uma sábia reação temporal a essas crenças superotimistas na Providência.

97:8:3 10711 Mas quinhentos anos de suserania, de governantes estrangeiros, mesmo para judeus pacientes e resignados, é demasiado. Os profetas e os sacerdotes começaram a gritar: “Até quando, ó Senhor, até quando?” E quando o judeu honesto buscou as escrituras, a sua perplexidade tornou-se mais confusa. Um antigo vidente prometeu que Deus protegeria e libertaria o seu “povo escolhido”. Amós fizera ameaças de que Deus abandonaria Israel, a menos que o povo restabelecesse os seus padrões de retidão nacional. O escriba do Deuteronômio tinha retratado a Grande Escolha – como entre o bem e o mal, o abençoado e o maldito. Isaías, o primeiro, tinha pregado sobre um rei libertador benigno. Jeremias tinha proclamado uma era de retidão interior – a aliança escrita nas tábuas do coração. O segundo Isaías falou da salvação pelo sacrifício e pela redenção. Ezequiel proclamou a libertação por meio do serviço da devoção, e Ezdras prometeu a prosperidade pela adesão à lei. Mas a despeito de tudo isso eles ficaram na escravidão; e a libertação foi protelada. Então Daniel apresentou o drama da “crise” iminente – o golpe dado sobre a grande imagem e o estabelecimento imediato do reino eterno da retidão, o reino messiânico.

97:8:4 10712 E toda essa falsa esperança levou a um tal grau de desapontamento, e de frustração racial, que os líderes dos judeus ficaram tão confusos que não conseguiram reconhecer nem aceitar a missão e o ministério de um Filho divino do Paraíso quando em breve ele veio a eles à semelhança da carne mortal – encarnado como o Filho do Homem.

97:8:5 10713 Todas as religiões modernas têm errado seriamente na tentativa de interpretar como miraculosas algumas épocas da história humana. Ainda que seja verdade que Deus tem muitas vezes metido a mão de Pai, com intervenções providenciais, na corrente dos assuntos humanos, é um erro encarar os dogmas teológicos e a superstição religiosa como uma sedimentação supranatural que tenha surgido por uma ação miraculosa nessa corrente da história humana. O fato de que os “Altíssimos governam nos reinos dos homens” não converte a história secular em uma chamada história sagrada.

97:8:6 10714 Os autores do Novo Testamento e os escritores cristãos posteriores complicaram ainda mais a distorção da história dos hebreus pelas suas tentativas bem-intencionadas de considerar os profetas judeus como transcendentalizantes. Assim a história hebraica tem sido explorada de um modo desastroso pelos escritores judeus, bem como pelos cristãos. A história hebraica secular tem sido radicalmente dogmatizada. Tem sido convertida em uma ficção da história sagrada e tem tornado-se inextricavelmente emaranhada aos conceitos morais e aos ensinamentos religiosos das nações chamadas cristãs.

97:8:7 10715 Uma breve exposição dos pontos altos na história hebraica poderá ilustrar como os fatos em arquivo foram bastante alterados pelos sacerdotes judeus, na Babilônia, de modo a transformar a história secular cotidiana do seu povo em uma história fictícia e sagrada.

9. A HISTÓRIA HEBRAICA


97:9:1 10716 Nunca existiram doze tribos de israelitas – apenas três ou quatro tribos estabeleceram-se na Palestina. A nação hebraica passou a existir em conseqüência da união dos chamados israelitas e dos cananeus. “E os filhos de Israel habitaram entre os cananeus. E tomaram as filhas deles como esposas e deram as próprias filhas aos filhos dos cananeus. ” Os hebreus nunca expulsaram os cananeus da Palestina, não obstante os registros feitos pelos sacerdotes dessas coisas declararem decididamente que o fizeram.

97:9:2 10721 A consciência israelita teve origem na montanhosa terra de Efraim; a consciência posterior é originária do clã sulino de Judá. Os judeus (os judaitas) sempre tentaram difamar e enegrecer a história dos israelitas do norte (os efraimitas).

97:9:3 10722 A história pretensiosa dos hebreus começa com Saul reunindo os clãs do norte para resistir a um ataque dos amonitas aos seus companheiros tribais – os gileaditas – no leste do Jordão. Com um exército de pouco mais de três mil homens, ele derrotou o inimigo e foi essa façanha que levou todas as tribos das colinas a fazê-lo rei. Quando os sacerdotes exilados reescreveram esse relato, eles elevaram para 330 000 o número de homens do exército de Saul e acrescentaram “Judá” à lista de tribos que participaram da batalha.

97:9:4 10723 Imediatamente depois da derrota dos amonitas, Saul foi feito rei por eleição popular das suas tropas. Nenhum sacerdote ou profeta participou desse acontecimento. Mas os sacerdotes, mais tarde, registraram nos arquivos que Saul foi coroado rei pelo profeta Samuel, cumprindo instruções divinas. E fizeram isso no intuito de estabelecer uma “linha divina de descendência” para a realeza judaita de Davi.

97:9:5 10724 A maior de todas as distorções da história judaica teve a ver com Davi. Após a vitória de Saul sobre os amonitas (a qual ele atribuiu a Yavé), os filisteus alarmaram-se e começaram a fazer ataques aos clãs do norte. Davi e Saul nunca chegaram a estar de acordo. Com seiscentos homens, Davi fez uma aliança com os filisteus e marchou costa acima até Esdraelon. Em Gath os filisteus ordenaram a Davi que deixasse o acampamento; eles temeram que ele pudesse passar para o lado de Saul. Davi retirou-se; os filisteus atacaram e derrotaram Saul. E não poderiam conseguir isso caso Davi tivesse sido leal a Israel. O exército de Davi era um agrupamento de poliglotas descontentes, constituindo-se na sua maior parte de desajustados sociais e de fugitivos da justiça.

97:9:6 10725 A trágica derrota de Saul em Gilboa para os filisteus depreciou em muito a posição de Yavé, entre os deuses, aos olhos dos vizinhos cananeus. Normalmente, a derrota de Saul teria sido atribuída a uma apostasia dele contra Yavé, mas dessa vez os editores judaitas atribuíram-na a erros de ritual. Eles precisavam da tradição de Saul e de Samuel como respaldo para a realeza de Davi.

97:9:7 10726 Com o seu pequeno exército, Davi fez da cidade não hebraica de Hebrom o seu quartel-general. E logo os seus compatriotas proclamaram-no rei do novo reino de Judá. Judá constituía-se na maior parte de elementos não hebreus – quenitas, calebitas, jebusitas e outros cananeus. Eram nômades – pastores – e, pois, devotados à idéia hebraica de propriedade da terra. Eles conservavam as ideologias dos clãs do deserto.

97:9:8 10727 A diferença entre a história sagrada e a profana é bem ilustrada pelas duas narrativas diferentes a respeito da subida de Davi ao trono, como são encontradas no Antigo Testamento. Uma parte da narrativa secular, de como os seus seguidores imediatos (o seu exército) transformaram-no em rei, foi inadvertidamente deixada nos arquivos pelos sacerdotes que prepararam subseqüentemente a prolongada e prosaica versão para a história sagrada, na qual é descrito como o profeta Samuel, por indicação divina, escolheu Davi entre os seus irmãos e passou, formalmente e por meio de cerimônias elaboradas e solenes, a ungi-lo como o rei dos hebreus e então a proclamá-lo sucessor de Saul.

97:9:9 10728 Tantas vezes, após preparar as suas narrativas fictícias sobre as gestões miraculosas de Deus para com Israel, os sacerdotes não se esqueceram inteiramente de cancelar os acontecimentos, narrados de modo claro e fiel aos fatos que estavam já nos registros.

97:9:10 10729 Davi buscava edificar-se politicamente, primeiro casando-se com a filha de Saul, depois com a viúva de Nabal, o edomita rico, e então com a filha de Talmai, o rei de Geshur. Ele teve seis esposas dentre as mulheres de Jebus, para não mencionar Betsabá, a esposa do hitita.

97:9:11 10731 E foi por tais métodos e por meio de tais pessoas que Davi construiu a ficção de um reino divino de Judá como o sucessor na herança das tradições do reino do norte, em desaparecimento, do Israel efraimita. A tribo cosmopolita, de Judá, de Davi, era mais gentia do que judia; contudo os anciães oprimidos de Efraim vieram e “ungiram-no como rei de Israel”. Depois de uma ameaça militar, Davi então se uniu aos jebusitas e estabeleceu a sua capital do reino unido em Jebus (Jerusalém), que era uma cidade fortemente murada a meio caminho entre Judá e Israel. Os filisteus sentiram-se provocados e logo atacaram Davi. Após uma batalha feroz foram derrotados e uma vez mais Yavé foi estabelecido como “O Deus de todas as Hostes”.

97:9:12 10732 Yavé, todavia, teria forçosamente de partilhar de alguma coisa dessa glória com os deuses cananeus, pois o grosso do exército de Davi era de não hebreus. E, desse modo, consta nos vossos registros (e foi negligenciado pelos editores judaitas) esta afirmação reveladora: “Yavé abriu uma brecha nos meus inimigos diante de mim. E, por isso, ele chamou o lugar de Baal-Perazim”. E fizeram isso porque oitenta por cento dos soldados de Davi eram baalitas.

97:9:13 10733 Davi explicou a derrota de Saul em Gilboa destacando que Saul tinha atacado uma cidade cananéia, a de Gibeon, cujo povo tinha um tratado de paz com os efraimitas. Por isso Yavé abandonou-o. Mesmo na época de Saul, Davi defendera a cidade cananéia de Keila contra os filisteus, e então colocou a sua capital em uma cidade cananéia. Para manter a política de compromisso com os cananeus, Davi entregou sete dos descendentes de Saul aos Gibeonitas para que fossem enforcados.

97:9:14 10734 Após a derrota dos filisteus, Davi ganhou a posse da “arca de Yavé”, trouxe-a para Jerusalém, e tornou oficial a adoração de Yavé dentro do seu reino. Em seguida ele impôs tributos pesados às tribos vizinhas – edomitas, moabitas, amonitas e sírios.

97:9:15 10735 A corrupta máquina política de Davi começou a tomar posse da terra ao norte, violando os costumes hebreus, e, em breve, tomou a si o controle das taxas pagas pelas caravanas anteriormente coletadas pelos filisteus. E então veio uma série de atrocidades que culminaram com o assassinato de Urias. Todos os apelos judiciais foram julgados em Jerusalém; não mais “os anciães” podiam fazer justiça. Não é de se espantar que irrompesse a rebelião. Hoje, Absalom poderia ser chamado de demagogo; a sua mãe era uma cananéia. Havia uma dúzia de pretendentes ao trono, além do filho de Betsabá – Salomão.

97:9:16 10736 Após a morte de Davi, Salomão expurgou a máquina política de todas as influências vindas do norte, mas continuou com toda a tirania e os impostos do regime do seu pai. Salomão levou a nação à bancarrota com as prodigalidades da sua corte e com o seu programa complicado de construções. Havia a casa do Líbano, o palácio da filha do Faraó, o templo de Yavé, o palácio do rei e a restauração dos muros de muitas cidades. Salomão criou uma vasta marinha hebraica, operada por marinheiros sírios que negociavam com o mundo inteiro. O seu harém tinha quase mil mulheres.

97:9:17 10737 Nessa época o templo de Yavé em Silo estava desacreditado, e todo o culto da nação estava centrado em Jebus na deslumbrante capela real. O reino do norte retornou ao culto de Eloim. Eles gozavam do favorecimento dos faraós, que mais tarde escravizaram Judá, colocando o reino do sul sob taxações.

97:9:18 10738 Havia altos e baixos – guerras entre Israel e Judá. Após quatro anos de guerra civil, e três dinastias, Israel caiu sob o domínio de déspotas citadinos que começaram a fazer comércio de terras. Até mesmo o rei Omri tentou comprar a propriedade de Shemer. Todavia, o fim desencadeou-se quando Salmanasar III decidiu controlar a costa do Mediterranâneo. O rei Acab, de Efraim, reuniu dez outros grupos e resistiu em Karkar; a batalha estava empatada. O avanço dos assírios tinha sido impedido, os aliados, contudo, foram dizimados. Essa grande luta nem é mencionada no Antigo Testamento.

97:9:19 10741 Novos problemas tiveram início quando o rei Acab tentou comprar terras de Nabot. A sua esposa fenícia falsificou o nome de Acab em papéis que mandavam que as terras de Nabot fossem confiscadas sob a acusação de que ele tinha blasfemado contra os nomes de “Eloim e do rei”. Ele e os seus filhos foram prontamente executados. O vigoroso Elias apareceu em cena denunciando Acab pelo assassinato dos Nabots. E assim, Elias, um dos maiores dentre os profetas, começou os seus ensinamentos como um defensor dos velhos costumes sobre a posse das terras, e contra a atitude baalista de venda de terras, e contra a tentativa das cidades de dominar o país. Mas a reforma não teve êxito até que o grande proprietário Jehu juntasse forças com o cacique cigano Jonadab para destruir os profetas (agentes imobiliários) de Baal na Samaria.

97:9:20 10742 Quando Joás e o seu filho Jeroboan liberaram Israel dos inimigos, surgiu uma nova vida. Todavia, nessa época, Samaria era governada por uma nobreza de bandidos cujas depredações rivalizavam-se com aquelas da dinastia davídica dos velhos tempos. O estado e a igreja funcionavam de mãos dadas. A tentativa de suprimir a liberdade de expressão levou Elias, Amós, e Oséias a começarem os seus escritos secretos, e esse foi o começo real da bíblia judaica e da bíblia cristã.

97:9:21 10743 Mas o reino do norte não desapareceu da história até que o rei de Israel conspirasse com o rei do Egito e recusasse a pagar tributos adicionais à Assíria. Então começou o sítio de três anos, seguido da dispersão total do reino do norte. Efraim (Israel) desapareceu assim. Judá – os judeus, o “remanescente de Israel” – tinha começado com a concentração de terras nas mãos de uns poucos, como disse Isaías, “Juntando casa com casa e campo com campo”. Em breve havia em Jerusalém um templo de Baal ao lado do templo de Yavé. Esse reino de terror terminou com uma revolta monoteísta liderada pelo rei adolescente Joás, que fez as cruzadas de Yavé durante trinta e cinco anos.

97:9:22 10744 O próximo rei, Amazías, teve problemas com a revolta dos contribuintes edomitas e os seus vizinhos. Depois de uma vitória notável ele voltou a atacar os seus vizinhos do norte e foi derrotado de um modo também notável. Então os campesinos revoltaram-se, assassinaram o rei e colocaram o seu filho de dezesseis anos no trono. Este foi Azarías, chamado de Uzías por Isaías. Depois de Uzias, as coisas foram de mal a pior, e Judá ficou durante cem anos pagando tributos aos reis da Assíria. Isaías, o primeiro, disse a eles que Jerusalém, sendo a cidade de Yavé, nunca cairia. Mas Jeremias não hesitou em proclamar a sua queda.

97:9:23 10745 A verdadeira eliminação de Judá foi feita por um círculo de políticos ricos e corruptos que operavam sob a direção de um rei adolescente, Manasés. A economia em mudança favoreceu a volta do culto de Baal, cujas negociações particulares eram contrárias à ideologia de Yavé. A queda da Assíria e da ascendência do Egito trouxe libertação para Judá, durante algum tempo, e os campesinos tomaram o poder. Sob Josias eles destruíram o círculo de políticos corruptos de Jerusalém.

97:9:24 10746 Mas essa era chegou a um fim trágico quando Josias presumiu interceptar o poderoso exército de Necao, que se transladava da costa do Egito para ajudar a Assíria contra a Babilônia. O exército foi totalmente destruído, e Judá passou a pagar tributo ao Egito. O partido político de Baal voltou ao poder em Jerusalém e assim começou a verdadeira escravidão aos egípcios. Então se seguiu um período no qual os políticos do Baal controlaram tanto os tribunais quanto o sacerdócio. O culto a Baal era um sistema econômico e social que negociava com os direitos de propriedade tanto quanto com a fertilidade do solo.

97:9:25 10751 Com a queda de Necao, deposto por Nabucodonossor, Judá caiu sob o domínio da Babilônia e recebeu dez anos de graça, mas logo se rebelou. Quando Nabucodonossor atacou-os, os judaitas iniciaram reformas sociais, tais como a libertação de escravos, para influir sobre Yavé. Quando o exército babilônio retirou-se temporariamente, os hebreus rejubilaram-se de que a sua magia para a reforma os tinha libertado. Foi durante esse período que Jeremias lhes disse da maldição iminente, e em breve Nabucodonossor voltou.

97:9:26 10752 E assim o fim de Judá chegou subitamente. A cidade foi destruída, e o povo foi levado para a Babilônia. A luta Yavé-Baal terminou com o cativeiro. E o choque do cativeiro levou o resto de Israel ao monoteísmo.

97:9:27 10753 Na Babilônia os judeus chegaram à conclusão de que não poderiam existir como um pequeno grupo na Palestina, tendo os seus próprios costumes sociais e econômicos e, para que as suas ideologias prevalecessem, eles deviam converter os gentios. Assim originou-se o seu novo conceito de destino – a idéia de que os judeus devem transformar-se nos servidores escolhidos de Yavé. A religião judaica do Antigo Testamento realmente teve a sua evolução na Babilônia, durante o cativeiro.

97:9:28 10754 A doutrina da imortalidade também tomou forma na Babilônia. Os judeus haviam pensado que a idéia da vida futura tirava a atenção da ênfase do seu evangelho de justiça social. Agora, pela primeira vez a teologia desalojava a sociologia e a economia. A religião estava tomando forma como um sistema de pensamento e conduta humanos, mais e mais separados da política, da sociologia e da economia.

97:9:29 10755 E assim a verdade sobre o povo judeu revela que muito daquilo que tem sido considerado como história sagrada não passa de um pouco mais do que uma crônica da história profana comum. O judaísmo foi o solo no qual o cristianismo cresceu, mas os judeus não foram um povo miraculoso.

10. A RELIGIÃO DOS HEBREUS


97:10:1 10756 Os líderes dos israelitas ensinaram-lhes que eles eram um povo escolhido, não para indulgências especiais ou para o monopólio do favorecimento divino, mas para o serviço especial de levar a verdade de um Deus acima de tudo a todas as nações. E eles prometeram aos judeus que, se cumprissem esse destino, eles iriam tornar-se os líderes espirituais de todos os povos, e que o Messias que viria reinaria sobre eles e sobre o mundo como o Príncipe da Paz.

97:10:2 10757 Quando os judeus foram libertados pelos persas, eles voltaram à Palestina apenas para cair de novo na escravidão aos seus próprios sacerdotes, e o seu código de leis, de sacrifícios e de rituais. E, como os clãs hebreus rejeitaram a maravilhosa história de Deus, apresentada na oração de despedida de Moisés, para os rituais de sacrifício e de penitência, do mesmo modo esses remanescentes da nação hebraica rejeitam o conceito magnífico do segundo Isaías para as regras, as regulamentações e os rituais do seu crescente sacerdócio.

97:10:3 10758 O egoísmo nacional, a fé falsa em um mal concebido Messias prometido, e a escravidão e a tirania crescente do sacerdócio silenciaram para sempre as vozes dos líderes espirituais (excetuando-se Daniel, Ezequiel, Hagai e Malaquias). E daquele dia até a época de João Batista, toda Israel experimentou um crescente retrocesso espiritual. Mas os judeus nunca perderam o conceito do Pai Universal; até o século vinte depois de Cristo eles continuaram a seguir essa concepção da Deidade.

97:10:4 10761 De Moisés a João Batista uma linha contínua de instrutores fiéis estendeu-se para transmitir, de geração a geração, a chama da luz monoteísta, enquanto, ao mesmo tempo, incessantemente repreendiam aos dirigentes inescrupulosos, denunciavam os sacerdotes que se comercializavam, e sempre exortaram o povo a aderir à adoração do supremo Yavé, o Senhor Deus de Israel.

97:10:5 10762 Como nação, os judeus finalmente perderam a sua identidade política, mas a religião hebraica, de crença sincera em um Deus único e universal, continua a viver nos corações dos exilados dispersados. E essa religião sobrevive porque tem efetivamente funcionado para conservar os valores mais elevados dos seus seguidores. A religião judaica preservou os ideais de um povo, mas não conseguiu fomentar o progresso e encorajar as descobertas filosóficas criativas no âmbito da verdade. A religião judaica teve muitos erros – foi deficiente na filosofia e quase desprovida de qualidades estéticas –, mas conservou os valores morais; e por isso sobreviveu. O Yavé supremo, comparado a outros conceitos da Deidade, era claro, vívido, pessoal e moral.

97:10:6 10763 Os judeus amavam a justiça, a sabedoria, a verdade e a retidão como poucos povos o fizeram, mas eles contribuíram menos que todos os povos para a compreensão intelectual e para o entendimento espiritual dessas qualidades divinas. Embora a teologia hebraica tenha se recusado a expandir-se, teve um papel importante no desenvolvimento de duas outras religiões mundiais, o cristianismo e o maometanismo.

97:10:7 10764 A religião judaica persistiu também por causa das suas instituições. É difícil uma religião sobreviver como uma prática particular de indivíduos isolados. Esse tem sido sempre o erro dos líderes religiosos: apercebendo-se dos males da religião institucionalizada, eles buscam destruir a técnica de funcionamento em grupo. Em lugar de destruir todo ritual, eles fariam melhor se o reformassem. Quanto a isso, Ezequiel era mais sábio do que os seus contemporâneos; embora se unisse a eles para insistir na responsabilidade moral pessoal, ele também tentou estabelecer a observância fiel de um ritual superior e purificado.

97:10:8 10765 E assim os sucessivos educadores de Israel efetuaram, na evolução da religião, o maior feito conseguido em Urântia: a transformação gradual, mas contínua, do conceito bárbaro do demônio selvagem Yavé, o deus espírito ciumento e cruel do fulminante vulcão do Sinai, no conceito posterior, elevado e superno do supremo Yavé, criador de todas as coisas e o Pai amoroso e misericordioso de toda a humanidade. E esse conceito hebraico de Deus foi a mais elevada visualização humana do Pai Universal até aquele momento, e esta foi ainda mais engrandecida e perfeitamente amplificada pelos ensinamentos pessoais e pelo exemplo de vida do Seu Filho, Michael de Nebadon.

97:10:9 10766 [Apresentado por um Melquisedeque de Nebadon.]

DOCUMENTO 98

OS ENSINAMENTOS DE MELQUISEDEQUE NO OCIDENTE
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Os ensinamentos de Melquisedeque penetraram na Europa por muitos caminhos, mas chegaram principalmente através do Egito, e foram incorporados à filosofia ocidental, depois de serem profundamente helenizados e, mais tarde, cristianizados. Os ideais do mundo ocidental eram basicamente socráticos, e a sua filosofia religiosa posterior chegou a ser a de Jesus, modificada e comprometida pelo contato com a filosofia e a religião ocidentais em evolução, tudo isso tendo culminado na igreja cristã.

98:0:2 10772 Durante um longo tempo, na Europa, os missionários de Salém levaram adiante as suas atividades, tornando-se gradualmente absorvidos por muitos dos cultos e grupos de rituais que surgiam periodicamente. Entre aqueles que mantiveram os ensinamentos de Salém na sua forma mais pura, devem ser mencionados os cínicos. Esses pregadores da fé e da confiança em Deus estavam ainda funcionando na Europa Romana, no primeiro século depois de Cristo, sendo mais tarde incorporados à nova religião cristã, que estava em formação.

98:0:3 10773 Grande parte da doutrina de Salém foi disseminada, na Europa, pelos soldados mercenários judeus, que lutaram em tantas das campanhas militares ocidentais. Nos tempos antigos, os judeus eram afamados tanto pelo seu valor militar, quanto pelas suas peculiaridades teológicas.

98:0:4 10774 As doutrinas básicas da filosofia grega, da teologia judaica e da ética cristã foram fundamentalmente repercussões dos ensinamentos iniciais de Melquisedeque.

1. A RELIGIÃO DE SALÉM ENTRE OS GREGOS


98:1:1 10775 Os missionários de Salém poderiam ter edificado uma grande estrutura religiosa entre os gregos, não fora a interpretação estrita do seu juramento de ordenação, uma promessa imposta por Maquiventa, que proibia a organização de congregações exclusivas para a adoração e que obrigava cada pregador a prometer nunca funcionar como um sacerdote, nunca receber remunerações por serviço religioso, apenas comida, roupas e abrigo. Quando os pregadores Melquisedeques penetraram na Grécia pré-helênica, eles encontraram um povo que ainda fomentava as tradições de Adamson e dos dias dos anditas, mas esses ensinamentos haviam sido bastante adulterados pelas noções e crenças das hordas de escravos inferiores, que haviam sido trazidas para as praias gregas em números crescentes. Essa adulteração acarretou um retrocesso no animismo rudimentar de ritos sangrentos; as classes mais baixas transformando em cerimoniais até mesmo as execuções de criminosos condenados.

98:1:2 10776 A influência inicial dos instrutores de Salém foi quase destruída pelas chamadas invasões arianas do sul e do leste da Europa. Esses invasores helênicos trouxeram consigo conceitos antropomórficos de Deus semelhantes àqueles que os seus companheiros arianos haviam levado para a Índia. Essa importação inaugurou a evolução da família grega de deuses e de deusas. Essa nova religião baseou-se parcialmente nos cultos dos invasores bárbaros helênicos, mas também incorporava os mitos dos habitantes mais antigos da Grécia.

98:1:3 10781 Os gregos helênicos encontraram o Mundo Mediterrâneo amplamente dominado pelo culto da mãe, e impuseram a esses povos o seu deus-homem, Dyaus-Zeus, que já se havia tornado, como Yavé para os semitas henoteístas, o deus principal de todo o panteão grego de deuses subordinados. E os gregos teriam terminado por alcançar um monoteísmo verdadeiro, com o conceito de Zeus, não fora o fato de haverem conservado o supercontrole do Destino. Um Deus de valor final deve, ele próprio, ser o árbitro e o criador do destino.

98:1:4 10782 Como conseqüência desses fatores na evolução religiosa, desenvolveu-se logo a crença popular nos deuses felizes e despreocupados do monte Olimpo, deuses mais humanos do que divinos e deuses que os inteligentes gregos nunca levaram assim tão a sério. Eles nunca amaram imensamente nem temeram intensamente a essas divindades da sua própria criação. Eles tinham um sentimento patriótico e racial por Zeus e a sua família de semi-homens e semideuses, mas dificilmente eles reverenciavam-nos ou adoravam-nos.

98:1:5 10783 Os helenos tornaram-se tão impregnados pelas doutrinas anti-sacerdotais dos instrutores iniciais de Salém, que nenhum sacerdócio de qualquer importância jamais surgiu na Grécia. Mesmo a feitura das imagens dos deuses tornou-se mais uma obra de arte do que uma questão de adoração.

98:1:6 10784 Os deuses do Olimpo ilustram um antromorfismo tipicamente humano. No entanto, a mitologia grega era mais estética do que ética. A religião grega foi útil por retratar um universo governado por um grupo de deidades. Contudo, a moral, a ética e a filosofia gregas logo avançaram muito mais do que o seu conceito de deus, e essa desarmonia entre o crescimento intelectual e o espiritual foi tão perigosa para a Grécia, quanto o demonstrou ser para a Índia.

2. O PENSAMENTO FILOSÓFICO GREGO


98:2:1 10785 Uma religião, se encarada de um modo ligeiro e superficial, não pode perdurar, especialmente quando não tem um sacerdócio para fomentar as suas formas e para preencher, de temor e de respeito, os corações dos devotos. A religião do Olimpo não prometia a salvação, nem saciava a sede espiritual dos seus crentes; portanto, estava fadada a perecer. Um milênio depois do seu início, ela já havia quase desaparecido e os gregos estavam sem uma religião nacional, pois os deuses do Olimpo haviam perdido o poder sobre as suas melhores mentes.

98:2:2 10786 Essa era a situação quando, durante o sexto século antes de Cristo, o Oriente e o Levante tiveram um renascimento de consciência espiritual e um novo despertar para o reconhecimento do monoteísmo. Contudo, o Ocidente não partilhou desse novo desenvolvimento; nem a Europa, nem o norte da África não participaram de um modo importante desse renascimento religioso. Os gregos, porém, empenharam-se em um avanço intelectual magnífico. Eles haviam começado a controlar o medo e não mais buscavam a religião como um antídoto para ele, mas ainda não haviam percebido que a verdadeira religião cura a fome da alma, cura a inquietação espiritual e o desespero moral. Eles buscavam o consolo da alma no pensar em profundidade – por meio da filosofia e da metafísica. Da contemplação de si e da preservação de si – a salvação –, eles voltaram-se para a compreensão e o entendimento de si próprios.

98:2:3 10787 Por meio do pensamento rigoroso, os gregos tentaram alcançar uma consciência de segurança que serviria como substituta da crença na sobrevivência, mas fracassaram completamente. Apenas os mais inteligentes, entre os das classes mais elevadas dos povos helênicos, puderam compreender esse novo ensinamento; as fileiras da massa, a progênie escrava de gerações anteriores, não tinham capacidade para receber esse novo substituto para a religião.

98:2:4 10791 Os filósofos desdenhavam todas as formas de adoração, não obstante praticamente todos eles haverem-se agarrado, de um modo pouco claro, ao embasamento passado da crença na doutrina de Salém, da “Inteligência do universo”, da “idéia de Deus” e da “Grande Fonte”. Visto que os filósofos gregos deram reconhecimento ao divino e ao suprafinito, eles estavam sendo francamente monoteístas; e quase não deram reconhecimento nenhum a toda a galáxia olímpica de deuses e de deusas.

98:2:5 10792 Os poetas gregos do quinto e do sexto séculos, notadamente Píndaro, intentaram reformar a religião grega. Eles elevaram os seus ideais, mas eram mais artistas do que religiosos. E falharam ao desenvolver uma técnica para promover e conservar os valores supremos.

98:2:6 10793 Xenófanes ensinou sobre a existência de um só Deus, mas o seu conceito de deidade era por demais panteísta para que chegasse a ser um Pai pessoal para o homem mortal. Anaxágoras era um mecanicista, a não ser por reconhecer uma Primeira Causa, uma Mente Inicial. Sócrates e os seus sucessores, Platão e Aristóteles, ensinaram que a virtude é conhecimento; a bondade, a saúde da alma; que é melhor sofrer a injustiça do que ser culpado dela, que é errado retribuir o mal com mal, e que os deuses são sábios e bons. As virtudes cardinais para eles eram: a sabedoria, a coragem, a temperança e a justiça.

98:2:7 10794 A evolução da filosofia religiosa para os povos helênico e hebreu permite uma ilustração, pelo contraste, da função da igreja como uma instituição na formação do progresso cultural. Na Palestina, o pensamento humano era tão controlado pelos sacerdotes, e tão dirigido pelas escrituras, que a filosofia e a estética foram inteiramente engolfadas pela religião e pela moralidade. Na Grécia, a quase completa ausência de sacerdotes e de “escrituras sagradas” deixava a mente humana livre e desacorrentada, resultando em um desenvolvimento assustador na profundidade do pensamento. A religião, porém, como uma experiência pessoal, fracassou, por não se manter atualizada com as pesquisas intelectuais sobre a natureza e a realidade do cosmo.

98:2:8 10795 Na Grécia, acreditar estava subordinado a pensar; na Palestina, o pensar era mantido como súdito do crer. Grande parte da força do cristianismo é devida a haver ele tomado grandes empréstimos à moralidade hebraica e ao pensamento grego.

98:2:9 10796 Na Palestina, o dogma religioso tornou-se cristalizado a ponto de ameaçar crescimentos posteriores; na Grécia, o pensamento humano tornou-se tão abstrato que o conceito de Deus ficou resolvido dentro da bruma de vapor da especulação panteísta, não de todo diferente da Infinitude impessoal dos filósofos brâmanes.

98:2:10 10797 Mas os homens comuns daqueles tempos não poderiam captar a filosofia grega da compreensão de si, e de uma Deidade abstrata, nem estavam muito interessados nisso; eles antes buscavam uma promessa de salvação, e que viesse junto a um Deus pessoal que pudesse ouvir as suas preces. Eles exilaram os filósofos e perseguiram os remanescentes do culto de Salém, duas doutrinas que se haviam tornado muito misturadas. E se prepararam para aquela terrível orgia que foi o mergulho nas loucuras dos cultos dos mistérios, que então se espalhavam pelas terras do Mediterrâneo. Os mistérios de Elêusis cresceram dentro do panteão olímpico, uma versão grega da adoração da fertilidade; floresceu a adoração da natureza com Dionísio; o melhor dos cultos foi o da irmandade órfica, cujas pregações morais e promessas de salvação foram um grande atrativo para tantos.

98:2:11 10801 Toda a Grécia envolveu-se nesses novos métodos de alcançar a salvação, nesses cerimoniais emocionais e ardentes. Nenhuma nação jamais atingiu tais alturas de filosofia artística em um tempo tão curto; nenhuma nação jamais criou um sistema suficientemente avançado de ética, praticamente sem Deidade e inteiramente desprovido de salvação humana; nenhuma nação jamais submergiu tão rápida, profunda e violentamente, em tais abismos de estagnação intelectual, de depravação moral e de pobreza espiritual, como esses mesmos povos gregos, quando eles se arrojaram nesse redemoinho enlouquecido dos cultos dos mistérios.

98:2:12 10802 As religiões têm resistido longamente sem sustentação filosófica, mas poucas filosofias, como tais, têm perdurado muito sem alguma identificação com a religião. Uma filosofia está para a religião como a concepção está para a ação. No entanto, o estado humano ideal é aquele em que a filosofia, a religião e a ciência estão fundidas em uma unidade significativa, por meio da ação conjunta da sabedoria, da fé e da experiência.

3. OS ENSINAMENTOS DE MELQUISEDEQUE EM ROMA


98:3:1 10803 Tendo saído das formas religiosas iniciais de adoração dos deuses da família para a reverência tribal a Marte, o deus da guerra, era natural que a religião posterior dos latinos fosse mais algo como uma observância política, do que o eram os sistemas intelectuais dos gregos e brâmanes, ou as religiões mais espirituais de vários outros povos.

98:3:2 10804 Na grande renascença monoteísta do evangelho de Melquisedeque, durante o sexto século antes de Cristo, pouquíssimos missionários de Salém penetraram na Itália, e aqueles que o fizeram foram incapazes de superar a influência do sacerdócio etrusco, que se espalhava rapidamente com a sua nova galáxia de deuses e templos, todos os quais se incorporaram à religião do estado romano. Essa religião das tribos latinas não era trivial e venal como a dos gregos, nem austera e tirânica como a dos hebreus; ela consistia, na sua maior parte, na observância de meras formalidades, de votos e tabus.

98:3:3 10805 A religião romana foi, em grande parte, influenciada pelas extensas importações culturais da Grécia. Finalmente, a maior parte dos deuses do Olimpo foi transplantada e incorporada ao panteão latino. Os gregos havia muito adoravam o fogo do átrio da família – Héstia era a deusa virgem do átrio; Vesta era a deusa romana do lar. Zeus tornou-se Júpiter; Afrodite, Vênus; e assim por diante, com as muitas deidades do Olimpo.

98:3:4 10806 A iniciação religiosa dos jovens romanos era a ocasião da sua consagração solene ao serviço do estado. Os juramentos e a admissão à cidadania na realidade eram cerimônias religiosas. Os povos latinos mantinham templos, altares e santuários, e, em uma crise, consultavam os oráculos. Eles preservavam os ossos dos heróis e, mais tarde, os dos santos cristãos.

98:3:5 10807 Essa forma, oficial e sem emoção, de patriotismo pseudo-religioso estava fadada ao colapso, do mesmo modo que o culto altamente intelectual e artístico dos gregos caíra diante da adoração fervorosa e profundamente emotiva dos cultos dos mistérios. O maior desses cultos devastadores foi a religião de mistério da seita da Mãe de Deus, que tinha a sua sede, naqueles dias, exatamente no local da atual igreja de São Pedro em Roma.

98:3:6 10808 O estado romano, emergente, era politicamente conquistador, mas, por sua vez, foi conquistado pelos cultos, rituais, mistérios e pelos conceitos de deus do Egito, da Grécia e do Levante. Esses cultos importados continuaram a florescer em todo o estado romano até a época de Augusto, que, por motivos puramente políticos e cívicos, fez um esforço heróico e, de uma certa maneira, cheio de êxito, para destruir os mistérios e reviver a mais antiga religião política.

98:3:7 10811 Um dos sacerdotes da religião estatal contou a Augusto sobre as tentativas anteriores dos instrutores de Salém de disseminar a doutrina de um Deus único, uma Deidade final dominando todos os seres sobrenaturais; e essa idéia implantou-se com tanta firmeza junto ao imperador, que ele construiu muitos templos guarnecendo-os com belas imagens, reorganizou o sacerdócio do estado, restabeleceu a religião do estado, apontou a si próprio como o mais alto sacerdote entre todos e, como imperador, não hesitou em proclamar-se o deus supremo.

98:3:8 10812 Essa nova religião, a da adoração de Augusto, floresceu e foi observada em todo o império durante a sua vida, menos na Palestina, o lar dos judeus. E essa era dos deuses humanos continuou até que o culto oficial romano chegou a ter um quadro de mais de quarenta deidades humanas auto-elevadas, todas clamando a si nascimentos miraculosos e outros atributos supra-humanos.

98:3:9 10813 A última resistência do corpo de crentes de Salém, que diminuía, foi feita por um grupo sincero de pregadores, os cínicos, que exortaram os romanos a abandonar os seus rituais religiosos tempestuosos e sem sentido e a retornar a uma forma de adoração que incorporava o evangelho de Melquisedeque, tal como fora modificado, e contaminado, mediante o contato com a filosofia dos gregos. Contudo, o povo em geral rejeitou os cínicos, e preferiu mergulhar nos rituais dos mistérios, que não apenas ofereciam esperanças de salvação pessoal, como também gratificavam o desejo de diversão, de excitação e de distração.

4. OS CULTOS DOS MISTÉRIOS


98:4:1 10814 A maioria das pessoas, no mundo greco-romano, tendo perdido as suas religiões primitivas, da família e do estado, e sendo incapazes ou não estando dispostas a compreender o sentido da filosofia grega, voltaram a sua atenção para os espetaculares e emotivos cultos dos mistérios do Egito e do Levante. A massa do povo ansiava por promessas de salvação – de consolo religioso, para o hoje, e o seguro da esperança de imortalidade, para depois da morte.

98:4:2 10815 Os três cultos dos mistérios que se tornaram mais populares foram:

10816 1. O culto frígio a Cibele e ao seu filho Átis.

10817 2. O culto egípcio a Osíris e à sua mãe Ísis.

10818 3. O culto iraniano da adoração de Mitras, como salvador e redentor da humanidade pecadora.

98:4:3 10819 Os mistérios frígio e egípcio ensinavam que o filho divino (respectivamente Átis e Osíris) havia experimentado a morte e havia sido ressuscitado pelo poder divino. Ensinavam, além disso, que todos os que fossem propriamente iniciados no mistério, e que celebrassem com reverência o aniversário da morte e da ressurreição do deus, passariam, com isso, a fazer parte da sua natureza divina e da sua imortalidade.

98:4:4 108110 As cerimônias frígias eram imponentes, mas degradantes; os seus festivais sangrentos indicavam quão degradados e primitivos esses mistérios levantinos se tornaram. O dia mais santo era a sexta-feira negra, o “dia do sangue”, comemorando a morte auto-infligida de Átis. Depois de três dias da celebração do sacrifício e morte de Átis, o festival transformava-se em alegria e em regozijo em honra à sua ressurreição.

98:4:5 10821 Os rituais da adoração de Ísis e Osíris eram mais refinados e comoventes do que os do culto frígio. Esse ritual egípcio era construído com a lenda do deus do Nilo de outrora, um deus que morreu e que ressuscitou, cujo conceito derivava da observação da interrupção anualmente recorrente do crescimento da vegetação, seguida pela restauração primaveril de todas as plantas vivas. O frenesi na observação desses cultos dos mistérios e as orgias dos seus cerimoniais, que supostamente levavam ao “entusiasmo” da compreensão da divindade, algumas vezes eram bastante revoltantes.

5. O CULTO DE MITRAS


98:5:1 10822 Os mistérios frígios e egípcios finalmente cederam diante do maior de todos os cultos dos mistérios, a adoração de Mitras. O culto mitraico atraía uma gama ampla dentro da natureza humana e gradualmente suplantou a ambos os seus predecessores. O mitraísmo espalhou-se pelo império romano, por meio da propaganda feita pelas legiões romanas recrutadas no Levante, onde essa religião era a moda, pois aquelas legiões carregavam consigo essa crença onde quer que fossem. E esse novo ritual religioso representava um avanço em relação aos cultos dos mistérios anteriores.

98:5:2 10823 O culto de Mitras surgiu no Irã e sobreviveu durante muito tempo na sua terra natal, a despeito da oposição militante dos seguidores de Zoroastro. No entanto, na época em que o mitraísmo chegou a Roma, havia-se tornado muito mais aprimorado, com a absorção de numerosos dos ensinamentos de Zoroastro. Foi principalmente por intermédio do culto mitraico que a religião de Zoroastro exerceu uma influência sobre o cristianismo, a qual apareceu posteriormente.

98:5:3 10824 O culto mitraico retratava um deus militante, que tinha origem em um grande rochedo, lançando-se em façanhas valentes e fazendo a água jorrar de uma rocha com um golpe da sua flecha. Houve um dilúvio, do qual um homem escapou em uma embarcação especialmente construída, e uma última ceia, na qual Mitras celebrou o deus-sol antes de ascender aos céus. Esse deus-sol, ou Sol Invictus, era uma degeneração de Ahura-Mazda, o conceito da deidade do zoroastrismo. Mitras foi concebido como o campeão sobrevivente do deus-sol na sua luta com o deus das trevas. E, em reconhecimento por ele haver matado violentamente o touro sagrado mítico, Mitras foi tornado imortal, sendo elevado ao posto de intercessor da raça humana entre os deuses do alto.

98:5:4 10825 Aqueles que aderiam a esse culto adoravam em cavernas e outros locais sagrados, cantando hinos, murmurando palavras mágicas, comendo a carne dos animais sacrificados e bebendo o seu sangue. Três vezes ao dia, eles adoravam, com cerimoniais semanais especiais no dia do deus-sol e com a observância bem elaborada de todos no festival anual de Mitras, aos vinte e cinco de dezembro. Acreditava-se que a participação no sacramento assegurava a vida eterna, a passagem imediata, depois da morte, ao seio de Mitras, para ali permanecer, em bênção, até o dia do julgamento. No dia do julgamento, as chaves mitraicas do céu abririam os portões do Paraíso para receber os fiéis; depois do que, todos os não batizados, entre os vivos e os mortos, seriam aniquilados com o retorno de Mitras à Terra. Era ensinado que, quando morria um homem, ele comparecia diante de Mitras para o julgamento, e que, ao fim do mundo, Mitras convocaria todos os mortos, dos seus túmulos, para o último julgamento. Os maus seriam destruídos pelo fogo, e os justos reinariam com Mitras para sempre.

98:5:5 10826 A princípio, essa era uma religião apenas para os homens, e havia sete ordens diferentes nas quais os crentes podiam ser sucessivamente iniciados. Mais tarde, as esposas e as filhas dos crentes foram admitidas aos templos da Grande Mãe, que eram contíguos aos templos mitraicos. O culto das mulheres era uma mistura do ritual mitraico e das cerimônias do culto frígio de Cibele, a mãe de Átis.

6. O MITRAÍSMO E O CRISTIANISMO


98:6:1 10831 Antes do aparecimento dos cultos dos mistérios e do cristianismo, a religião pessoal dificilmente desenvolvia-se como uma instituição independente, nas terras civilizadas do norte da África e da Europa; era mais um assunto da família, da cidade-estado, da política e do império. Os gregos helênicos nunca fizeram evoluir um sistema centralizado de adoração; o ritual era local; eles não tinham um sacerdócio, nem um “livro sagrado”. Como sucederia aos romanos, suas instituições religiosas careciam de um agente impulsor poderoso para a preservação de valores morais e espirituais mais elevados. Conquanto seja verdade que a institucionalização da religião, em geral, haja depreciado a sua qualidade espiritual, é também fato que nenhuma religião teve êxito, até então, em sobreviver sem a ajuda de uma organização institucional de alguma monta, maior ou menor.

98:6:2 10832 A religião ocidental definhou, assim, até os dias dos céticos, dos cínicos, dos epicuristas e dos estóicos, porém, de um modo mais importante, até os tempos da grande disputa entre o mitraísmo e a nova religião de Paulo, o cristianismo.

98:6:3 10833 Durante o terceiro século depois de Cristo, as igrejas mitraicas e as cristãs eram muito semelhantes, tanto na aparência quanto pelo caráter dos seus ritos. Uma maioria desses locais de culto era subterrânea, e ambas as igrejas continham altares cujos panos de fundo variadamente retratavam os sofrimentos do salvador, que havia trazido a salvação a uma raça humana amaldiçoada pelo pecado.

98:6:4 10834 Havia sido sempre uma prática dos adoradores mitraicos, ao entrar no templo, mergulhar os seus dedos na água benta. E já que, em alguns distritos, havia aqueles que, durante algum tempo, pertenceram a ambas as religiões, eles introduziram esse costume na maioria das igrejas cristãs, na vizinhança de Roma. Ambas as religiões empregavam o batismo e partilhavam do sacramento do pão e do vinho. A grande diferença entre o mitraísmo e o cristianismo, à parte o caráter de Mitras e de Jesus, era que uma encorajava o militarismo, enquanto a outra era ultrapacifista. A tolerância do mitraísmo pelas outras religiões (exceto o posterior cristianismo) conduziu à sua destruição final. Contudo, o fator decisivo na luta entre as duas foi a admissão das mulheres como membros plenos da comunidade da fé cristã.

98:6:5 10835 Ao final, a fé nominalmente cristã dominou o Ocidente. A filosofia grega supriu os conceitos de valor ético; o mitraísmo, o ritual da observância da adoração; e o cristianismo, como tal, a técnica de conservação dos valores morais e sociais.

7. A RELIGIÃO CRISTÃ


98:7:1 10836 Um Filho Criador não se encarnou à semelhança da carne mortal nem se auto-outorgou junto à humanidade de Urântia para apaziguar um Deus enraivecido, mas antes para levar toda a humanidade ao reconhecimento do amor do Pai e para a compreensão da sua filiação a Deus. Afinal, mesmo o grande advogado da doutrina da expiação compreendeu algo dessa verdade, pois ele declarou que “Deus estava, em Cristo, reconciliando o mundo consigo próprio”.

98:7:2 10841 Não é da alçada deste documento tratar da origem e da disseminação da religião cristã. É suficiente dizer que foi edificada em torno da pessoa de Jesus de Nazaré, o Filho humanamente encarnado, Michael de Nebadon, conhecido em Urântia como o Cristo, o ungido do Senhor. O cristianismo espalhou-se em todo o Levante e em todo o Ocidente, por intermédio dos seguidores desse Galileu; e o zelo missionário deles igualou-se àquele dos seus ilustres predecessores, os setitas e os salemitas, bem como ao dos seus sinceros contemporâneos asiáticos, os instrutores budistas.

98:7:3 10842 A religião cristã, como um sistema urantiano de crença, surgiu por meio da composição dos seguintes ensinamentos, influências, credos, cultos e atitudes pessoais individuais:

98:7:4 10843 1. Os ensinamentos de Melquisedeque, que são um fator básico em todas as religiões do Ocidente e do Oriente surgidas nos últimos quatro mil anos.

98:7:5 10844 2. O sistema hebraico de moralidade, de ética, de teologia e de crença tanto na Providência, quanto no supremo Yavé.

98:7:6 10845 3. A concepção zoroastriana da luta entre o bem cósmico e o mal, que já havia deixado a sua marca tanto no judaísmo, quanto no mitraísmo. Por meio de um contato prolongado, que acompanhou as lutas entre o mitraísmo e o cristianismo, as doutrinas do profeta iraniano tornaram-se um forte fator na determinação da fusão teológica e filosófica e da estrutura dos dogmas, dos princípios e da cosmologia das versões helenizadas e latinizadas dos ensinamentos de Jesus.

98:7:7 10846 4. Os cultos dos mistérios, especialmente o mitraísmo, mas também a adoração da Grande Mãe no culto frígio. Até mesmo as lendas do nascimento de Jesus em Urântia tornaram-se matizadas pela versão romana do nascimento miraculoso do salvador-herói iraniano, Mitras, cujo advento na Terra supôs-se ter sido testemunhado apenas por um punhado de pastores trazendo presentes, os quais haviam sido informados desse evento iminente pelos anjos.

98:7:8 10847 5. O fato histórico da vida humana de Joshua ben José, a realidade de Jesus de Nazaré, como Cristo glorificado, o Filho de Deus.

98:7:9 10848 6. O ponto de vista pessoal de Paulo de Tarso. E deveria ser registrado que o mitraísmo fora a religião dominante de Tarso durante a sua adolescência. Paulo mal sonhava que as suas bem-intencionadas cartas aos seus convertidos iriam algum dia ser consideradas pelos cristãos posteriores como a “palavra de Deus”. Os instrutores bem-intencionados como ele não devem ser considerados responsáveis pelo uso feito dos seus escritos por sucessores mais recentes.

98:7:10 10849 7. O pensamento filosófico dos povos helenísticos, de Alexandria e Antióquia, através da Grécia, até Siracusa e Roma. A filosofia dos gregos estava mais em harmonia com a versão de Paulo, para o cristianismo, do que com qualquer outro sistema religioso da época, e tornou-se um fator importante para o sucesso do cristianismo no Ocidente. A filosofia grega, ligada à teologia de Paulo, ainda forma a base da ética européia.

98:7:11 108410 À medida que os ensinamentos originais de Jesus penetraram no Ocidente, eles tornaram-se ocidentalizados e, à medida que se tornaram ocidentalizados, começaram a perder o seu potencial de atração universal sobre todas as raças e espécies de homens. O cristianismo, hoje, tornou-se uma religião bem adaptada aos costumes sociais, econômicos e políticos das raças brancas. Ele deixou, há muito, de ser a religião de Jesus, embora ainda retrate valentemente uma bela religião sobre Jesus, para os indivíduos que buscam sinceramente seguir o caminho dos ensinamentos dela. Tem glorificado Jesus como o Cristo, o ungido Messias do Senhor, mas esqueceu, em boa medida, o evangelho pessoal do mestre: a Paternidade de Deus e a fraternidade universal de todos os homens.

98:7:12 10851 E esta é a longa história dos ensinamentos de Maquiventa Melquisedeque em Urântia. Passaram-se quase quatro mil anos desde que esse Filho emergencial de Nebadon auto-outorgou-se em Urântia e, naquela época, os ensinamentos do “sacerdote de El Elyon, o Deus Altíssimo”, tiveram penetração junto a todas as raças e povos. E Maquiventa teve êxito em realizar o propósito da sua outorga inusitada: quando Michael se preparou para surgir em Urântia, o conceito de Deus era existente nos corações dos homens e mulheres, o mesmo conceito de Deus que ainda resplandece com chamas novas na experiência espiritual viva dos múltiplos filhos do Pai Universal, que vivem as suas misteriosas vidas temporais nos planetas que giram no espaço.

98:7:13 10852 [Apresentado por um Melquisedeque de Nebadon.]

DOCUMENTO 99

OS PROBLEMAS SOCIAIS DA RELIGIÃO
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A religião concretiza a sua mais elevada ministração social quando tem as menores ligações com as instituições seculares da sociedade. Nas idades passadas, desde que as reformas sociais ficaram grandemente confinadas ao domínio moral, a religião não teve de ajustar a sua atitude a mudanças amplas nos sistemas econômico e político. O problema principal da religião foi o esforço para substituir o mal pelo bem, dentro da ordem social existente da cultura política e econômica. A religião, por isso, acabou tendendo a perpetuar, indiretamente, a ordem estabelecida da sociedade, a fomentar a manutenção do tipo existente de civilização.

99:0:2 10862 Todavia, a religião não deveria estar diretamente empenhada, nem na criação de ordens sociais novas, nem na preservação das antigas. A verdadeira religião de fato opõe-se à violência, como técnica de evolução social, mas não se opõe aos esforços inteligentes da sociedade para adaptar os seus usos e costumes, ajustando as suas instituições às novas exigências das condições econômicas e culturais.

99:0:3 10863 A religião aprovou as reformas sociais ocasionais dos séculos passados, mas, no século vinte, ela é chamada, por necessidade, a enfrentar os ajustes devidos a uma reconstrução social abrangente e contínua. As condições de vida alteram-se tão rapidamente que as modificações institucionais devem ser grandemente aceleradas, e a religião deve, conseqüentemente, apressar a sua adaptação a essa ordem social nova e sempre mutante.

1. A RELIGIÃO E A RECONSTRUÇÃO SOCIAL


99:1:1 10864 As invenções mecânicas e a disseminação do conhecimento estão modificando a civilização; certos ajustes econômicos e algumas mudanças sociais tornaram-se imperativos, caso se queira evitar o desastre cultural. Essa ordem social nova e vindoura não se estabelecerá complacentemente ainda por um milênio. A raça humana deve reconciliar-se com uma série de mudanças, de ajustes e de reajustes. A humanidade está a caminho de um destino planetário novo e irrevelado.

99:1:2 10865 A religião deve tornar-se uma poderosa influência para a estabilidade moral e o progresso espiritual, funcionando dinamicamente em meio a essas condições sempre em modificação e aos ajustes econômicos sem fim.

99:1:3 10866 A sociedade de Urântia jamais pode esperar estabelecer-se do modo como o fez em idades passadas. O barco social já levantou âncoras, saindo do abrigo das baías da tradição estabelecida, e já iniciou a travessia do alto-mar do destino evolucionário; e a alma do homem, como nunca dantes, na história do mundo, necessita examinar minuciosamente os seus mapas cartográficos de moralidade e consultar meticulosamente a bússola da orientação religiosa. A missão suprema da religião, como influência social, é estabilizar os ideais da humanidade, durante esses tempos perigosos de transição entre uma fase e a outra da civilização, e entre um nível da cultura e o outro.

99:1:4 10871 A religião não tem novos deveres a cumprir, mas está convocada urgentemente a funcionar como um guia sábio e como uma conselheira experiente, em todas essas novas e rapidamente mutáveis situações humanas. A sociedade está-se tornando mais mecânica, mais compacta, mais complexa e mais criticamente interdependente. A religião deve funcionar no sentido de impedir que essas interassociações novas e íntimas se tornem mutuamente retrógradas ou mesmo destrutivas. A religião deve atuar como o sal cósmico, que impede que os fermentos do progresso destruam o sabor cultural da civilização. Apenas por meio do ministério da religião poderão essas novas relações sociais e perturbações econômicas resultar em irmandade durável.

99:1:5 10872 Um humanitarismo sem Deus pode ser, humanamente falando, um nobre gesto, mas a verdadeira religião é o único poder que pode fazer crescer, de um modo perdurável, a sensibilidade de um grupo social às necessidades e sofrimentos de outros grupos. No passado, a religião institucional podia permanecer passiva, enquanto o estrato mais elevado da sociedade fazia ouvidos surdos aos sofrimentos e à opressão dos estratos mais baixos e desamparados. Nos tempos modernos, contudo, essas ordens sociais mais baixas não são mais tão abjetamente ignorantes nem tão impotentes na esfera política.

99:1:6 10873 A religião não deve tornar-se organicamente envolvida no trabalho secular de reconstrução social e de reorganização econômica. Todavia, ela deve manter-se, de um modo ativo, à altura desses avanços da civilização, reafirmando com nitidez e com vigor os seus mandatos morais, os seus preceitos espirituais e a sua filosofia progressiva de viver humano e sobrevivência transcendental. O espírito da religião é eterno, mas a forma da sua expressão deve ser reformulada toda vez que o dicionário da linguagem humana for revisado.

2. A FRAQUEZA DA RELIGIÃO INSTITUCIONALIZADA


99:2:1 10874 A religião institucionalizada não se pode permitir ter inspiração nem prover a liderança, dentro da reconstrução social e a reorganização econômica iminentes em escala mundial, porque, infelizmente, ela se tornou mais ou menos algo como uma parte orgânica da ordem social e do sistema econômico, que estão destinados a passar por uma reconstrução. Apenas a religião real da experiência espiritual pessoal pode funcionar de um modo útil e criativo na presente crise da civilização.

99:2:2 10875 A religião institucionalizada está, no presente momento, num impasse, dentro de um círculo vicioso. Ela não pode reconstruir a sociedade, sem primeiro reconstruir-se a si própria; e, sendo uma parte tão integral da ordem estabelecida, ela não pode reconstruir-se a si própria antes que a sociedade tenha sido radicalmente reconstruída.

99:2:3 10876 Os religiosos devem funcionar, na sociedade, na indústria e na política, como indivíduos, não como grupos, nem como partidos ou instituições. Um grupo religioso que presume funcionar como tal, em separado das atividades religiosas, imediatamente torna-se um partido político, uma organização econômica, ou uma instituição social. O coletivismo religioso deve limitar os seus esforços ao apoio das causas religiosas.

99:2:4 10877 Os religiosos não têm mais valor, nas tarefas de reconstrução social, do que os não religiosos, salvo pelo fato de que a religião deles pode haver-lhes conferido uma previsão cósmica maior e pode havê-los dotado com aquela sabedoria social superior que nasce do desejo sincero de amar a Deus acima de tudo e de amar a cada homem como a um irmão do Reino celeste. Uma ordem social ideal é aquela na qual todo homem ama o seu semelhante como ama a si próprio.

99:2:5 10878 A igreja institucionalizada, no passado, pode ter parecido servir à sociedade, de modo a glorificar as ordens política e econômica estabelecidas, mas ela deve apressar-se em cessar com esse tipo de ação se quiser sobreviver. A sua única atitude decente consiste em ensinar a não-violência, a doutrina da evolução pacífica, no lugar da revolução violenta – a paz na Terra e a boa vontade entre todos os homens.

99:2:6 10881 A religião moderna acha difícil ajustar a sua atitude, durante as rápidas alterações sociais, apenas porque ela permitiu a si própria tornar-se muito arraigadamente tradicionalizada, dogmatizada e institucionalizada. A religião da experiência viva não encontra dificuldade em manter-se à frente de todos esses desenvolvimentos sociais e perturbações econômicas, em meio aos quais ela sempre funciona como um estabilizador moral, um guia social e um piloto espiritual. A verdadeira religião transporta, de uma idade para outra, aquela cultura que vale a pena e aquela sabedoria que nasce da experiência de conhecer a Deus e de esforçar-se para ser como Ele.

3. A RELIGIÃO E O RELIGIOSO


99:3:1 10882 O cristianismo inicial era inteiramente isento de qualquer envolvimento civil, de engajamentos sociais e de alianças econômicas. Só o cristianismo institucionalizado posterior tornou-se uma parte orgânica da estrutura política e social da civilização ocidental.

99:3:2 10883 O Reino do céu não é nem de ordem social nem de ordem econômica; é uma fraternidade exclusivamente espiritual, de indivíduos sabedores de Deus. É bem verdade que tal fraternidade, em si própria, é um fenômeno social novo e surpreendente, acompanhado de repercussões políticas e econômicas espantosas.

99:3:3 10884 O religioso tem compaixão pelo sofrimento social, tem preocupação com a injustiça civil, não se isola do pensamento econômico, nem é insensível à tirania política. A religião influencia a reconstrução social diretamente, porque ela espiritualiza e idealiza individualmente o cidadão. Indiretamente, a civilização cultural é influenciada pela atitude desses religiosos individuais, quando eles se tornam membros ativos e influentes de vários grupos sociais, morais, econômicos e políticos.

99:3:4 10885 Para atingir-se uma civilização altamente elevada em termos culturais, torna-se necessário que se forme, primeiro, o tipo ideal de cidadão e, então, os mecanismos sociais adequados e ideais, por meio dos quais essa cidadania pode controlar as instituições econômicas e políticas de uma sociedade humana tão avançada.

99:3:5 10886 A igreja, tomada por um excesso de sentimentalidade falsa, há muito tem ministrado aos menos favorecidos e aos infelizes, e isso tem sido um bem; mas esse mesmo sentimento tem levado à perpetuação imprudente de linhagens degeneradas, o que retardou imensamente o progresso da civilização.

99:3:6 10887 Muitos indivíduos reconstrucionistas sociais, ainda que repudiando veementemente a religião institucionalizada, são, afinal, zelosamente religiosos na propagação das suas reformas sociais. E assim é que a motivação religiosa pessoal, e mais ou menos não reconhecida, está exercendo um grande papel no programa atual de reconstrução social.

99:3:7 10888 A grande fraqueza de todo esse tipo não reconhecido e inconsciente de atividade religiosa é que ele está incapacitado de aproveitar-se da crítica religiosa aberta e, portanto, de alcançar níveis proveitosos de autocorreção. É um fato que a religião não cresce, a menos que seja disciplinada pela crítica construtiva, amplificada pela filosofia, purificada pela ciência e nutrida pela comunhão leal.

99:3:8 10889 Há sempre o grande perigo de que a religião se torne distorcida e desvirtuada, na busca de falsas metas, exatamente como quando, nos tempos de guerra, cada nação em contenda prostitui a sua religião na propaganda militar. O zelo sem amor sempre causa danos à religião, do mesmo modo que a perseguição desvia as atividades da religião para a realização de algum impulso sociológico ou teológico.

99:3:9 10891 A religião pode manter-se isenta de alianças seculares nefastas apenas se:

10892 1. Tiver uma filosofia criticamente corretiva.

10893 2. Mantiver-se livre de quaisquer alianças de ordem social, econômica e política.

10894 3. Tiver comunidades criativas, confortadoras e que se desenvolvam na expansão do amor.

10895 4. Intensificar o progressivo discernimento espiritual e a apreciação dos valores cósmicos.

10896 5. Impedir o fanatismo por meio das compensações da atitude mental científica.

99:3:10 10897 Os religiosos, como um agrupamento, não devem nunca se ocupar de outra coisa além da religião, se bem que qualquer dos religiosos, como cidadão individual, possa tornar-se o líder destacado de algum movimento de reconstrução social, econômica ou política.

99:3:11 10898 É papel da religião criar, sustentar e inspirar no cidadão individual uma lealdade cósmica, que o conduza a alcançar o êxito de avançar em todos esses serviços sociais, difíceis, mas desejáveis.

4. AS DIFICULDADES DA TRANSIÇÃO


99:4:1 10899 A religião genuína empresta ao religioso uma fragrância social especial e gera o discernimento íntimo sobre a comunidade humana. Entretanto, a formalização de grupos religiosos, muitas vezes, destrói os mesmos valores pela promoção dos quais o grupo foi organizado. A amizade humana e a religião divina são mutuamente úteis e significativamente iluminadoras, desde que cresçam de um modo igual e harmônico. A religião dá um significado novo a todas as associações grupais – famílias, escolas e clubes. Confere novos valores aos jogos e exalta todo o verdadeiro humor.

99:4:2 108910 A liderança social é transformada por meio do discernimento espiritual; a religião impede todos os movimentos coletivos de perderem de vista os seus verdadeiros objetivos. Assim como as crianças, a religião é a grande unificadora da vida da família, desde que seja de uma fé viva e crescente. A vida familiar não pode existir sem crianças; pode ser vivida sem religião, mas, se assim for, as dificuldades dessa associação humana íntima ficam enormemente multiplicadas. Durante as primeiras décadas do século vinte, é a vida da família, junto com a experiência religiosa pessoal, que mais sofre com a decadência conseqüente da transição entre as antigas lealdades religiosas e os novos significados e valores emergentes.

99:4:3 108911 A verdadeira religião é um caminho de vida, cheio de significados, que se coloca dinamicamente face a face com o lugar-comum das realidades da vida diária. Todavia, se a religião deve estimular o desenvolvimento individual do caráter e aumentar a integração da personalidade, ela não deve ser padronizada. Se deve estimular a apreciação da experiência e servir de valor de atração, ela não deve ser estereotipada. Se a religião deve promover lealdades supremas, não deve ser demasiado formal.

99:4:4 108912 Não importa que sublevações possam acompanhar o crescimento social e econômico da civilização, a religião será genuína e digna se fomentar, no indivíduo, uma experiência na qual prevaleça a soberania da verdade, da beleza e da bondade; pois esse é o verdadeiro conceito espiritual da suprema realidade. E esta, por meio do amor e da adoração, torna-se significativa na irmandade dos homens e na filiação a Deus.

99:4:5 10901 Afinal, é aquilo em que se crê, mais do que aquilo que se conhece, que determina a conduta e rege as atuações pessoais. O conhecimento puramente factual exerce uma influência muito pequena sobre o homem mediano, a menos que esse conhecimento seja emocionalmente ativado. No entanto, a ativação da religião é supra-emocional, unificando toda a experiência humana em níveis transcendentais, por meio do contato com energias espirituais e a liberação dessas energias espirituais na vida mortal.

99:4:6 10902 Durante os tempos de instabilidade psicológica do século vinte, em meio às perturbações econômicas, às contracorrentes morais, e às violentas marés sociológicas e ciclones. que são transições para uma era científica, na qual milhares e milhares de homens e mulheres tornam-se humanamente deslocados, ficando ansiosos, impacientes, temerosos, incertos e instáveis; como nunca antes, na história do mundo; e necessitam da consolação e estabilidade de uma religião sadia. Em meio a uma realização científica e um desenvolvimento mecânico sem precedentes, pairam a estagnação espiritual e o caos filosófico.

99:4:7 10903 Não há perigo de que a religião se torne, mais e mais, uma questão privada – uma experiência pessoal –, desde que ela não perca a sua motivação de serviço social altruísta e amoroso. A religião tem sofrido muitas influências secundárias: da mistura súbita de culturas, da interfusão de credos, da diminuição da autoridade eclesiástica, das alterações sofridas pela vida familiar, além da urbanização e da mecanização no mundo.

99:4:8 10904 O grande risco espiritual que o homem corre consiste no progresso parcial, no crescimento incompleto realizado às pressas: o abandono das religiões evolucionárias do medo, sem ter imediatamente ao seu alcance a religião reveladora do amor. A ciência moderna, particularmente a psicologia, tem enfraquecido tão somente aquelas religiões muito amplamente dependentes do medo, da superstição e da emoção.

99:4:9 10905 A transição é sempre acompanhada pela confusão, e haverá pouca tranqüilidade no mundo religioso até que termine a grande luta atual entre as três filosofias da religião:

10906 1. A crença espiritista (numa Deidade providencial), de muitas religiões.

10907 2. A crença humanista e idealista de muitas filosofias.

10908 3. As concepções mecanicistas e naturalistas de muitas ciências.

99:4:10 10909 Essas três abordagens parciais da realidade do cosmo devem finalmente tornar-se harmonizadas por uma apresentação reveladora da religião, da filosofia e da cosmologia que retrate a existência trina do espírito, da mente e da energia, os quais procedem da Trindade do Paraíso e alcançam a unificação, no tempo-espaço, dentro da Deidade do Supremo.

5. OS ASPECTOS SOCIAIS DA RELIGIÃO


99:5:1 109010 A religião é uma experiência espiritual exclusivamente pessoal – conhecer a Deus como um Pai. O corolário dessa experiência – conhecer o homem como um irmão – requer o ajustamento do eu a outros eus, e isso envolve o aspecto social ou grupal da vida religiosa. A religião é antes um ajustamento interior ou pessoal, e torna-se, então, uma questão de serviço social ou de ajustamento grupal. O fato de o homem ser gregário determina, forçosamente, que os grupos religiosos venham à existência. O que acontece a esses grupos religiosos depende muito de uma liderança inteligente. Na sociedade primitiva, o grupo religioso não foi sempre muito diferente dos grupos econômicos ou políticos. A religião tem sido sempre um agente conservador da moral e estabilizador da sociedade. E isso ainda é verdade, não obstante muitos socialistas e humanistas modernos ensinarem o contrário.

99:5:2 10911 Vós deveis ter sempre em mente que a verdadeira religião existe para vos fazer conhecer a Deus como o vosso Pai, e ao homem como vosso irmão. A religião não é a crença escrava em ameaças de punição, nem em promessas mágicas de recompensas místicas futuras.

99:5:3 10912 A religião de Jesus é a influência mais dinâmica que jamais estimulou a raça humana. Jesus abalou a tradição, destruiu o dogma e convocou a humanidade à realização dos seus ideais mais elevados no tempo e na eternidade – ser perfeito, como o próprio Pai no céu é perfeito.

99:5:4 10913 A religião tem pouca chance de funcionar, até que o grupo religioso fique separado de todos os outros grupos – o agrupamento social dos membros espirituais do Reino do céu.

99:5:5 10914 A doutrina da depravação total do homem destruiu muito do potencial que a religião tem para produzir as repercussões sociais de natureza elevadora e de valor de inspiração. Jesus procurou restaurar a dignidade do homem, quando declarou que todos os homens são filhos de Deus.

99:5:6 10915 Qualquer crença religiosa que seja eficaz para a espiritualização do crente certamente terá repercussões poderosas na vida social de tal religioso. A experiência religiosa, infalivelmente, produz os “frutos do espírito” na vida diária do mortal que é guiado pelo espírito.

99:5:7 10916 Tão certamente quanto compartilham as suas crenças religiosas, os homens criam grupos religiosos de alguma espécie, que finalmente gerarão metas comuns. Algum dia, os religiosos deixarão de tentar reunir-se se baseando em opiniões psicológicas e crenças teológicas, e efetivarão uma cooperação real, com base na unidade de ideais e de propósitos. As metas, mais do que as crenças, é que devem unificar os religiosos. Já que a verdadeira religião é uma questão de experiência espiritual pessoal, é inevitável que cada religioso, individualmente, deva ter a sua interpretação própria e pessoal da realização dessa experiência espiritual. Que o termo “fé” represente a relação individual com Deus, mais do que a formulação da crença naquilo que algum grupo de mortais tenha sido capaz de escolher como sendo uma atitude religiosa em comum. “Tu tens fé? Então mantém-na para ti próprio. ”

99:5:8 10917 À fé interessa apenas captar os valores ideais, e isso é demonstrado na declaração feita no Novo Testamento de que a fé é a essência das coisas pelas quais se espera, e a evidência das coisas que não se vêem.

99:5:9 10918 O homem primitivo pouco esforço fez para colocar as suas convicções religiosas em palavras. A sua religião era antes dançada, mais do que pensada. Os homens modernos têm imaginado muitos credos e têm criado muitos critérios para a fé religiosa. Os religiosos do futuro deverão viver a sua religião e dedicar-se ao serviço sincero da irmandade dos homens. É chegada a hora de o homem ter uma experiência religiosa tão pessoal e tão sublime que só possa ser compreendida e expressa por “sentimentos que são profundos demais para serem expressos em palavras”.

99:5:10 10919 Jesus não exigiu que os seus seguidores se reunissem periodicamente e que recitassem fórmulas rituais indicadoras das suas crenças comuns. Ele apenas ordenou que eles se reunissem para fazer algo, factualmente – compartilhar da ceia comunitária em lembrança da sua vida de auto-outorga em Urântia.

99:5:11 109110 Que erro não cometem os cristãos quando, ao apresentarem Cristo como o ideal supremo da liderança espiritual, ousam exigir que homens e mulheres, conscientes de Deus, rejeitem a liderança histórica dos homens conhecedores de Deus que contribuíram para a sua iluminação particular, nacional ou racial, em épocas passadas.

6. A RELIGIÃO INSTITUCIONALIZADA


99:6:1 10921 O sectarismo é uma doença da religião institucionalizada, enquanto o dogmatismo é uma escravização da natureza espiritual. De longe, é melhor ter uma religião sem uma igreja, do que uma igreja sem religião. O tumulto religioso do século vinte não indica, em si e por si mesmo, uma decadência espiritual. A confusão vem antes do crescimento, tanto quanto antes da destruição.

99:6:2 10922 Há um propósito, de fato, na socialização da religião. É propósito das atividades religiosas grupais dramatizar as lealdades à religião, exagerar as seduções da verdade, da beleza e da bondade; fomentar as atrações dos valores supremos; elevar os serviços feitos na fraternidade altruísta; glorificar os potenciais da vida familiar; promover a educação religiosa; prover o conselho sábio e a orientação espiritual; e encorajar a adoração grupal. E todas as religiões vivas encorajam a amizade humana, conservam a moralidade, promovem o bem-estar da comunidade, e facilitam a disseminação do evangelho essencial das suas respectivas mensagens de salvação eterna.

99:6:3 10923 No entanto, quando a religião torna-se institucionalizada, porém, o seu poder para o bem fica reduzido, ao passo que as possibilidades para o mal se tornam grandemente multiplicadas. Os perigos da religião formalizada são: a fixação das crenças e a cristalização dos sentimentos; a acumulação de direitos e interesses adquiridos com um crescimento da secularização; a tendência para a padronização e a fossilização da verdade; o desvio da religião para o serviço da igreja, em vez do serviço de Deus; a inclinação dos líderes de tornarem-se administradores, em vez de ministradores; a tendência a formar seitas e divisões competitivas; o estabelecimento de uma autoridade eclesiástica opressiva; a criação da atitude aristocrática do tipo “povo-escolhido”; o estímulo ao surgimento de idéias falsas e exageradas sobre o sagrado; a transformação da religião em algo rotineiro e a petrificação da adoração; a tendência a venerar o passado e ignorar as solicitações do presente; o fracasso em fazer interpretações atuais da religião; o envolvimento com as funções das instituições seculares; a criação do mal que é a discriminação por castas religiosas; o perigo de a religião transformar-se num juiz ortodoxo intolerante; o fracasso de manter vivo o interesse da juventude aventurosa e a perda gradativa da mensagem salvadora do evangelho da salvação eterna.

99:6:4 10924 A religião formal restringe os homens nas suas atividades espirituais pessoais, em vez de liberá-los para o serviço mais elevado de edificadores do Reino.

7. A CONTRIBUIÇÃO DA RELIGIÃO


99:7:1 10925 Embora as igrejas e todos os outros grupos religiosos devam permanecer distantes de todas as atividades seculares, ao mesmo tempo, a religião não deve fazer nada para impedir ou retardar a coordenação social das instituições humanas. A vida deve continuar a crescer na sua significação; o homem deve continuar a sua reforma da filosofia e o seu esclarecimento da religião.

99:7:2 10926 A ciência política deve efetuar a reconstrução da economia e da indústria por meio das técnicas que aprende das ciências sociais e pela luz do discernimento interior e dos motivos proporcionados pelo viver religioso. Em toda reconstrução social, a religião proporciona uma estabilizadora lealdade a um objetivo transcendente, a uma meta firme que permanece além e acima do objetivo imediato e temporal. No centro das confusões de um meio ambiente que se transforma rapidamente, o homem mortal necessita da sustentação de uma vasta perspectiva cósmica.

99:7:3 10931 A religião inspira o homem a viver corajosa e jubilosamente na face da Terra; ela reúne a paciência e a paixão, a luz do discernimento interior e o zelo, a compaixão e o poder, os ideais e a energia.

99:7:4 10932 O homem nunca poderá decidir sabiamente sobre as questões temporais, nem transcender o egoísmo dos interesses pessoais, a menos que medite em presença da soberania de Deus e conte com as realidades dos significados divinos e valores espirituais.

99:7:5 10933 A interdependência econômica e a fraternidade social irão, finalmente, conduzir à fraternidade. O homem é naturalmente um sonhador, mas a ciência está chamando-o à sensatez, de modo que a religião poderá, em breve, estimulá-lo com um perigo muito menor de precipitar reações fanáticas. As necessidades econômicas atrelam o homem à realidade, e a experiência religiosa pessoal coloca esse mesmo homem frente a frente com as realidades eternas de uma cidadania cósmica sempre em expansão e em progresso.

99:7:6 10934 [Apresentado por um Melquisedeque de Nebadon.]

DOCUMENTO 100

A RELIGIÃO NA EXPERIÊNCIA HUMANA
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A experiência da vivência religiosa dinâmica transforma o indivíduo medíocre numa personalidade de poder idealístico. A religião contribui para o progresso de todos, fomentando o crescimento de cada indivíduo, e o progresso de cada um é aumentado por meio da realização de todos.

100:0:2 10942 O crescimento espiritual é estimulado mutuamente pela associação íntima com outros religiosos. O amor propicia o solo para o crescimento religioso — uma atração objetiva, em lugar de uma gratificação subjetiva — e ainda proporciona a suprema satisfação subjetiva. E a religião enobrece a lida comum da vida diária.

1. O CRESCIMENTO RELIGIOSO


100:1:1 10943 Embora a religião produza o crescimento dos significados e um engrandecimento dos valores, o mal sempre surge quando avaliações puramente pessoais são elevadas ao nível do absoluto. Uma criança avalia uma experiência de acordo com o seu conteúdo de prazer; a maturidade é proporcional à substituição do prazer pessoal pelos significados mais elevados, e mesmo pela lealdade aos conceitos mais elevados das situações diversificadas da vida e das relações cósmicas.

100:1:2 10944 Algumas pessoas acham-se ocupadas demais para poderem crescer e, por isso, expõem-se ao grave perigo de estagnação espiritual. Devem ser tomadas providências para o crescimento dos significados, em idades diferentes, em culturas sucessivas e nos estágios passageiros da civilização que avança. Os principais inibidores do crescimento são o preconceito e a ignorância.

100:1:3 10945 Dai a cada criança em desenvolvimento uma oportunidade de fazer com que a sua própria experiência religiosa cresça; não imponhais a ela a experiência já pronta do adulto. Lembrai-vos de que o progresso, ano a ano, dentro de um regime educacional estabelecido, não significa necessariamente um progresso intelectual, e muito menos um crescimento espiritual. O aumento do vocabulário não significa desenvolvimento de caráter. O crescimento não é indicado verdadeiramente por meros produtos, mas, muito mais, pelo progresso. O crescimento educacional verdadeiro é indicado pelo engrandecimento dos ideais, por uma apreciação maior dos valores, por novos significados para os valores e por uma maior lealdade aos valores supremos.

100:1:4 10946 As crianças ficam impressionadas permanentemente apenas pela lealdade dos seus companheiros adultos; os preceitos, ou mesmo o exemplo, não têm uma influência duradoura. As pessoas leais são pessoas em crescimento, e o crescimento é uma realidade que causa impressão e que inspira. Vivei lealmente hoje – crescei –, e o amanhã responderá por si. A maneira mais rápida de um girino tornar-se uma rã é vivendo lealmente cada momento como um girino.

100:1:5 10947 O solo essencial ao crescimento religioso pressupõe uma vida progressiva de auto-realização, de coordenação das propensões naturais, de exercício da curiosidade, de um desfrutar das aventuras razoáveis da experimentação de sentimentos de satisfação, de fazer o temor funcionar como estímulo para a atenção e a consciência, de sedução pelo maravilhoso e de uma consciência normal de pequenez, de humildade. O crescimento é também baseado na descoberta de si, acompanhada da autocrítica – a consciência; pois a consciência é realmente a crítica voltada para si próprio, por meio da própria escala de valores dos ideais pessoais.

100:1:6 10951 A experiência religiosa é influenciada de um modo marcante pela saúde física, pelo temperamento herdado e pelo meio social. Contudo, as condições temporais não inibem o progresso espiritual interno de uma alma dedicada a fazer a vontade do Pai no céu. Em todos os mortais normais, estão presentes certos impulsos inatos para o crescimento e para a auto-realização, que funcionam se não forem especificamente inibidos. A técnica certa de alimentar esse dom, que é parte do potencial de crescimento espiritual, é manter uma atitude de devoção, de todo o coração, aos valores supremos.

100:1:7 10952 A religião não pode ser outorgada, recebida, emprestada, aprendida, nem perdida. É uma experiência pessoal, que se amplia proporcionalmente à busca crescente dos valores finais. O crescimento cósmico, assim, acompanha a acumulação de significados e a elevação sempre em expansão dos valores. Contudo, o crescimento em nobreza é, em si mesmo, sempre inconsciente.

100:1:8 10953 Os hábitos religiosos de pensar e agir contribuem para a economia do crescimento espiritual. Pode-se desenvolver uma predisposição religiosa de reações favoráveis aos estímulos espirituais, uma espécie de reflexo condicionado espiritual. Os hábitos que favorecem o crescimento religioso abrangem o cultivo da sensibilidade para os valores divinos, o reconhecimento do viver religioso nos outros, a meditação reflexiva dos significados cósmicos, o fervor da adoração ao resolver os problemas, o compartilhar da própria vida espiritual com os semelhantes, o evitar do egoísmo, a recusa de abusar da misericórdia divina e o viver como se estivesse na presença de Deus. Os fatores para o crescimento religioso podem ser intencionais, mas o crescimento, em si, é invariavelmente inconsciente.

100:1:9 10954 A natureza inconsciente do crescimento religioso não significa, contudo, que seja uma atividade a operar nos domínios supostos do subconsciente do intelecto humano; significa, antes, atividades criativas nos níveis supraconscientes da mente mortal. A experiência da compreensão da realidade do crescimento religioso inconsciente é a maior prova positiva da existência funcional da supraconsciência.

2. O CRESCIMENTO ESPIRITUAL


100:2:1 10955 O desenvolvimento espiritual depende, em primeiro lugar, da manutenção de uma conexão espiritual viva com as verdadeiras forças espirituais e, em segundo lugar, da produção contínua de frutos espirituais: dando aos semelhantes a ministração daquilo que foi recebido dos próprios benfeitores espirituais. O progresso espiritual é fundamentado no reconhecimento intelectual da própria pobreza espiritual combinada à autoconsciência da fome de perfeição, ao desejo de conhecer a Deus e de ser como Ele, com um propósito verdadeiro de fazer a vontade do Pai no céu, de todo coração.

100:2:2 10956 Inicialmente o crescimento espiritual é um despertar para as necessidades e, em seguida, um discernimento dos significados e, depois, uma descoberta dos valores. A evidência do verdadeiro desenvolvimento espiritual consiste em demonstrar uma personalidade humana motivada pelo amor, animada pela ministração não egoísta e dominada pela adoração sincera dos ideais de perfeição da divindade. E toda essa experiência constitui a realidade da religião, em contraste com a das meras crenças teológicas.

100:2:3 10957 A religião pode progredir até aquele nível de experiência em que se torna uma técnica esclarecida e sábia de reação espiritual ao universo. Tal religião glorificada pode funcionar em três níveis da personalidade humana: o intelectual, o moroncial e o espiritual; sobre a mente, sobre a alma em evolução e junto ao espírito residente.

100:2:4 10961 A espiritualidade imediatamente passa a ser indicadora da vossa proximidade de Deus e a medida da vossa capacidade de servir aos vossos semelhantes. A espiritualidade realça a capacidade de descobrir a beleza nas coisas, de reconhecer a verdade nos significados, e de descobrir a bondade nos valores. O desenvolvimento espiritual é determinado por essas capacidades e é diretamente proporcional à eliminação das qualidades egoístas do amor.

100:2:5 10962 O status espiritual real é a medida do vosso alcance da Deidade, da vossa sintonização com o Ajustador. O alcançar da finalidade da espiritualidade é equivalente a atingir o máximo de realidade, o máximo de semelhança a Deus. A vida eterna é a busca sem fim dos valores infinitos.

100:2:6 10963 A meta da auto-realização humana deveria ser espiritual, não material. As únicas realidades que valem o esforço são as divinas, as espirituais e eternas. O homem mortal encontra-se capacitado para desfrutar do prazer físico e da satisfação de afetos humanos; ele beneficia-se da lealdade da associação a outros homens e das instituições temporais; mas estas não são fundações eternas sobre as quais se deva edificar a personalidade imortal, a qual deve transcender ao espaço, vencer o tempo e alcançar o destino da perfeição divina e o serviço de finalitor.

100:2:7 10964 Jesus retratou a profunda segurança do mortal sabedor de Deus ao dizer: “Para um crente do Reino, que conhece Deus, que importa se todas as coisas entrarem em colapso?” As seguranças temporais são vulneráveis, mas as seguranças espirituais são inexpugnáveis. Quando as torrentes da adversidade humana, do egoísmo, da crueldade, do ódio, da malícia e da inveja afluírem à porta da alma humana, vós podeis manter-vos na certeza de que há um bastião interior, a cidadela do espírito, que permanece absolutamente inatingível; e isso é verdadeiro, ao menos, para todo ser humano que tenha entregado a guarda da sua alma ao espírito residente do Deus eterno.

100:2:8 10965 Depois dessa realização espiritual, assegurada pelo crescimento gradativo ou por uma crise específica, ocorre uma nova orientação da personalidade, bem como o desenvolvimento de uma nova medida de valores. Tais indivíduos nascidos do espírito têm as suas motivações tão renovadas na vida, que podem calmamente permanecer de pé, enquanto perecem as suas ambições mais caras e entram em colapso as suas mais ardentes esperanças; eles sabem positivamente que tais catástrofes não são senão os cataclismos retificadores que arruínam as suas criações temporais, como um prenúncio da construção de uma realidade mais nobre e mais duradoura, num nível novo e mais sublime de realização no universo.

3. OS CONCEITOS DO VALOR SUPREMO


100:3:1 10966 A religião não é uma técnica para alcançar uma paz mental estática e abençoada; é um impulso para organizar a alma para o serviço dinâmico. É o alistamento de toda a individualidade no serviço leal de amar a Deus e de servir ao homem. A religião paga qualquer preço que seja essencial ao alcance da meta suprema, a recompensa eterna. Há uma plenitude de consagração, na lealdade religiosa, que é de uma sublimidade magnífica. E esse tipo de lealdade é socialmente eficaz e espiritualmente progressivo.

100:3:2 10967 Para o religioso, a palavra Deus torna-se um símbolo que significa uma aproximação à realidade suprema e um reconhecimento ao valor divino. As preferências e os desagrados humanos não determinam o bem e o mal; os valores morais não crescem com os desejos realizados, nem com a frustração emocional.

100:3:3 10968 Na contemplação dos valores, vós deveis distinguir entre aquilo que é valor e aquilo que tem valor. Vós deveis reconhecer a relação entre as atividades agradáveis, a integração significativa delas e a realização engrandecida em níveis sempre mais elevados da experiência humana.

100:3:4 10971 Significado é algo que a experiência acrescenta ao valor; é a consciência apreciativa dos valores. Um prazer isolado e puramente egoísta pode conotar uma desvalorização virtual dos significados, um gozo sem sentido que beira as raias do mal relativo. Os valores são experienciais, quando as realidades têm sentido e são mentalmente associadas, quando tais relações são reconhecidas e apreciadas pela mente.

100:3:5 10972 Os valores não podem nunca ser estáticos; a realidade significa mudança, crescimento. A mudança sem crescimento, sem expansão de significado e sem a exaltação do valor, nada vale – é mal em potencial. Quanto maior a qualidade da adaptação cósmica, mais significado qualquer experiência traz. Os valores não são ilusões conceituais; eles são reais, mas sempre dependem do ato dos relacionamentos. Os valores são sempre tanto factuais quanto potenciais – não o que foi, mas o que é e o que está para ser.

100:3:6 10973 A associação dos factuais e dos potenciais equivale ao crescimento, à realização experiencial dos valores. Contudo, o crescimento não é mero progresso. O progresso é sempre significativo, mas torna-se relativamente sem valor, se não vier acompanhado do crescimento. O valor supremo da vida humana consiste no crescimento dos valores, no progresso dos significados e na realização da inter-relação cósmica de ambas essas experiências. E tal experiência é equivalente à consciência de Deus. Esse mortal, se bem que não seja supranatural, está tornando-se verdadeiramente supra-humano; uma alma imortal que está evoluindo.

100:3:7 10974 O homem não pode provocar o crescimento, mas ele pode gerar as condições favoráveis para tanto. O crescimento é sempre inconsciente, seja ele físico, intelectual ou espiritual. E assim cresce o amor; ele não pode ser criado, nem manufaturado, nem comprado; deve crescer. A evolução é uma técnica cósmica de crescimento. O crescimento social não pode ser assegurado pela legislação, e o crescimento moral não é garantido por uma administração melhor. O homem pode manufaturar uma máquina, mas o seu real valor deve derivar da cultura humana e da apreciação pessoal. A única contribuição do homem para o crescimento é a mobilização dos poderes totais da sua personalidade – a fé viva.

4. PROBLEMS OF GROWTH




100:4:1 10975 O viver religioso é o viver devotado, e o viver devotado é o viver criativo, original e espontâneo. Novas percepções religiosas surgem de conflitos que iniciam a escolha de novos e melhores hábitos de reação, no lugar de formas antigas e inferiores de reação. Novos significados emergem apenas em meio a conflitos; e o conflito persiste apenas em face da recusa de esposar os valores mais elevados, portadores de significados superiores.

100:4:2 10976 As perplexidades religiosas são inevitáveis; não pode haver nenhum crescimento sem conflito psíquico e sem agitação espiritual. A organização de um modelo filosófico de vida requer uma considerável perturbação nos domínios filosóficos da mente. A lealdade não é exercitada em nome daquilo que é grande, bom, verdadeiro e nobre, sem uma batalha. O esforço é seguido do esclarecimento da visão espiritual e da ampliação do discernimento de visão cósmica. E o intelecto humano reluta contra ser desmamado da alimentação das energias não espirituais da existência temporal. A mente animal indolente rebela-se com o esforço exigido pela luta na solução dos problemas cósmicos.

100:4:3 10977 Entretanto, o grande problema do viver religioso consiste na tarefa de unificar os poderes da alma da personalidade, por meio da predominância do AMOR. A saúde, a eficiência mental e a felicidade surgem da unificação dos sistemas físicos, dos sistemas mentais e dos sistemas espirituais. De saúde e de sanidade o homem entende bastante, mas de felicidade ele só entendeu de fato pouquíssimo. A felicidade mais elevada está indissoluvelmente ligada ao progresso espiritual. O crescimento espiritual gera um júbilo duradouro, uma paz que ultrapassa qualquer entendimento.

100:4:4 10981 Na vida física, os sentidos dizem sobre a existência das coisas; a mente descobre a realidade das significações; mas a experiência espiritual revela ao indivíduo os verdadeiros valores da vida. Esses altos níveis de vida humana são alcançados no supremo amor a Deus e no amor não egoísta pelo homem. Se vós amais o vosso semelhante, vós deveis ter descoberto os seus valores. Jesus amou tanto os homens porque atribuía a eles um valor muito elevado. Vós podeis melhor descobrir os valores dos vossos companheiros, descobrindo a sua motivação. Se alguém vos irrita, causa a emoção de ressentimentos, vós devíeis buscar discernir compassivamente o seu ponto de vista, as suas razões para uma conduta de tal modo censurável. Uma vez que tenhais compreendido o vosso semelhante, vós vos tornareis tolerantes, e essa tolerância amadurecerá a amizade transformando-a em amor.

100:4:5 10982 Com os olhos da vossa mente, trazei à vossa lembrança o quadro de um dos vossos ancestrais primitivos dos tempos das cavernas – um pequeno rosnador, disforme e sujo, um homem pesado, de pernas arqueadas, de porrete levantado, respirando ódio e animosidade, enquanto olha ferozmente para a frente. Esse quadro dificilmente retrata a dignidade divina do homem. Contudo, ele nos permite ampliar o retrato. Em frente a esse humano animado, um tigre dente-de-sabre está em posição de ataque. Atrás dele, uma mulher e duas crianças. Imediatamente, vós reconheceis que esse quadro representa o começo de muito daquilo que é bom e nobre na raça humana, mas o homem é o mesmo, em ambos os quadros. Apenas, no segundo arranjo, vós sois favorecidos com um horizonte amplo. E, nele, vós discernis a motivação desse mortal em evolução. A sua atitude torna-se louvável, porque vós o compreendeis. Se vós pudésseis apenas penetrar os motivos dos vossos semelhantes, quão melhor vós os entenderíeis! Se vós pudésseis apenas conhecer os vossos semelhantes, vós iríeis finalmente encher-vos de amor por eles.

100:4:6 10983 De fato, vós não podeis amar os vossos semelhantes por um mero ato de vontade. O amor nasce apenas de uma compreensão enérgica dos motivos e dos sentimentos do vosso próximo. Não é tão importante amar a todos os homens hoje quanto é importante que a cada dia vós aprendais a amar um ser humano a mais. Se a cada dia ou a cada semana vós alcançardes a compreensão de mais um dos vossos irmãos, e se for esse o limite da vossa capacidade, então certamente estareis socializando e verdadeiramente espiritualizando a vossa personalidade. O amor é contagiante e, quando a devoção humana é inteligente e sábia, o amor é mais cativante que o ódio. Todavia, apenas o amor genuíno e não egoísta é verdadeiramente contagioso. Se cada mortal pudesse apenas tornar-se o foco de uma afeição dinâmica, esse vírus benigno do amor penetraria logo a corrente da emoção sentimental da humanidade, numa tal extensão que toda a civilização seria abraçada pelo amor, e isso seria a realização da irmandade dos homens.

5. A CONVERSÃO E O MISTICISMO


100:5:1 10984 O mundo está repleto de almas perdidas. Não no sentido teológico, mas porque perderam o sentido de direção; e acham-se vagando na confusão entre os ismos e os cultos de uma era filosoficamente frustrada. Pouquíssimas almas aprenderam como estabelecer para si próprias uma filosofia de vida, em lugar de aceitar o autoritarismo religioso. (Os símbolos da religião socializada não são para serem desprezados como canais de crescimento, pois o leito do rio não é o rio. )

100:5:2 10985 A progressão do crescimento religioso conduz, por meio do conflito, da estagnação até a coordenação, da insegurança até a fé sem dúvidas, da confusão na consciência cósmica à unificação da personalidade, de um objetivo temporal até o eterno, do cativeiro do medo à liberdade da filiação divina.

100:5:3 10991 Deveria ficar esclarecido que as profissões de fé aos supremos ideais – a percepção psíquica, emocional e espiritual daquele que tem consciência de Deus – podem vir de um crescimento natural e gradual ou podem, algumas vezes, ser experienciadas em certas conjunções, como numa crise. O apóstolo Paulo experimentou exatamente uma conversão súbita e espetacular naquele dia memorável na estrada de Damasco. Gautama Sidarta teve uma experiência semelhante na noite em que se assentou a sós e buscou penetrar o mistério da verdade final. Muitos outros têm tido experiências, e muitos crentes verdadeiros progrediram em espírito, sem nenhuma conversão súbita.

100:5:4 10992 A maior parte dos fenômenos espetaculares relacionados às chamadas conversões religiosas é inteiramente psicológica pela sua natureza, mas, de quando em quando, ocorrem experiências que são também espirituais, pela sua origem. Quando a mobilização mental é absolutamente total, em qualquer nível da expansão na direção da realização espiritual, quando é perfeita a motivação humana de lealdade à idéia divina, então, muito freqüentemente, ocorre que o espírito residente sincroniza-se subitamente abaixo, com o propósito concentrado e consagrado da mente supraconsciente do mortal crente. E essas experiências de fenômenos intelectuais e espirituais unificados constituem as conversões, que consistem de fatores que estão além dos envolvimentos puramente psicológicos.

100:5:5 10993 Todavia, a emoção por si só indica uma conversão falsa; deve ter-se fé, tanto quanto sentimentos. Visto que tal mobilização psíquica é parcial e que a motivação da lealdade humana é incompleta, nessa mesma medida a experiência da conversão será uma realidade mista: intelectual, emocional e espiritual.

100:5:6 10994 Se se está disposto a reconhecer uma mente subconsciente teórica, como uma hipótese prática com a qual trabalhar, numa vida intelectual unificada de outro modo, então, para ser-se consistente, dever-se-ia postular um domínio semelhante e correspondente de atividade intelectual ascendente, como nível supraconsciente: uma zona de contato imediato com a entidade do espírito residente, o Ajustador do Pensamento. Os grandes perigos de todas as especulações psíquicas são que as visões e as outras experiências, chamadas de místicas, junto com os sonhos extraordinários, cheguem a ser considerados todos como comunicações divinas à mente humana. Nos tempos passados, os seres divinos revelaram-se a algumas pessoas sabedoras de Deus, não por causa dos transes místicos nem das visões mórbidas delas, mas a despeito de todos esses fenômenos.

100:5:7 10995 Em contraste com a busca da conversão, o melhor modo de aproximação das zonas moronciais de contato possível com o Ajustador do Pensamento seria por meio da fé viva e da adoração sincera, da oração feita de todo o coração e sem egoísmo. De um modo geral, a maior parte das memórias que advieram de níveis inconscientes da mente humana tem sido confundida com revelações divinas e comandos espirituais.

100:5:8 10996 Um grande perigo está ligado à prática habitual do sonho religioso, estando acordado; o misticismo pode tornar-se uma técnica para evitar-se a realidade, se bem que haja sido, algumas vezes, um meio de comunhão espiritual genuína. Períodos curtos de retirada da cena das ocupações da vida podem não ser seriamente perigosos, mas o isolamento prolongado da personalidade é bastante indesejável. Sob nenhuma circunstância deveria o estado de transe de consciência visionária ser cultivado como uma experiência religiosa.

100:5:9 10997 As características do estado místico são a difusão da consciência, com ilhas vívidas de atenção focalizada, operando num intelecto relativamente passivo. Tudo isso faz a consciência gravitar na direção do subconsciente mais do que na direção da zona de contato espiritual, o supraconsciente. Muitos místicos levaram a sua dissociação mental até o ponto de manifestações mentais anormais.

100:5:10 11001 A atitude mais saudável de meditação espiritual é colocar-se em adoração reflexiva e em oração de agradecimento. A comunhão direta com o próprio Ajustador do Pensamento, tal como ocorreu nos últimos anos da vida de Jesus na carne, não deveria ser confundida com essas experiências chamadas de místicas. Os fatores que contribuem para a iniciação da comunhão mística denotam, em si, o perigo desses estados psíquicos. O estado místico é favorecido por coisas tais como: a fadiga física, o jejum, a dissociação psíquica, a experiência estética profunda, os impulsos sexuais vívidos, o medo, a ansiedade, o furor e as danças selvagens. A maior parte do material que surge como resultado dessas preparações preliminares tem a sua origem na mente subconsciente.

100:5:11 11002 Por mais favoráveis que possam ter sido as condições para os fenômenos místicos, deveria ser claramente compreendido que Jesus de Nazaré nunca recorreu a tais métodos para a sua comunhão com o Pai do Paraíso. Jesus não tinha alucinações subconscientes, nem ilusões do supraconsciente.

6. OS SINAIS DO VIVER RELIGIOSO


100:6:1 11003 As religiões evolucionárias e as religiões da revelação podem diferir bastante pelos métodos, mas são muito semelhantes pelas suas motivações. A religião não é uma função específica da vida; é antes um modo de viver. A verdadeira religião é uma devoção sincera a alguma realidade que o religioso considera ser de valor supremo para si próprio e para toda a humanidade. E as características mais destacadas de todas as religiões são: a lealdade inquestionável e a devoção, de coração puro, aos valores supremos. Essa devoção religiosa aos valores supremos é mostrada na relação da mãe, supostamente irreligiosa, para com o seu filho, e na lealdade fervorosa dos não religiosos a uma causa esposada por eles.

100:6:2 11004 O valor supremo aceito para o religioso pode ser ignóbil ou falso mesmo, mas, apesar de tudo, ele é religioso. Uma religião é genuína na medida em que o valor que é tido como supremo é verdadeiramente uma realidade cósmica de valor espiritual.

100:6:3 11005 Os sinais da sensibilidade humana ao impulso religioso abrangem as qualidades de nobreza e de grandeza. O religioso sincero é consciente da cidadania universal e é ciente de fazer contato com fontes de poder supra-humano. Ele emociona-se e energiza-se pela segurança de pertencer à fraternidade superior e enobrecida dos filhos de Deus. A consciência da dignidade própria tornou-se aumentada pelo estímulo da busca dos objetivos mais elevados no universo – as metas supremas.

100:6:4 11006 O eu rendeu-se ao ímpeto intrigante de uma motivação todo-abrangente que impõe uma autodisciplina maior, que reduz o conflito emocional e torna a vida mortal verdadeiramente digna de ser vivida. O reconhecimento mórbido das limitações humanas é transformado na consciência natural das falhas mortais, associada à determinação moral e à aspiração espiritual de atingir as metas universais e superuniversais mais elevadas. E essa luta intensa para alcançar os ideais supramortais é sempre caracterizada por uma paciência crescente, pela indulgência, pela fortaleza e pela tolerância.

100:6:5 11007 A verdadeira religião, contudo, é um amor vivo, uma vida de serviço. O distanciamento do religioso de muito daquilo que é puramente temporal e trivial nunca leva ao isolamento social, e não deveria destruir o senso de humor. A religião genuína não tira nada da existência humana, mas acrescenta, sim, um novo sentido a tudo na vida; gera novos tipos de entusiasmo, de zelos e de coragem. Pode até mesmo engendrar o espírito das cruzadas, o que é mais do que perigoso, se não for controlado pelo discernimento espiritual e pela devoção leal às obrigações sociais comuns das lealdades humanas.

100:6:6 11011 Um dos mais surpreendentes sinais para a identificação da vida religiosa é aquela paz dinâmica e sublime, aquela paz que está além de todo entendimento humano, aquele equilíbrio cósmico que indica a ausência de toda dúvida e tumulto. Tais níveis de estabilidade espiritual são imunes ao desapontamento. Os religiosos assim são como o apóstolo Paulo, que disse: “Estou persuadido de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem os poderes, nem as coisas presentes, nem as coisas que estão por vir, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer outra coisa será capaz de nos separar do amor de Deus”.

100:6:7 11012 Há um senso de segurança, associado à realização da glória triunfante, que reside na consciência do religioso que compreendeu a realidade do Supremo e persegue a meta do Último.

100:6:8 11013 Mesmo a religião evolucionária é tudo isso, em lealdade e grandeza, porque é uma experiência genuína. Contudo, a religião revelada tanto tem de excelência quanto de autenticidade. As novas lealdades, na visão espiritual ampliada, criam novos níveis de amor e de devoção, de serviço e de companheirismo; e toda essa perspectiva social ampliada produz uma consciência maior da Paternidade de Deus e da irmandade dos homens.

100:6:9 11014 A diferença característica entre a religião que evoluiu e a religião revelada é uma qualidade nova de sabedoria divina, que é acrescentada à sabedoria humana puramente experiencial. No entanto, é a experiência dentro das religiões humanas que desenvolve a capacidade para a recepção das dádivas subseqüentes de mais sabedoria divina e discernimento cósmico.

7. O APOGEU DA VIDA RELIGIOSA


100:7:1 11015 Embora o mortal comum de Urântia não possa esperar atingir a alta perfeição de caráter que Jesus de Nazaré adquiriu, enquanto permaneceu na carne, é totalmente possível a todo mortal crente desenvolver uma personalidade forte e unificada, pautando-se pelas linhas perfeccionadas da personalidade de Jesus. O aspecto singular da personalidade do Mestre não era tanto a sua perfeição, quanto a sua simetria, a sua unificação extraordinária e equilibrada. A apresentação mais efetiva de Jesus consiste em seguir o exemplo daquele que disse, enquanto gesticulava na direção do Mestre, de pé diante dos seus acusadores: “Eis o homem!”

100:7:2 11016 A bondade infalível de Jesus tocava os corações dos homens, mas a sua força inflexível de caráter maravilhava os seus seguidores. Ele era verdadeiramente sincero; nada havia de hipócrita nele. Ele não tinha afetação; era sempre reanimadoramente autêntico. Nunca condescendia em pretensões, e nunca recorria à trapaça. Ele viveu a verdade, do mesmo modo que a ensinou. Ele foi a verdade. Foi forçado a proclamar a verdade salvadora à sua geração, ainda que tanta sinceridade algumas vezes haja causado dor. Ele foi inquestionavelmente leal a toda verdade.

100:7:3 11017 O Mestre, porém, era tão razoável, tão acessível. Ele era tão prático em todas as suas ministrações e, ao mesmo tempo, todos os seus planos eram caracterizados por um senso comum tão santificado. Ele era tão liberto de qualquer tendência à extravagância, à irregularidade e à excentricidade. Nunca era caprichoso, esquisito nem histérico. Em todos os seus ensinamentos e em tudo o que fazia, havia uma discriminação depurada, ligada a um senso extraordinário daquilo que é apropriado.

100:7:4 11021 O Filho do Homem foi sempre uma personalidade bem equilibrada. Mesmo os seus inimigos mantinham um respeito salutar por ele; eles chegavam mesmo a temer a sua presença. Jesus não conhecia o medo. Ele transbordava de entusiasmo divino, mas nunca se tornou um fanático. Era emocionalmente ativo, mas nunca inconstante. Era imaginativo, mas sempre prático. Ele enfrentava as realidades da vida com franqueza, mas nunca chegava a ficar embotado nem prosaico. Era corajoso, mas nunca descuidado; prudente, mas nunca covardemente. Ele era compassivo, mas não era sentimental; único, sem ser excêntrico. Ele era pio, mas não era santarrão. E era assim bem equilibrado, porque era perfeitamente bem unificado.

100:7:5 11022 A originalidade de Jesus não era sufocante. Ele não estava preso pela tradição, nem limitado pela escravização a nenhum convencionalismo restritivo. Ele falava com uma confiança segura e ensinava com autoridade absoluta. Contudo, a sua originalidade superior não o levava a negligenciar as pérolas da verdade nos ensinamentos dos seus predecessores e contemporâneos. E o mais original dos seus ensinamentos foi a ênfase no amor e na misericórdia, em lugar do medo e do sacrifício.

100:7:6 11023 Jesus era muito amplo de visão. Ele exortava os seus seguidores a pregar o evangelho a todos os povos. Não tinha nenhuma estreiteza de mente. O seu coração compassivo abraçava toda a humanidade, e mesmo um universo. Sempre a sua exortação era: “Quem quiser vir, que venha”.

100:7:7 11024 De Jesus foi realmente dito: “Ele confiou em Deus”. Como um homem entre os homens, ele confiou de um modo muito sublime no Pai do céu. Ele confiou no seu Pai, como uma criança pequena confia no seu pai terreno. A sua fé foi perfeita, mas nunca presunçosa. Não importa quão cruel a natureza possa parecer, nem quão indiferente possa ser ao bem-estar do homem na Terra, Jesus nunca faltou com a sua fé. Ele era imune ao desapontamento e inatingível pela perseguição. Ele não permaneceu intacto diante do fracasso aparente.

100:7:8 11025 Jesus amou os homens como irmãos, ao mesmo tempo reconhecendo quão diferentes eram os seus dons inatos e as suas qualidades adquiridas. “Ele escolheu o seu caminho de fazer o bem. ”

100:7:9 11026 Jesus era uma pessoa inusitadamente alegre, mas não era um otimista cego e pouco razoável. A sua palavra de constante exortação era: “Tende ânimo”. Ele podia manter a sua atitude confiante por causa da sua fé inabalável em Deus e na sua confiança imperturbável no homem. Ele demonstrou sempre uma consideração tocante por todos os homens, porque ele os amava e acreditava neles. E ainda foi sempre fiel às suas convicções e magnificamente firme na sua devoção de fazer a vontade do seu Pai.

100:7:10 11027 O Mestre foi sempre generoso. Ele nunca se cansou de dizer: “Dar é mais abençoado do que receber”. Dizia ele: “Gratuitamente recebestes, dai gratuitamente”. E ainda, com toda a sua ilimitada generosidade, ele nunca foi esbanjador nem extravagante. Ele ensinou que vós deveis acreditar para receber a salvação. “Pois todo aquele que procura receberá. ”

100:7:11 11028 Ele era candidamente direto, mas sempre afável. Ele dizia: “Se assim não fosse, eu vos teria dito”. E era franco, mas sempre amigável. Era aberto no seu amor pelos pecadores e no seu ódio ao pecado. Contudo, mesmo com a sua surpreendente franqueza, ele foi infalivelmente justo.

100:7:12 11029 Jesus era alegre de um modo consistente, não obstante algumas vezes ele bebesse profundamente da taça do sofrimento humano. Destemidamente, ele enfrentou as realidades da existência, e permaneceu pleno de entusiasmo pelo evangelho do Reino. Ele, porém, controlava o seu entusiasmo; nunca se deixou controlar por ele. Era dedicado sem reservas aos “assuntos do Pai”. Esse entusiasmo divino levou os seus irmãos não espiritualizados a pensarem que ele estava fora de si, mas o universo que o observava apreciava-o como modelo de sanidade e como arquétipo da suprema devoção mortal aos altos padrões da vida espiritual. E o seu entusiasmo controlado era contagioso; os seus companheiros eram levados a compartilhar do seu otimismo divino.

100:7:13 11031 Este homem da Galiléia não era um homem de tristezas; era uma alma da alegria. Estava sempre dizendo: “Rejubilai-vos na mais repleta alegria”. Todavia, quando o dever exigia, ele estava disposto a caminhar corajosamente no “vale da sombra da morte”. Ele era jubiloso, mas, ao mesmo tempo, humilde.

100:7:14 11032 A sua coragem só era igualada pela sua paciência. Quando pressionado a agir prematuramente, ele apenas respondia: “Minha hora ainda não chegou”. Ele nunca tinha pressa; a sua serenidade era sublime. No entanto, freqüentemente, tornava-se indignado com o mal, e intolerante com o pecado. Muitas vezes, ele foi levado a resistir àquilo que era contrário ao bem-estar dos seus filhos da Terra. E a sua indignação contra o pecado levou-o a ficar enraivecido com os pecadores.

100:7:15 11033 A coragem de Jesus era magnífica, mas não era nunca irrefletido. A sua palavra-chave foi: “não temais”. A sua bravura era elevada, e a sua coragem, freqüentemente heróica. No entanto, a sua coragem estava ligada à prudência e era controlada pela razão. Era uma coragem nascida da fé, não da presunção cega pela negligência. Ele era verdadeiramente valente, mas nunca atrevido.

100:7:16 11034 O Mestre era um modelo de reverência. A prece, já na sua juventude, começava com: “Pai nosso que estás no céu, santificado seja o teu nome”. Ele era respeitoso até mesmo com o culto errôneo dos seus irmãos. Isso não o deteve, todavia, de condenar as tradições religiosas nem de atacar os erros das crenças humanas. Ele reverenciava a verdadeira santidade, e ainda podia apelar para os seus semelhantes dizendo: “Quem dentre vós me condena de pecado?”

100:7:17 11035 Jesus foi grande, porque era bom e, mais, ele confraternizava com as crianças pequenas. Ele era gentil e despretensioso na sua vida pessoal e, ainda, era ele o homem perfeccionado de todo um universo. Os seus companheiros chamavam-no espontaneamente de Mestre.

100:7:18 11036 Jesus foi a personalidade humana perfeitamente unificada. E ainda agora, como na época da Galiléia, ele continua a unificar a experiência mortal e a coordenar os esforços humanos. Ele unifica a vida, enobrece o caráter e simplifica a experiência. Ele entra na mente humana para elevá-la, para transformá-la e transfigurá-la. É literalmente verdade que: “Se qualquer homem tem Cristo Jesus dentro dele, ele é uma nova criatura; as velhas coisas estão passando; olhai, que todas as coisas estão-se tornando novas”.

100:7:19 11037 [Apresentado por um Melquisedeque de Nebadon.]

DOCUMENTO 101

A NATUREZA REAL DA RELIGIÃO
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A religião, enquanto experiência humana, estende-se desde a escravidão primitiva do medo, no selvagem em evolução, até a liberdade sublime e magnífica da fé, naqueles mortais civilizados que se acham esplendidamente conscientes da sua filiação ao Deus eterno.

101:0:2 11042 A religião é ancestral das éticas avançadas e da moral superior, na evolução social progressiva. Contudo, a religião, como tal, não é meramente um movimento moral, embora as suas manifestações exteriores e sociais sejam fortemente influenciadas pelo momentum ético e moral da sociedade humana. A religião é sempre a inspiração da natureza do homem que evolui, mas não é o segredo dessa evolução.

101:0:3 11043 A religião, a convicção-fé da personalidade, pode sempre triunfar sobre a lógica superficialmente contraditória do desespero que nasce na mente material incrédula. Há realmente uma voz interior verdadeira e genuína, aquela “luz verdadeira que ilumina a todos os homens que vêm ao mundo”. E esse guiamento do espírito é diferente da conclamação ética da consciência humana. O sentimento de segurança religiosa é mais do que um sentimento emocional. A segurança da religião transcende à razão da mente, e mesmo à lógica da filosofia. A religião é fé, confiança e segurança.

1. A VERDADEIRA RELIGIÃO


101:1:1 11044 A verdadeira religião não é um sistema de crença filosófica que possa ser deduzido pela razão, nem consubstanciado por provas naturais, nem é uma experiência fantástica e mística de sentimentos indescritíveis de êxtase a serem desfrutados apenas pelos devotos românticos do misticismo. A religião não é produto da razão, mas, quando vista do seu interior, ela é plenamente racional. A religião não se deriva da lógica da filosofia humana, mas, como uma experiência mortal, é plenamente lógica. A religião é a experiência da divindade pela consciência de um ser moral de origem evolucionária; representa a verdadeira experiência com as realidades eternas no tempo, a realização das satisfações espirituais enquanto ainda na carne.

101:1:2 11045 Os Ajustadores do Pensamento não têm nenhum mecanismo especial por meio do qual ganhar auto-expressão; não há nenhum atributo religioso místico que proporcione a recepção ou a expressão das emoções religiosas. Tais experiências tornam-se disponíveis por meio do mecanismo naturalmente dotado da mente mortal. E nisso repousa uma explicação da dificuldade do Ajustador de entrar em comunicação direta com a mente material da sua residência constante.

101:1:3 11046 O espírito divino faz contato com o homem mortal, não por sentimentos nem emoções, mas no domínio do pensamento mais elevado e mais espiritualizado. São os vossos pensamentos, não os vossos sentimentos, que vos conduzem a Deus. A natureza divina pode ser percebida apenas com os olhos da mente. No entanto, a mente que realmente discerne Deus, que escuta o Ajustador residente, é a mente pura. “Sem consagrar-se, nenhum homem pode ver o Senhor. ” Toda essa comunhão interior e espiritual é chamada discernimento espiritual. Tais experiências religiosas resultam da impressão feita na mente do homem pelas atuações combinadas do Ajustador e do Espírito da Verdade, funcionando entre e sobre as idéias, os ideais, sobre a visão interior e sobre os esforços espirituais dos filhos de Deus em evolução.

101:1:4 11051 A religião vive e prospera, assim, não pela visão, nem pelo sentimento, mas antes pela fé e pelo discernimento interior. Não consiste na descoberta de fatos novos, nem no que se encontra por meio de uma experiência única, mas antes na descoberta de significados novos e espirituais nos fatos já bem conhecidos da humanidade. A mais elevada experiência religiosa não depende de ações anteriores de crença, de tradição e de autoridade; nem é a religião filha de sentimentos sublimes e de emoções puramente místicas. É, antes, uma experiência profunda e factual de comunhão espiritual, com as influências do espírito residente dentro da mente humana e, tanto quanto essa experiência pode ser definível em termos de psicologia, é simplesmente a experiência de vivenciar a realidade de crer em Deus como a realidade desse evento puramente pessoal.

101:1:5 11052 Conquanto a religião não seja produto de especulações racionalistas de uma cosmologia material, ela é, entretanto, a criação de um discernimento interior plenamente racional que se origina na experiência da mente do homem. A religião não nasce de meditações místicas, nem de contemplações isoladas, ainda que seja mais ou menos misteriosa e sempre indefinível e inexplicável, em termos de uma razão puramente intelectual ou de uma lógica filosófica. Os germes da verdadeira religião originam-se no âmbito da consciência moral do homem e são revelados no crescimento do discernimento interior espiritual do homem: aquela faculdade da personalidade humana que se torna acrescida em conseqüência da presença do Ajustador e que revela Deus à mente mortal sedenta Dele.

101:1:6 11053 A fé une o discernimento moral à discriminação conscienciosa dos valores, e o sentido do dever evolucionário preexistente completa o ancestral da verdadeira religião. A experiência da religião, finalmente, resulta em uma consciência firme de Deus e em uma segurança inquestionável da sobrevivência da personalidade que acredita.

101:1:7 11054 Assim, pode-se perceber que as aspirações religiosas e os impulsos espirituais não são de uma natureza tal que levaria meramente os homens a querer crer em Deus mas são, antes, de uma natureza e um poder tal que os homens ficam profundamente impressionados com a convicção de que deveriam acreditar em Deus. O sentido do dever evolucionário e as obrigações conseqüentes da iluminação da revelação causam uma impressão tão profunda sobre a natureza moral do homem, que ele finalmente alcança aquela posição de mente e aquela atitude de alma por meio das quais ele conclui que não tem direito de não acreditar em Deus. A sabedoria mais elevada e suprafilosófica dos indivíduos esclarecidos e disciplinados instrui-os, em ultimidade, que duvidar de Deus ou não confiar na Sua bondade seria uma prova de infidelidade para com a coisa mais real e mais profunda dentro da mente e da alma humana – o Ajustador divino.

2. A RELIGIÃO COMO UM FATO


101:2:1 11055 A realidade da religião consiste inteiramente na experiência religiosa de seres humanos racionais e comuns. E é nesse sentido, unicamente, que a religião poderia ser considerada como científica ou mesmo psicológica. A prova de que a revelação é revelação, é esse mesmo fato da experiência humana: o fato de que a revelação sintetiza as ciências da natureza, aparentemente divergentes, bem como sintetiza a teologia da religião numa filosofia, consistente e lógica, do universo, uma explicação coordenada e contínua da ciência e da religião, criando, assim, uma harmonia de mente e uma satisfação de espírito que respondem, para a experiência humana, àqueles questionamentos da mente mortal a qual almeja saber como o Infinito opera a sua vontade e os seus planos na matéria, com as mentes e dentro do espírito.

101:2:2 11061 A razão é o método da ciência; a fé é o método da religião; a lógica é a técnica com que a filosofia tenta lidar. A revelação compensa a ausência do ponto de vista moroncial, fornecendo uma técnica para alcançar a unidade na compreensão da realidade e das relações entre a matéria e o espírito, pela mediação da mente. E a verdadeira revelação jamais afasta a ciência da natureza, nem a religião da razão, ou a filosofia da lógica.

101:2:3 11062 A razão, por meio do estudo da ciência, pode levar a natureza até uma Primeira Causa, mas ela requer uma fé religiosa para transformar a Causa Primeira da ciência em um Deus de salvação; e a revelação é ainda requerida para a validação de tal fé, o discernimento espiritual interior.

101:2:4 11063 Há duas razões básicas para crer em um Deus que fomenta a sobrevivência humana:

11064 1. A experiência humana e a certeza pessoal; a esperança e a confiança de algum modo iniciadas e de algum modo registradas pelo Ajustador residente.

11065 2. A revelação da verdade, seja pela ministração direta pessoal do Espírito da Verdade, na auto-outorga neste mundo de Filhos divinos, seja por meio das revelações em palavra escrita.

101:2:5 11066 A ciência completa a sua busca por meio da razão na hipótese de uma Causa Primeira. A religião não pára no seu vôo de fé, até estar segura de um Deus de salvação. O estudo discriminado da ciência sugere logicamente a realidade e a existência de um Absoluto. A religião acredita sem reservas na existência e na realidade de um Deus que fomenta a sobrevivência da personalidade. Aquilo que a metafísica deixa totalmente de fazer, e aquilo que mesmo a filosofia parcialmente fracassa em fazer, a revelação faz; isto é, afirma que essa Primeira Causa da ciência e o Deus da Salvação da religião são uma e a mesma Deidade.

101:2:6 11067 A razão é a prova da ciência, a fé, a prova da religião, a lógica, a prova da filosofia, mas a revelação é validada apenas pela experiência humana. A ciência gera conhecimento; a religião gera felicidade; a filosofia gera a unidade; a revelação confirma a harmonia experiencial dessa abordagem trina da realidade universal.

101:2:7 11068 A contemplação da natureza apenas pode revelar um Deus da natureza, um Deus do movimento. A natureza exibe apenas matéria, movimento e animação – a vida. Matéria mais energia, sob certas condições, manifesta-se em formas vivas, mas, se bem que a vida natural seja assim relativamente contínua como fenômeno, ela é totalmente transitória quanto às individualidades. A natureza não provê uma base para a crença lógica na sobrevivência da personalidade humana. O homem religioso que encontra Deus na natureza, já encontrara, primeiro, esse mesmo Deus pessoal na sua própria alma.

101:2:8 11069 A fé revela Deus na alma. A revelação, a substituta do discernimento moroncial interior num mundo evolucionário, capacita o homem a ver na natureza o mesmo Deus que pela fé se manifesta na sua alma. Assim, a revelação faz com êxito uma ponte, atravessando o abismo entre o material e o espiritual, e mesmo entre a criatura e o Criador, entre o homem e Deus.

101:2:9 11071 A contemplação da natureza conduz logicamente a um guiamento interior inteligente, e mesmo até uma orientação vivencial, mas, de nenhum modo satisfatório, ela revela um Deus pessoal. A natureza, por outro lado, também não demonstra nada que impeça que o universo possa ser considerado como uma obra do mesmo Deus da religião. Deus não pode ser encontrado somente por meio da natureza, mas o fato de que o homem O haja encontrado torna o estudo da natureza integralmente consistente com uma interpretação mais elevada e mais espiritual do universo.

101:2:10 11072 A revelação, como fenômeno para uma época, é periódica; como experiência humana pessoal, é contínua. A divindade opera na personalidade mortal como dádiva do Ajustador do Pai, como Espírito da Verdade do Filho e como Espírito Santo do Espírito do Universo, pois esses três dons supramortais estão unificados na evolução experiencial humana como ministração do Supremo.

101:2:11 11073 A verdadeira religião é um vislumbrar da realidade, é a filha da fé dentro da consciência moral, e não um assentimento meramente intelectual dado a um corpo doutrinário dogmático qualquer. A verdadeira religião consiste na experiência de que “o Espírito, ele próprio, dá um testemunho para o nosso espírito de que nós somos os filhos de Deus”. A religião não consiste em proposições teológicas, mas no discernimento espiritual interior e na sublimidade da confiança da alma.

101:2:12 11074 A vossa natureza mais profunda – o Ajustador divino – cria dentro de vós a fome e a sede de retidão, um certo anseio pela perfeição divina. A religião é o ato de fé no reconhecimento desse impulso interno de realização divina; e assim nascem a confiança e a segurança de alma, as quais vós reconhecereis como o caminho da salvação, a técnica de sobrevivência da personalidade e de todos aqueles valores que viestes a considerar como sendo verdadeiros e bons.

101:2:13 11075 O entendimento na religião nunca tem sido e nunca será dependente de um grande aprendizado, nem de uma lógica hábil. Ele é discernimento espiritual, e essa é exatamente a razão pela qual alguns dos maiores educadores religiosos do mundo e mesmo os profetas, algumas vezes, possuíram tão pouco da sabedoria profana do mundo. A fé religiosa está disponível tanto para os instruídos como para os ignorantes.

101:2:14 11076 A religião deve ser sempre a sua própria crítica e juíza; não pode nunca ser observada e muito menos compreendida, do lado de fora. A vossa segurança num Deus pessoal consiste no vosso próprio discernimento quanto à vossa crença nas coisas espirituais, e na vossa experiência delas. Para todos os vossos companheiros que tiveram uma experiência semelhante, nenhuma argumentação sobre a personalidade ou a realidade de Deus se faz necessária, ao passo que, para todos os outros homens que não estão assim tão seguros de Deus, nenhuma argumentação possível pode jamais ser de fato convincente.

101:2:15 11077 A psicologia, na verdade, pode tentar estudar o fenômeno das reações religiosas ao ambiente social, mas nunca pode esperar penetrar os motivos reais e interiores, nem os trabalhos da religião. Apenas a teologia, domínio da fé e da técnica da revelação, pode proporcionar qualquer espécie inteligente de explicação quanto à natureza e ao conteúdo da experiência religiosa.

3. AS CARACTERÍSTICAS DA RELIGIÃO


101:3:1 11078 A religião é tão vital que sobrevive, ainda que na ausência de instrução. Vive a despeito da contaminação que possa ter de cosmologias errôneas e de filosofias falsas; sobrevive mesmo à confusão da metafísica. Durante todas as vicissitudes históricas da religião, persiste sempre o que é indispensável ao progresso e à sobrevivência humana: o conhecimento da ética e a consciência prática da moral.

101:3:2 11081 A fé-discernimento ou a intuição espiritual é o dom da mente cósmica associado ao trabalho do Ajustador do Pensamento, o qual é uma dádiva do Pai ao homem. A razão espiritual, a inteligência da alma, é dom do Espírito Santo, dádiva do Espírito Criativo ao homem. A filosofia espiritual, a sabedoria das realidades espirituais, é dom do Espírito da Verdade, a dádiva conjugada dos Filhos auto-outorgados aos filhos dos homens. E a coordenação e a interassociação desses dons de espírito constituem, dentro do homem, uma personalidade espiritual com um destino potencial.

101:3:3 11082 É essa mesma personalidade espiritual, sob a sua forma primitiva e embrionária, na posse do Ajustador, que sobrevive à morte natural na carne. Essa entidade composta de origem espiritual, em associação com a experiência humana, fica capacitada, por intermédio da forma de vida provida pelos Filhos divinos, a sobreviver (conservada pelo Ajustador) à dissolução do eu material da mente e da matéria, quando essa sociedade transitória, do material e do espiritual, for rompida pela cessação do movimento vital.

101:3:4 11083 Por meio da fé religiosa, a alma do homem revela a si própria e demonstra a divindade potencial da sua natureza emergente, do modo característico pelo qual ela induz a personalidade mortal a reagir a certas situações intelectuais e sociais de provação e de teste. A fé espiritual genuína (a consciência moral verdadeira) é revelada naquilo que:

11084 1. Faz a ética e a moral progredirem, a despeito de tendências animais inerentes e adversas.

11085 2. Produz uma sublime confiança na bondade de Deus, mesmo em face de um amargo desapontamento ou de derrotas esmagadoras.

11086 3. Gera uma coragem e uma confiança profundas, a despeito de adversidades naturais e de calamidades físicas.

11087 4. Demonstra um equilíbrio inexplicável e uma tranqüilidade que se fortifica, a despeito de doenças desconcertantes e mesmo de um sofrimento físico agudo.

11088 5. Mantém um misterioso equilíbrio e o élan da personalidade, em face de maus-tratos e da mais flagrante injustiça.

11089 6. Mantém uma confiança divina na vitória última, a despeito das crueldades de um destino aparentemente cego e da indiferença aparentemente total das forças naturais para com o bem-estar humano.

110810 7. Persiste inquebrantável na crença em Deus, a despeito de todas as demonstrações, em contrário, da lógica, e resiste com êxito a todos os outros sofismas intelectuais.

110811 8. Continua a demonstrar uma fé audaz na sobrevivência da alma, apesar dos ensinamentos enganosos da falsa ciência e das ilusões persuasivas das filosofias tendenciosas.

110812 9. Vive e triunfa independentemente da sobrecarga esmagadora das civilizações complexas e fanatizadas dos tempos modernos.

110813 10. Contribui para a sobrevivência continuada do altruísmo, a despeito do egoísmo humano, dos antagonismos sociais, da usura industrial e dos desajustes políticos.

110814 11. Adere com firmeza a uma crença sublime na unidade do universo e no guiamento divino, sem preocupações quanto à presença perturbadora do mal e do pecado.

110815 12. Continua adorando a Deus a despeito de tudo e de todos. Ousa declarar: “Ainda que Ele me mate, ainda assim servirei a Ele”.

101:3:5 110816 Sabemos, pois, por intermédio de três fenômenos, que o homem tem um espírito divino, ou espíritos, residindo dentro dele: primeiro, pela experiência pessoal – a fé religiosa – ; segundo, pela revelação – pessoal e racial – ; e terceiro, pela demonstração surpreendente das reações extraordinárias, e não inatas, ao meio ambiente material, conforme ilustram as doze atuações de cunho espiritual, em face das situações de provação na vida real que acabamos de citar. E ainda há outras.

101:3:6 11091 E é precisamente essa atuação vital e vigorosa da fé, no domínio da religião, que autoriza o homem mortal a afirmar a posse pessoal e a existência da realidade espiritual de um dom que coroa a natureza humana: a experiência religiosa.

4. AS LIMITAÇÕES DA REVELAÇÃO


101:4:1 11092 Pelo fato de que o vosso mundo geralmente é ignorante das origens, e mesmo das origens físicas, pareceu ser sábio, de tempos em tempos, prover instrução sobre a cosmologia; mas isso sempre gera problemas no futuro. As leis da revelação impedem-nos grandemente, pela proscrição que fazem sobre transmitir conhecimento ainda imerecido ou prematuro. Qualquer cosmologia apresentada como uma parte da religião revelada destina-se a ser ultrapassada num tempo muito curto. Em conseqüência, os estudantes futuros dessa revelação serão tentados a descartar qualquer elemento de verdade religiosa genuína que possa conter, porque descobrem erros nas cosmologias apresentadas conseqüentemente neles.

101:4:2 11093 A humanidade deveria compreender que nós, que participamos da revelação da verdade, somos muito rigorosamente limitados pelas instruções dos nossos superiores. Não temos liberdade de antecipar as descobertas científicas de mil anos. Os reveladores devem agir de acordo com as instruções que formam uma parte do mandato da revelação. Nós não vemos como superar essa dificuldade, agora ou em qualquer tempo futuro. Sabemos perfeitamente que, embora os fatos históricos e as verdades religiosas da presente série de apresentações reveladoras fiquem nos registros das idades que virão, dentro de uns poucos curtos anos, muitas das nossas afirmações a respeito das ciências físicas estarão necessitando de revisão, em conseqüência de novos desenvolvimentos científicos e de novas descobertas. Esses novos desenvolvimentos, desde agora, nós os prevemos, mas estamos proibidos de incluir, nos registros reveladores, esses fatos não descobertos pela humanidade. Que fique claro que as revelações não são necessariamente inspiradas. A cosmologia nessas revelações não é inspirada. Ela é limitada pela permissão que temos de coordenação e de triagem do conhecimento de hoje. Conquanto o discernimento divino ou espiritual seja uma dádiva, a sabedoria humana deve evoluir.

101:4:3 11094 A verdade é sempre uma revelação: é uma auto-revelação, quando emerge como resultado do trabalho do Ajustador residente; é uma revelação para uma época, quando é apresentada pelo trabalho de alguma outra agência, grupo ou personalidade celeste.

101:4:4 11095 Em última análise, a religião deve ser julgada pelos seus frutos, segundo o modo e a extensão pelos quais demonstra a sua excelência inerente e divina.

101:4:5 11096 A verdade não pode ser senão relativamente inspirada, se bem que a revelação seja invariavelmente um fenômeno espiritual. Ainda que as afirmações que se refiram à cosmologia nunca sejam inspiradas, estas revelações são de um valor imenso, ao menos transitoriamente, tornando os conhecimentos claros, pois elas:

11098 1. Reduzem a confusão, por meio de uma eliminação do erro, com autoridade.

11099 2. Fazem a coordenação dos fatos e observações que são conhecidos ou que estão para ser conhecidos.

11101 3. Restauram partes importantes do conhecimento perdido a respeito de acontecimentos de uma época num passado distante.

11102 4. Fornecem a informação que preencherá lacunas vitais no conhecimento adquirido de outro modo.

11103 5. Apresentam dados cósmicos, de modo a iluminar os ensinamentos espirituais contidos na revelação que os acompanha.

5. A RELIGIÃO EXPANDIDA PELA REVELAÇÃO


101:5:1 11104 A revelação é uma técnica por meio da qual idades e mais idades de tempo são poupadas do trabalho necessário de triar e de separar os erros cometidos na evolução das verdades adquiridas pelo espírito.

101:5:2 11105 A ciência lida com os fatos; a religião ocupa-se apenas dos valores. Por intermédio da filosofia esclarecida, a mente esforça-se para unir os significados dos fatos e dos valores, chegando, assim, a um conceito da realidade completa. Lembrai-vos de que a ciência é o domínio do conhecimento, a filosofia, o reino da sabedoria, e a religião, a esfera da experiência pela fé. A religião, entretanto, apresenta duas fases de manifestação:

101:5:3 11106 1. A religião evolucionária. É a experiência da adoração primitiva, a religião que se deriva da mente.

101:5:4 11107 2. A religião revelada. É a atitude universal que se deriva do espírito; é a convicção e a crença na conservação das realidades eternas, a sobrevivência da personalidade e a realização de alcançar, afinal, a Deidade cósmica, cujo propósito tornou tudo isso possível. É parte do plano do universo que, mais cedo ou mais tarde, a religião evolucionária esteja destinada a receber a expansão espiritual da revelação.

101:5:5 11108 Tanto a ciência quanto a religião começam por assumir certas bases, geralmente aceitas, para deduções lógicas. Assim, também a filosofia começa a sua carreira assumindo a realidade de três coisas:

11109 1. O corpo material.

111010 2. A fase supramaterial do ser humano, a alma, ou mesmo o espírito residente.

111011 3. A mente humana, o mecanismo de intercomunicação e de interassociação entre o espírito e a matéria, entre o material e o espiritual.

101:5:6 111012 Os cientistas reúnem os fatos, os filósofos coordenam as idéias, enquanto os profetas exaltam os ideais. O sentimento e a emoção acompanham invariavelmente a religião, mas eles não são religião. A religião pode ser o sentimento da experiência, mas dificilmente é a experiência de sentimentos. Nem a lógica (a racionalização), nem a emoção (o sentimento) fazem, essencialmente, parte da experiência religiosa, se bem que ambas possam estar associadas, de um modo variável, ao exercício da fé para fazer o discernimento espiritual progredir até o discernimento da realidade, tudo de acordo com o status da mente individual e das tendências do temperamento dessa mente.

101:5:7 111013 A religião evolucionária é a exteriorização do dom do ajudante da mente, do universo local, encarregado de criar e fomentar a tendência à adoração no homem evolucionário. As religiões primitivas estão diretamente interessadas na ética e na moral, no senso humano do dever. Tais religiões estão fundadas na segurança da consciência e resultam na estabilização de civilizações relativamente éticas.

101:5:8 11111 As religiões pessoalmente reveladas são promovidas pelos espíritos de outorga, que representam as três pessoas da Trindade do Paraíso e que se ocupam especialmente da expansão da verdade. A religião evolucionária faz o indivíduo lembrar-se da idéia do dever pessoal; a religião revelada dá ênfase crescente ao amor, à regra de ouro.

101:5:9 11112 A religião que evoluiu repousa integralmente na fé. A revelação dá a segurança suplementar da sua apresentação expandida das verdades da divindade e da realidade, e dá um testemunho de valor ainda maior sobre a experiência de fato que se acumula em conseqüência da união prática eficiente entre a fé vinda da evolução e a verdade vinda da revelação. Essa união eficiente da fé humana e da verdade divina constitui uma posse que tem um caráter bastante bem encaminhado para adquirir, de fato, uma personalidade moroncial.

101:5:10 11113 A religião evolucionária apenas proporciona a segurança da fé e a confirmação da consciência; a religião reveladora provê a segurança da fé mais a verdade de uma experiência viva nas realidades da revelação. O terceiro passo na religião, ou a terceira fase da experiência na religião, tem a ver com o estado moroncial, com uma aquisição mais firme dentro da mota. No curso da progressão moroncial, as verdades da religião revelada são expandidas; mais e mais, vós sabereis sobre a verdade dos valores supremos, da bondade divina, das relações universais, das realidades eternas e dos destinos últimos.

101:5:11 11114 Durante a progressão moroncial, cada vez mais a certeza da verdade substitui a certeza da fé. Quando vós fordes integrados finalmente ao mundo real do espírito, então, a certeza do puro discernimento espiritual irá funcionar no lugar da fé e da verdade, ou, antes, operará em conjunção com elas, sobrepondo-se a essas técnicas anteriores de prover a certeza à personalidade.

6. A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA PROGRESSIVA


101:6:1 11115 A fase moroncial da religião revelada tem a ver com a experiência da sobrevivência, e o seu grande anseio é alcançar a perfeição espiritual. Nela está também presente o impulso mais elevado da adoração, associado a um impulso forte, chamando para um serviço cada vez mais ético. O discernimento moroncial interno facilita uma consciência sempre em expansão do Sétuplo, do Supremo e, mesmo, do Último.

101:6:2 11116 Ao longo de toda a experiência religiosa, desde a sua mais tenra insipiência, no nível material, até a época do alcance de realização, de status espiritual pleno, o Ajustador é o segredo da compreensão pessoal da realidade da existência do Supremo; e esse mesmo Ajustador também mantém os segredos da vossa fé na realização transcendental do Último. A personalidade experiencial do homem, em evolução, unida ao Ajustador, cuja essência é a de ser um Deus existencial, constitui a culminação potencial da existência suprema e constitui inerentemente uma base para a factualização suprafinita da personalidade transcendental.

101:6:3 11117 A vontade moral abrange decisões baseadas no conhecimento, no raciocínio ampliado pela sabedoria e sancionado pela fé religiosa. Essas escolhas são atos de natureza moral e evidenciam a existência da personalidade moral, a precursora da personalidade moroncial e, afinal, do status espiritual verdadeiro.

101:6:4 11118 O conhecimento do tipo evolucionário não é senão a acumulação de material protoplásmico da memória; e essa é a mais primitiva forma de consciência da criatura. A sabedoria abrange as idéias formuladas da memória protoplásmica, em processo de associação e recombinação, e tais fenômenos diferenciam a mente humana da mente meramente animal. Os animais têm conhecimento, mas apenas o homem possui capacidade de sabedoria. A verdade é tornada acessível ao indivíduo dotado de sabedoria, por meio da outorga feita à sua mente, dos espíritos do Pai e dos Filhos, o Ajustador do Pensamento e o Espírito da Verdade.

101:6:5 11121 Cristo Michael, quando auto-outorgado em Urântia, viveu sob o domínio da religião evolucionária até a época do seu batismo. Daquele momento em diante, inclusive no evento da sua crucificação, ele levou adiante o seu trabalho, sob o guiamento combinado da religião evolucionária e da religião revelada. A partir da manhã da sua ressurreição até a sua ascensão, ele passou por múltiplas fases da vida moroncial, da transição mortal do mundo da matéria até o mundo do espírito. Depois da sua ascensão, Michael tornou-se o mestre da experiência da Supremacia, a compreensão do Supremo; e, sendo a única pessoa em Nebadon a possuir a capacidade ilimitada de experienciar a realidade do Supremo, imediatamente atingiu o status de soberania e supremacia no seu universo local e para este universo.

101:6:6 11122 Para o homem, a fusão final e a unificação resultante com o Ajustador residente – a síntese da personalidade de homem e a essência de Deus – fazem dele, em potencial, uma parte viva do Supremo e asseguram a esse ser, que certa vez foi um mortal, o direito de nascimento eterno de busca sem fim da finalidade do serviço no universo, para e com o Supremo.

101:6:7 11123 A revelação ensina ao homem mortal que, para começar essa magnífica e intrigante aventura no espaço, por intermédio da progressão no tempo, ele deveria começar pela organização do conhecimento em idéias-decisões; para, em seguida, comandar à sabedoria que trabalhe incansavelmente na sua nobre tarefa de transformar as idéias próprias pessoais em ideais cada vez mais práticos, mas não menos supernos, até mesmo naqueles conceitos que, sendo tão razoáveis como idéias e tão lógicos enquanto ideais, o Ajustador ousa combiná-los e espiritualizá-los, tornando-os disponíveis para essa associação na mente finita que fará deles um complemento humano factual, pronto para a ação do Espírito da Verdade dos Filhos, que são as manifestações no espaço-tempo da verdade do Paraíso – a verdade universal. A coordenação das idéias-decisões, dos ideais lógicos e da verdade divina constitui a posse de um caráter reto, que é o pré-requisito para a admissão do mortal nas realidades sempre em expansão e crescentemente espirituais dos mundos moronciais.

101:6:8 11124 Os ensinamentos de Jesus constituíram a primeira religião urantiana a abranger tão plenamente uma coordenação harmoniosa de conhecimento, sabedoria, fé, verdade e amor, tão completa e simultaneamente, a ponto de proporcionar a tranqüilidade temporal, a certeza intelectual, o esclarecimento moral, a estabilidade filosófica, a sensibilidade ética, a consciência de Deus e a certeza positiva da sobrevivência pessoal. A fé de Jesus apontou o caminho para a finalidade da salvação humana, para a ultimidade da realização mortal no universo, pois ela assegurou:

11126 1. A salvação das correntes materiais, pela realização da filiação a Deus, que é espírito.

11127 2. A salvação da escravidão intelectual: o homem conhecerá a verdade, e a verdade o libertará.

11128 3. A salvação da cegueira espiritual, a realização humana da fraternidade entre os seres mortais e a consciência moroncial da irmandade de todas as criaturas do universo; o serviço-descoberta da realidade espiritual e do ministério-revelação da bondade dos valores espirituais.

11131 4. A salvação da incompletude do ego, por meio de um alcance até os níveis espirituais no universo e por meio da realização final da harmonia de Havona e da perfeição do Paraíso.

11132 5. A salvação do eu, a liberação das limitações da autoconsciência, por meio do alcance dos níveis cósmicos da mente do Supremo e pela coordenação com as realizações de todos os outros seres autoconscientes.

11133 6. A salvação do tempo, a realização de uma vida eterna de progressão infindável no reconhecimento de Deus e no serviço de Deus.

11134 7. A salvação do finito, por meio da unidade perfeccionada com a Deidade no Supremo, e por meio do qual a criatura intenta a descoberta transcendental do Último, nos níveis de pós-finalidade do absonito.

101:6:9 11135 Essa salvação sétupla é equivalente à realização completa e perfeita da experiência em ultimidade com o Pai Universal. E tudo isso, em potencial, está contido na realidade da fé da experiência humana na religião. E pode estar assim contida, posto que a fé de Jesus foi nutrida por realidades até mesmo além do Último, e foi reveladora delas; a fé de Jesus aproximou-se do status de um absoluto no universo, na medida em que tal seja possível de ser manifestado no cosmo em evolução do tempo e do espaço.

101:6:10 11136 Por meio da apropriação da fé de Jesus, o homem mortal pode antecipar, no tempo, o gosto das realidades da eternidade. Jesus fez a descoberta, na sua experiência humana, do Pai Final, e os seus irmãos na carne, em vida mortal, podem segui-lo ao longo dessa mesma experiência de descoberta do Pai. Eles podem até mesmo alcançar, sendo o que são, a mesma satisfação, nessa experiência com o Pai, que Jesus alcançou, sendo o que ele era. Novos potenciais factualizaram-se no universo de Nebadon em conseqüência da auto-outorga final de Michael; e um destes é a nova iluminação do caminho de eternidade que conduz ao Pai de tudo, e que pode ser percorrido pelos mortais de carne e sangue material, ainda na vida inicial nos planetas do espaço. Jesus foi e é o novo caminho vivo, por meio do qual o homem pode chegar à herança divina que o Pai decretou que fosse dele, apenas ele assim o pedisse. Com Jesus ficam abundantemente demonstrados os começos e os fins da experiência de fé da humanidade, e até mesmo da humanidade divina.

7. UMA FILOSOFIA PESSOAL DA RELIGIÃO


101:7:1 11137 Uma idéia é apenas um plano teórico para a ação, ao passo que uma decisão positiva é um plano de ação confirmado. Um estereótipo é um plano de ação aceito sem a validação. Os materiais dos quais se pode fazer uma filosofia pessoal da religião são derivados tanto da experiência interna quanto da experiência do indivíduo com o ambiente. O status social, as condições econômicas, as oportunidades educacionais, as inclinações morais, as influências institucionais, os desenvolvimentos políticos, as tendências raciais e os ensinamentos religiosos do tempo e do local tornam-se todos fatores na formulação de uma filosofia pessoal da religião. Mesmo o temperamento inerente e a inclinação intelectual determinam, de um modo marcante, o modelo de filosofia religiosa. A vocação, o casamento e as afinidades, todos influenciam na evolução dos padrões pessoais de vida.

101:7:2 11138 Uma filosofia da religião evolui de um crescimento básico das idéias, somado à vivência experiencial, pois ambos são modificados pela tendência de imitar os semelhantes. A idoneidade das conclusões filosóficas depende de um pensamento discriminador penetrante, honesto e criterioso, em ligação com a sensibilidade para os significados e a precisão de avaliação.

101:7:3 11141 Os covardes morais nunca alcançam os planos elevados do pensamento filosófico; é necessário coragem para invadir novos níveis de experiência e para tentar a exploração de domínios desconhecidos da vida intelectual.

101:7:4 11142 Atualmente, novos sistemas de valores passam à existência; novas formulações de princípios e padrões são feitas; hábitos e ideais são reformulados; uma idéia de um Deus pessoal é alcançada, seguida de conceitos ampliados de relações com ela. A grande diferença entre uma filosofia religiosa e uma filosofia não-religiosa de vida consiste na natureza e no nível dos valores reconhecidos e naquilo que é merecedor da lealdade. Há quatro fases na evolução da filosofia religiosa: tal experiência pode tornar-se meramente conformadora e resignada à submissão à tradição e à autoridade; ou pode dar-se por satisfeita com realizações leves, suficientes apenas para estabilizar a vida diária, e, pois, tornar-se logo presa num nível ocasional. Esses mortais acreditam que o melhor é inimigo do bom. Um terceiro grupo progride até o nível da intelectualidade lógica, mas fica estagnado aí, em conseqüência da escravidão cultural. É verdadeiramente uma pena ver intelectos tão grandes serem mantidos tão solidamente dentro da garra cruel de laços culturais. É igualmente patético observar aqueles que transformam as correntes materialistas de uma ciência, ou de uma falsa ciência, na sua prisão cultural. O quarto nível de filosofia alcança a liberdade de todas as limitações convencionais e tradicionais e ousa pensar, agir e viver honesta, leal, destemida e verdadeiramente.

101:7:5 11143 A prova máxima para qualquer filosofia religiosa está na sua capacidade de distinguir ou não entre as realidades do mundo material e as do mundo espiritual e, ao mesmo tempo, reconhecer a sua unificação no esforço intelectual e a serviço do social. Uma filosofia religiosa sólida não confunde as coisas de Deus com as coisas de César. E também não reconhece o culto estético do maravilhoso puro como um substituto para a religião.

101:7:6 11144 A filosofia transforma aquela religião primitiva, que foi um grande conto de fadas da consciência, numa experiência viva com os valores ascendentes da realidade cósmica.

8. A FÉ E A CRENÇA


101:8:1 11145 A crença terá alcançado o nível da fé quando ela estiver motivando a vida e moldando o modo de vida. A aceitação de um ensinamento como verdadeiro não é fé; é mais uma crença. Nem a certeza nem a convicção também não são fé. Um estado mental atinge os níveis da fé apenas quando, de fato, domina o modo de vida. A fé é um atributo de uma experiência pessoal religiosa verdadeira. Acredita-se na verdade, admira-se a beleza e reverencia-se a bondade, mas não se as adora; essa atitude da fé salvadora é centrada em Deus apenas, que é tudo isso personificado e infinitamente mais.

101:8:2 11146 A crença é sempre limitante e aprisionadora; a fé é expansiva e libertadora. A crença fixa, a fé liberta. Todavia, a fé religiosa viva é mais do que uma associação de crenças nobres; é mais do que um sistema elevado de filosofia; é uma experiência viva, voltada para os significados espirituais, junto aos ideais divinos e aos valores supremos; é conhecer a Deus e servir aos homens. As crenças podem transformar-se em posses grupais, mas a fé deve ser pessoal. As crenças teológicas podem ser sugeridas a um grupo, mas a fé apenas pode surgir individualmente no coração do religioso.

101:8:3 11147 A fé falsifica a sua confiabilidade, quando presume negar as realidades e conferir aos seus devotos conhecimentos presumidos. A fé é traidora, quando fomenta a traição à integridade intelectual e deprecia a lealdade aos valores supremos e aos ideais divinos. A fé nunca evita o dever de resolver os problemas da vida mortal. A fé viva não fomenta o fanatismo, a perseguição ou a intolerância.

101:8:4 11151 A fé não impede a imaginação criativa, nem mantém um preconceito irracional contra as descobertas da investigação científica. A fé revitaliza a religião e obriga o religioso a viver heroicamente a regra de ouro. O zelo da fé está de acordo com o conhecimento, e os seus esforços são o prelúdio de uma paz sublime.

9. A RELIGIÃO E A MORALIDADE


101:9:1 11152 Nenhuma revelação da religião, professada como tal, poderia ser considerada como autêntica, se deixasse de reconhecer as demandas do dever da obrigação ética que foram criadas e fomentadas pela religião evolucionária precedente. A revelação amplia infalivelmente o horizonte ético da religião evoluída e, simultânea e infalivelmente, expande as obrigações morais de todas as revelações anteriores.

101:9:2 11153 Quando presumirdes fazer um julgamento crítico da religião primitiva do homem (ou sobre a religião do homem primitivo), devíeis lembrar-vos de julgar tais selvagens e de avaliar a sua experiência religiosa de acordo com o seu esclarecimento e o seu estado de consciência. Não cometais o erro de julgar a religião de alguém segundo os vossos próprios padrões de conhecimento e de verdade.

101:9:3 11154 A verdadeira religião é aquela convicção sublime e profunda que, de dentro da alma, aconselha ao homem, de um modo irresistível, que seria errado para ele não acreditar naquelas realidades moronciais que são os seus conceitos éticos e morais mais elevados, na sua interpretação mais elevada dos maiores valores da vida e das realidades mais profundas do universo. E essa religião é simplesmente a experiência de devotar a lealdade intelectual aos ditames mais elevados da consciência espiritual.

101:9:4 11155 A busca da beleza é uma parte da religião apenas na medida em que é ética e enriquece o conceito da moral. A arte só é religiosa quando se confunde com o propósito derivado da motivação espiritual elevada.

101:9:5 11156 A consciência espiritual esclarecida do homem civilizado não se preocupa tanto com alguma crença intelectual ou com um modo particular de vida, quanto com a descoberta da verdade da vida, com a técnica boa e correta de reagir às situações sempre recorrentes da existência mortal. A consciência moral é apenas um nome dado ao reconhecimento e à consciência humana daqueles valores éticos e moronciais emergentes, aos quais o dever manda que o homem se conforme, no controle cotidiano e no seu modo de conduzir-se.

101:9:6 11157 Embora reconhecendo que a religião seja imperfeita, existem ao menos duas manifestações práticas da sua natureza e função:

101:9:7 11158 1. O estímulo espiritual e a pressão filosófica da religião tendem a levar o homem a projetar a sua apreciação dos valores morais diretamente para fora, na direção dos assuntos ligados aos seus semelhantes – a reação ética da religião.

101:9:8 11159 2. A religião cria, para a mente humana, uma consciência espiritualizada da realidade divina, baseada em conceitos antecedentes de valores morais, derivada deles pela fé e coordenada com conceitos superimpostos de valores espirituais. A religião, por isso, torna-se um censor dos assuntos mortais, uma forma de crédito moral de confiança glorificada na realidade, nas realidades do tempo realçadas e nas realidades mais duradouras da eternidade.

101:9:9 11161 A fé transforma-se na conexão entre a consciência moral e o conceito espiritual da realidade permanente. A religião transforma-se na via pela qual o homem escapa das limitações materiais do mundo temporal e natural, para alcançar as realidades supernas do mundo eterno e espiritual, por meio da técnica da salvação, a transformação moroncial progressiva.

10. A RELIGIÃO COMO LIBERTADORA DO HOMEM


101:10:1 11162 O homem inteligente sabe que é um filho da natureza, uma parte do universo material; e também não discerne nenhuma sobrevivência da personalidade individual nos movimentos e nas tensões de nível matemático do universo da energia. Nem jamais pode o homem discernir a realidade espiritual por meio do exame das causas e dos efeitos físicos.

101:10:2 11163 Um ser humano é consciente também de que ele é uma parte do cosmo ideacional, mas, embora um conceito possa perdurar além do ciclo de uma vida mortal, nada há de inerente ao conceito que indique a sobrevivência pessoal da personalidade que o concebe. Nem o esgotamento de todas as possibilidades da lógica e da razão jamais revelará ao lógico, ou ao argumentador, a verdade eterna da sobrevivência da personalidade.

101:10:3 11164 O nível material da lei assegura a continuidade da causalidade, a interminável reação de efeito à ação antecedente; o nível da mente sugere a perpetuação da continuidade ideacional, o fluxo incessante da potencialidade conceitual das concepções preexistentes. No entanto, nenhum desses níveis, no universo, abre ao mortal buscador um caminho escapatório da parcialidade do seu status e da incerteza intolerável de ser uma realidade transitória no universo, uma personalidade temporal condenada a ser extinta quando da exaustão das limitadas energias da vida.

101:10:4 11165 Apenas pela via moroncial, que conduz ao discernimento espiritual interior, é que o homem pode romper as cadeias inerentes ao seu status de mortal no universo. A energia e a mente podem conduzir de volta ao Paraíso e à Deidade, mas nem o dom da energia nem o dom da mente, dados ao homem, provêm diretamente dessa Deidade do Paraíso. Apenas no sentido espiritual o homem é um filho de Deus. E isso é verdade porque apenas no sentido espiritual é que o homem é atualmente dotado e residido pelo Pai do Paraíso. A humanidade nunca descobrirá a divindade a não ser por meio da via da experiência religiosa e pelo exercício da verdadeira fé. A aceitação da verdade de Deus, por meio da fé, capacita o homem a escapar dos confins circunscritos das limitações materiais e lhe dá uma esperança racional de obter o salvo-conduto do reino material, onde existe a morte, para o Reino espiritual, onde há a vida eterna.

101:10:5 11166 O propósito da religião não é satisfazer a curiosidade sobre Deus, mas, sim, proporcionar a constância intelectual e a segurança filosófica de estabilizar e de enriquecer a vida humana, combinando o mortal com o divino, o parcial com o perfeito, o homem e Deus. É por intermédio da experiência religiosa que os conceitos humanos da idealidade tornam-se dotados e plenos de realidade.

101:10:6 11167 Nunca haverá uma prova científica ou lógica da divindade. A razão por si só nunca poderá ratificar os valores e a excelência da experiência religiosa. Todavia, será sempre verdade que qualquer um que se disponha a cumprir a vontade de Deus compreenderá a validade dos valores espirituais. Essa é a maior aproximação que pode ser realizada, no nível mortal, para oferecer provas da realidade da experiência religiosa. Tal fé proporciona a única saída das garras mecânicas do mundo material e da distorção do erro da incompletude do mundo intelectual; é a única solução descoberta para o impasse gerado no pensamento mortal a respeito da continuidade da sobrevivência da personalidade individual. É o único passaporte para a realidade completa e para a eternidade da vida em uma criação universal de amor, lei, unidade e alcance progressivo da Deidade.

101:10:7 11171 A religião cura eficazmente o sentido de isolamento idealista do homem, ou de solidão espiritual; ela emancipa o crente como um filho de Deus, um cidadão de um universo novo e significativo. A religião assegura ao homem que, seguindo a luz da retidão que é discernível dentro da sua alma, ele está assim identificando-se com o plano do Infinito e com o propósito do Eterno. Uma alma liberada desse modo começa imediatamente a sentir-se em casa nesse novo universo, o seu universo.

101:10:8 11172 Quando passardes pela experiência de uma tal transformação pela fé, não sereis mais uma parte escravizada do cosmo matemático, sereis mais um independente filho volicional do Pai Universal. Não mais esse filho liberado está lutando sozinho contra a condenação inexorável da terminação na existência temporal; não mais ele combate a toda a natureza, com as possibilidades desesperadamente contra si; não mais ele hesita com um medo paralisante de ter, por acaso, colocado a sua confiança numa quimera sem esperança ou de ter pregado a sua fé num alfinete imaginário.

101:10:9 11173 Agora, sobretudo, os filhos de Deus estão alistados juntos para lutarem na batalha que é o triunfo da realidade sobre as sombras parciais da existência. Afinal, todas as criaturas tornam-se conscientes do fato de que Deus e todas as hostes divinas, de um universo quase sem limites, estão do seu lado na luta superna para alcançar a eternidade da vida e a divindade de status. Tais filhos, liberados pela fé, certamente se alistaram nas lutas do tempo ao lado das forças supremas e das personalidades divinas da eternidade; até mesmo as estrelas, nos seus cursos, agora, estão na batalha por eles; afinal, eles contemplam o universo de dentro, do ponto de vista de Deus, e, das incertezas de um isolamento material, tudo fica transformado nas certezas da progressão espiritual eterna. E mesmo o tempo não se torna mais do que uma sombra da eternidade, lançada pelas realidades do Paraíso, sobre a panóplia, em movimento, do espaço.

101:10:10 11174 [Apresentado por um Melquisedeque de Nebadon.]

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