sexta-feira, 20 de agosto de 2010

URANTIA JESUS DE NAZARÉ VI

DOCUMENTO 180

O DISCURSO DE DESPEDIDA
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Após cantarem o salmo, na conclusão da Última Ceia, os apóstolos pensaram que Jesus tivesse a intenção de voltar imediatamente ao acampamento, mas ele indicou-lhes que deveriam sentar-se. Disse o Mestre:

180:0:2 19442 “Vós vos lembrais bem quando vos enviei sem bolsa ou carteira e até avisei mesmo que não levásseis nenhuma roupa extra. E vos lembrareis que nada vos faltou. Mas agora estais em tempos turbulentos. Não mais podeis depender da boa vontade das multidões. De agora em diante, aquele que tiver uma bolsa, que a leve consigo. Quando sairdes para o mundo para proclamar este evangelho, façais as provisões para o vosso sustento como achardes melhor. Eu vim para trazer a paz, mas ela não surgirá ainda por muito tempo.

180:0:3 19443 “Chegou a hora do Filho do Homem ser glorificado, e o Pai será glorificado em mim. Meus amigos, devo ficar convosco apenas por pouco tempo mais. Em breve buscareis por mim, mas não me encontrareis, pois estou indo para um lugar onde vós não podeis ir, neste momento. Mas quando tiverdes acabado a vossa obra na Terra, como agora eu completei a minha, então vireis a mim do mesmo modo que agora eu me preparo com a finalidade de ir para o meu Pai. Muito em breve eu vou deixar-vos, e não me vereis mais na Terra, vós todos me vereis, todavia, na idade que virá, quando ascenderdes ao Reino que o meu Pai me deu”.

1. O NOVO MANDAMENTO


180:1:1 19444 Após alguns momentos de conversa informal, Jesus levantou-se e disse: “Quando eu representei para vós uma parábola, indicando como deveríeis estar dispostos a servir, uns aos outros, eu disse que desejava dar-vos um novo mandamento e, agora que estou para deixar-vos, eu gostaria de fazer isso. Bem sabeis o mandamento que indica que deveis amar-vos uns aos outros, que ameis o vosso semelhante como a vós próprios. Mas não estou plenamente satisfeito, nem mesmo com essa devoção sincera da parte dos meus filhos. Eu gostaria de ver-vos praticando atos ainda maiores de amor no Reino da fraternidade crente. E assim vos dou este novo mandamento: Que amais uns aos outros como eu vos amei. E, com isso, todos os homens saberão que sois os meus discípulos se amardes assim uns aos outros.

180:1:2 19445 “Ao dar-vos esse novo mandamento, eu não coloco nenhum peso novo sobre as vossas almas; eu trago, sim, para vós, uma nova alegria e torno possível a vós experimentar o novo prazer de conhecer as delícias de conferirdes a afeição do vosso coração aos vossos semelhantes. Eu estou na iminência de experimentar uma alegria suprema, ainda que, passando por um sofrimento exterior, na dádiva da minha afeição a vós e aos vossos companheiros mortais.

180:1:3 19446 “Quando eu vos convido a amardes uns aos outros, como eu vos amei, eu vos apresento a medida suprema da afeição verdadeira, pois um amor maior do que este nenhum homem pode ter: o de dar a sua vida pelos seus amigos. E vós sois meus amigos; continuareis sendo meus amigos se estiverdes dispostos a não fazer senão o que eu vos ensinei. Vós me chamastes de Mestre, mas eu não vos chamo de servos. Se apenas amardes uns aos outros, como eu vos estou amando, sereis meus amigos e eu sempre vos falarei daquilo que o Pai revela a mim.

180:1:4 19451 “Não fostes meramente vós que me escolhestes, eu também vos escolhi, e ordenei-vos que saísseis pelo mundo para colher o fruto do serviço de amor aos vossos semelhantes, do mesmo modo que eu vivi entre vós e vos revelei o Pai. O Pai e eu trabalharemos ambos convosco, e vós experimentareis a plenitude divina da alegria se apenas obedecerdes ao meu mandamento para que ameis uns aos outros, do mesmo modo que eu vos amei”.

180:1:5 19452 Se quiserdes compartilhar a alegria do Mestre, deveis compartilhar o seu amor. E compartilhar o seu amor significa que compartilhastes o seu serviço. Essa experiência de amor não vos liberta das dificuldades deste mundo, não cria um novo mundo, mas muito certamente faz do velho um novo mundo.

180:1:6 19453 Tende sempre em mente: É a lealdade, não o sacrifício, que Jesus pede. A consciência do sacrifício implica a ausência daquele afeto de todo o coração que teria feito desse serviço de amor uma alegria suprema. A idéia do dever significa que tendes a mente voltada para o servir e que, pois, falta a emoção poderosa de fazer o vosso serviço como um amigo e para um amigo. O impulso da amizade transcende todas as convicções de dever, e o serviço de um amigo por um amigo nunca pode ser chamado de sacrifício. O Mestre ensinou aos apóstolos que eles são os filhos de Deus. Ele chamou-os de irmãos, e agora, antes que ele parta, ele chama-os de seus amigos.

2. A VINHA E OS RAMOS


180:2:1 19454 Então Jesus levantou-se novamente e continuou ensinando aos seus apóstolos: “Eu sou a vinha verdadeira, e o meu Pai é o cultivador. Eu sou a vinha, e vós sois os ramos. E o Pai exige de mim apenas que vós deis muitos frutos. A vinha é podada apenas para que aumente a frutificação dos seus ramos. Cada ramo que sai de mim, e que não dá nenhum fruto, o Pai o cortará. Todo ramo que gera frutos, o Pai o limpará para que possa conceber mais frutos. Vós já sois limpos por intermédio da palavra que eu pronunciei, mas deveis continuar a ser limpos. Deveis habitar em mim, e eu em vós; o ramo morrerá se se separar da vinha. Como o ramo não pode dar fruto a menos que habite na vinha, assim, também vós não podereis produzir os frutos do serviço do amor a menos que habiteis em mim. Lembrai-vos: Eu sou a vinha verdadeira, e vós sois ramos vivos. Aquele que vive em mim, e que nele eu vivo, dará muitos frutos do espírito e experimentará a alegria suprema de produzir essa colheita espiritual. Se mantiverdes comigo essa ligação espiritual viva, dareis frutos abundantes. Se habitardes em mim e se as minhas palavras viverem em vós, sereis capazes de comungar livremente comigo e então o meu espírito vivo pode infundir-se em vós para que possais pedir tudo o que o meu espírito quer, e cumprir tudo isso com a segurança de que o Pai nos concederá o nosso pedido. Nisto o Pai é glorificado: pois a vinha tem muitos ramos vivos, e cada ramo dá muitos frutos. E, quando o mundo vir esses ramos frutificando – os meus amigos que se amam uns aos outros, como eu os amei –, todos os homens saberão que vós sois verdadeiramente os meus discípulos.

180:2:2 19455 “Como o Pai me amou, assim eu vos amei. Vivei no meu amor como eu vivo no amor do Pai. Se fizerdes como eu vos ensinei, vós residireis no meu amor como eu tenho mantido a palavra do Pai e eternamente moro no Seu amor”.

180:2:3 19461 Os judeus há muito ensinaram que o Messias seria “um talo que surgiria da videira” dos ancestrais de Davi e, em comemoração a esse velho ensinamento, um grande emblema da uva e da sua vinha decorava a entrada do templo de Herodes. Os apóstolos todos se relembraram dessas coisas enquanto o Mestre falava a eles nessa noite na sala do andar de cima.

180:2:4 19462 Mas um grande pesar mais tarde acompanhou a interpretação errônea das conclusões do Mestre a respeito da prece. Teria havido pouca dificuldade sobre esses ensinamentos se as suas palavras exatas tivessem sido lembradas e, depois, registradas fielmente. Mas, quando o registro foi feito, os crentes finalmente consideraram a prece em nome de Jesus como uma espécie de magia suprema, pensando que fossem receber do Pai qualquer coisa que pedissem. Durante séculos, almas honestas continuaram a fazer naufragar a própria fé lançando-a contra esse obstáculo. Quanto tempo demorará no mundo dos crentes até que se compreenda a prece, não como um procedimento destinado a obter-se o que se quer, e sim como um programa para entrar no caminho de Deus, uma experiência para aprender como reconhecer e executar a vontade do Pai? É inteiramente verdadeiro que, quando a vossa vontade tiver sido verdadeiramente alinhada com a Dele, podereis pedir qualquer coisa concebida nessa união de vontades, e será concedida. E tal união de vontades é efetuada por meio de Jesus, como a vida da vinha flui por meio dos ramos vivos.

180:2:5 19463 Quando existe essa conexão viva entre a divindade e a humanidade, ainda que a humanidade ore impensada e ignorantemente pela despreocupação egoísta e por realizações vaidosas, só poderia haver uma resposta divina: que os talos dos ramos vivos dêem mais e maiores frutos do espírito. Quando o ramo da videira está vivo, só pode haver uma resposta a todos os pedidos: que se produzam mais uvas. De fato, o ramo existe apenas para produzir uvas, e nada pode fazer além de gerar frutos, de produzir uvas. E assim o verdadeiro crente existe apenas com o propósito de conceber os frutos do espírito: amar o homem como ele próprio tem sido amado por Deus – que nos amemos uns aos outros, como Jesus nos amou.

180:2:6 19464 E, quando a mão da disciplina do Pai é colocada sobre a videira, isso é feito por amor, com a finalidade de que os ramos possam dar muitos frutos. E um cultivador sábio corta fora apenas os ramos mortos e que não dão frutos.

180:2:7 19465 Jesus teve uma grande dificuldade em levar até mesmo os seus apóstolos a reconhecerem que a prece é uma função de crentes nascidos do espírito no Reino dominado pelo espírito.

3. A INIMIZADE DO MUNDO


180:3:1 19466 Os onze mal tinham cessado com as suas discussões sobre o discurso da videira e os ramos, quando o Mestre, indicando que estava desejoso de falar mais a eles e sabendo que o seu tempo era curto, disse: “Quando eu vos tiver deixado, não vos desencorajeis com a inimizade do mundo. Não vos deixeis abater mesmo quando os crentes medrosos voltarem-se contra vós e juntarem as mãos com os inimigos do Reino. Se o mundo odiar-vos, deveis lembrar-vos de que ele odiou a mim antes mesmo de odiar-vos. Se fôsseis deste mundo, então o mundo amaria o que é dele, mas porque não sois, o mundo recusa-se a vos amar. Estais neste mundo; em vossas vidas, contudo, não deveis viver à maneira dele. Eu escolhi-vos e tirei-vos do mundo para representardes o espírito de um outro mundo a este mesmo mundo do qual fostes escolhidos. Todavia lembrai-vos sempre das palavras que eu vos disse: O servo não é maior do que o seu mestre. Se eles ousarem perseguir-me, eles irão também vos perseguir. Se as minhas palavras ofendem aos descrentes, as vossas palavras irão também ofender aos sem Deus. E tudo isso eles farão a vós porque eles não crêem em mim nem Nele que me enviou; e por isso sofrereis muitas coisas em nome do meu evangelho. Mas, quando passardes por essas tribulações, deveis lembrar-vos de que eu também sofri antes de vós por causa deste evangelho do Reino celeste.

180:3:2 19471 “Muitos daqueles que vos atacarão são ignorantes da luz do céu, mas isso não é verdade sobre alguns dentre aqueles que nos perseguem. Se não tivéssemos ensinado a eles a verdade, eles poderiam fazer muitas coisas estranhas sem cair em condenação, mas agora, posto que eles conhecem a luz e presumem rejeitá-la, eles não têm desculpa para tal atitude. Aquele que odeia a mim odeia o meu Pai. Não pode ser de outro modo; a luz que, sendo aceita, vos salvaria; se for conscientemente rejeitada, apenas pode condenar-vos. E o que fiz eu a esses homens para que eles me odiassem com um ódio tão terrível? Nada, exceto oferecer-lhes a fraternidade na Terra e a salvação no céu. Mas não lestes na escritura onde está dito: ‘E eles me odiaram sem um motivo’?

180:3:3 19472 “Contudo, não vos deixarei abandonados no mundo. Muito em breve, depois que eu tiver ido, enviar-vos-ei um espírito ajudante. Vós tereis convosco aquele que tomará o meu lugar, entre vós, e continuará a ensinar-vos o caminho da verdade e irá mesmo até confortar-vos.

180:3:4 19473 “Não deixeis os vossos corações serem perturbados. Vós credes em Deus; continuai a acreditar também em mim. Ainda que eu tenha que vos deixar, não estarei longe de vós. Eu já vos disse que no universo do meu Pai há muitos locais de permanência. Se isso não fosse verdade, eu não teria repetidamente dito a vós sobre eles. Eu vou voltar para esses mundos de luz, estações no céu do Pai para as quais vós algum dia ireis ascender. Desses locais eu vim para este mundo, e a hora agora é aquela em que eu devo retornar à obra do meu Pai nas esferas do alto.

180:3:5 19474 “Se então eu for antes de vós para o Reino celeste do Pai, eu irei certamente mandar buscar-vos para que vós possais estar comigo nos lugares que foram preparados para os filhos mortais de Deus antes que este mundo existisse. Ainda que tenha de deixar-vos, eu estarei presente junto a vós em espírito, e finalmente vós estareis comigo pessoalmente quando tiverdes ascendido até a mim no meu universo, do mesmo modo que eu estou na iminência de ascender ao meu Pai no Seu universo maior. E o que eu vos disse é verdadeiro e eterno, ainda que possais não o compreender totalmente. Eu vou para o Pai e, embora vós não possais seguir-me agora, certamente me seguireis nas idades que estão para vir”.

180:3:6 19475 Quando Jesus sentou-se, Tomé levantou-se e disse: “Mestre, não sabemos para onde tu estás indo; e, desse modo, claro está que não sabemos o caminho. Mas nós te seguiremos assim mesmo, nesta noite, se nos ensinares o caminho”.

180:3:7 19476 Depois de ouvir Tomé, Jesus respondeu: “Tomé, eu sou o caminho, a verdade e a vida. Nenhum homem vai ao Pai a não ser por meu intermédio. Todos aqueles que encontram o Pai, primeiro encontraram a mim. Se me conhecerdes, vós conhecereis o caminho até o Pai. E vós me conheceis sem dúvida, pois vivestes comigo e ainda agora podeis ver-me”.

180:3:8 19477 Esse ensinamento, todavia, era profundo demais para muitos dos apóstolos, especialmente para Filipe, que, depois de trocar algumas palavras com Natanael, levantou-se e disse: “Mestre, mostra-nos o Pai, e tudo o que disseste ficará claro”.

180:3:9 19478 E depois de Filipe ter dito isso, Jesus perguntou: “Filipe, por tanto tempo eu estive contigo e ainda sequer me conheces? De novo eu declaro: Aquele que me viu, terá visto o Pai. Como podes então pedir: Mostre-nos o Pai? Não acreditas que eu estou no Pai e que o Pai está em mim? Acaso não vos ensinei que as palavras que falo não são minhas palavras, mas palavras do Pai? Eu falo pelo Pai e não por mim mesmo. Estou neste mundo para fazer a vontade do Pai, e foi o que eu fiz. O meu Pai reside em mim e trabalha por meu intermédio. Acreditai em mim quando eu digo que o Pai está em mim, e que eu estou no Pai, ou então acreditai em nome da própria vida que eu vivi – pela obra”.

180:3:10 19481 Como o Mestre saiu para refrescar-se e tomar água, os onze entraram em uma discussão animada sobre esses ensinamentos; e Pedro estava começando a entregar-se a um longo discurso quando Jesus retornou e chamou-os para sentarem-se.

4. O AJUDANTE PROMETIDO


180:4:1 19482 Jesus continuou a ensinar, dizendo: “Quando eu tiver ido para o Pai, e depois que Ele tiver aceitado plenamente a obra que fiz para vós na Terra, e após ter eu recebido a soberania final do meu próprio domínio, eu direi ao meu Pai: Tendo deixado os meus filhos sozinhos na Terra, a minha promessa é de enviar a eles um outro instrutor. E, quando o Pai aprovar, eu verterei o Espírito da Verdade sobre toda a carne. O espírito do meu Pai já está nos vossos corações e, quando chegar esse dia, vós ireis também ter a mim convosco como agora tendes o Pai. Essa nova dádiva é o Espírito da Verdade viva. Os descrentes a princípio não ouvirão os ensinamentos desse espírito, mas os filhos da luz todos irão recebê-lo com alegria e de coração pleno. E vós conhecereis esse espírito quando ele vier, como vós me conhecestes, e recebereis essa dádiva nos vossos corações, e ele residirá em vós. E, assim, vós percebereis que eu não hei de deixar-vos sem ajuda e sem orientação. Eu não vos deixarei em desolamento. Hoje eu posso estar convosco apenas pessoalmente. Nos tempos que virão eu estarei convosco e com todos os outros homens que desejarem a minha presença, onde quer que estejais, e com cada um de vós ao mesmo tempo. Não conseguis discernir quão melhor é que eu vá embora; que eu vos deixe na carne para que eu possa estar convosco melhor e mais plenamente em espírito?

180:4:2 19483 “Em poucas horas o mundo não me verá mais; mas vós continuareis a conhecer-me nos vossos corações, quando eu enviar-vos este novo instrutor: o Espírito da Verdade. Como eu vivi convosco pessoalmente, então eu viverei em vós; eu serei um com a vossa experiência pessoal no Reino do espírito. E quando isso vier a acontecer, vós sabereis certamente que eu estou no Pai, e que, conquanto a vossa vida esteja oculta em mim com o Pai, eu também estou em vós. E que amei o Pai e mantive a Sua palavra; que vós me amastes, e ireis manter a minha palavra. Como o meu Pai deu-me o Seu espírito, também eu dar-vos-ei o meu espírito. E esse Espírito da Verdade, que eu outorgarei a vós, vos guiará e vos confortará e, finalmente, vos conduzirá a toda a verdade.

180:4:3 19484 “Estou dizendo todas essas coisas a vós enquanto ainda estou convosco a fim de que possais estar mais bem preparados para resistir às provações que mesmo agora já estão caindo sobre nós. E quando esse novo dia vier, vós estareis resididos pelo Filho tanto quanto pelo Pai. E essas dádivas do céu trabalharão sempre uma com a outra, como o Pai e eu temos trabalhado na Terra e diante dos vossos próprios olhos, como uma pessoa, o Filho do Homem. E esse espírito amigo trará à vossa lembrança tudo o que eu vos ensinei”.

180:4:4 19485 Como o Mestre parou por um momento, Judas Alfeu ousou fazer uma das poucas perguntas que tanto ele quanto o seu irmão fizeram a Jesus em público. Disse Judas: “Mestre, tu sempre viveste entre nós como um amigo; como te conheceremos quando tu não mais te manifestares a nós exceto por esse espírito? Se o mundo não te vir, como poderemos nós estar certos de que és tu? Como tu te mostrarás a nós?”

180:4:5 19491 Jesus olhou para todos, sorriu e disse: “Meus filhinhos, eu estou indo embora, de volta para o meu Pai. Dentro de pouco tempo não me vereis como agora, em carne e osso. Dentro de pouco tempo eu enviarei a vós o meu espírito, que é exatamente como eu, exceto por esse corpo material. Este novo instrutor é o Espírito da Verdade que viverá em cada um de vós, nos vossos corações, e assim todos os filhos da luz serão como um e serão atraídos uns aos outros. E, desse modo, o meu Pai e eu seremos capazes de viver nas almas de cada um de vós e também nos corações de todos os outros homens que nos amam e que fazem esse amor tornar-se real nas suas experiências, amando-se mutuamente como eu agora vos amo”.

180:4:6 19492 Judas Alfeu não compreendeu plenamente o que o Mestre disse, mas captou a promessa do novo instrutor e, pela expressão no rosto de André, ele percebeu que a sua pergunta tinha sido respondida satisfatoriamente.

5. O ESPÍRITO DA VERDADE


180:5:1 19493 O novo ajudante que Jesus prometeu enviar aos corações dos crentes, que ele iria verter e efundir, sobre toda a carne, é o Espírito da Verdade. Essa dotação divina não é a letra nem a lei da verdade, nem deve funcionar na forma nem na expressão da verdade. O novo instrutor é a convicção da verdade, a consciência e a certeza dos verdadeiros significados nos níveis espirituais verdadeiros. E esse novo instrutor é o Espírito da Verdade viva e crescente, da verdade em expansão, em desdobramento e em adaptação.

180:5:2 19494 A verdade divina é uma realidade viva discernida pelo espírito. A verdade existe apenas em elevados níveis espirituais de realização da divindade e da consciência da comunhão com Deus. Vós podeis conhecer a verdade, e podeis viver a verdade; vós podeis experimentar um crescimento da verdade na alma e gozar da liberdade do seu esclarecimento na mente, mas vós não podeis aprisionar a verdade em fórmulas, códigos, credos nem nos padrões intelectuais de conduta humana. Ao fazerdes a formulação humana da verdade divina, rapidamente ela se desfaz. A salvação depois da morte da verdade aprisionada, mesmo no melhor dela, apenas torna-se um fato na realização de uma forma peculiar de sabedoria intelectualizada glorificada. Verdade estática é verdade morta, e apenas a verdade morta pode ser mantida como uma teoria. A verdade viva é dinâmica e apenas pode gozar de uma existência experiencial na mente humana.

180:5:3 19495 A inteligência nasce de uma existência material que é iluminada pela presença da mente cósmica. A sabedoria abrange a consciência do conhecimento, elevado a novos níveis de significados e ativado pela presença no universo da dotação do ajudante da sabedoria. A verdade é um valor da realidade espiritual, experimentado apenas pelos seres dotados de espírito que funcionam em níveis supramateriais da consciência do universo, e que, após a compreensão da verdade, permitem o seu espírito ativador viver e reinar dentro das suas almas.

180:5:4 19496 O verdadeiro discernimento interior do filho do universo busca o Espírito da Verdade vivo em toda palavra de sabedoria. O indivíduo conhecedor de Deus está elevando constantemente a sabedoria aos níveis da verdade viva de alcance divino; a alma que não progride espiritualmente está constantemente reduzindo a verdade viva, trazendo-a até os níveis mortos da sabedoria e aos domínios do mero conhecimento engrandecido.

180:5:5 19497 A regra de ouro, quando despojada do discernimento interior supra-humano do Espírito da Verdade, transforma-se em nada mais que uma regra de conduta de alta ética. A regra de ouro, quando interpretada literalmente, pode tornar-se um instrumento de grande ofensa ao semelhante. Sem o discernimento espiritual da regra de ouro da sabedoria, vós poderíeis raciocinar que, posto que sois desejosos de que todos os homens digam a vós a verdade plena e franca das suas mentes, vós deveríeis, pois, plena e francamente, dizer o pensamento total da vossa mente aos vossos semelhantes. Essa interpretação não espiritual da regra de ouro poderia resultar em infelicidades incontáveis e em um sem-fim de sofrimentos.

180:5:6 19501 Algumas pessoas discernem e interpretam a regra de ouro como uma afirmação puramente intelectual de fraternidade humana. Outras experimentam essa expressão de relacionamento humano como uma gratificação emocional dos sentimentos de ternura da personalidade humana. Outros mortais reconhecem essa mesma regra de ouro como a unidade de medida de todas as relações sociais, o padrão da conduta social. Outros, ainda, consideram-na como sendo a prescrição positiva de um grande instrutor moral que incorporou nessa afirmação o mais elevado conceito de obrigação moral, no que diz respeito a todas as relações fraternais. Nas vidas de tais seres morais, a regra de ouro torna-se o centro sábio e a circunferência de toda a sua filosofia.

180:5:7 19502 No Reino da fraternidade crente de amantes da verdade e de sabedores de Deus, essa regra de ouro assume qualidades vivas, de compreensão espiritual, naqueles níveis mais elevados de interpretação, que levam os filhos mortais de Deus a ver essa injunção do Mestre como exigindo deles que se relacionem com os seus semelhantes de um modo tal que eles recebam o bem mais elevado possível, como resultado do contato do crente com eles. Esta é a essência da verdadeira religião: que ames ao teu próximo como a ti mesmo.

180:5:8 19503 Mas a compreensão mais elevada e a interpretação mais verdadeira, da regra de ouro, consistem na consciência do Espírito da Verdade, da realidade duradoura e viva de uma tal declaração divina. O verdadeiro significado cósmico dessa regra de relacionamento universal é revelado apenas na sua compreensão espiritual, na interpretação da lei de conduta feita pelo espírito do Filho, para o espírito do Pai que reside na alma do homem mortal. Quando tais mortais, guiados pelo espírito, compreendem o significado verdadeiro dessa regra de ouro, eles preenchem-se, ao transbordamento, com a certeza da cidadania em um universo amigável, e os seus ideais da realidade espiritual apenas se satisfazem quando eles amam os seus semelhantes como Jesus nos amou a todos, e essa é a realidade da compreensão do amor de Deus.

180:5:9 19504 Essa mesma filosofia da flexibilidade viva e adaptabilidade cósmica, da verdade divina, às exigências individuais e à capacidade de cada filho de Deus deve ser percebida antes que possais esperar compreender adequadamente o ensinamento e a prática do Mestre, quanto à não-resistência ao mal. O ensinamento do Mestre é basicamente um pronunciamento espiritual. Mesmo as implicações materiais da sua filosofia não podem ser consideradas de maneira útil, independentemente das suas correlações espirituais. A essência da injunção do Mestre consiste na não-resistência de toda a reação egoísta ao universo, combinada à realização dinâmica e progressiva até níveis probos de valores espirituais verdadeiros: a beleza divina, a bondade infinita e a verdade eterna – de conhecer Deus e de tornar-se cada vez mais semelhante a Ele.

180:5:10 19505 O amor e a ausência de egoísmo devem estar submetidos a uma interpretação constante e vivamente readaptadora dos relacionamentos, de acordo com o guiamento do Espírito da Verdade. O amor deve, assim, captar os conceitos, sempre mutantes e em ampliação, do bem cósmico mais elevado para o indivíduo que é amado. E, então, o amor continua a assumir essa mesma atitude no que concerne a todos os outros indivíduos que poderiam possivelmente ser influenciados pelo relacionamento crescente e vivo do amor, de um mortal guiado pelo espírito, aos outros cidadãos do universo. E toda essa adaptação viva de amor deve ser efetuada tanto à luz ambiente do mal presente quanto à luz da meta eterna da perfeição do destino divino.

180:5:11 19506 E assim devemos claramente reconhecer que nem a regra de ouro, nem o ensinamento da não-resistência podem jamais ser apropriadamente compreendidos como dogmas ou preceitos. Eles podem ser compreendidos apenas ao serem vividos, ao terem os seus sentidos realizados na interpretação viva do Espírito da Verdade, que dirige o contato, pleno de amor, de um ser humano com outro.

180:5:12 19511 E tudo isso indica claramente a diferença entre a velha religião e a nova. A velha religião ensinava o auto-sacrifício; a nova religião ensina apenas o auto-esquecimento, uma auto-realização maior conjugada a um serviço social de compreensão do universo. A velha religião era motivada pela consciência-medo; o novo evangelho do Reino é dominado pela convicção da verdade, pelo Espírito da Verdade eterna e universal. E nenhuma quantidade de piedade, nem de fidelidade a um credo, pode compensar a ausência, na experiência de vida dos crentes do Reino, daquela amizade espontânea, generosa e sincera que caracteriza os filhos, nascidos pelo espírito, do Deus vivo. Nem a tradição, nem um sistema cerimonial de adoração formal podem reparar a falta da compaixão genuína pelos nossos semelhantes.

6. A NECESSIDADE DE PARTIR


180:6:1 19512 Depois que Pedro, Tiago, João e Mateus tinham feito inúmeras perguntas ao Mestre, ele continuou o seu discurso de despedida dizendo: “E eu afirmo tudo isso a vós antes de deixar-vos, com a finalidade de que vós possais estar preparados para o que virá sobre vós e a fim de que não caiais em erro sério. As autoridades não ficarão contentes em colocar-vos meramente para fora das sinagogas; eu vos previno de que é chegada a hora em que aqueles que irão matar-vos pensarão estar prestando um serviço a Deus. E todas essas coisas eles farão a vós, e àqueles a quem vós conduzis ao Reino do céu, porque eles não conhecem o Pai. Eles recusaram-se a conhecer o Pai, ao recusarem-se a me receber; e eles recusam-se a me receber, quando eles vos rejeitam, porque tendes mantido o meu novo mandamento de amar-vos uns aos outros como eu próprio vos amei. Estou antecipando essas coisas a vós para que, quando a vossa hora vier, como a minha agora veio, possais estar fortalecidos no conhecimento de que tudo era sabido por mim, e de que o meu espírito estará convosco em todos os vossos sofrimentos por minha causa e por causa do evangelho. Foi com esse propósito que eu estive falando tão claramente a vós desde o princípio. Eu vos preveni até mesmo de que os adversários de um homem podem estar dentre os da sua própria casa. Embora este evangelho do Reino nunca deixe de trazer uma grande paz à alma do indivíduo que crê, ele não trará paz à Terra até que o homem esteja disposto a crer de todo o coração no meu ensinamento, e a estabelecer a prática de fazer a vontade do Pai como o principal propósito, ao viver a vida mortal.

180:6:2 19513 “Agora que vos estou deixando, vendo que é chegada a hora que eu devo ir para o Pai, eu surpreendo-me com o fato de que nenhum de vós me perguntou: Por que nos estás abandonando? Contudo, eu sei que fazeis essas perguntas nos vossos corações. E falarei a vós claramente, como um amigo a outro. É realmente proveitoso para vós que eu me vá. Se eu não for embora, o novo instrutor não poderá vir até os vossos corações. E eu devo despojar-me deste corpo mortal e ser restaurado no meu lugar no alto, antes de poder enviar o espírito instrutor para viver nas vossas almas e guiar os vossos espíritos para a verdade. Quando o meu espírito vier residir em vós, ele iluminará a diferença, entre pecado e retidão, e capacitar-vos-á a discernir entre eles, com sabedoria, nos vossos corações.

180:6:3 19514 “Eu ainda tenho muito a vos dizer, mas vós não podeis suportar nada mais, no momento. Todavia, quando ele vier, o Espírito da Verdade, finalmente guiar-vos-á até toda a verdade, ao passardes pelas muitas moradas no universo do meu Pai.

180:6:4 19515 “Esse espírito não falará por si próprio, mas ele irá declarar-vos aquilo que o Pai revelou ao Filho e mostrar-vos-á mesmo as coisas que virão; ele glorificar-me-á como eu glorifiquei o meu Pai. Esse espírito virá de mim e revelará a vós a minha verdade. Tudo que o Pai tem sob o Seu domínio agora é meu; e é por isso que eu disse que esse novo instrutor tomaria daquilo que é meu e o revelaria a vós.

180:6:5 19521 “Muito em breve eu vos deixarei, mas por pouco tempo. E depois disso, quando me virdes novamente, eu estarei já a caminho do Pai e, pois, nem mesmo então me vereis por muito tempo”.

180:6:6 19522 Enquanto Jesus parou por um momento, os apóstolos começaram a conversar uns com os outros: “O que é isso que ele está dizendo a nós? ‘Muito em breve eu vos deixarei’, e ‘Quando me virdes novamente não será por muito tempo, pois eu já estarei a caminho do Pai e, pois, nem mesmo então me vereis por muito tempo’. O que quer ele dizer com esse ‘muito em breve’ e ‘por muito tempo’? Nós não conseguimos compreender o que ele nos está dizendo”.

180:6:7 19523 E, porque Jesus soubesse que eles faziam essas perguntas a si próprios, ele disse: “Vós perguntais dentro de vós sobre o que eu quis dizer quando afirmei que em breve eu não estaria convosco e que, quando me virdes novamente, eu estarei já a caminho do Pai? Eu vos disse claramente que o Filho do Homem deve morrer, mas ele ressuscitará. E então não podeis saber o significado das minhas palavras? Primeiro ficareis tristes, mas, mais tarde rejubilar-vos-eis junto com muitos dos que compreenderão essas coisas, depois que elas acontecerem. Uma mulher de fato sofre na hora do parto, mas, depois de dar à luz o seu filho, ela imediatamente esquece a sua angústia com a alegria de saber que um ser humano nasceu para o mundo. E assim será com a vossa tristeza na hora da minha partida, mas eu vos verei de novo em breve e, então, a vossa tristeza transformar-se-á em júbilo, e uma nova revelação virá a vós, a da salvação de Deus, que nenhum homem poderá tomar de vós. E todos os mundos serão abençoados nessa mesma revelação da vida de triunfo sobre a morte. Até então vós fizestes todos os vossos pedidos em nome do meu Pai. Quando me virdes novamente, vós podeis pedir em meu nome também, e eu vos ouvirei.

180:6:8 19524 “Aqui na Terra eu vos ensinei por meio de provérbios e falei a vós por parábolas. E o fiz assim porque no espírito éreis apenas crianças, mas a época está chegando em que eu vos falarei claramente a respeito do Pai e do Seu Reino. E eu farei isso porque o próprio Pai vos ama e deseja ser revelado mais plenamente a vós. O homem mortal não pode ver o espírito do Pai; portanto eu vim ao mundo para mostrar o Pai aos vossos olhos de criaturas. Mas, quando tiverdes crescido para tornar-vos perfeitos em espírito, então vereis o próprio Pai”.

180:6:9 19525 Quando os onze ouviram-no falar, eles disseram uns aos outros: “Vede, ele fala claramente a nós. Certamente o Mestre veio de Deus. Mas por que ele diz que deve voltar ao Pai?” E Jesus viu que nem assim eles o haviam compreendido ainda. Esses onze homens não conseguiam escapar das suas idéias, longamente alimentadas dentro do conceito judeu do Messias. Quanto mais eles criam em Jesus como sendo o Messias, mais complicadas tornavam-se essas noções arraigadas a respeito do triunfo material glorioso do Reino na Terra.

DOCUMENTO 181

EXORTAÇÕES E CONSELHOS FINAIS
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Após a conclusão do discurso de despedida feito aos onze, Jesus conversou informalmente com eles e relatou novamente muitas experiências que lhes diziam respeito como grupo e como indivíduos. Afinal, esses galileus estavam começando a perceber que o seu amigo e instrutor iria abandoná-los e, nas suas esperanças, eles agarravam-se à promessa de que, após um curto período de tempo, ele estaria de novo com eles, no entanto estavam propensos a esquecer que essa visita de volta era também por pouco tempo. Muitos dos apóstolos e principais discípulos realmente pensavam que essa promessa de voltar por um período curto (o curto intervalo entre a ressurreição e a ascensão) indicava que Jesus estava indo embora para uma breve visita ao seu Pai, após o que ele voltaria para estabelecer o Reino. E tal interpretação do seu ensinamento conformava-se tanto às suas crenças preconcebidas, quanto às suas esperanças ardentes. Posto que, desse modo, as suas crenças de toda uma vida e esperanças de ver os desejos satisfeitos estavam de acordo, não era difícil para eles encontrarem uma interpretação para as palavras do Mestre que justificasse as suas aspirações intensas.

181:0:2 19532 Depois de terem analisado o discurso de despedida e de terem começado a assimilá-lo nas suas mentes, Jesus chamou novamente os apóstolos à ordem e começou a fazer-lhes exortações e a dar-lhes os seus conselhos finais.

1. ÚLTIMAS PALAVRAS DE CONFORTO


181:1:1 19533 Quando os onze tomaram seus assentos, Jesus permaneceu de pé e dirigiu-se a eles: “Posto que eu esteja convosco na carne, não posso ser senão um indivíduo em meio a vós ou no mundo inteiro. Mas, quando eu tiver sido libertado dessa veste de natureza mortal, serei capaz de retornar como um espírito que residirá em cada um de vós e em todos os outros crentes deste evangelho do Reino. Desse modo o Filho do Homem tornar-se-á uma encarnação espiritual nas almas de todos os verdadeiros crentes.

181:1:2 19534 “Quando eu tiver voltado para viver em vós e trabalhar por vosso intermédio, eu poderei conduzir-vos melhor nesta vida e guiar-vos pelas várias moradas na vida futura, nos céus dos céus. A vida na criação eterna do Pai não é um descanso sem fim, de indolência e sossego egoísta, mas é, antes, uma progressão incessante na graça, na verdade e na glória. Cada uma, entre tantas estações na casa do meu Pai, é um local de permanência para uma vida destinada a preparar-vos para a próxima, que está à frente. E assim os filhos da luz irão, de glória em glória, até que alcancem o estado divino no qual estarão espiritualmente perfeccionados, como o Pai é perfeito em todas as coisas.

181:1:3 19535 “Se quiserdes me seguir, quando eu vos deixar, empreendei os vossos esforços mais honestos para viver de acordo com o espírito dos meus ensinamentos e com o ideal da minha vida – fazer a vontade do meu Pai. Fazei isso, em vez de tentar imitar a minha vida natural na carne, como eu fui, por necessidade, solicitado a viver neste mundo.

181:1:4 19541 “O Pai enviou-me a este mundo, mas apenas poucos de vós escolheram receber-me plenamente. Eu irei verter o meu espírito sobre toda a carne; no entanto, não serão todos os homens que escolherão receber esse novo instrutor como guia e conselheiro da alma. Todos os que o receberem, todavia, serão iluminados, purificados e confortados. E esse Espírito da Verdade tornar-se-á, neles, um poço de água viva, fazendo-os crescer para a vida eterna.

181:1:5 19542 “E agora, estando para deixar-vos, eu gostaria de dizer palavras de conforto. Eu deixo a paz convosco; a minha paz eu dou-a a vós. Faço essas dádivas não como o mundo dá – medindo-as –, eu dou a cada um de vós tudo o que podeis receber. Que os vossos corações não se perturbem, e que não fiquem temerosos. Eu venci o mundo, e em mim todos vós ireis triunfar pela fé. Eu preveni-vos de que o Filho do Homem será morto, mas eu asseguro-vos de que eu retornarei antes de ir para o Pai, ainda que seja apenas por momentos. E, depois que tiver ascendido ao Pai, eu irei seguramente enviar o novo instrutor para estar convosco e para residir nos vossos próprios corações. E quando virdes tudo isso acontecer, não vos desanimeis, acrediteis antes, porquanto de tudo isso sabíeis de antemão. Eu vos amei com um grande afeto, e não gostaria de abandonar-vos, mas é essa a vontade do Pai. A minha hora é chegada.

181:1:6 19543 “Não duvideis de nenhuma dessas verdades, mesmo depois que estiverdes dispersos pelas perseguições e abatidos por causa de muitos sofrimentos. Quando sentirdes que estais sós no mundo, eu saberei do vosso isolamento, do mesmo modo que sabereis dos meus sofrimentos, quando estiverdes dispersos, todos vós, em caminhos diferentes, deixando o Filho do Homem nas mãos dos seus inimigos. Todavia eu nunca estou só; o Pai está sempre comigo. Mesmo em uma hora como esta, eu orarei por vós. E todas essas coisas eu vos disse para que possais ter paz e tê-la mais abundantemente. Neste mundo vós tereis tribulações, mas tendes coragem e alegria; eu triunfei no mundo e vos mostrei o caminho do júbilo e do serviço eterno”.

181:1:7 19544 Jesus dá a paz àqueles que junto com ele fazem a vontade de Deus, mas não na ordem das alegrias e satisfações deste mundo material. Os materialistas descrentes e os fatalistas apenas podem esperar gozar de duas espécies de paz e de conforto de alma: ou eles devem ser estóicos, possuídos de uma determinação de enfrentar, com uma resolução inquebrantável, o inevitável, e de resistir ao pior; ou devem ser otimistas, abandonando-se sempre à esperança que brota eternamente do peito humano, aspirando em vão ter uma paz que nunca realmente virá.

181:1:8 19545 Uma certa quantidade tanto de estoicismo quanto de otimismo é útil para viver a vida na Terra, mas nenhum dos dois nada tem a ver com aquela paz esplêndida que o Filho de Deus confere aos seus irmãos na carne. A paz que Michael dá aos seus filhos na Terra é aquela mesma paz que preencheu a sua própria alma quando ele próprio viveu a vida mortal na carne e neste mesmo mundo. A paz de Jesus é o júbilo e a satisfação de um indivíduo, conhecedor de Deus, que alcançou o triunfo de aprender plenamente como fazer a vontade de Deus, enquanto vivia a sua vida mortal na carne. A paz da mente de Jesus funda-se em uma fé humana absoluta na realidade do cuidado sábio e compassivo do Pai divino. Jesus teve dificuldades na Terra, ele foi até mesmo falsamente chamado “homem dos sofrimentos”, mas, em todas essas experiências, ele desfrutou do conforto daquela confiança que sempre lhe deu o poder de continuar com o seu propósito de vida, na certeza plena de que ele estava realizando a vontade do Pai.

181:1:9 19546 Jesus era determinado, persistente e profundamente devotado à realização da sua missão, mas ele não era um estóico insensível e endurecido; ele sempre buscou os aspectos mais positivos das experiências da sua vida, contudo ele não foi um otimista cego que se enganava. O Mestre sabia de tudo o que o esperava, e era destemido. Após ter outorgado essa paz a cada um dos seus seguidores, ele podia dizer consistentemente: “Não deixes o teu coração perturbar-se, nem te deixes amedrontar”.

181:1:10 19551 A paz de Jesus é, então, a paz e a firmeza de um filho que crê plenamente que a sua carreira pelo tempo e pela eternidade está segura e inteiramente sob os cuidados e a guarda de um espírito-Pai Todo-sábio, Todo-amoroso e Todo-Poderoso. E esta é, de fato, uma paz que transcende a compreensão da mente mortal, mas que pode ser gozada plenamente pelo coração humano crente.

2. EXORTAÇÕES PESSOAIS DE DESPEDIDA


181:2:1 19552 O Mestre tinha terminado de dar as suas instruções de despedida e de fazer as suas exortações finais aos apóstolos como um grupo. E então ele tratou de despedir-se individualmente e de dar a cada um uma palavra de conselho pessoal, junto com a sua bênção de despedida. Os apóstolos estavam ainda sentados à mesa, como quando eles primeiro sentaram-se para compartilhar a Última Ceia e, à medida que o Mestre ia contornando a mesa e falando com eles, cada um punha-se de pé quando Jesus dirigia-se a ele.

181:2:2 19553 A João, Jesus disse: “Tu, João, és o mais jovem dos meus irmãos. Tens estado muito próximo de mim e eu te amo com o mesmo amor que um pai tem para com os seus filhos, além de tudo, tu foste designado por André como um dos três que deveriam sempre estar perto de mim. E tu tens atuado por mim e deves continuar a atuar assim, em muitas questões que concernem à minha família terrena. E eu vou para o Pai, João, tendo a confiança plena de que tu continuarás a velar por aqueles que são os meus na carne. Vela para que a tua confusão atual a respeito da minha missão não impeça de nenhum modo que lhes estendas toda a simpatia, conselho e ajuda, como sabes que eu faria se fosse permanecer na carne. E, quando todos eles vierem para ver a luz e entrar integralmente no Reino, ainda que todos vós dêem jubilosas boas-vindas a eles, eu dependo de ti, João, para dar-lhes as boas-vindas por mim.

181:2:3 19554 “E agora, ao entrar nas horas finais da minha carreira terrena, permanece por perto e disponível para que eu possa deixar contigo qualquer mensagem para a minha família terrena. No que diz respeito à obra colocada nas minhas mãos pelo Pai, agora ela está terminada, exceto pela minha morte na carne, e eu estou pronto para beber deste último cálice. Mas quanto às responsabilidades passadas a mim por José, meu pai terreno, eu as tenho cumprido durante a minha vida, no entanto, devo depender de ti para agir em meu lugar em todas essas questões. E eu escolhi a ti para fazer isso por mim, João, porque tu és o mais jovem e, portanto, viverá mais do que os outros apóstolos.

181:2:4 19555 “Certa vez nós te chamamos e ao teu irmão de filhos do trovão. Tu começaste conosco muito autoritário e intolerante, mas tu mudaste bastante desde que quiseste que eu fizesse descer o fogo sobre as cabeças de descrentes impensados e ignorantes. E tu deves mudar ainda mais. Tu deverias transformar-te no apóstolo do novo mandamento que eu vos dei esta noite. Dedica a tua vida a ensinar aos teus irmãos como vos amar mutuamente, como eu vos amei”.

181:2:5 19556 João Zebedeu permanecia na sala superior, com as lágrimas rolando pelo seu rosto e, olhando para o rosto do Mestre, ele disse: “E assim eu farei, meu Mestre, mas como posso aprender a amar mais os meus irmãos?” E então Jesus respondeu: “Tu aprenderás a amar mais os teus irmãos quando aprenderes primeiro a amar mais o Pai no céu e após teres te tornado realmente mais interessado no bem-estar deles no tempo e na eternidade. E todo esse interesse humano é fomentado pela compaixão compreensiva, pelo serviço desinteressado e pelo perdão irrestrito. Nenhum homem deveria desdenhar-te pela tua juventude, e eu exorto-te a dar sempre a devida consideração ao fato de que a idade muitas vezes representa experiência, e de que nada nos assuntos humanos pode tomar o lugar da experiência real. Esforça-te para viver pacificamente com todos os homens, especialmente os teus amigos, na fraternidade do Reino celeste. E, João, lembra-te sempre, não lutes tanto com as almas que gostarias de ganhar para o Reino”.

181:2:6 19561 E então o Mestre, contornando o próprio assento, parou um momento ao lado do lugar de Judas Iscariotes. Os apóstolos ficaram muito surpresos de que Judas não tivesse voltado antes, e estavam bastante curiosos para descobrir o significado do semblante triste de Jesus, enquanto ele permaneceu diante do assento vago do traidor. Mas nenhum deles, exceto, possivelmente, André, tinha a mais leve idéia de que o tesoureiro deles havia saído para trair o seu Mestre, como Jesus sugerira-lhes, mais cedo naquela tarde e durante a ceia. Tantas coisas estavam acontecendo que, naquele momento, eles tinham esquecido completamente o anúncio feito pelo Mestre de que um deles iria traí-lo.

181:2:7 19562 Jesus nesse momento foi até onde estava Simão zelote, que se levantou para ouvir esta exortação: “Tu és um verdadeiro filho de Abraão, mas quanto tempo eu gastei tentando fazer de ti um filho deste Reino celeste. Eu amo a ti e a todos os teus irmãos também. Sei que tu me amas, Simão, e também que amas ao Reino, mas tu ainda estás determinado a fazer este Reino vir de acordo com o teu desejo. Eu sei muito bem que tu irás finalmente captar a natureza espiritual e o significado do meu evangelho, e que tu irás fazer um trabalho valente na proclamação dele, mas eu fico angustiado com o que pode acontecer a ti quando eu partir. Gostaria de me regozijar de saber que tu não irias hesitar; e ficaria feliz se pudesse saber que, depois que eu for para o Pai, tu não deixarias de ser meu apóstolo, e que tu irias comportar-te aceitavelmente como um embaixador do Reino celeste”.

181:2:8 19563 Mal Jesus acabou de falar a Simão zelote quando o patriota ardente, secando os seus olhos, replicou: “Mestre, não tenhas nenhum temor pela minha lealdade. Eu dei as minhas costas a tudo aquilo a que eu pudesse dedicar na minha vida para o estabelecimento do teu Reino na Terra, e não hesitarei. Tenho sobrevivido a todos os desapontamentos até agora, e eu não te abandonarei”.

181:2:9 19564 E, então, colocando sua mão no ombro de Simão, Jesus disse: “De fato, é reanimador ouvir-te falar assim, especialmente em um momento como este, mas, meu bom amigo, tu ainda não sabes do que estás falando. Nem por um momento, eu duvidaria da tua lealdade, da tua devoção, sei que tu não hesitarias em continuar na batalha e morrer por mim, como todos os outros também não (e eles todos acenaram em uma aprovação vigorosa), mas isso não será exigido de ti. E, repetidamente, tenho-te dito que o meu Reino não é deste mundo e que os meus discípulos não terão de lutar para que ele seja estabelecido. Eu te disse isso muitas vezes, Simão, mas te recusas a enfrentar a verdade. Não estou preocupado com a tua lealdade a mim e ao Reino; e sim com o que irás fazer quando eu me for e quando então afinal te despertares para a compreensão de que não captaste o significado dos meus ensinamentos e de que deves ajustar as tuas concepções erradas à realidade de uma outra ordem mais espiritual de assuntos do Reino?”

181:2:10 19565 Simão queria falar ainda mais, mas Jesus levantou a sua mão e, refreando-o, continuou a dizer: “Nenhum dos meus apóstolos é mais sincero e honesto de coração do que tu, mas nenhum deles ficará tão perturbado e desalentado quanto tu após a minha partida. Durante todo o teu desencorajamento, o meu espírito residirá dentro de ti, e os teus irmãos não te abandonarão. Não te esqueças do que eu te ensinei a respeito da relação entre a cidadania na Terra e a filiação ao Reino espiritual do Pai. Pondera bem sobre tudo o que eu te disse quanto a dar a César as coisas que são de César e a Deus aquilo que é de Deus. Dedica a tua vida, Simão, a mostrar quão aceitavelmente o homem mortal pode cumprir a minha injunção a respeito do reconhecimento simultâneo do dever temporal aos poderes civis e do serviço espiritual na irmandade do Reino. Se fores instruído pelo Espírito da Verdade, nunca haverá conflito entre as exigências da cidadania na Terra e a filiação ao céu, a menos que os dirigentes temporais presumam exigir de ti a homenagem e o culto que pertencem a Deus.

181:2:11 19571 “E agora, Simão, quando tu finalmente vires tudo isso, e depois que te vires livre da tua depressão e que tiveres saído para proclamar este evangelho, com um grande poder, nunca te esqueças de que eu estive contigo, mesmo durante os teus momentos de desencorajamento, e que eu irei contigo até o fim mesmo. Tu serás meu apóstolo para sempre, e depois que tu te tornares disposto a ver com os olhos do espírito e que estiveres mais disposto a submeter a tua vontade à vontade do Pai no céu, então tu voltarás a trabalhar como meu embaixador e ninguém tirará de ti a autoridade que eu te conferi, por causa da tua lentidão em compreender as verdades que eu te ensinei. E assim, Simão, uma vez mais eu te previno de que aqueles que lutam com a espada perecem pela espada, enquanto aqueles que trabalham com o espírito alcançam a vida eterna no Reino vindouro, com júbilo e paz no Reino em que estão agora. E quando o trabalho colocado nas tuas mãos terminar na Terra, tu, Simão, sentar-te-ás comigo no meu Reino. Tu realmente verás o Reino que almejastes, mas não nesta vida. Continues a crer em mim e naquilo que eu revelei a ti, e tu receberás a dádiva da vida eterna”.

181:2:12 19572 Depois que acabou de dizer isso a Simão zelote, Jesus encaminhou-se até Mateus Levi e falou: “Não mais recairá sobre ti a tarefa de prover o tesouro do grupo apostólico. Em breve, muito em breve, todos vós estareis dispersos; não vos será permitido desfrutar da ligação confortante e encorajadora com nenhum dos vossos irmãos. À medida que fordes pregando este evangelho do Reino, tereis de encontrar novos colaboradores para vós. Eu vos enviei dois a dois durante os tempos do vosso aperfeiçoamento, mas agora que vos estou deixando, após terde-vos recuperado do choque, saireis sozinhos, e até os confins da Terra, proclamando as boas-novas que declaram: Os mortais vivificados pela fé são os filhos de Deus”.

181:2:13 19573 E então Mateus falou: “Mas, Mestre, quem nos enviará, e como saberemos aonde ir? Será que André nos mostrará o caminho?” E Jesus respondeu: “Não, Levi, André não mais vos dirigirá na proclamação do evangelho. Ele irá, na verdade, continuar como vosso amigo e conselheiro até aquele dia em que o novo instrutor vier e, então, o Espírito da Verdade conduzirá cada um de vós pelo mundo a fim de que trabalheis para a expansão do Reino. Tu passaste por muitas mudanças, desde aquele dia na aduana, em que tu primeiro decidiste seguir-me; mas muitas mais devem acontecer-te antes de te fazeres capaz de ter a visão de uma irmandade na qual os gentios assentam-se ao lado dos judeus em uma ligação fraternal. Mas sai e, com o teu ímpeto, vai ganhar os teus irmãos judeus até ficares satisfeito plenamente e, então, volta-te com força aos gentios. De uma coisa podes estar certo, Levi: Tu ganhaste a confiança e o afeto dos teus irmãos; eles todos te amam”. (E todos os dez acenaram com a sua aquiescência às palavras do Mestre. )

181:2:14 19581 “Levi, muito eu sei sobre as tuas ansiedades, sacrifícios e lidas para manter o tesouro repleto e, disso tudo, os teus irmãos não sabem, e eu me rejubilo de que, embora aquele que leve a bolsa esteja ausente, o embaixador publicano está aqui, na minha reunião de despedida com os mensageiros do Reino. Eu oro para que tu possas discernir o significado do meu ensinamento, com os olhos do espírito. E, quando o novo instrutor vier ao teu coração, segue como ele te conduzir e deixa que os teus irmãos vejam – e todo o mundo mesmo – o que o Pai pode fazer por um coletor de impostos, odiado, que ousou seguir o Filho do Homem e acreditar no evangelho do Reino. Desde o princípio, Levi, eu te amei como estimei esses outros galileus. Sabendo, então, muito bem, que nem o Pai nem o Filho têm preferência por pessoas, zela para que não faças nenhuma distinção entre aqueles que se tornam crentes no evangelho por intermédio da tua ministração. E assim, Mateus, dedica toda a tua vida de serviço futuro a mostrar a todos os homens que Deus não tem preferência por pessoas; que, aos olhos de Deus e na fraternidade do Reino, todos os homens são iguais, todos os crentes são filhos de Deus”.

181:2:15 19582 Então, andando até onde estava Tiago Zebedeu, o qual ficou de pé, em silêncio, Jesus disse: “Tiago, quando tu e o teu irmão mais jovem vieram até a mim buscando a preferência nas honras do Reino, eu disse que tais honras eram para o Pai conceder e eu perguntei se seríeis capazes de beber do meu cálice, ambos responderam que o éreis. Ainda que não fôsseis capazes então, e se ainda não fordes capazes agora, em breve, estareis preparados para tal serviço, pela experiência que estais por passar. Com esse comportamento deixastes os vossos irmãos enraivecidos naquele momento. Se eles não tiverem já perdoado-vos plenamente, eles o farão quando virem que bebereis do meu cálice. Seja a tua ministração longa ou breve, mantém a tua alma paciente. Quando o novo instrutor vier, deixe que ele te ensine o equilíbrio da compaixão e aquela tolerância de simpatia que nasce da confiança sublime em mim e da submissão perfeita à vontade do Pai. Dedica a tua vida a demonstrar o afeto humano, combinado à dignidade divina do discípulo conhecedor de Deus e crente no Filho. E todos que viverem assim revelarão o evangelho, até mesmo pela sua maneira de morrer. Tu e o teu irmão João tomarão caminhos diferentes, e um de vós pode assentar-se comigo no Reino eterno muito antes do outro. De muita ajuda seria para ti se tu aprendesses que a verdadeira sabedoria abrange a prudência do discernimento tanto quanto a coragem. Tu deverias aprender a ser sagaz para conviver bem com a tua agressividade. Aproximam-se aqueles momentos supremos nos quais os meus discípulos não hesitarão em dar as suas vidas por este evangelho, mas em todas as circunstâncias comuns seria muito melhor aplacar a ira dos descrentes, para que possas viver e continuar a pregar as boas-novas. À medida que estiver ao teu alcance, vive longamente na Terra para que essa vida de muitos anos possa ser cheia de frutos em almas conquistadas para o Reino do céu”.

181:2:16 19583 Depois que o Mestre terminou a sua fala a Tiago Zebedeu, ele contornou a mesa até o fim, onde André estava sentado e, olhando o seu fiel ajudante nos olhos, Jesus disse: “André, tu me tens representado fielmente como o dirigente atuante dos embaixadores do Reino do céu. Embora tu tenhas algumas vezes duvidado e outras vezes manifestado uma timidez perigosa, ainda assim, tu tens sido sempre sinceramente justo e eminentemente equânime ao lidar com os teus companheiros. Desde a tua ordenação e dos teus irmãos como mensageiros do Reino, tu tens sido auto-suficiente e autônomo, todas as decisões administrativas para o grupo foram tuas, exceto a tua designação, como dirigente desses homens escolhidos, que foi feita por mim. Em nenhuma outra questão temporal eu atuei no sentido de dirigir ou de influenciar as tuas decisões. E essa escolha eu a fiz com a finalidade de prover a liderança para dirigir todas as deliberações grupais subseqüentes. No meu universo e no universo dos universos do meu Pai, os nossos irmãos-filhos são tratados como indivíduos, em todas as suas relações espirituais, mas em todas as relações grupais nós provemos infalivelmente uma liderança definida. O nosso Reino é um domínio de ordem, e onde duas ou mais criaturas de vontade atuam em cooperação, há sempre que ser providenciada a autoridade da liderança.

181:2:17 19591 “E agora, André, por seres o dirigente dos teus irmãos com a autoridade de uma designação feita por mim, e porque tens servido assim, como o meu representante pessoal, e como eu estou na iminência de deixar-vos e voltar para o meu Pai, eu libero-te de toda responsabilidade que diga respeito a esses assuntos temporais e administrativos. De agora em diante tu só podes exercer jurisdição sobre os teus irmãos naquilo que tiver sido conquistado pela tua capacidade como líder espiritual, e que os teus irmãos reconheçam livremente. Desse momento em diante tu não podes exercer nenhuma autoridade sobre os teus irmãos, a menos que eles restaurem essa jurisdição, dando-a a ti por meio de uma ação legislativa definida, depois que eu tiver ido para o Pai. Mas essa liberação da responsabilidade, como dirigente administrativo desse grupo, não diminui, de nenhum modo, a tua responsabilidade moral de fazer tudo o que estiver ao teu alcance para manter os teus irmãos juntos com um pulso firme e amoroso durante os tempos de provação que estão pela frente; aqueles dias que estarão entre a minha partida na carne e o envio do novo instrutor que irá viver nos vossos corações, e que afinal vos conduzirá a toda verdade. Enquanto me preparo para deixar-vos, eu gostaria de liberar-te de toda responsabilidade administrativa que teve o seu começo e autoridade na minha presença, como um entre todos. Doravante eu irei exercer a autoridade apenas espiritual sobre vós e entre vós.

181:2:18 19592 “Se os teus irmãos desejarem manter-te como conselheiro deles, eu te instruo que deverias, em todas as questões temporais e espirituais, fazer o melhor para promover a paz e a harmonia entre os vários grupos de crentes sinceros do evangelho. Dedica o restante da tua vida a promover os aspectos práticos do amor fraterno entre os teus irmãos. Sê bom para os meus irmãos na carne quando eles vierem a crer plenamente neste evangelho; manifesta devoção amorosa e imparcial aos gregos no oeste e a Abner no leste. Já que esses meus apóstolos logo irão, todos, estar espalhados por todas as regiões da Terra, para proclamarem as boas-novas da salvação pela filiação a Deus, tu deves mantê-los juntos, durante os tempos de provações que temos pela frente, durante aquele período de testes intensos no qual tu deves aprender a crer neste evangelho sem a minha presença pessoal, enquanto pacientemente esperas a chegada do novo instrutor, o Espírito da Verdade. E assim, André, embora possa não caber a ti fazer as grandes obras, como vistas pelos homens, fica contente de seres tu o instrutor e conselheiro daqueles que fazem tais coisas. Prossegue com a tua obra na Terra até o fim, e então irás continuar essa ministração no Reino eterno, pois não tenho eu dito muitas vezes a ti que possuo outras ovelhas que não são deste aprisco?”

181:2:19 19593 Jesus então dirigiu-se aos gêmeos Alfeus e, de pé entre eles, disse: “Meus filhinhos, vós sois um dos três grupos de irmãos que escolheram seguir-me. Todos os seis fizeram bem ao trabalhar em paz junto com os da vossa mesma carne e sangue, mas ninguém o fez melhor do que vós. Tempos difíceis estão à nossa frente. Podeis não compreender tudo o que sobrevirá a vós e aos vossos irmãos, mas nunca duvideis de que fostes, um dia, chamados para a obra do Reino. Durante algum tempo não haverá multidões para administrar, mas não vos desencorajeis; quando o trabalho da vossa vida tiver acabado, eu vos receberei no alto, onde, na glória, vós contareis sobre a vossa salvação às hostes seráficas e ao grande número de altos Filhos de Deus. Dedicai as vossas vidas ao engrandecimento do trabalho pesado comum. Mostrai a todos os homens na Terra e aos anjos do céu quão alegre e corajosamente pode o homem mortal, após ter sido chamado a trabalhar por um bom tempo no serviço especial de Deus, retornar aos trabalhos dos dias anteriores. Caso, agora, o vosso trabalho com os assuntos exteriores do Reino tenha chegado ao fim, deveis voltar à vossa faina anterior com o esclarecimento novo da experiência da filiação a Deus e com a compreensão elevada de que, para aquele que conhece a Deus, não existem coisas tais como um trabalho banal e a faina secular. Para vós que trabalhastes comigo, todas as coisas tornaram-se sagradas, e toda a lida terrena tornou-se um serviço mesmo a Deus, o Pai. E quando ouvirdes os novos feitos dos vossos antigos companheiros apostólicos, rejubilai com eles e continuai o vosso trabalho cotidiano como aqueles que aguardam a Deus e que servem enquanto esperam. Vós tendes sido os meus apóstolos, e sempre sereis, e eu me lembrarei de vós no Reino que virá”.

181:2:20 19601 E então Jesus encaminhou-se até Filipe, que, levantou-se para ouvir esta mensagem do seu Mestre: “Filipe, tu me fizeste muitas perguntas tolas, mas eu empenhei-me em responder a todas, e agora eu gostaria de responder à última das indagações que surgiram na tua mente honestíssima, mas ainda não espiritual. Em todo esse tempo que levei para contornar a mesa e chegar a ti, tu tens estado a perguntar a ti próprio: ‘O que farei se o Mestre for embora e nos deixar sozinhos no mundo?’Ó, quão pouca fé tens! E tu tens ainda tanta fé quanto muitos dos teus irmãos. Foste um bom intendente, Filipe. As tuas falhas foram raras, e uma delas nós a utilizamos para manifestar a glória do Pai. A tua função de intendente está praticamente terminada. Deves em breve fazer mais plenamente o trabalho para o qual foste chamado a fazer – a pregação deste evangelho do Reino. Filipe, tu sempre quiseste que as coisas te fossem mostradas, e muito em breve tu verás grandes coisas. Muito melhor seria se tu tivesses visto tudo isso pela fé, mas por teres sido sincero, mesmo com a tua visão material, tu viverás para ver as minhas palavras serem cumpridas. E então, quando fores abençoado com a visão espiritual, vai adiante com o teu trabalho, dedicando a tua vida à causa de guiar a humanidade na busca de Deus e na busca de realidades eternas, com o olho da fé espiritual e não com os olhos da mente material. Lembra-te, Filipe, tu tens uma grande missão na Terra, pois o mundo está cheio daqueles que olham para a vida exatamente como tu tinhas a tendência de olhar. Tu tens uma grande obra a fazer e, quando ela estiver completa na fé, tu virás a mim no meu Reino, e eu terei um grande prazer em mostrar-te aquilo que o olho não viu, nem ouviu o ouvido, nem a mente mortal concebeu. Nesse meio tempo, seja como uma criança pequena no Reino do espírito e permite-me, por meio do espírito do novo instrutor, guiar-te para a frente no Reino espiritual. E, desse modo, eu serei capaz de fazer por ti muito daquilo que eu não fui capaz de realizar quando permaneci contigo como um mortal deste reino. E lembra-te sempre, Filipe, aquele que tiver visto a mim terá visto o Pai”.

181:2:21 19602 Então o Mestre foi a Natanael. Quando Natanael levantou-se, Jesus pediu-lhe que se sentasse e, sentando-se a seu lado, disse Jesus: “Natanael, tu aprendeste a viver acima do preconceito e a praticar uma tolerância maior, desde que te tornaste meu apóstolo. Mas há muito mais que deves aprender. Tu tens sido uma bênção para os teus companheiros, porque eles sempre foram aconselhados pela tua firme e coerente sinceridade. Quando eu tiver ido, pode ser que a tua franqueza te impeça de ter um bom relacionamento com os teus irmãos, tanto os antigos quanto os novos. Devias aprender que, mesmo a expressão de um bom pensamento, deve ser modulada de acordo com o status intelectual e com o desenvolvimento espiritual do ouvinte. A sinceridade é muito útil na obra do Reino, quando é aliada à prudência do discernimento.

181:2:22 19611 “Se quiseres aprender a trabalhar com os teus irmãos, poderás realizar coisas mais permanentes, entretanto, se saíres à procura daqueles que pensam como tu, dedica a tua vida a provar que o discípulo que sabe de Deus pode tornar-se um edificador do Reino, ainda que esteja só no mundo e totalmente isolado dos seus companheiros crentes. Sei que tu serás fiel até o fim, e algum dia eu dar-te-ei as boas-vindas, ao serviço engrandecido do meu Reino, no alto”.

181:2:23 19612 Então Natanael falou, fazendo esta pergunta a Jesus: “Tenho ouvido ao teu ensinamento desde a primeira vez que me chamaste ao serviço deste Reino, todavia, honestamente eu não posso compreender o significado pleno de tudo o que nos dizes. Não sei o que esperar em seguida, e penso que a maior parte dos meus irmãos está também perplexa, mas eles hesitam em confessar a sua confusão. Podes ajudar-me?” Jesus, colocando a sua mão no ombro de Natanael, disse: “Meu amigo, não é estranho que tu fiques perplexo na tentativa de captar o significado dos meus ensinamentos espirituais, já que tu és tão limitado pelos teus preconcebimentos da tradição judaica, e tão confundido pela tua tendência persistente de interpretar o meu evangelho de acordo com os ensinamentos dos escribas e dos fariseus.

181:2:24 19613 “E eu muito te ensinei por meio da palavra pessoal, e passei a minha vida entre vós. Fiz tudo o que pode ser feito para esclarecer as vossas mentes e liberar as vossas almas, e o que tu não fostes capaz de apreender dos meus ensinamentos e da minha vida deveis preparar-te para agora adquirir das mãos desse mestre de todos os instrutores – a experiência factual. E eu te precederei em toda essa nova experiência que te aguarda, e o Espírito da Verdade estará contigo. Não temas; o que não conseguires compreender, o novo instrutor, quando vier, revelará a ti durante o resto da tua vida na Terra e durante a tua reeducação nas idades eternas”.

181:2:25 19614 E então o Mestre, voltando-se para todos eles, disse: “Não vos desanimeis porque deixastes de captar o significado pleno do evangelho. Vós sois apenas homens finitos, mortais, e aquilo que eu vos ensinei é infinito, divino e eterno. Sede pacientes e tende coragem, pois tende as idades eternas diante de vós, e nelas podereis continuar a vossa realização da experiência progressiva, de tornar-vos perfeitos, como o vosso Pai no Paraíso é perfeito”.

181:2:26 19615 E então Jesus dirigiu-se para junto de Tomé, que, levantando-se, ouviu-o dizer: “Tomé, a fé tem faltado-te com freqüência; contudo, quando tiveste os teus momentos de dúvida, nunca a coragem te faltou. Eu sei muito bem que os falsos profetas e os instrutores espúrios não te enganarão. Depois que eu tiver ido, os teus irmãos irão apreciar mais o teu modo crítico de ver os ensinamentos novos. E, quando estiverem todos espalhados até os confins da Terra, nos tempos que virão, lembra-te de que ainda és meu embaixador. Dedica a tua vida à grande obra de mostrar como a crítica da mente material do homem pode triunfar sobre a inércia da dúvida intelectual frente à demonstração da manifestação da verdade viva. Essa mesma verdade viva que atua na experiência dos homens e mulheres nascidos do espírito, e que produz os frutos do espírito nas vidas deles, fazendo-os amarem-se mutuamente, como eu vos tenho amado. Tomé, eu estou contente de que tu te tenhas unido a nós e sei que, após um curto período de perplexidade, tu continuarás no serviço do Reino. As tuas dúvidas têm deixado os teus irmãos perplexos, mas elas nunca perturbaram a mim. Tenho confiança em ti e preceder-te-ei mesmo nos confins da Terra”.

181:2:27 19621 Então o Mestre seguiu até onde estava Simão Pedro, que se levantou enquanto Jesus dirigia-se a ele: “Pedro, sei que tu me amas, e que tu dedicarás a vida à proclamação pública deste evangelho do Reino, tanto a judeus quanto a gentios, no entanto eu fico angustiado com o fato de que os teus anos de contato tão íntimo comigo não te ajudaram a pensar mais antes de falar. Por qual experiência deves passar antes de aprenderes a colocar uma vigilância nos próprios lábios? Quantos problemas não nos trouxeste com as tuas palavras impensadas e com a tua autoconfiança presunçosa! E tu estás destinado a trazer muito mais complicações ainda para ti mesmo, se não dominares essa fragilidade. Sabes que os teus irmãos te amam a despeito dessa fraqueza. E deverias também compreender que esse defeito de nenhum modo prejudica a minha afeição por ti, mas ele diminui a tua utilidade e não deixa de trazer complicações para ti. Mas tu irás sem dúvida receber uma grande ajuda da experiência que terás a partir mesmo até desta noite. E o que eu agora te digo, Simão Pedro, do mesmo modo eu digo a todos os teus irmãos aqui reunidos: Nesta noite todos vós correreis um grande perigo de tropeçar por minha causa. Sabeis que está escrito: ‘O pastor será golpeado, e as ovelhas dispersadas’. Quando eu estiver ausente, haverá um grande perigo de que alguns de vós sucumbais às dúvidas e tropeceis em vista daquilo que sobrevirá a mim. Mas eu prometo-vos agora que voltarei a vós por um breve momento, e que então eu estarei diante de vós na Galiléia”.

181:2:28 19622 Então Pedro disse, colocando a sua mão no ombro de Jesus: “Não importa se todos os meus irmãos sucumbam às dúvidas por tua causa, eu prometo que não tropeçarei em qualquer coisa que possas fazer. Irei contigo e, se for necessário, morrerei por ti”.

181:2:29 19623 Enquanto Pedro permanecia diante do seu Mestre, todo trêmulo, com a emoção intensa e transbordante de amor verdadeiro por ele, Jesus olhou diretamente dentro dos seus olhos molhados e disse: “Pedro, em verdade, em verdade, eu te digo, nesta noite o galo não cantará antes que tu me tenhas negado três ou quatro vezes. E, assim, o que tu não conseguiste aprender de uma ligação pacífica comigo, tu irás aprender por meio de muita complicação e de muitos sofrimentos. E, depois que tu tiveres realmente aprendido essa lição imprescindível, deverias fortalecer os teus irmãos e continuar levando uma vida dedicada a pregar este evangelho, embora possas ir para a prisão e, talvez, seguir-me e pagar o preço supremo pelo serviço de amor na edificação do Reino do Pai.

181:2:30 19624 “Mas lembra-te da minha promessa: Quando eu ressuscitar, permanecerei convosco algum tempo antes de ir para o Pai. E, nessa mesma noite, eu farei uma súplica ao Pai para que fortaleça cada um de vós naquilo por que devereis agora tão em breve passar. Eu vos amo a todos, com o amor com que o Pai me ama e, portanto, deveríeis doravante amar-vos uns aos outros como eu vos amei”.

181:2:31 19625 E por fim, depois de cantarem um hino, eles partiram para o acampamento no monte das Oliveiras.

DOCUMENTO 182

NO GETSÊMANE
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Eram por volta das dez horas dessa quinta-feira quando Jesus conduziu os onze apóstolos saindo da casa de Elias e Maria Marcos, pelo caminho de volta ao acampamento do Getsêmane. Desde aquele dia nas colinas, João Marcos tomara como seu o dever de manter Jesus sempre à vista. João, que estivera precisando de dormir, havia conseguido várias horas de descanso durante o intervalo em que o Mestre esteve com os seus apóstolos na sala superior, mas, ao ouvi-los descendo para o andar debaixo, ele levantou-se e, jogando rapidamente sobre si um manto de linho, seguiu-os pela cidade, passando pelo riacho Cédrão, e prosseguiu até o seu acampamento particular, adjacente ao parque do Getsêmane. E João Marcos permaneceu tão perto do Mestre durante essa noite e no dia seguinte, que testemunhou tudo e ouviu grande parte do que o Mestre disse desde esse momento até a hora da crucificação.

182:0:2 19632 Enquanto Jesus e os onze encontravam-se no caminho de volta ao acampamento, os apóstolos começaram a perguntar-se sobre o significado da ausência prolongada de Judas, e falavam uns com os outros sobre a predição do Mestre de que um deles o trairia e, pela primeira vez, suspeitaram de que nem tudo estava bem com Judas Iscariotes. No entanto, eles não fizeram nenhum comentário aberto sobre Judas, até que chegaram ao acampamento e observaram que ele não estava lá, à espera para recebê-los. Então todos eles cercaram André para saber o que tinha acontecido a Judas; o dirigente deles apenas observou: “Eu não sei onde Judas está, mas temo que ele nos tenha desertado”.

1. A ÚLTIMA PRECE DO GRUPO


182:1:1 19633 Poucos momentos depois de chegarem ao acampamento, Jesus disse-lhes: “Meus amigos e irmãos, o tempo que me resta para passar convosco é muito curto, e o meu desejo é que nos isolemos enquanto oramos ao nosso Pai no céu pedindo força para sustentar-nos nesta hora e daqui por diante em todo o trabalho que devemos fazer no Seu nome”.

182:1:2 19634 Depois de falar assim, ele seguiu pelo caminho até uma curta distância, subindo o monte das Oliveiras, onde havia uma vista plena de Jerusalém, e pediu-lhes que se ajoelhassem sobre uma rocha grande e espalhada, em volta dele em um círculo, como tinham feito no dia da sua ordenação; e, então, enquanto permanecia ali, glorificado no meio deles, sob a luz suave da lua, Jesus levantou os olhos aos céus e orou:

182:1:3 19635 “Pai, é chegada a minha hora; glorifica agora o Teu Filho, para que o Filho possa glorificar-Te. Sei que me deste a autoridade plena sobre todas as criaturas vivas no meu Reino, e eu darei a vida eterna a todos que se tornarem filhos de Deus pela fé. E a vida eterna é que as minhas criaturas Te conheçam como o único Deus verdadeiro e Pai de todos, e que elas acreditem naquele a quem Tu enviaste ao mundo. Pai, eu exaltei-Te na Terra e realizei o trabalho que Tu me deste para fazer. Eu já quase terminei as minhas auto-outorgas junto aos filhos da nossa própria criação; resta-me apenas deixar a minha vida na carne. E agora, ó meu Pai, glorifica-me com a glória que eu possuía Contigo antes da existência deste mundo e recebe-me uma vez mais à Tua mão direita.

182:1:4 19641 “Eu tenho-Te manifestado aos homens a quem escolheste no mundo e que me deste. Eles são Teus – como toda a vida está nas Tuas mãos – e Tu os deste a mim, e eu vivi entre eles ensinando-lhes o caminho da vida, e eles creram. Esses homens estão aprendendo que tudo o que tenho vem de Ti, e que a vida que eu vivo na carne é para tornar o meu Pai conhecido aos mundos. A verdade que Tu me deste, eu a revelei a eles. E eles, meus amigos e embaixadores, sinceramente dispuseram-se a receber a Tua palavra. Eu disse-lhes que saí de Ti, que Tu me enviaste a este mundo, e que eu estou na iminência de voltar para Ti. Pai, eu oro por esses homens escolhidos. E oro para eles, não como oraria pelo mundo, mas como oro por aqueles a quem eu escolhi neste mundo para representar-me, depois que tiver retornado à Tua obra, como eu próprio representei-Te neste mundo durante a minha permanência na carne. Esses homens são meus; Tu os deste a mim; todas as coisas que são minhas, todavia, são sempre Tuas, e tudo o que era Teu, Tu agora tornaste meu. Tu foste exaltado em mim, e agora oro para que possa eu ser honrado nesses homens. Eu não mais posso ficar neste mundo; estou na iminência de voltar à obra que Tu me deste para fazer. Eu devo deixar esses homens aqui para representar-nos e ao nosso Reino entre os homens. Pai, mantém esses homens fiéis, enquanto eu me preparo para deixar a minha vida na carne. Ajuda esses amigos meus a serem um em espírito, como somos Um. Enquanto pude estar com eles, eu cuidei deles e guiei-os, mas agora estou para ir embora. Fica junto a eles, Pai, até que possamos enviar o novo instrutor para confortá-los e fortalecê-los.

182:1:5 19642 “Tu me deste doze homens e eu os mantive todos, menos um, o filho da vingança, que não quis mais estar na nossa fraternidade. Esses homens são fracos e frágeis, mas sei que podemos confiar neles; eu já os pus à prova; eles me amam, tanto quanto Te reverenciam. Conquanto eles devam sofrer bastante por minha causa, eu desejo que eles fiquem cheios pelo júbilo da segurança da filiação ao Reino celeste. A esses homens eu passei a Tua palavra e ensinei-lhes a verdade. O mundo pode odiá-los, como me odiou, mas eu não Te peço que os tire do mundo; apenas que os proteja do mal no mundo. Santifica-os na verdade; a Tua palavra é a verdade. E, como me enviaste a este mundo, do mesmo modo estou enviando esses homens ao mundo. Com eles eu vivi entre os homens e consagrei a minha vida ao Teu serviço, para que eu pudesse inspirá-los a serem purificados por meio da verdade que eu lhes ensinei e por meio do amor que lhes revelei. Eu bem sei, meu Pai, que não há necessidade de que eu Te peça que cuide desses irmãos depois que eu for embora; sei que Tu os amas como eu, mas faço isso para que possam compreender melhor que o Pai ama os homens mortais tanto quanto o Filho os ama.

182:1:6 19643 “E agora, meu Pai, eu gostaria de fazer uma prece não apenas por esses onze homens, mas também por todos os outros que agora crêem, ou que podem, de agora em diante, crer no evangelho do Reino por meio da palavra da Tua ministração futura. Quero que sejam um, como Tu e eu somos Um. Tu estás em mim e eu estou em Ti, e eu desejo que esses crentes, do mesmo modo, estejam em Nós; que ambos os nossos Espíritos residam neles. Se os meus filhos forem um, como nós somos Um, e se eles amarem uns aos outros como eu os tenho amado, então, todos os homens crerão que eu vim de Ti e estarão dispostos a receber a revelação da verdade e da glória que eu tive. A glória que Tu me deste, eu a revelei a esses crentes. Como Tu viveste comigo em espírito, eu também vivi com eles na carne. Como Tu tens sido Um comigo, eu também tenho sido um com eles, e assim fará o novo instrutor que será sempre um com eles e neles. E tudo isto eu fiz para que os meus irmãos na carne possam saber que o Pai os ama como o Filho os ama, e que Tu os amas como Tu amas a mim. Pai, trabalha comigo para salvar esses crentes, para que eles possam, muito em breve, vir a estar comigo na glória e, então, continuarem até juntar-se a Ti no abraço do Paraíso. Aqueles que servem comigo na humilhação, eu gostaria de tê-los comigo na glória, de modo que eles possam ver tudo o que Tu colocaste nas minhas mãos como colheita eterna da semente do tempo, na semelhança da carne mortal. Eu aspiro mostrar aos meus irmãos terrenos a glória que eu tinha Contigo antes do começo deste mundo. Este mundo conhece pouquíssimo de Ti, Pai virtuoso, mas eu Te conheço, e eu tornei-Te conhecido para esses crentes, e eles farão o Teu nome conhecido para outras gerações. E agora eu prometo a eles que Tu estarás com eles no mundo como Tu estiveste comigo – e que assim seja”.

182:1:7 19651 Os onze permaneceram ajoelhados nesse círculo em volta de Jesus por vários minutos antes de levantarem-se e, em silêncio, tomarem o caminho de volta para o acampamento próximo.

182:1:8 19652 Jesus orou pela unidade entre os seus seguidores, mas ele não desejava a uniformidade. O pecado cria um nível morto de inércia maligna, mas a retidão nutre o espírito criativo da experiência individual nas realidades vivas da verdade eterna e na comunhão progressiva dos espíritos divinos do Pai e do Filho. Na fraternidade espiritual do filho crente com o Pai divino, nunca pode haver intenção com finalidade doutrinária nem consciência sectária de superioridade grupal.

182:1:9 19653 O Mestre, durante o andamento dessa prece final com os seus apóstolos, aludiu ao fato de que ele tinha manifestado o nome do Pai para o mundo. E isso foi verdadeiramente o que ele fez para a revelação de Deus por meio da sua vida perfeita na carne. O Pai no céu tinha procurado revelar-Se a Moisés, mas Ele não pôde ir mais longe do que fazer com que fosse dito: “EU SOU”. E, quando foi pedido que fizesse mais revelações de Si mesmo, ficou apenas revelado: “EU SOU AQUELE QUE SOU”. Mas, quando Jesus terminou a sua vida na Terra, esse nome do Pai tinha sido revelado de um modo tal que o Mestre, que era o Pai encarnado, podia dizer em verdade:

182:1:10 19654 Eu sou o pão da vida.

Eu sou a água viva.

Eu sou a luz do mundo.

Eu sou o desejo de todos os tempos.

Eu sou a porta aberta para a salvação eterna.

Eu sou a realidade da vida perpétua.

Eu sou o bom pastor.

Eu sou o caminho da perfeição infinita.

Eu sou a ressurreição e a vida.

Eu sou o segredo da sobrevivência eterna.

Eu sou o caminho, a verdade e a vida.

Eu sou o Pai infinito dos meus filhos finitos.

Eu sou a verdadeira videira; vós sois os ramos.

Eu sou a esperança de todos que conhecem a verdade viva.

Eu sou a ponte viva de um mundo para outro.

~ Eu sou o elo vivo entre o tempo e a eternidade.

182:1:11 196520 Assim, Jesus ampliou para todas as gerações a revelação viva do nome de Deus. Do mesmo modo que o amor divino revela a natureza de Deus, a verdade eterna desvela o seu nome em proporções sempre crescentes.

2. A ÚLTIMA HORA ANTES DA TRAIÇÃO


182:2:1 19661 Os apóstolos ficaram muito chocados quando voltaram para o acampamento e perceberam a ausência de Judas. Enquanto os onze estavam empenhados em uma discussão calorosa sobre o companheiro deles, o apóstolo traidor, Davi Zebedeu e João Marcos levaram Jesus para um lado e revelaram que eles o tinham mantido sob observação por vários dias, e que eles sabiam que ele tinha a intenção de traí-lo, pondo-o nas mãos dos seus inimigos. Jesus ouviu-os e apenas disse: “Meus amigos, nada pode acontecer ao Filho do Homem a menos que seja a vontade do Pai no céu. Que os vossos corações não se perturbem; todas as coisas atuarão juntas para a glória de Deus e para a salvação dos homens”.

182:2:2 19662 A atitude cheia de ânimo de Jesus alterava-se. Com o passar das horas, ele foi ficando mais e mais circunspecto, triste mesmo. Os apóstolos, achavam-se muito agitados e revelavam-se avessos a retornar para as suas tendas, ainda que o próprio Mestre pedisse-lhes que fizessem isso. Voltando da sua caminhada com Davi e João, ele dirigiu as suas últimas palavras a todos os onze, dizendo: “Meus amigos, ide descansar. Preparai-vos para o trabalho de amanhã. Lembrai-vos de que nós devemos todos submeter-nos à vontade do Pai no céu. Deixo a minha paz convosco”. E, tendo dito isso, fez um gesto para que eles fossem para as suas tendas, mas, no momento em que estavam saindo, chamou Pedro, Tiago e João, e disse-lhes: “Desejo que fiqueis comigo um pouco mais”.

182:2:3 19663 E, porque estivessem literalmente exaustos, os apóstolos pegaram no sono; desde a chegada deles de Jerusalém, eles simplesmente não dormiam suficientemente. Antes que fossem para os seus alojamentos, Simão zelote levou-os até a sua tenda, onde estocava as espadas e outras armas, e proveu a cada um deles com o equipamento de luta. Exceto Natanael, todos receberam as armas e guarneceram-se com elas. Natanael, ao recusar-se a se armar, disse: “Meus irmãos, o Mestre nos disse repetidas vezes que o seu Reino não é deste mundo, e que os seus discípulos não deveriam lutar com espadas para estabelecê-lo. Eu acredito nisso; não penso que o Mestre necessite de que empreguemos espadas para defendê-lo. Todos vimos já a força do seu poder e sabemos que poderia defender-se contra os seus inimigos se ele assim o desejasse. Se ele não oferece resistência aos seus inimigos, deve ser porque esse procedimento representa a sua tentativa de cumprir a vontade do seu Pai. Eu farei preces, mas não brandirei uma espada”. Quando André ouviu o que Natanael disse, entregou de volta a sua espada a Simão zelote. E assim nove dentre eles estavam armados quando se separaram naquela noite.

182:2:4 19664 O ressentimento pelo fato de Judas ser um traidor, naquele momento, eclipsou tudo o mais nas mentes dos apóstolos. O comentário do Mestre em relação a Judas, dito durante a última oração, havia-lhes aberto os olhos para a realidade de que ele já os havia abandonado.

182:2:5 19665 Após oito dos apóstolos terem finalmente voltado para as suas tendas e, enquanto Pedro, Tiago e João esperavam para receber as ordens do Mestre, Jesus disse a Davi Zebedeu: “Envia-me o seu mensageiro mais veloz e confiável”. Quando Davi trouxe ao Mestre um certo Jacó, que tinha sido mensageiro no serviço noturno, entre Jerusalém e Betsaida, Jesus, dirigindo-se a ele, disse: “Vai a Abner na Filadélfia, com toda a tua rapidez, e diz-lhe: ‘O Mestre envia-vos saudações de paz e diz que a hora é chegada em que ele será entregue nas mãos dos seus inimigos, que o levarão à morte, mas que ele ressuscitará dos mortos e aparecerá a vós, durante pouco tempo, antes de ir para o Pai; e então dará as orientações para a época em que o novo instrutor vier para residir nos vossos corações’”. E, quando Jacó repetiu essa mensagem até que o Mestre se desse por satisfeito, Jesus colocou-o a caminho, dizendo: “Não temas o que algum homem possa fazer a ti, Jacó, pois nessa noite um mensageiro invisível correrá ao seu lado”.

182:2:6 19671 Então Jesus voltou-se para o dirigente dos gregos visitantes, os quais estavam acampados com eles, e disse: “Meu irmão, não te perturbes com o que está para acontecer, pois disso eu já te preveni. O Filho do Homem será levado à morte, sob a instigação dos seus inimigos, do dirigente dos sacerdotes e dos dirigentes dos judeus, mas eu ressuscitarei para estar convosco durante um curto espaço de tempo antes de ir para o Pai. E, quando tu tiveres visto tudo isso acontecer, glorifica a Deus e dá forças aos teus irmãos”.

182:2:7 19672 Sob circunstâncias comuns os apóstolos teriam dado ao Mestre um boa-noite pessoal, mas nessa noite eles estavam tão preocupados com o acontecimento súbito da deserção de Judas e tão aturdidos com a natureza inusitada da oração de despedida do Mestre, que ouviram a sua saudação de despedida e foram embora em silêncio.

182:2:8 19673 E, nessa noite, quando André saía de perto de Jesus, este lhe disse o seguinte: “André, faze o que puder para manter juntos os teus irmãos até que eu volte novamente para vós, depois que eu tiver bebido deste cálice. Dá força aos teus irmãos, considerando que a ti eu já disse tudo. A paz esteja contigo”.

182:2:9 19674 Nenhum dos apóstolos esperava que algo fora do ordinário acontecesse naquela noite, posto que já era muito tarde. Eles tentaram dormir a fim de levantar cedo de manhã e estar preparados para o pior. Pensavam que o dirigente dos sacerdotes buscaria apreender o seu Mestre cedo pela manhã, já que nenhum trabalho secular jamais era feito após o meio do Dia da Preparação da Páscoa. Apenas Davi Zebedeu e João Marcos entenderam que os inimigos de Jesus viriam com Judas naquela mesma noite.

182:2:10 19675 Davi havia arranjado para montar a guarda, naquela noite, na trilha superior que levava à estrada Betânia-Jerusalém, enquanto João Marcos devia vigiar a estrada que seguia pelo Cédrão ao Getsêmane. Antes de Davi ir para cumprir a sua tarefa auto-imposta de sentinela avançada, ele despediu-se de Jesus, dizendo: “Mestre, eu tive um grande júbilo no meu serviço contigo. Os meus irmãos são teus apóstolos, mas eu tive prazer em cuidar das coisas menores que deveriam ser feitas, e sentirei a tua falta de todo o meu coração quando tu te fores”. E então disse Jesus a Davi: “Davi, meu filho, outros fizeram aquilo que lhes foi mandado que fizessem, mas esse serviço tu fizeste do teu próprio coração e eu não estive desatento à tua devoção. Tu, também, servirás comigo no Reino eterno”.

182:2:11 19676 E então, enquanto se preparava para ir vigiar na trilha de cima, Davi disse a Jesus: “Sabes, Mestre, eu mandei buscar a tua família, e recebi de um mensageiro a informação de que eles encontram-se em Jericó esta noite. Eles estarão aqui amanhã antes do meio-dia, já que seria arriscado para eles virem à noite pela estrada perigosa”. E Jesus, abaixando o olhar até Davi, apenas disse: “Que assim seja, Davi”.

182:2:12 19677 Enquanto Davi subia pelo monte das Oliveiras, João Marcos foi para o seu posto de vigia perto da estrada que ia pelo rio até Jerusalém. E João teria permanecido nesse posto, não fosse o seu grande desejo de manter-se perto de Jesus e de saber o que acontecia. Pouco depois de Davi tê-lo deixado, e ao observar Jesus retirar-se com Pedro, Tiago e João, até uma ravina próxima, João Marcos esteve tão dominado por uma combinação de devoção e curiosidade que abandonou o seu posto de sentinela e seguiu-os, escondendo-se nos arbustos, e desse lugar ele viu e ouviu tudo o que se passou durante esses últimos momentos no jardim e pouco antes de chegarem Judas e os guardas armados para prender Jesus.

182:2:13 19681 No momento em que tudo isso acontecia no acampamento do Mestre, Judas Iscariotes estava conversando com o capitão dos guardas do templo, que tinha reunido os seus homens em preparação para partir, sob a liderança do traidor, a fim de prender Jesus.

3. A SÓS NO GETSÊMANE


182:3:1 19682 Depois, quando tudo estava calmo e silencioso no acampamento, Jesus, levando Pedro, Tiago e João, andou um pouco até uma ravina próxima onde, antes, freqüentemente ele ia para orar e comungar. Os três apóstolos não puderam deixar de reconhecer que estavam dolorosamente oprimidos; nunca antes eles tinham visto o seu Mestre tão abatido e triste. Quando chegaram ao local das suas devoções, ele pediu aos três que se assentassem e que vigiassem com ele, enquanto retirava-se ali por perto para uma prece. E, jogando-se com o rosto contra o chão, ele orou: “Meu Pai, eu vim a este mundo para fazer a Tua vontade, e assim eu o fiz. Sei que a hora chegou de abandonar esta vida na carne, e eu não estou recuando perante isso; mas eu gostaria de saber se é da Tua vontade que eu beba deste cálice. Envia a mim a certeza de que eu Te contentarei na minha morte, como eu assim fiz na minha vida”.

182:3:2 19683 O Mestre permaneceu em atitude de prece durante alguns momentos, e então, voltando para junto dos três apóstolos, ele os encontrou em profundo sono, pois, de olhos tão pesados, eles não conseguiram manter-se despertos. Ao acordá-los, Jesus disse: “O quê! Não podeis vigiar comigo nem mesmo por uma hora? Não conseguistes ver que a minha alma está excessivamente triste, até à morte, e que eu preciso da vossa companhia?” Depois que os três despertaram-se do seu sono, o Mestre novamente separou-se deles e, jogando-se ao chão, fez uma outra prece: “Pai, sei que é possível evitar este cálice – todas as coisas são possíveis para Ti –, mas eu vim para cumprir a Tua vontade e, embora este seja um cálice amargo, eu gostaria de beber dele se essa for a Tua vontade”. E, assim, quando terminou a sua prece, um anjo poderoso desceu até o seu lado e, falando a ele, tocou nele transmitindo-lhe força.

182:3:3 19684 Quando Jesus voltou para falar com os três apóstolos, novamente ele os encontrou em profundo sono. Despertando-os, Jesus disse: “Numa hora como esta eu preciso de que vós vigieis e oreis comigo – e vós necessitais muito das preces para não cairdes em tentação – e por que adormeceis quando eu vos deixo?”

182:3:4 19685 E então, por uma terceira vez, o Mestre retirou-se e orou: “Pai, podes ver os meus apóstolos adormecidos; tem misericórdia deles. O espírito está realmente disposto, mas a carne é fraca. E agora, ó Pai, se este cálice não pode ser afastado, então eu gostaria de beber dele. Não a minha vontade, mas a Tua seja feita”. E, quando terminou a sua prece, ele ficou prostrado por um momento no chão. Quando se levantou, foi de volta até os seus apóstolos e, uma vez mais, encontrou-os adormecidos. Ele observou-os e, com um gesto de piedade, disse ternamente: “Agora, podeis dormir e descansar; a hora da decisão já passou. O momento agora é chegado, em que o Filho do Homem será traído e colocado nas mãos dos seus inimigos”. E, quando ele abaixou-se para sacudi-los a fim de acordá-los, disse: “Levantai, vamos de volta ao acampamento, pois eis que aquele que me trai está por perto, e a hora é chegada em que o meu rebanho vai ser dispersado. Mas eu já vos preveni sobre essas coisas”.

182:3:5 19686 Durante os anos em que Jesus viveu entre os seus seguidores, eles tiveram, verdadeiramente, muitas evidências da sua natureza divina, mas agora, exatamente, eles estão na iminência de testemunhar evidências novas da sua humanidade. Pouco antes da maior de todas as revelações da sua divindade, a sua ressurreição, devem vir as grandes provas da sua natureza mortal: a sua humilhação e crucificação.

182:3:6 19691 A cada vez que ele fazia uma prece no jardim, a sua humanidade agarrava-se à sua divindade com a mão sempre mais forte da fé; a sua vontade humana tornava-se mais completamente una com a vontade divina do seu Pai. Entre outras palavras ditas a ele, pelo poderoso anjo, estava a mensagem de que o Pai desejava que o seu Filho terminasse a sua auto-outorga terrena, passando pela experiência que a criatura tem da morte, exatamente como todas as criaturas mortais devem experimentar a dissolução material passando da existência no tempo para a progressão da eternidade.

182:3:7 19692 Mais cedo, naquela noite, não teria parecido tão difícil beber do cálice, mas à medida que o Jesus humano despedia-se dos seus apóstolos e enviava-os para o seu descanso, a provação ficava mais terrível. Jesus experimentou o fluxo e o refluxo naturais dos sentimentos comuns a todos os humanos experimentar, e exatamente agora que ele estava cansado do trabalho, exausto das longas horas de labor extenuante e de ansiedade dolorosa a respeito da segurança dos seus apóstolos. Se bem que nenhum mortal possa presumir compreender os pensamentos e os sentimentos do Filho de Deus encarnado, em um momento assim, sabemos que ele provou uma grande angústia e sofreu tristezas inenarráveis, pois a transpiração rolava do seu rosto em grandes gotas. Afinal, ele estava convencido de que o Pai tinha a intenção de permitir que os acontecimentos tivessem um decorrer natural; ele estava plenamente determinado a não empregar nenhum dos seus poderes de soberano, como supremo dirigente de um universo, para salvar a si próprio.

182:3:8 19693 As hostes reunidas, de uma imensa criação, pairavam sobre essa cena sob o comando transitório conjunto de Gabriel e do Ajustador Personalizado de Jesus. Os comandantes de divisão desses exércitos celestes tinham sido prevenidos reiteradamente para não interferir nessas transações na Terra a menos que o próprio Jesus lhes ordenasse intervir.

182:3:9 19694 A experiência da sua separação dos apóstolos exerceu uma grande tensão sobre o coração humano de Jesus; essa tristeza de amor abateu-o e tornou mais difícil enfrentar a morte, que o esperava, ele sabia. Compreendeu quão fracos e ignorantes eram os seus apóstolos, e temeu abandoná-los. Ele bem sabia que o momento da sua partida tinha chegado, mas o seu coração humano aspirava a saber se não poderia haver por acaso alguma forma legítima de escapar dessa terrível situação de sofrimento e de tristeza. Quando o seu coração assim havia buscado escapar, sem conseguir, ele ficou disposto a beber do cálice. A mente divina de Michael sabia que ele tinha dado o melhor de si pelos doze apóstolos; mas o coração humano de Jesus desejava que fosse feito mais por eles antes que fossem abandonados no mundo. O coração de Jesus estava sendo destroçado; ele verdadeiramente amava os seus irmãos. Ele encontrava-se isolado da sua família na carne; um dos seus companheiros estava traindo-o. O povo do seu pai José tinha rejeitado-o e, com isso, selava o seu próprio destino, de povo com uma missão especial na Terra. A sua alma estava torturada pelo amor baldado e pela misericórdia rejeitada. Era exatamente um desses momentos humanos terríveis em que tudo parecia desabar em uma crueldade esmagadora e em uma agonia aterradora.

182:3:10 19695 A humanidade de Jesus não era insensível a essa situação de solidão pessoal, de vergonha pública e de aparência de fracasso para a sua causa. Todos esses sentimentos pesavam sobre ele como uma carga de peso indescritível. Nessa grande tristeza a sua mente voltou aos dias da sua infância em Nazaré e para o seu trabalho inicial na Galiléia. Nesse momento de grande provação, muitas daquelas cenas agradáveis do seu ministério terreno vieram à sua mente. E foi com essas velhas memórias de Nazaré, de Cafarnaum, do monte Hermom e do alvorecer e do pôr-do-sol no resplandecente mar da Galiléia, que ele conseguiu acalmar-se, fazendo o seu coração humano ficar mais fortalecido e pronto para ir ao encontro do traidor que dentro em pouco iria atraiçoá-lo.

182:3:11 19701 Antes da chegada de Judas e dos soldados, o Mestre tinha recuperado o seu equilíbrio costumeiro; o espírito havia triunfado sobre a carne; a fé afirmado-se acima de todas as tendências humanas de temer ou de nutrir dúvidas. A provação suprema da compreensão plena da natureza humana havia sido enfrentada e superada de modo aceitável. Uma vez mais o Filho do Homem estava preparado para enfrentar os seus inimigos com equanimidade e na segurança plena da sua invencibilidade, como homem mortal dedicado sem reservas a fazer a vontade do Pai.

DOCUMENTO 183

A TRAIÇÃO A JESUS E A SUA PRISÃO
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Depois de Jesus ter acordado Pedro, Tiago e João, definitivamente, ele sugeriu que eles fossem para as suas tendas e que tentassem dormir a fim de preparar-se para os deveres do dia seguinte. Contudo, desta vez os três apóstolos estavam bem acordados; eles ficaram renovados com aqueles cochilos curtos e, além disso, viam-se estimulados e despertados pela entrada em cena de dois mensageiros agitados a perguntarem por Davi Zebedeu e saírem rapidamente à procura dele quando Pedro informou-lhes que ele estava de guarda.

183:0:2 19712 Embora oito dos apóstolos estivessem profundamente adormecidos, os gregos que se encontravam acampados perto deles estavam bastante temerosos de que ocorressem encrencas, tanto que haviam colocado uma sentinela para dar-lhes alarme em caso de perigo. Quando os dois mensageiros chegaram apressados ao acampamento, a sentinela grega começou a acordar todos os seus amigos compatriotas, que correram para fora das suas tendas, já totalmente vestidos e armados. Todo o acampamento estava agora de pé, exceto os oito apóstolos. Pedro desejava chamar os seus companheiros, mas Jesus proibiu-o definitivamente. O Mestre exortou-os com brandura a voltarem para as suas tendas, mas mantinham-se relutantes em aquiescer à sua sugestão.

183:0:3 19713 Não tendo conseguido dispersar os seus seguidores, o Mestre deixou-os e caminhou descendo até a prensa de azeite perto da entrada do parque do Getsêmane. Embora os três apóstolos, os gregos e os outros membros do acampamento hesitassem em segui-lo imediatamente, João Marcos apressou-se a contornar as oliveiras e ocultou-se em um pequeno abrigo perto da prensa. Jesus havia afastado-se do acampamento e dos seus amigos para que aqueles que o viessem buscar, ao chegarem, pudessem prendê-lo sem perturbar os seus apóstolos. O Mestre temia que, despertando, os seus apóstolos estivessem presentes no momento da sua prisão e que, assim, o espetáculo da traição de Judas pudesse provocar a animosidade deles levando-os a oferecer resistência diante dos soldados e que fossem levados em custódia junto com ele. Ele temia que, se fossem presos junto com ele, pudessem também perecer.

183:0:4 19714 Embora Jesus soubesse que o plano para a sua morte tenha tido a sua origem nos conselhos dos governantes dos judeus, ele era também sabedor de que todos esses esquemas nefandos tinham a aprovação plena de Lúcifer, Satã e Caligástia. E ele bem sabia que esses rebeldes dos reinos também se comprazeriam em ver os apóstolos destruídos junto com ele.

183:0:5 19715 Jesus sentou-se, solitário, na prensa de olivas, onde ele esperou a vinda do traidor e, nesse momento, apenas João Marcos e uma hoste inumerável de observadores celestes podiam vê-lo.

1. A VONTADE DO PAI


183:1:1 19716 Existe um grande perigo de se interpretar mal os significados de numerosas coisas que foram ditas e os acontecimentos relacionados com o término da carreira do Mestre na carne. O tratamento cruel dado a Jesus, pelos servos ignorantes e pelos soldados insensíveis, a conduta injusta do seu julgamento, e a atitude insensível dos professos líderes religiosos não devem ser confundidos com o fato de que Jesus, submetendo-se pacientemente a todo esse sofrimento e humilhação, estivesse verdadeiramente cumprindo o desejo do Pai, no Paraíso. De fato e de verdade, era a vontade do Pai que o seu Filho bebesse o cálice inteiro da experiência mortal, do nascimento à morte, mas o Pai no céu não teve absolutamente nenhuma contribuição em provocar o comportamento bárbaro daqueles seres humanos, supostamente civilizados, que tão brutalmente torturaram o Mestre e que tão horrivelmente acumularam indignidades sucessivas sobre a sua pessoa que não opunha a menor resistência. Aquelas experiências desumanas e chocantes, que Jesus foi levado a suportar nas horas finais da sua vida mortal não eram, de modo algum, parte da vontade divina do Pai; vontade esta que a natureza humana de Jesus comprometera-se, de um modo tão triunfante, a cumprir na época da rendição final do homem a Deus, como indicado na prece tripla que ele formulou no jardim enquanto os seus apóstolos cansados entregavam-se ao sono da exaustão física.

183:1:2 19721 O Pai no céu desejava que o Filho auto-outorgado terminasse a sua carreira na Terra naturalmente, à maneira exata como todos os mortais devem terminar as suas vidas na Terra e na carne. Os homens e mulheres comuns não podem esperar ter as suas últimas horas na Terra, bem como o acontecimento subseqüente da morte, facilitado por uma dispensação especial. Desse modo, Jesus escolheu abandonar a sua vida na carne da maneira que estivesse de acordo com o decorrer natural dos acontecimentos, e recusou terminantemente a livrar-se das garras cruéis de uma perversa conspiração de acontecimentos desumanos que o arrastaram, com uma certeza horrível, até uma humilhação inacreditável e uma morte ignominiosa. E cada detalhe de toda essa assombrosa manifestação de ódio e dessa demonstração sem precedentes de crueldade foi o trabalho de homens maliciosos e de mortais perversos. A vontade de Deus no céu não era essa, nem os arquiinimigos de Jesus ditaram os acontecimentos, embora eles muito tivessem feito para assegurar que os mortais impensados e perversos rejeitassem assim o Filho na sua doação de auto-outorga. Até mesmo o pai do pecado desviou o rosto do horror excruciante da cena da crucificação.

2. JUDAS NA CIDADE


183:2:1 19722 Depois de abandonar tão abruptamente a mesa enquanto partilhava da Última Ceia, Judas dirigiu-se imediatamente à casa do seu primo e, então, os dois foram diretamente até o capitão da guarda do templo. Judas pediu ao capitão que reunisse os guardas e informou-lhe que estava pronto para levá-los a Jesus. Como Judas tinha surgido em cena um pouco antes do esperado, houve alguma demora em partir para a casa de Marcos, onde Judas esperava encontrar Jesus ainda em reunião com os apóstolos. O Mestre e os onze deixaram a casa de Elias Marcos ao menos quinze minutos antes da chegada do traidor e dos guardas. No momento em que os captores chegaram à casa de Marcos, Jesus e os onze já estavam fora dos muros da cidade e a caminho do acampamento do monte das Oliveiras.

183:2:2 19723 Judas ficou muito perturbado com o seu malogro, de não encontrar Jesus na residência de Marcos e em companhia dos onze homens, dos quais apenas dois estavam armados para resistir. Ele soube por casualidade que, na tarde em que eles haviam deixado o acampamento, apenas Simão Pedro e Simão zelote estavam guarnecidos com as suas espadas; Judas esperava prender Jesus quando a cidade estivesse tranqüila, e quando então houvesse poucas possibilidades de resistência. O traidor temia que, caso esperasse que eles voltassem ao acampamento, mais de sessenta discípulos devotados teriam de ser enfrentados, e ele sabia também que Simão zelote estava de posse de um estoque amplo de armas. Judas ficava cada vez mais nervoso ao imaginar como os onze apóstolos leais iriam detestá-lo, e temia que todos eles buscassem destruí-lo. Ele não era apenas desleal, mas possuía realmente um coração covarde.

183:2:3 19731 Quando não logrou encontrar Jesus na sala superior, Judas pediu ao capitão da guarda para que retornassem ao templo. Enquanto isso os dirigentes tinham começado a reunir-se na casa do sumo sacerdote, em preparativos para receber Jesus, posto que a sua barganha com o traidor demandava a prisão de Jesus por volta da meia-noite daquele dia. Judas explicou aos seus cúmplices que não tinham encontrado Jesus na casa de Marcos que seria necessário que fossem ao Getsêmane para prendê-lo. O traidor então afirmou que mais de sessenta seguidores devotados encontravam-se acampados com ele, e que eles estavam todos bem armados. Os dirigentes dos judeus lembraram a Judas que Jesus havia sempre pregado a não-resistência, mas Judas respondeu que eles não poderiam contar com todos os seguidores de Jesus obedecendo a esse ensinamento. Ele realmente temia por si próprio e por isso ousou pedir uma companhia de quarenta soldados armados. Posto que as autoridades judaicas não tinham tal força de homens armados sob a sua jurisdição, eles foram imediatamente à fortaleza de Antônia e solicitaram ao comandante romano que lhes fornecesse essa guarda; mas, quando este soube que o objetivo era prender Jesus, ele recusou-se prontamente a aceder a tal pedido e remeteu-os ao seu oficial superior. Desse modo mais de uma hora foi gasta em ir de uma autoridade até a outra, até que, finalmente, foram obrigados a ir ao próprio Pilatos a fim de obter a permissão para utilizar os guardas romanos armados. Era tarde quando chegaram à casa de Pilatos, e ele tinha já se retirado para os seus aposentos particulares com a sua esposa. Ele hesitava em ter qualquer coisa a ver com essa empreitada, e mais ainda por sua esposa ter pedido a ele que não atendesse a esse pedido. Todavia, como o presidente do sinédrio judeu encontrava-se presente e com um pedido pessoal para ter essa ajuda, o governador julgou ser sábio conceder o que estava sendo pedido, pensando que fosse possível mais tarde emendar qualquer injustiça que eles pudessem estar dispostos a cometer.

183:2:4 19732 E assim, quando Judas Iscariotes saiu do templo, por volta de onze e meia da noite, ele estava acompanhado por mais de sessenta pessoas – guardas do templo, soldados romanos e servos curiosos dos sacerdotes e dos dirigentes principais.

3. A PRISÃO DO MESTRE


183:3:1 19733 Quando essa companhia de soldados e de guardas armados, levando tochas e lanternas, aproximou-se do jardim, Judas adiantou-se e colocou-se à frente de todos a fim de imediatamente identificar Jesus, de modo que os captores pudessem com facilidade colocar as mãos nele antes que os seus companheiros conseguissem acorrer em sua defesa. E havia ainda uma outra razão para que Judas escolhesse estar à frente dos inimigos do Mestre: pensou que poderia parecer que ele tivesse chegado ao local antes dos soldados, de modo que os apóstolos e os outros que se reuniam em torno de Jesus não fossem ligá-lo diretamente à presença dos guardas armados que seguiam tão de perto os seus passos. Judas tinha pensado mesmo em posar como tendo apressado-se para avisá-los da aproximação dos captores, mas esse plano foi frustrado pela saudação sombria de Jesus ao traidor. Embora o Mestre tenha falado a Judas com amabilidade, ele saudou-o como a um traidor.

183:3:2 19734 Tão logo Pedro, Tiago e João e, ainda, uns trinta dos seus companheiros de acampamento viram a companhia armada e com tochas contornar o topo das colinas, eles logo souberam que esses soldados vinham para prender Jesus, e todos eles correram para baixo até perto da prensa de olivas onde o Mestre estava sentado em solidão, sob a luz da lua. À medida que a companhia aproximava-se de um lado, os três apóstolos e os seus companheiros vinham do outro lado. E enquanto Judas adiantava-se a passos largos para abordar o Mestre, os dois grupos lá ficaram imóveis, com o Mestre entre eles e Judas preparando-se para estampar o beijo traidor na fronte de Jesus.

183:3:3 19741 A esperança do traidor era de que pudesse, após conduzir os guardas ao Getsêmane, simplesmente apontar Jesus para os soldados, ou no máximo cumprir a promessa de saudá-lo com um beijo, e então rapidamente retirar-se da cena. Judas temia bastante que os apóstolos estivessem todos presentes e que concentrassem o seu ataque sobre ele, em castigo pelo seu atrevimento de trair ao seu amado instrutor. Mas quando o Mestre saudou-o como um traidor, ele ficou tão confuso que não fez nenhuma tentativa de fugir.

183:3:4 19742 Jesus empreendeu um último esforço para poupar Judas de traí-lo de fato, pois antes que o traidor pudesse alcançá-lo, ele andou para o lado e, dirigindo-se ao soldado mais próximo à esquerda, o capitão dos romanos, disse: “A quem buscais?” O capitão respondeu: “Jesus de Nazaré”. Então Jesus adiantou-se imediatamente à frente do oficial e permaneceu ali, na calma majestática de um Deus de toda a sua criação, e disse: “Sou eu”. Muitos dessa companhia armada haviam ouvido Jesus ensinar no templo; outros haviam ouvido falar sobre as suas obras poderosas e, quando o escutaram assim corajosamente anunciar a sua identidade, aqueles que estavam nas fileiras da frente recuaram subitamente. Eles haviam sido tomados de surpresa com o anúncio calmo e majestático da identidade dele. E não havia, portanto, nenhuma necessidade de que Judas continuasse com o seu plano de traição. Com ousadia o Mestre havia revelado-se aos seus inimigos, que poderiam tê-lo prendido sem a ajuda de Judas. Mas o traidor precisava fazer algo para justificar a sua presença junto a esses homens armados e, além disso, queria demonstrar que fazia sua parte na barganha da traição com os dirigentes dos judeus para que se fizesse merecedor da grande recompensa e das honras que, acreditava, se acumulariam sobre ele como recompensa pela sua promessa de entregar Jesus nas mãos deles.

183:3:5 19743 Enquanto os guardas recuperavam-se da sua primeira vacilação ao verem Jesus, com o som da voz inusitada dele e enquanto os apóstolos e discípulos aproximavam-se, Judas foi até Jesus e, aplicando um beijo na sua fronte, disse: “Salve, Mestre e Instrutor”. E quando Judas abraçou assim o seu Mestre, Jesus disse: “Amigo, não te bastava fazer isso! Tinhas mesmo que trair o Filho do Homem com um beijo?”

183:3:6 19744 Os apóstolos e discípulos estavam literalmente atônitos com o que viram. Por um momento ninguém se moveu. Então Jesus, desembaraçando-se do abraço traidor de Judas, caminhou até os guardas e soldados e de novo perguntou: “A quem procurais?” E de novo o capitão disse: “Jesus de Nazaré”. E de novo Jesus respondeu: “Eu te disse que sou eu. Se, pois, buscas a mim, deixa os outros irem em paz. Estou pronto para ir contigo”.

183:3:7 19745 Jesus estava pronto para ir de volta a Jerusalém com os guardas, e o capitão dos soldados também estava disposto a permitir que os três apóstolos e os seus companheiros tomassem seu caminho em paz. Mas antes que fossem capazes de sair do lugar, como Jesus permaneceu lá esperando as ordens do capitão, um tal de Malco, o guarda-costa sírio do sumo sacerdote andou até Jesus e se preparou para atar as suas mãos nas costas, embora o capitão romano não tivesse ordenado que Jesus devesse ser amarrado assim. Quando Pedro e os seus amigos viram o seu Mestre sendo submetido a essa indignidade, eles não mais foram capazes de controlar-se. Pedro sacou da sua espada e, com os outros, avançou para golpear Malco. Mas, antes que os soldados pudessem vir em defesa do serviçal do sumo sacerdote, Jesus levantou uma mão de proibição para Pedro e, usando de firmeza, disse: “Pedro, guarda a tua espada. Aqueles que usam a espada perecerão pela espada. Não compreendes que é da vontade do Pai que eu beba deste cálice? E não sabes também que eu poderia agora mesmo comandar mais de doze legiões de anjos e seus colaboradores, que me libertariam das mãos desses poucos homens?”

183:3:8 19751 Jesus assim efetivamente punha um fim nessa demonstração de resistência física da parte dos seus seguidores, o que foi suficiente para despertar o medo no capitão dos guardas, que agora, com a ajuda dos seus soldados, colocava pesadas mãos sobre Jesus e o atava rapidamente. E, enquanto eles amarravam as suas mãos com cordas grossas, Jesus disse-lhes: “Por que viestes contra mim com espadas e com bastões como se fossem capturar um ladrão? Eu estive diariamente convosco no templo, ensinando publicamente ao povo, e vós não fizestes nenhum esforço para levar-me”.

183:3:9 19752 Quando Jesus estava sendo atado, o capitão, temendo que os seguidores do Mestre pudessem tentar resgatá-lo, deu ordens para capturá-los; mas os soldados não foram suficientemente rápidos; e tendo ouvido as ordens do capitão para prendê-los, os seguidores de Jesus fugiram às pressas de volta para a ravina. Durante todo esse tempo João Marcos esteve escondido em um abrigo próximo. Quando os guardas partiram de volta para Jerusalém com Jesus, João Marcos tentou sair do abrigo para alcançar os apóstolos e os discípulos em fuga; mas, quando ele saiu, um dos últimos soldados que esteve perseguindo os discípulos em fuga passou por perto e, vendo esse jovem com o seu manto de linho, tentou pegá-lo e quase conseguiu isso. De fato, o soldado chegou perto o suficiente de João para agarrá-lo pelo manto, mas o jovem moço livrou-se do manto, escapando nu, enquanto o soldado segurava o manto vazio. João Marcos correu até Davi Zebedeu na trilha de cima. Quando o garoto contou a Davi o que havia acontecido, ambos apressaram-se de volta até as tendas dos apóstolos adormecidos e informaram aos oito sobre a traição ao Mestre e a sua prisão.

183:3:10 19753 Quase no mesmo momento em que os oito apóstolos estavam sendo despertados, aqueles que tinham fugido pela ravina vinham retornando, e eles todos se reuniram perto da prensa de olivas para debater sobre o que deveriam fazer. Nesse meio tempo, Simão Pedro e João Zebedeu, escondidos entre as oliveiras, já tinham ido atrás da multidão de soldados, guardas e servos, que agora levavam Jesus de volta a Jerusalém como se conduzissem um criminoso disposto a tudo. João acompanhou a multidão bem de perto, mas Pedro a seguiu de longe. Após escapar da garra do soldado, João Marcos cobriu-se com um manto que encontrou na tenda de Simão Pedro e João Zebedeu. Ele suspeitava que os guardas estivessem levando Jesus para a casa de Anás, o sumo sacerdote benemérito; e assim contornou por entre o pomar de oliveiras e chegou lá antes da multidão, escondendo-se perto do portão de entrada do palácio do sumo sacerdote.

4. A DISCUSSÃO NA PRENSA DE OLIVAS


183:4:1 19754 Tiago Zebedeu viu-se separado de Simão Pedro e do seu irmão João e, assim, agora ele unia-se aos outros apóstolos e aos seus companheiros de acampamento na prensa de olivas para deliberar sobre o que eles deveriam fazer em vista da prisão do Mestre.

183:4:2 19755 André tinha sido liberado de toda a responsabilidade na direção do grupo dos seus companheiros apóstolos; e assim, nesta que era a maior de todas as crises nas suas vidas, ele ficara em silêncio. Depois de uma discussão informal curta, Simão zelote subiu na mureta de pedra da prensa de olivas e, fazendo um apelo apaixonado de lealdade ao Mestre e à causa do Reino, exortou os seus companheiros apóstolos e os outros discípulos a se apressarem em seguir a multidão e efetuar o resgate de Jesus. A maioria do grupo estaria disposta a seguir a sua liderança atuante não fosse o conselho de Natanael, que se levantou no momento em que Simão tinha acabado de falar e chamou a atenção de todos para os ensinamentos tantas vezes repetidos de Jesus a respeito da não-resistência. Ele ainda lembrou-lhes de que Jesus, naquela mesma noite, tinha instruído a todos no sentido de que preservassem as suas vidas para a época em que deveriam sair para o mundo, proclamando as boas-novas do evangelho do Reino celeste. E Natanael foi encorajado nessa posição por Tiago Zebedeu, que agora contava a todos como Pedro e outros sacaram das suas espadas para defender o Mestre contra a prisão, e como Jesus pediu a Simão Pedro e aos seus companheiros com espadas que embainhassem as suas lâminas. Mateus e Filipe também fizeram discursos, mas nada de definitivo saiu dessa discussão, até que Tomé, chamando a atenção deles para o fato de que Jesus tinha aconselhado a Lázaro que não se expusesse à morte, destacou que nada podiam fazer para salvar o seu Mestre, porquanto ele se recusara a permitir os seus amigos de defendê-lo e persistia em abster-se de usar os seus poderes divinos para frustrar os seus inimigos humanos. Tomé persuadiu-os a espalharem-se, cada homem por si e separadamente, com o acordo de que Davi Zebedeu permanecesse no acampamento para manter um centro de coordenação e uma sede central de mensageiros para o grupo. Por volta de duas e meia naquela manhã, o campo estava deserto; apenas Davi permanecia à mão com três ou quatro mensageiros, os outros haviam sido despachados para assegurar a informação sobre o local para onde Jesus fora levado, e quanto ao que pretendiam fazer com ele.

183:4:3 19761 Cinco dos apóstolos, Natanael, Mateus, Filipe e os gêmeos, foram esconder-se em Betfage e na Betânia. Tomé, André, Tiago e Simão zelote estavam escondidos na cidade. Simão Pedro e João Zebedeu seguiram juntos para a casa de Anás.

183:4:4 19762 Pouco depois do amanhecer, Simão Pedro perambulou de volta ao acampamento do Getsêmane, era o retrato desanimado de um profundo desespero. Davi enviou-o, acompanhado por um mensageiro, para juntar-se ao seu irmão, André, que estava na casa de Nicodemos, em Jerusalém.

183:4:5 19763 Até o final da crucificação, João Zebedeu, como Jesus havia instruído que fizesse, permaneceu sempre por perto e à mão, e foi ele que supriu os mensageiros de Davi com as informações de hora em hora, que eles levavam a Davi no acampamento do jardim, e que então eram repassadas aos apóstolos escondidos e à família de Jesus.

183:4:6 19764 Por certo, o pastor foi golpeado e as ovelhas foram dispersadas! Conquanto todos vagamente constatassem que Jesus os tinha advertido de antemão exatamente sobre essa situação, estavam todos chocados em demasia com o desaparecimento súbito do Mestre, para serem capazes de usar as suas mentes de um modo normal.

183:4:7 19765 Era pouco depois do nascer do dia, e, justamente depois que Pedro tinha sido enviado para juntar-se ao seu irmão, quando Judá, o irmão de Jesus na carne, chegou ao campo, quase sem fôlego e, bem antes do resto da família de Jesus, para ficar sabendo apenas que o Mestre tinha sido já colocado na prisão; e ele apressou-se de volta, estrada de Jericó abaixo, para levar essa informação à sua mãe e aos seus irmãos e irmãs. Davi Zebedeu enviou um recado à família de Jesus, por meio de Judá, para que se reunissem na casa de Marta e Maria na Betânia e para que lá esperassem pelas notícias que os seus mensageiros levariam regularmente a eles.

183:4:8 19766 Essa era a situação durante a segunda metade da noite de quinta-feira e das primeiras horas da manhã da sexta-feira, no que concerne aos apóstolos, aos principais discípulos e à família terrena de Jesus. E o serviço de mensageiros de Davi Zebedeu, continuou operando; da sua sede no acampamento do Getsêmane, ele mantinha todos esses grupos e indivíduos em contato uns com os outros.

5. A CAMINHO DO PALÁCIO DO SUMO SACERDOTE


183:5:1 19771 Antes de partirem do jardim com Jesus, surgiu, entre o capitão judeu dos guardas do templo e o capitão romano da companhia de soldados, uma discussão sobre o local para onde deviam levar Jesus. O capitão dos guardas do templo deu ordens para que os soldados o levassem a Caifás, o sumo sacerdote em exercício. O capitão dos soldados romanos ordenou que Jesus fosse levado ao palácio de Anás, o antigo sumo sacerdote e sogro de Caifás. E assim foi feito porque os romanos estavam acostumados a lidar diretamente com Anás, para resolver todas as questões que tinham a ver com a aplicação à força das leis eclesiásticas judaicas. E as ordens do capitão romano foram obedecidas; eles levaram Jesus à casa de Anás para que ele examinasse preliminarmente o caso.

183:5:2 19772 Judas marchou perto dos capitães, escutando tudo o que estava sendo dito, mas não tomou parte na discussão, pois nem o capitão judeu nem tampouco o oficial romano queriam falar com o traidor – de tal modo o desprezavam.

183:5:3 19773 Por volta desse momento João Zebedeu, lembrando-se das instruções do seu Mestre para permanecer sempre por perto e à mão, correu até perto de Jesus enquanto ele caminhava entre os dois capitães. O comandante dos guardas do templo, ao ver João vindo junto com eles, disse ao seu assistente: “Prende esse homem e amarra-o. Ele é um dos seguidores deste homem”. Mas quando o capitão romano ouviu isso e, olhando em volta, viu João, ele deu ordens para que o apóstolo viesse até ele, e que não fosse molestado por ninguém. Então o capitão romano disse ao capitão judeu: “Este homem não é nem um traidor, nem um covarde. Vi-o no jardim, e ele não sacou de uma espada para resistir a nós. Ele teve a coragem de vir aqui para estar com o seu Mestre, e nenhum homem colocará as mãos nele. A lei romana permite que qualquer prisioneiro possa ter ao menos um amigo para acompanhá-lo à barra do tribunal, e este homem não será impedido de permanecer ao lado do seu Mestre, o prisioneiro”. E quando Judas ouviu isso, ficou tão envergonhado e humilhado que retardou o passo e se pôs atrás do grupo, chegando ao palácio de Anás sozinho.

183:5:4 19774 E isso explica por que se permitiu que João Zebedeu permanecesse perto de Jesus durante todo o seu caminho de experiências penosas, nessa noite e no dia seguinte. Os judeus ficaram com medo de falar qualquer coisa a João ou de molestá-lo, de qualquer maneira, porque ele conseguiu algo como o status de um conselheiro romano indicado para atuar como observador das transações da corte eclesiástica dos judeus. A posição privilegiada de João tornou-se ainda mais segura quando, ao entregar Jesus ao capitão dos guardas do templo na porta do palácio de Anás, o romano, dirigindo-se ao seu assistente, disse: “Vai junto com este prisioneiro e cuida para que esses judeus não o matem sem o consentimento de Pilatos. Vigia para que eles não o assassinem, e cuida para que ao seu amigo, o galileu, seja permitido ficar junto e observar tudo o que acontece”. E assim João capacitou-se para estar perto de Jesus até o momento da sua morte na cruz, enquanto os outros dez apóstolos foram obrigados a permanecer escondidos. João estava agindo sob a proteção romana, e os judeus não ousaram molestá-lo até depois da morte do Mestre.

183:5:5 19775 Em todo o trajeto até o palácio de Anás, Jesus não abriu a boca. Desde o momento da sua prisão até o de apresentar-se diante de Anás, o Filho do Homem não disse uma palavra sequer.

DOCUMENTO 184

PERANTE O TRIBUNAL DO SINÉDRIO
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Os representantes de Anás haviam instruído secretamente ao capitão dos soldados romanos que trouxesse Jesus ao palácio de Anás, imediatamente depois de ter ele sido preso. O antigo sumo sacerdote desejava manter o seu prestígio como autoridade eclesiástica principal dos judeus. Ele também possuía um outro propósito em deter Jesus na sua casa por várias horas, e que era o de dar tempo para convocar legalmente uma reunião da corte do sinédrio. Não era legal convocar um tribunal do sinédrio antes da hora da oferenda do sacrifício matinal no templo, e esse sacrifício era oferecido por volta das três horas da manhã.

184:0:2 19782 Anás sabia que uma corte de sinedristas estava aguardando no palácio do seu genro, Caifás. Uns trinta membros do sinédrio encontravam-se reunidos na casa do sumo sacerdote por volta da meia-noite, de modo a estar prontos para julgar Jesus quando ele pudesse ser trazido diante deles. Estavam reunidos apenas aqueles membros que se opunham forte e abertamente a Jesus e aos seus ensinamentos, posto que eram necessários apenas vinte e três deles para que um tribunal de julgamento fosse constituído.

184:0:3 19783 Jesus passou cerca de três horas no palácio de Anás, no monte das Oliveiras, não longe do jardim do Getsêmane, onde o haviam capturado. João Zebedeu estava livre e a salvo no palácio de Anás, não apenas por causa da palavra do capitão romano, mas também porque ele e o seu irmão Tiago eram bem conhecidos dos serviçais mais antigos, tendo muitas vezes sido convidados do palácio, pois o antigo sumo sacerdote era um parente distante da mãe deles, Salomé.

1. O INTERROGATÓRIO DE ANÁS


184:1:1 19784 Enriquecido com os impostos do templo, tendo o seu genro como sumo sacerdote em exercício e mantendo lá as suas relações com as autoridades romanas, Anás era de fato o indivíduo mais poderoso da comunidade judaica. Ele era um planejador e um manipulador político bem educado. Desejava ter o controle dessa questão ligada a Jesus; pois decisões muito importantes ele temia confiá-las integralmente ao seu genro, que era brusco e precipitado. Anás queria assegurar-se de que o julgamento do Mestre fosse mantido nas mãos dos saduceus; temia a possível simpatia de alguns dos fariseus, vendo que praticamente todos os membros do sinédrio, que tinham esposado a causa de Jesus, eram fariseus.

184:1:2 19785 Anás não via Jesus há vários anos, desde a época em que o Mestre, ao apresentar-se na sua casa, saiu imediatamente dali ao deparar com a frieza e a reserva com que fora recebido. Anás chegou a pensar em prevalecer-se dessa antiga relação e então intentou persuadir Jesus a abandonar as suas pretensões e deixar a Palestina. Ele estava relutante em participar do assassinato de um bom homem e supunha que Jesus chegasse a escolher deixar o país em lugar de ter de submeter-se à morte. Mas, quando Anás se pôs diante do valente e decidido galileu, ele soube imediatamente que seria inútil fazer tais propostas. Jesus estava ainda mais majestoso e bem equilibrado do que antes, segundo Anás conseguia recordar-se dele.

184:1:3 19791 Quando Jesus era jovem, Anás tivera um grande interesse por ele, mas agora as suas rendas estavam sendo ameaçadas por aquilo que Jesus havia feito, muito recentemente, afastando os cambistas e outros comerciantes do templo. Esse ato havia despertado a inimizade do antigo sumo sacerdote muito mais do que os ensinamentos de Jesus.

184:1:4 19792 Anás adentrou-se na sua espaçosa sala de audiências, sentou-se em uma grande cadeira, e mandou que Jesus fosse trazido diante dele. Após observar silenciosamente o Mestre por uns momentos, ele disse: “Tu compreendes que algo deverá ser feito quanto aos teus ensinamentos, já que estás perturbando a paz e a ordem do nosso país”. E quando Anás olhou inquisidoramente para Jesus, o Mestre examinou fundo nos olhos dele, mas não deu nenhuma resposta. De novo Anás falou: “Quais são os nomes dos teus discípulos, além de Simão zelote, o agitador?” De novo Jesus olhou-o de cima para baixo, mas nada respondeu.

184:1:5 19793 Anás ficou consideravelmente perturbado com a recusa de Jesus a responder às suas perguntas, tanto que lhe disse: “Tu te importas com o quanto estou sendo amigável contigo, ou não? Não tens nenhum respeito pelo poder que eu detenho para definir sobre as questões do teu futuro julgamento?” Depois de ouvir isso, Jesus disse: “Anás, sabes que poderias não ter nenhum poder sobre mim se assim não fosse permitido pelo meu Pai. Alguns gostariam de destruir o Filho do Homem porque são ignorantes, de nada sabem direito, mas tu, amigo, tu sabes o que estás fazendo. Como podes, pois, rejeitar a luz de Deus?”

184:1:6 19794 A maneira amável com a qual Jesus falou a Anás quase o confundiu. Mas ele havia já determinado na sua mente que Jesus devia deixar a Palestina, ou morrer; e assim tomou coragem para perguntar: “O que exatamente estás tentando ensinar ao povo? O que tu alegas ser?” Jesus respondeu: “Tu sabes muito bem o que eu tenho falado abertamente ao mundo. Eu tenho ensinado nas sinagogas e muitas vezes no templo, onde todos os judeus e muitos dos gentios têm ouvido a mim. Nada eu disse secretamente; por que, então, me perguntas sobre os meus ensinamentos? Por que não convocas aqueles que me ouviram e não perguntas a eles? Sabes bem que toda Jerusalém ouviu aquilo que eu disse, ainda que não tenhas ouvido esses ensinamentos por ti mesmo”. Antes, entretanto, que Anás pudesse replicar, o administrador dirigente do palácio, que estava bem perto, estapeou Jesus no rosto com a própria mão, dizendo: “Como ousas responder ao sumo sacerdote com tais palavras?” Anás nada disse para repreender o seu administrador, mas Jesus dirigiu-se a ele, dizendo: “Meu amigo, se o que eu tiver dito é o mal, então dá testemunho contra o mal; mas se eu tiver dito a verdade, por que deverias golpear-me?”

184:1:7 19795 Embora Anás lamentasse que o seu administrador tivesse batido em Jesus, ele era orgulhoso demais para levar em conta essa questão. Na sua confusão ele retirou-se para uma outra sala, deixando Jesus sozinho com os criados da casa e os guardas do templo por quase uma hora.

184:1:8 19796 Quando voltou, indo até o lado do Mestre, ele disse: “Tu alegas ser o Messias, o Libertador de Israel?” Disse Jesus: “Anás, tu me conheces desde a época da minha juventude. Sabes que eu não pretendo ser nada, a não ser o que o meu Pai designou; e que eu fui enviado a todos os homens gentios, tanto quanto aos judeus”. Então Anás disse: “Foi dito para mim que tu pretendes ser o Messias; isso é verdade?” Jesus olhou para Anãs; todavia, respondeu apenas: “Assim o disseste tu”.

184:1:9 19801 Por volta desse momento, chegavam mensageiros do palácio de Caifás para perguntar a que horas Jesus seria levado diante da corte do sinédrio e, já que estava próximo o alvorecer do dia, Anás julgou ser melhor enviar Jesus amarrado e sob a custódia dos guardas do templo, até Caifás. Ele próprio seguiu um pouco atrás deles.

2. PEDRO NO PÁTIO


184:2:1 19802 Quando a companhia de guardas e de soldados aproximou-se da entrada do palácio de Anás, João Zebedeu estava caminhando ao lado do capitão dos soldados romanos. Judas havia ficado a uma certa distância para trás, e Simão Pedro estava ainda mais atrás. Depois que João entrou no jardim do palácio, com Jesus e os guardas, Judas veio ao portão, mas, vendo Jesus e João, ele dirigiu-se para a casa de Caifás, onde sabia que o verdadeiro julgamento do Mestre teria lugar mais tarde. Logo depois que Judas saiu, Simão Pedro chegou e, como ficou diante do portão, João o avistou exatamente quando iam levar Jesus ao palácio. A porteira que tomava conta da entrada conhecia João e, quando ele falou com ela, pedindo que deixasse Pedro entrar, ela prontamente consentiu.

184:2:2 19803 Pedro, ao entrar no pátio do jardim, foi até a lareira de carvão, buscando aquecer-se, pois a noite estava muito fria. Ele sentia-se deslocado ali entre os inimigos de Jesus e, de fato, não estava no seu lugar. O Mestre não instruíra a ele que ficasse perto e disponível como pedira a João. Pedro deveria estar com os outros apóstolos, que tinham sido especificamente avisados para não colocar as suas vidas em perigo durante esses momentos de julgamento e de crucificação do seu Mestre.

184:2:3 19804 Pedro jogou fora a sua espada pouco antes de chegar ao portão do palácio, de modo que entrou no jardim de Anás desarmado. A sua mente estava em um redemoinho de confusão; e ele mal podia conceber que Jesus tinha sido preso. Não captava a realidade da situação – que ele estava ali no jardim de Anás, aquecendo-se diante dos serviçais do sumo sacerdote. Ficava imaginando o que os outros apóstolos estariam fazendo e, ao revolver na sua mente como é que João havia sido admitido no palácio, concluiu que isso se devesse ao fato de João ser conhecido dos servos, já que havia pedido à porteira para deixa-lo entrar.

184:2:4 19805 Pouco depois que a porteira deixou Pedro entrar e, enquanto ele estava aquecendo-se junto à lareira, ela foi até ele e disse maliciosamente: “Não és também tu um dos discípulos deste homem?” Ora, Pedro não devia ter-se surpreendido com esse reconhecimento, pois fora João que havia requisitado da moça que o deixasse passar pelo portão do palácio; mas ele estava em um estado tal de tensão nervosa que essa identificação como um discípulo deixou-o desequilibrado e, com um só pensamento dominando a sua mente – o de escapar com vida –, prontamente ele respondeu à pergunta da porteira dizendo: “Não, eu não sou”.

184:2:5 19806 Logo um outro serviçal veio a Pedro e perguntou: “Eu não te vi no jardim, quando eles prenderam este homem? Não és um dos seus seguidores?” Pedro estava agora profundamente alarmado; ele não via nenhum modo de escapar com segurança desses acusadores; e, assim, veementemente negou qualquer ligação com Jesus, dizendo: “Eu não conheço este homem, e não sou um dos seus seguidores”.

184:2:6 19807 Nesse momento a porteira chamou Pedro a um lado e disse: “Eu estou certa de que tu és um discípulo desse Jesus, não apenas porque um dos seus seguidores pediu-me que te deixasse entrar aqui no jardim, mas a minha irmã aqui tem te visto no templo com esse homem. Por que negas isso?” Quando Pedro ouviu a criada acusá-lo, ele negou qualquer ligação com Jesus, com muito praguejar e com juramentos, dizendo novamente: “Eu não sou um seguidor deste homem; eu sequer o conheço; eu nunca ouvi falar dele antes”.

184:2:7 19811 Pedro saiu de perto da lareira por um momento, enquanto caminhava pelo jardim. Ele gostaria de ter fugido dali, mas temia atrair as atenções sobre si. Sentindo frio, ele voltou para perto da lareira, e um dos homens ali perto disse: “Certamente tu és um dos discípulos deste homem. Esse Jesus é galileu, e a tua fala te trai, pois também falas como um galileu”. E novamente Pedro negou qualquer ligação com o seu Mestre.

184:2:8 19812 Pedro estava tão perturbado que buscou escapar do contato com os seus acusadores, saindo de perto do fogo e permanecendo só próximo à entrada. Depois de uma hora nesse isolamento, a porteira e a sua irmã tiveram a oportunidade de passar por ele, e ambas de novo acusaram-no provocadoramente de ser um seguidor de Jesus. E de novo ele negou a acusação. E exatamente depois de que ele tinha negado uma vez mais qualquer ligação com Jesus, o galo cantou, e Pedro lembrou-se das palavras de aviso faladas a ele pelo seu Mestre, mais cedo naquela mesma noite. Enquanto ele estava ali, de coração pesado e esmagado pelo sentimento de culpa, as portas do palácio abriram-se para que passassem os guardas que levavam Jesus para a casa de Caifás. Quando o Mestre passou por Pedro, ele viu, sob a luz dos tocheiros, a marca de desespero no rosto do anteriormente tão seguro de si mesmo e aparentemente valente apóstolo, e ele voltou e olhou para Pedro. Pedro nunca se esqueceu daquele olhar enquanto ele viveu. Era um olhar de piedade misturada a um amor tal que nenhum homem mortal jamais contemplou na face do Mestre.

184:2:9 19813 Depois que Jesus e os guardas passaram para fora dos portões do palácio, Pedro seguiu-os, mas só até uma certa distância. Ele não podia ir mais longe. E sentou-se ao lado da estrada e chorou amargamente. E depois de ter derramado essas lágrimas de agonia, ele se pôs a caminhar para o acampamento, esperando encontrar o seu irmão André. Ao chegar no acampamento, ele encontrou apenas Davi Zebedeu, que enviou um mensageiro para conduzi-lo até onde o seu irmão estava escondido em Jerusalém.

184:2:10 19814 Toda experiência de Pedro aconteceu no jardim do palácio de Anás, no monte das Oliveiras. Ele não seguiu Jesus ao palácio do sumo sacerdote Caifás. O fato de Pedro ter sido levado à constatação, pelo canto de um galo, de que tinha negado repetidamente ao seu Mestre, indica que tudo isso ocorreu fora de Jerusalém, pois era contra a lei manter criações domésticas de aves dentro da cidade propriamente dita.

184:2:11 19815 Antes que o cantar do galo tivesse levado Pedro de novo ao seu bom senso, ele havia pensado apenas, enquanto andava para cima e para baixo da entrada à lareira a fim de se aquecer, em quão espertamente ele tinha esquivado-se das acusações dos serviçais, e como ele havia frustrado o propósito deles de identificá-lo com Jesus. Até então, ele tinha considerado apenas que esses servos não possuíam nenhum direito moral ou legal de questioná-lo assim, e ele repetidamente havia congratulado-se a si próprio pela maneira com a qual ele julgava ter evitado ser identificado e possivelmente submeter-se a ser preso. E não ocorrera a Pedro, antes do galo cantar, que ele tinha negado o seu Mestre. E só quando Jesus olhou para ele é que ele deu por si, que tinha deixado de estar à altura dos seus privilégios como um embaixador do Reino.

184:2:12 19816 Tendo dado o primeiro passo ao longo do caminho do compromisso e da menor resistência, não parecia a Pedro que houvesse outra saída a não ser continuar no curso da conduta pela qual havia optado. É necessário um caráter grande e nobre, tendo começado errado, para voltar e retomar o caminho certo. Com muita freqüência a própria mente tende a justificar a continuidade no caminho do erro, uma vez que se tenha entrado nele.

184:2:13 19821 Pedro nunca acreditou plenamente que pudesse ser perdoado, até que ele encontrou o seu Mestre, depois da ressurreição, e viu que ele estava sendo recebido exatamente como antes das experiências dessa noite trágica das negações.

3. PERANTE O TRIBUNAL DOS SINEDRISTAS


184:3:1 19822 Eram por volta de três e meia da madrugada, dessa sexta-feira, quando o sacerdote principal, Caifás, declarou constituído o tribunal dos sinedristas, para a investigação, e pediu que Jesus fosse trazido perante eles para que fosse julgado formalmente. Em três ocasiões prévias, o sinédrio tinha decretado a morte de Jesus; com uma ampla maioria de votos, havia decidido que ele merecia a morte por acusações informais de usurpar a lei, de blasfêmia e de insultar as tradições dos pais de Israel.

184:3:2 19823 Não se tratava de uma reunião do sinédrio convocada regularmente e não estava sendo realizada no local habitual, a sala de pedra lavrada no templo. Esse era um tribunal especial de uns trinta sinedristas e que foram convocados ao palácio do sumo sacerdote. João Zebedeu estava presente junto com Jesus durante este assim chamado julgamento.

184:3:3 19824 Como esses sacerdotes principais, escribas, saduceus e alguns dos fariseus gabavam-se de que Jesus, o perturbador da sua posição e o desafiador da sua autoridade, estava agora detido seguramente nas suas mãos! E eles estavam decididos a não deixá-lo escapar vivo das suas garras vingativas.

184:3:4 19825 Normalmente, ao julgarem um homem sob uma acusação capital, os judeus procediam com uma grande prudência e providenciavam toda a garantia de eqüidade na seleção de testemunhas e em toda a conduta do tribunal. Mas, nessa ocasião, Caifás era mais um promotor do que um juiz imparcial.

184:3:5 19826 Jesus apareceu perante esse tribunal com as suas vestes habituais e com as suas mãos atadas juntas nas suas costas. Toda a corte estava espantada e um tanto confusa com o seu porte majestoso. Nunca em toda a sua vida tinham eles colocado os seus olhos sobre um prisioneiro como este, nem presenciado a uma tal compostura em um homem cuja vida estava sob julgamento.

184:3:6 19827 A lei judaica exigia que ao menos duas testemunhas devessem concordar sobre qualquer ponto antes que uma acusação pudesse ser feita contra o prisioneiro. Judas não podia ser usado como uma testemunha contra Jesus porque a lei judaica proibia especificamente que a testemunha fosse um traidor. Mais de vinte testemunhas falsas estavam à mão para atestarem contra Jesus, mas os seus testemunhos eram tão contraditórios e tão visivelmente fraudulentos que os próprios sinedristas muito se envergonhavam de toda aquela situação. Jesus permaneceu lá, olhando benignamente para esses perjuros, e a sua própria compostura desconsertava as testemunhas mentirosas. Durante todos esses testemunhos falsos, o Mestre em nenhum momento disse sequer uma palavra; não respondeu às várias acusações falsas.

184:3:7 19828 A primeira vez que dois dos testemunhos apresentaram sequer a semelhança de estarem de acordo foi quando dois homens atestaram que tinham ouvido Jesus dizer durante um dos seus discursos no templo que ele “destruiria esse templo feito com as mãos do homem e em três dias faria um outro templo sem empregar mãos humanas”. Isso não era exatamente o que Jesus dissera, independentemente do fato de que apontara para o seu próprio corpo ao fazer aquele comentário.

184:3:8 19829 Embora o sumo sacerdote tivesse gritado para Jesus: “Não repondes a nenhuma dessas acusações?” Jesus não abriu a boca. Permaneceu ali em silêncio, enquanto todas essas testemunhas falsas faziam as suas declarações. O ódio, o fanatismo e o exagero inescrupuloso de tal modo caracterizaram as palavras desses perjuros, que os seus testemunhos desmoronavam nos próprios embaraços. O melhor modo de refutar às suas acusações falsas foi o silêncio calmo e majestoso do Mestre.

184:3:9 19831 Pouco depois do início das declarações das testemunhas falsas, Anás chegou e tomou o seu assento ao lado de Caifás. Anás agora se levantava e argumentava que essa ameaça feita por Jesus de destruir o templo era suficiente para justificar três acusações contra ele:

19832 1. Que era ele um perigoso desacreditador para o povo. Que ele ensinava a eles coisas impossíveis e os enganava de outros modos.

19833 2. Que ele era um revolucionário fanático, pois advogava que se colocasse mãos violentas no templo sagrado, ou então como poderia destruí-lo?

19834 3. Que ele ensinava magia, posto que prometera construir um novo templo, e ainda sem a ajuda das mãos.

184:3:10 19835 O sinédrio inteiro já tinha concordado que Jesus era culpado por transgressões das leis judaicas que exigiam a sua morte, mas eles estavam agora mais preocupados em desenvolver acusações a respeito da sua conduta e dos ensinamentos que servissem como justificativa a Pilatos para pronunciar a sentença de morte ao prisioneiro. Eles sabiam que deviam assegurar o consentimento do governador romano antes que Jesus pudesse legalmente ser levado à morte. E Anás estava decidido a continuar na linha de fazer parecer que Jesus era um instrutor perigoso para ser deixado em liberdade junto ao povo.

184:3:11 19836 Mas Caifás não podia mais suportar a visão do Mestre ali com um perfeito domínio de si e em um silêncio inquebrantável. Ele pensava saber ao menos um modo pelo qual o prisioneiro pudesse ser induzido a falar. E assim, ele acorreu até o lado de Jesus e, sacudindo o seu dedo acusador no rosto do Mestre, disse: “Eu te conjuro, em nome do Deus vivo, a que nos diga se és o Libertador, o Filho de Deus”. Jesus respondeu a Caifás: “Eu sou. Logo irei para o Pai, e em breve o Filho do Homem será investido com o poder e uma vez mais reinará sobre as hostes do céu”.

184:3:12 19837 Quando o sumo sacerdote ouviu Jesus dizendo essas palavras, ficou excessivamente enraivecido e, rasgando a sua veste externa, exclamou: “Que necessidade temos de mais testemunhos? Vede, agora todos vós ouvistes a blasfêmia deste homem. O que pensais agora que deve ser feito com esse blasfemo e usurpador da lei?” E eles todos responderam em uníssono: “Ele é digno de morte; que seja crucificado”.

184:3:13 19838 Jesus não manifestou nenhum interesse por qualquer pergunta feita a ele quando diante de Anás ou dos sinedristas, exceto pela pergunta relativa à sua missão de auto-outorga. Quando perguntado sobre se ele era o Filho de Deus, respondeu instantânea e inequivocamente de modo afirmativo.

184:3:14 19839 Anás desejava que o julgamento continuasse ainda, e que as acusações de uma natureza definida a respeito da relação de Jesus com a lei e com as instituições romanas fossem formuladas para uma apresentação subseqüente a Pilatos. Os conselheiros estavam ansiosos para levar essas questões a um fim rápido, não apenas porque era o Dia da Preparação para a Páscoa, e nenhum trabalho secular devia ser feito depois do meio-dia, mas também porque eles temiam que Pilatos pudesse a qualquer momento voltar a Cesaréia, capital romana da Judéia, pois ele estava em Jerusalém apenas para a celebração da Páscoa.

184:3:15 198310 Contudo, Anás não teve êxito em manter o controle da corte. Depois que Jesus tinha de um modo inesperado respondido a Caifás, o sumo sacerdote se adiantou e esbofeteou-o no rosto com a própria mão. Anás ficou verdadeiramente chocado quando viu os outros membros da corte, ao passarem por ele antes de sair da sala, cuspindo no rosto de Jesus e muitos deles, de um modo zombeteiro, estapeando-o no rosto com a palma das suas mãos. E assim, em desordem e confusão inaudita, essa primeira sessão do julgamento sinedrista de Jesus terminou, depois das quatro e meia da manhã.

184:3:16 19841 Trinta falsos juízes cheios de preconceitos e cegos pelas tradições, com as suas testemunhas falsas, têm a pretensão de julgar o justo Criador de um universo. E esses acusadores extremados ficam exasperados com o silêncio majestoso e com a presença magnífica desse Deus-homem. O seu silêncio é terrível de suportar; a sua palavra é destemidamente desafiante. Ele permanece inarredável diante das ameaças deles e não se intimida com os seus ataques. O homem julga a Deus, e mesmo assim Ele os ama e os salvaria se pudesse.

4. A HORA DA HUMILHAÇÃO


184:4:1 19842 A lei judaica exigia que, na questão da declaração da sentença de morte, houvesse duas sessões do tribunal. Essa segunda sessão devia ser efetuada no dia seguinte ao da inicial, e o tempo entre as duas deveria ser passado em jejum e reclusão pelos membros do tribunal. Mas esses homens não podiam esperar até o dia seguinte para a confirmação da sua decisão de que Jesus devia morrer. Eles esperaram apenas uma hora. Nesse meio tempo, Jesus foi deixado na sala do tribunal sob a custódia dos guardas do templo, que, com os servos do sumo sacerdote, se divertiam em lançar todas as espécies de indignidades sobre o Filho do Homem. Eles zombaram dele, cuspiram nele e esbofetearam-no com crueldade. Eles batiam no rosto dele com um vergalhão e então diziam: “Faça uma profecia, tu Libertador, sobre quem foi que bateu em ti”. E assim eles continuaram por uma hora inteira, insultando e maltratando esse homem da Galiléia que não opunha resistência.

184:4:2 19843 Durante essa trágica hora de sofrimento, de provações e de zombaria perante os guardas e os servos ignorantes e insensíveis, João Zebedeu esperou com um terror solitário em uma sala adjacente. Logo que esses abusos começaram, Jesus indicou a João, com um aceno de cabeça, que ele devia retirar-se. O Mestre bem sabia que, se ele permitisse ao seu apóstolo permanecer na sala e testemunhar essas indignidades, o ressentimento dentro de João seria tão forte a ponto de produzir uma explosão de indignação e protesto que iria provavelmente resultar na sua morte.

184:4:3 19844 Durante essa hora terrível, Jesus não murmurou uma palavra sequer. Para essa alma humana branda e sensível, unida, em uma relação de personalidade ao Deus de todo esse universo, não houve nenhum momento mais amargo no cálice da sua humilhação do que essa hora terrível à mercê desses guardas e servos ignorantes e cruéis, que tinham sido estimulados a abusar dele pelo exemplo dos membros desse chamado tribunal sinedrista.

184:4:4 19845 O coração humano não pode certamente conceber o estremecimento de indignação que varreu todo um vasto universo quando as inteligências celestes testemunharam o seu amado soberano sendo submetido à vontade das suas criaturas ignorantes e desviadas na esfera desafortunada de Urântia, obscurecida pelo pecado.

184:4:5 19846 Qual então é esse vestígio do animal no homem que o leva a querer insultar e agredir fisicamente aquilo que não pode alcançar espiritualmente, nem conceber intelectualmente? No homem meio-civilizado ainda espreita uma brutalidade maldosa que busca liberar-se sobre aqueles que são superiores em sabedoria e em alcance espiritual. Vede a maldosa grosseria e a ferocidade brutal desses homens supostamente civilizados, que sentem uma certa forma de prazer animal com esse ataque físico ao Filho do Homem, que não opunha resistência. Enquanto esses insultos, sarcasmos e golpes caíam sobre Jesus, ele não se defendia, mas ele não estava sem defesa. Jesus não foi vencido, ele meramente não lutou no sentido material.

184:4:6 19851 Esses são os momentos das maiores vitórias do Mestre em toda a sua carreira longa e importante de criador, sustentador e salvador de um universo vasto e variegado. Tendo vivido na sua plenitude uma vida para revelar Deus ao homem, Jesus está agora engajado em fazer uma revelação nova e sem precedentes do homem para Deus. Jesus está agora revelando aos mundos o triunfo final sobre todos os medos do isolamento da personalidade da criatura. O Filho do Homem finalmente conseguiu a realização da identidade como Filho de Deus. Jesus não hesita em afirmar que ele e o Pai são Um; e, na base do fato e da verdade dessa experiência suprema e superna, ele exorta todo o crente do Reino a tornar-se um com ele, como ele e o seu Pai são Um. A experiência viva na religião de Jesus assim passa a ser a técnica segura e certa por meio da qual os mortais, espiritualmente isolados e cosmicamente solitários, da Terra, tornam-se capazes de escapar do isolamento de personalidade, com todas as suas seqüelas de medo e de sentimentos associados de desamparo. Nas realidades fraternas do Reino do céu, os filhos de Deus pela fé encontram a libertação final do isolamento do eu, tanto pessoal quanto planetariamente. O crente conhecedor de Deus experimenta crescentemente o êxtase e a grandeza da socialização espiritual em uma escala universal – a cidadania no alto, associada à realização eterna do destino divino de alcance da perfeição.

5. A SEGUNDA REUNIÃO DO TRIBUNAL


184:5:1 19852 Às cinco horas e trinta minutos, o tribunal retomou os trabalhos, e Jesus foi levado à sala adjacente onde João estava esperando. Ali o soldado romano e os guardas do templo vigiaram Jesus, enquanto a corte começava a formulação das acusações que deviam ser apresentadas a Pilatos. Anás deixou claro para os seus companheiros que a acusação de blasfêmia não deveria ter nenhuma importância para Pilatos. Judas estava presente durante essa segunda reunião do tribunal, mas não testemunhou.

184:5:2 19853 Essa sessão do tribunal durou apenas meia hora e, quando suspenderam-na para irem diante de Pilatos, eles haviam delineado a acusação de Jesus, para fazê-lo merecedor da pena de morte, resumindo-a em três razões:

19854 1. Que era um pervertedor da nação judaica; ele enganara o povo e incitara-o à rebelião.

19855 2. Que ensinava o povo a recusar pagar o tributo a César.

19856 3. Que, com a pretensão de ser um rei e o fundador de uma nova espécie de reino, incitava à traição contra o imperador.

184:5:3 19857 Todo esse procedimento era irregular e totalmente contrário às leis judaicas. Não havia duas testemunhas que tivessem concordado em qualquer questão, exceto aqueles que testemunharam a respeito da afirmação de Jesus sobre destruir o templo, edificando-o novamente em três dias. E mesmo a respeito desse ponto, nenhuma testemunha falou pela defesa, nem foi Jesus chamado a explicar a intenção do que havia dito.

184:5:4 19858 O único ponto sobre o qual o tribunal poderia tê-lo julgado com consistência era o da blasfêmia, e o julgamento dela teria que repousar inteiramente no próprio testemunho dele. Mesmo no que concernia à blasfêmia, eles deixaram de proceder a uma votação formal sobre a pena de morte.

184:5:5 19859 E agora presumiam formular três acusações, com as quais ir perante Pilatos, e sobre as quais nenhuma testemunha tinha sido ouvida, e que foram decididas quando da ausência do prisioneiro acusado. E quando isso foi feito, três dos fariseus deixaram o tribunal; eles queriam ver Jesus destruído, mas eles não formulariam acusações contra ele sem testemunhas e na sua ausência.

184:5:6 19861 Jesus não apareceu novamente perante o tribunal sinedrista. Eles não queriam ter de olhar novamente para o seu rosto enquanto julgavam a sua vida inocente. Jesus não sabia (como homem) das acusações formais deles até tê-las ouvido de Pilatos.

184:5:7 19862 Enquanto Jesus encontrava-se na sala com João e os guardas, e enquanto o tribunal estava na sua segunda sessão, algumas das mulheres do palácio do sumo sacerdote, junto com as suas amigas, vieram para ver o estranho prisioneiro, e uma delas perguntou-lhe: “Tu és o Messias, o Filho de Deus?” E Jesus respondeu: “Se eu te disser, tu não crerás em mim; e se eu te perguntar, tu não responderás”.

184:5:8 19863 Às seis horas naquela manhã Jesus foi levado da casa de Caifás para comparecer perante Pilatos, a fim de ver-se confirmada a sentença de morte que esse tribunal sinedrista tinha, assim, injusta e irregularmente decretado.

DOCUMENTO 185

O JULGAMENTO DIANTE DE PILATOS
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Pouco depois das seis horas dessa manhã de sexta-feira, 7 de abril, do ano 30 d. C. , Jesus foi levado perante Pilatos, que era o procurador romano do governo da Judéia, Samaria e Iduméia, sob a supervisão imediata do emissário da Síria. Amarrado, o Mestre foi levado à presença do governador romano pelos guardas do templo; e estava acompanhado de cerca de cinqüenta dos seus acusadores, incluindo o tribunal sinedrista (principalmente os saduceus), Judas Iscariotes, o sumo sacerdote, Caifás, e o apóstolo João. Anás não apareceu diante de Pilatos.

185:0:2 19872 Pilatos estava de pé e pronto para receber esse grupo de visitantes madrugadores, e foi informado, por aqueles que na noite anterior haviam assegurado o seu consentimento para empregar os soldados romanos na detenção do Filho do Homem, de que Jesus seria trazido perante ele bem cedo. Havia sido arranjado que esse julgamento tivesse lugar em frente ao pretório; uma construção feita em complemento à fortaleza de Antônia, onde Pilatos e a sua esposa possuíam o seu quartel-general para quando permanecessem em Jerusalém.

185:0:3 19873 Embora Pilatos tenha conduzido grande parte do interrogatório de Jesus dentro das salas do pretório, o julgamento público foi realizado do lado de fora nos degraus que levavam à entrada principal. Era uma concessão aos judeus, que se recusaram a entrar em qualquer edifício gentio onde o fermento pudesse ser usado nesse Dia da Preparação para a Páscoa. Essa conduta não apenas os tornaria cerimonialmente impuros, privando-os, portanto, de compartilhar da festa vespertina de ação de graças, como também faria com que fosse necessário que eles se sujeitassem às cerimônias de purificação depois do pôr-do-sol, antes de poderem participar da ceia de Páscoa.

185:0:4 19874 Conquanto esses judeus não tivessem, de nenhum modo, tido a sua consciência perturbada ao fazerem intrigas efetivar o assassinato judicial de Jesus, eles enchiam-se de escrúpulos no que dizia respeito a todas essas questões de limpeza cerimonial e de regularidade do cumprimento das tradições. E esses judeus não foram os únicos a deixar de reconhecer as obrigações elevadas e santas de natureza divina, ao darem uma atenção meticulosa mais a coisas de somenos importância para o bem-estar humano tanto no tempo quanto na eternidade.

1. PÔNCIO PILATOS


185:1:1 19875 Se Pôncio Pilatos não tivesse sido um governador razoavelmente bom das províncias menores, Tibério não o teria suportado como procurador da Judéia por dez anos. Embora ele fosse um administrador bastante bom, era moralmente covarde. Não era um homem de grandeza suficiente para compreender a natureza da sua tarefa como governador dos judeus. Ele não captou o fato de que esses hebreus tinham uma religião verdadeira, uma fé pela qual eles estavam dispostos a morrer, e que milhões e milhões deles, espalhados aqui e ali por todo o império, encaravam Jerusalém como o santuário da sua fé e tinham um respeito pelo sinédrio como sendo o mais alto tribunal na Terra.

185:1:2 19881 Pilatos não gostava dos judeus, e esse ódio profundo cedo começou a manifestar-se. De todas as províncias romanas, não havia nenhuma mais difícil de governar do que a Judéia. Pilatos nunca compreendeu realmente os problemas que a administração dos judeus abrangia e, assim, muito cedo na sua experiência de governador, ele cometeu uma série de grandes erros quase fatais e praticamente suicidas. E foram tais erros que deram aos judeus um tal poder sobre ele. Quando eles queriam influenciar as suas decisões, tudo o que tinham a fazer era ameaçar com uma revolta, e Pilatos capitulava rapidamente. E essa aparente vacilação, ou falta de coragem moral, do procurador era devida principalmente à memória de um certo número de controvérsias que ele tinha mantido com os judeus e porque em todos os casos eles categoricamente haviam levado a melhor. Os judeus sabiam que Pilatos sentia medo deles, que ele temia pela própria posição perante Tibério, e eles usaram a consciência disso como desvantagem para o governador em inúmeras ocasiões.

185:1:3 19882 O desagrado que os judeus mantinham para com Pilatos surgiu depois de muitos conflitos infelizes. Primeiro, ele não levou a sério o profundo preconceito deles contra todas as imagens como símbolos de adoração idólatra. E, assim, permitiu que os soldados entrassem em Jerusalém sem remover as imagens de César das suas bandeiras, como tinha sido a prática dos soldados romanos sob o comando do seu predecessor. Uma grande delegação de judeus aguardou por Pilatos durante cinco dias, implorando-lhe que tirasse essas imagens dos estandartes militares. Ele recusou-se completamente a conceder ao pedido deles e ameaçou-os com a morte imediata. Pilatos, sendo ele próprio um cético, não compreendia que homens com fortes sentimentos religiosos não hesitassem em morrer pelas próprias convicções religiosas; e, pois, ficou consternado quando esses judeus alinharam-se, desafiantes, diante do seu palácio, colocando as suas faces no chão, dizendo que estavam prontos para morrer. Pilatos então compreendeu que tinha feito uma ameaça que não estava disposto a cumprir. Ele recuou, ordenou que as imagens fossem removidas dos estandartes dos seus soldados em Jerusalém, e viu-se, daquele dia em diante, sujeito grandemente aos caprichos dos líderes judeus, que desse modo haviam descoberto a sua fraqueza ao fazer ameaças que temia cumprir.

185:1:4 19883 Posteriormente Pilatos determinou reconquistar esse prestígio perdido e assim ele teve os escudos do imperador, tais como eram usados comumente para a adoração de César, colocados nas paredes do palácio de Herodes em Jerusalém. Quando os judeus protestaram, ele foi inflexível. Recusou-se a escutar os protestos, e eles, prontamente, apelaram para Roma, e o imperador também prontamente ordenou que os escudos ofensivos fossem removidos. E então Pilatos passou a ser tido com menos apreço ainda do que antes.

185:1:5 19884 Uma outra coisa que o colocou em grande desprestígio junto aos judeus foi ele ter ousado retirar dinheiro do tesouro do templo para pagar a construção de um novo aqueduto que desse maior suprimento de água aos milhões de visitantes de Jerusalém na época das grandes festas religiosas. Os judeus sustentaram que apenas o sinédrio poderia desembolsar os fundos do templo, e nunca cessaram de censurar Pilatos por essa ordem abusiva. Nada menos do que vinte tumultos e muito derramamento de sangue resultaram dessa decisão. A última dessas revoltas sérias teve a ver com a matança de um grande grupo de galileus, quando estavam no seu culto no altar.

185:1:6 19885 É significativo que, conquanto esse vacilante dirigente romano tenha sacrificado Jesus pelo seu medo dos judeus, para salvaguardar a sua posição pessoal, ele finalmente tenha sido deposto em conseqüência de um massacre desnecessário de samaritanos a propósito das pretensões de um falso Messias que liderou tropas até o monte Gerizim, onde pretendia ele que os vasos do templo estivessem enterrados; e motins ferozes aconteceram quando ele não conseguiu revelar o local onde estava escondido o vasilhame sagrado, como havia prometido. Em conseqüência desse episódio, o embaixador da Síria mandou Pilatos de volta para Roma. Tibério morreu enquanto Pilatos estava a caminho de Roma, e ele não foi apontado de novo como procurador da Judéia. Nunca de fato ele recuperou-se completamente da condenação ao pesar, por ter consentido na crucificação de Jesus. Não encontrando prestígio aos olhos do novo imperador, ele afastou-se, indo para a província de Lausane, onde posteriormente cometeu suicídio.

185:1:7 19891 Cláudia Prócula, a esposa de Pilatos, tinha ouvido falar de Jesus por meio das informações da sua camareira, que era uma crente fenícia do evangelho do Reino. Após a morte de Pilatos, Cláudia passou a identificar-se de modo proeminente com a difusão das boas-novas.

185:1:8 19892 E tudo isso explica muito do que aconteceu nessa trágica sexta-feira pela manhã. É fácil compreender por que os judeus tiveram a presunção de dar ordens a Pilatos – fazendo-o levantar-se às seis horas para julgar Jesus – e também por que eles não hesitaram em ameaçar entregá-lo ao imperador, por traição, se ele ousasse recusar-se a cumprir as exigências deles quanto à morte de Jesus.

185:1:9 19893 Um governador romano condigno que não se tivesse envolvido de modo desvantajoso com os dirigentes dos judeus jamais teria permitido que esses fanáticos religiosos, sedentos de sangue, causassem a morte de um homem que ele próprio havia declarado não ter cometido nenhuma falta e ser inocente dessas falsas acusações. Roma cometeu um erro grave, um erro de conseqüências profundas nos assuntos da Terra, quando enviou a mediocridade de um Pilatos para governar a Palestina. Tibério teria feito melhor se tivesse enviado aos judeus o melhor administrador de províncias do império.

2. JESUS APRESENTA-SE DIANTE DE PILATOS


185:2:1 19894 Quando Jesus e os seus acusadores haviam-se reunido em frente da sala de julgamento de Pilatos, o governador romano saiu e, dirigindo-se a todos ali reunidos, perguntou: “Que acusação trazeis contra este homem?” Os saduceus e os conselheiros que haviam tomado a si a tarefa de colocar Jesus fora do seu caminho, haviam decidido ir perante Pilatos e pedir a confirmação da sentença de morte pronunciada contra Jesus, evitando querer fazer acusações definidas. E por isso o porta-voz do tribunal sinedrista respondeu a Pilatos: “Se este homem não fosse um malfeitor, nós não o estaríamos entregando a ti”.

185:2:2 19895 Quando Pilatos observou que eles estavam relutantes em afirmar as suas acusações contra Jesus, embora ele soubesse que eles tinham estado toda a noite deliberando quanto à sua culpa, ele respondeu-lhes: “Já que decidistes por não fazer nenhuma acusação definida, por que não levais este homem para julgá-lo de acordo com as vossas próprias leis?”

185:2:3 19896 Então o escriturário do tribunal do sinédrio disse a Pilatos: “Não é legal para nós colocar qualquer homem sob a pena de morte, e esse perturbador da nossa nação é digno de morrer pelas coisas que ele disse e fez. E por isso viemos diante de ti buscar a confirmação desse decreto”.

185:2:4 19897 Comparecer perante o governador romano com essa tentativa de escapatória revelava, não apenas a malevolência e o mau humor dos sinedristas para com Jesus, mas também a sua falta de respeito pela eqüidade, a honra e a dignidade de Pilatos. Que afronta a desses cidadãos súditos, a de comparecer diante do seu governador provincial pedindo um decreto de execução contra um homem, antes de assegurar a ele um julgamento justo e sem apresentar sequer acusações criminais definidas contra ele!

185:2:5 19901 Pilatos sabia alguma coisa do trabalho de Jesus entre os judeus, e conjecturava que as acusações possíveis contra ele tivessem a ver com violações das leis eclesiásticas dos judeus; e por isso ele tentava reenviar o caso de volta ao tribunal deles próprios. Novamente, Pilatos deleitou-se de fazer com que eles confessassem publicamente que eram impotentes para pronunciar e executar a sentença de morte, ainda que fosse a um da sua própria raça a quem eles passaram a desprezar com ódio amargo e invejoso.

185:2:6 19902 Há apenas algumas poucas horas, um pouco antes da meia-noite e após ele ter concedido a permissão de usar os soldados romanos para efetuar a prisão secreta de Jesus, Pilatos tinha ouvido, da sua mulher, Cláudia, mais coisas a respeito de Jesus e dos seus ensinamentos. Cláudia, então quase convertida ao judaísmo, tornou-se mais tarde uma crente convicta do evangelho de Jesus.

185:2:7 19903 Pilatos gostaria de ter adiado essa audiência, mas percebeu que os líderes judeus estavam determinados a levar o caso até o fim. Ele sabia que essa manhã não apenas era a de preparação da Páscoa, mas que esse dia, sendo sexta-feira, era também o Dia da Preparação para o sábado judeu, dia de oração e de descanso.

185:2:8 19904 Pilatos, sendo extremamente sensível ao modo desrespeitoso pelo qual esses judeus o tinham abordado, não estava inclinado a aceder às suas demandas para que Jesus fosse sentenciado à morte, sem um julgamento. Depois, portanto, de ter esperado uns momentos para que eles apresentassem as suas acusações contra o prisioneiro, voltou-se para eles e disse: “Eu não sentenciarei este homem à morte sem um julgamento; nem consentirei em interrogá-lo até terdes apresentado as vossas acusações contra ele, por escrito”.

185:2:9 19905 Quando o sumo sacerdote e os outros ouviram Pilatos dizer isso, eles deram um sinal para o escrivão do tribunal, que então passou às mãos de Pilatos as acusações escritas contra Jesus. E essas acusações eram:

185:2:10 19906 “O tribunal sinedrista considera este homem como um malfeitor e perturbador da nossa nação, pois é culpado de:

19907 “1. Subverter a nossa nação e incitar o nosso povo à rebelião.

19908 “2. Proibir o povo de pagar o tributo a César.

19909 “3. Chamar a si próprio de rei dos judeus e de pregar a fundação de um novo reino”.

185:2:11 199010 Jesus não fora julgado de maneira regulamentar, nem fora legalmente considerado culpado por nenhuma dessas acusações. Ele nem pudera ouvir tais incriminações quando pela primeira vez foram feitas, mas Pilatos o havia trazido do pretório, onde estivera sob a custódia dos guardas, e insistia que essas acusações fossem repetidas diante de Jesus.

185:2:12 199011 Quando Jesus ouviu essas acusações, ele bem sabia que não tinha sido interrogado sobre tais questões perante o tribunal judaico. E tampouco João Zebedeu e os próprios acusadores nada sabiam disso. Mas Jesus não respondeu a essas denúncias falsas. Mesmo quando Pilatos ordenou que ele respondesse aos seus acusadores, ele não abriu a boca. Pilatos estava tão atônito com a injustiça de todo o procedimento, e tão impressionado com o comportamento silencioso e magistral de Jesus, que decidiu levar o prisioneiro para dentro da sala e interrogá-lo em privacidade.

185:2:13 199012 Pilatos estava com a sua mente confusa, no seu coração ele estava receoso dos judeus e poderosamente incitado, no seu espírito, com o espetáculo da presença de Jesus ali, majestosamente de pé, perante os seus acusadores sedentos de sangue e contemplando-os de cima, não com desprezo silencioso, mas com uma expressão de piedade genuína e de afeição pesarosa.

3. O INTERROGATÓRIO PRIVADO FEITO POR PILATOS


185:3:1 19911 Pilatos levou Jesus e João Zebedeu até uma sala privada, deixando os guardas do lado de fora, na ante-sala; e, uma vez ali, pediu ao prisioneiro para sentar-se; e, sentando-se ao seu lado, fez várias perguntas. Pilatos começou a sua conversa com Jesus, assegurando-lhe que não acreditava na primeira acusação contra ele: de ser um pervertedor da nação e um incitador de rebeliões. Então ele perguntou: “Tu ensinaste alguma vez que se deveria recusar a pagar os tributos a César?” Jesus, apontando João, disse: “Pergunta a ele ou a qualquer homem que tenha ouvido aos meus ensinamentos”. Então Pilatos perguntou a João sobre essa questão do tributo, e João testificou a respeito do ensinamento do seu Mestre e explicou que Jesus e os seus apóstolos pagavam os impostos tanto a César quanto ao templo. Quando Pilatos fez a João a pergunta, ele disse: “Trata de não contar a nenhum homem que eu te dirigi a palavra”. E João nunca revelou nada sobre essa questão.

185:3:2 19912 Pilatos nesse momento se voltou para fazer a Jesus outras perguntas, e disse: “E agora sobre a terceira acusação contra ti: de que és o rei dos judeus?” Já que havia um tom, na voz de Pilatos, de que essa fosse uma pergunta possivelmente sincera, Jesus sorriu para o procurador e disse: “Pilatos, perguntas isso por ti mesmo, ou trazes essa pergunta dos outros, dos meus acusadores?” Depois disso, em um tom de meia indignação, o governador respondeu: “Acaso sou judeu? O teu próprio povo e os sacerdotes principais entregaram-te e me pediram para sentenciar-te à morte. Eu questiono a validade das acusações deles e estou apenas tentando saber por mim mesmo o que fizeste. Dize-me, tu afirmaste que és o rei dos judeus e tentaste fundar um novo reino?”

185:3:3 19913 Nisso disse Jesus a Pilatos: “Não percebes que o meu Reino não é deste mundo? Se o meu Reino fosse deste mundo, os meus discípulos certamente lutariam para que eu não fosse entregue nas mãos dos judeus. A minha presença aqui diante de ti, de mãos atadas, é suficiente para mostrar a todos os homens que o meu Reino é um domínio espiritual, como a fraternidade dos homens que, pela fé e pelo amor, se tornaram filhos de Deus. E essa salvação é para os gentios, tanto quanto para os judeus”.

185:3:4 19914 “Então, afinal, és um rei?” Perguntou Pilatos. E Jesus respondeu: “Sim, eu sou tal rei, e o meu Reino é a família, pela fé, dos filhos do meu Pai que está no céu. Com esse propósito eu nasci neste mundo, para que eu pudesse mostrar o Pai a todos os homens e dar o testemunho da verdade de Deus. E, ainda agora, eu declaro a ti que todo aquele que ama a verdade ouve a minha voz”.

185:3:5 19915 Nesse momento Pilatos, meio ridicularizando e meio com sinceridade, disse: “Verdade? O que é a verdade – quem sabe?”

185:3:6 19916 Pilatos não foi capaz de penetrar nas palavras de Jesus, nem foi capaz de compreender a natureza do seu Reino espiritual, mas agora ele estava certo de que o prisioneiro nada tinha feito para ser merecedor da sentença de morte. Um olhar sobre Jesus, face a face, era suficiente para convencer até mesmo a Pilatos de que aquele homem brando e cansado, entretanto majestoso e justo, não era nenhum revolucionário indômito e perigoso que aspirava estabelecer-se no trono temporal de Israel. Pilatos pensou ter compreendido alguma coisa do que Jesus quis dizer quando chamou a si próprio de rei, pois estava familiarizado com os ensinamentos dos estóicos, os quais afirmavam que “o homem sábio é um rei”. Pilatos estava profundamente convencido de que, em vez de ser um perigoso instigador de sedições, Jesus era, nada mais nada menos do que um visionário inofensivo, um inocente fanático.

185:3:7 19917 Após interrogar o Mestre, Pilatos voltou até os sacerdotes principais e os acusadores de Jesus e disse: “Já interroguei este homem, e não encontro nenhum erro nele. Não penso que seja culpado das acusações que fizestes contra ele; penso que deveria ser liberado”. E quando os judeus ouviram isso, eles encolerizaram-se enormemente, tanto que gritaram ferozmente que Jesus deveria morrer; e um dos sinedristas ousadamente subiu ao lado de Pilatos, dizendo: “Este homem incita o povo; começou pela Galiléia e continuará por toda a Judéia. Ele é um promotor de desordens e um malfeitor. Tu lamentarás muito se deixares este homem perverso sair livre”.

185:3:8 19921 Pilatos via-se em apuros sem saber o que fazer com Jesus; por isso, quando os ouviu dizendo que ele começara a sua obra na Galiléia, pensou, para evitar a responsabilidade de decidir sobre o caso, ou ao menos para ganhar tempo e pensar, em enviar Jesus para comparecer perante Herodes, que então estava na cidade para a Páscoa. Pilatos também pensou que esse gesto poderia ajudar como um antídoto para o rancor que existia há algum tempo entre ele próprio e Herodes, devido aos numerosos mal-entendidos sobre questões de jurisdição.

185:3:9 19922 Pilatos, chamando os guardas, disse: “Este homem é galileu. Levai-o imediatamente a Herodes e, depois que ele o tiver interrogado, informai-me sobre as suas conclusões”. E eles levaram Jesus a Herodes.

4. JESUS DIANTE DE HERODES


185:4:1 19923 Quando ficava em Jerusalém, Herodes Antipas ocupava o velho palácio Macabeu de Herodes, o Grande; e, para essa casa do antigo rei, Jesus estava agora sendo levado pelos guardas do templo. Ele foi seguido pelos seus acusadores e por uma multidão que crescia. Herodes há muito havia ouvido falar de Jesus, e estava bastante curioso a respeito dele. Quando o Filho do Homem foi posto diante dele, nessa sexta-feira pela manhã, o perverso idumeu não se lembrou, sequer por um instante, do jovem de anos anteriores que comparecera perante ele, em Séforis, pleiteando uma decisão justa a respeito do dinheiro devido ao seu pai, que fora acidentalmente morto durante o trabalho em um dos prédios públicos. Pelo que sabia, Herodes nunca havia visto Jesus, embora tivesse estado muito preocupado por causa dele quando a sua obra esteve centrada na Galiléia. Agora que se encontrava sob a custódia de Pilatos e dos judeianos, Herodes estava desejoso de vê-lo, sentindo-se seguro contra qualquer problema com ele, no futuro. Herodes tinha ouvido muita coisa sobre os milagres operados por Jesus, e realmente esperava vê-lo fazer alguma coisa prodigiosa.

185:4:2 19924 Quando trouxeram Jesus diante de Herodes, o tetrarca ficou assombrado com a sua aparência imponente e com a serenidade do seu semblante. Durante uns quinze minutos Herodes fez perguntas a Jesus, mas o Mestre não respondeu. Herodes escarneceu e desafiou-o a fazer um milagre, mas Jesus nada responderia às suas muitas inquirições, nem reagiria aos seus sarcasmos.

185:4:3 19925 Então Herodes voltou-se para os sacerdotes principais e para os saduceus e, escutando as suas acusações, ouviu a tudo o que Pilatos havia escutado e mais, a respeito das supostas maldades feitas pelo Filho do Homem. Finalmente, estando convencido de que Jesus não iria falar com ele, nem operar nenhum prodígio, Herodes, após tentar ridicularizá-lo por um certo tempo, colocou sobre ele um antigo manto real de cor púrpura e enviou-o de volta a Pilatos. Herodes sabia que não tinha jurisdição sobre Jesus na Judéia. Embora ele estivesse contente de crer que, finalmente, se veria livre de Jesus na Galiléia, estava grato pelo fato de que seria Pilatos quem teria a responsabilidade de enviá-lo à morte. Herodes nunca se tinha recuperado completamente do medo que o amaldiçoava, em conseqüência de ter matado João Batista. Herodes, algumas vezes, havia até mesmo temido que Jesus fosse João ressuscitado dos mortos. Agora ele estava aliviado desse medo, pois pôde observar que Jesus era um tipo de pessoa muito diferente do profeta feroz e franco que ousou expor e denunciar a sua vida privada.

5. JESUS DE VOLTA DIANTE DE PILATOS


185:5:1 19931 Quando os guardas trouxeram Jesus de volta para Pilatos, ele saiu para os degraus da frente do pretório, onde o seu assento de julgamento tinha sido colocado e, reunindo os sacerdotes principais e sinedristas, disse-lhes: “Vós trouxestes este homem a mim com acusações de que ele subverte o povo, proíbe o pagamento de impostos, e pretende ser o rei dos judeus. Eu interroguei-o e não o considerei culpado dessas acusações. De fato, não vejo transgressões nele. Depois, eu o enviei a Herodes, e o tetrarca deve ter chegado à mesma conclusão, pois ele o enviou de volta para nós. Certamente, nada merecedor da sentença de morte foi cometido por este homem. Se ainda pensais que ele necessita ser castigado, estou disposto a puni-lo antes de libertá-lo”.

185:5:2 19932 No exato momento em que os judeus estavam prontos para começar a gritar em protesto contra a libertação de Jesus, uma vasta multidão veio aproximando-se do pretório com o propósito de pedir a Pilatos a libertação de um prisioneiro, em honra pela comemoração da Páscoa. Durante algum tempo fora costume do governador romano permitir aos populares escolher algum homem prisioneiro ou condenado para receber o perdão na época da Páscoa. E agora que essa multidão tinha vindo diante dele para pedir-lhe a libertação de um prisioneiro, e já que Jesus tinha estado tão recentemente nas boas graças das multidões, ocorreu a Pilatos que certamente ele poderia livrar-se da sua difícil situação, já que Jesus agora era um prisioneiro diante do seu assento de julgamento, propondo a essa multidão libertar para eles este homem da Galiléia, em sinal de boa vontade Pascal.

185:5:3 19933 Enquanto a multidão lançava-se, subindo a escada do edifício, Pilatos ouvia-a chamando o nome de um tal de Barrabás. Notório agitador político e ladrão assassino, Barrabás era filho de um sacerdote e, recentemente, tinha sido preso em flagrante no ato de roubo e assassinato na estrada de Jericó. Esse homem estaria sob a sentença de morte, tão logo terminassem as festividades da Páscoa.

185:5:4 19934 Pilatos levantou-se e explicou à multidão que Jesus tinha sido trazido a ele pelos sacerdotes principais, que procuravam tê-lo condenado à morte sob algumas acusações, e que ele não achava que o homem merecia morrer. Disse Pilatos: “E, portanto, a quem preferiríeis que eu liberte para vós, esse Barrabás, o assassino, ou esse Jesus da Galiléia?” E, depois de Pilatos ter dito isso, os sacerdotes principais e os conselheiros sinedristas, todos gritaram com o máximo das suas vozes: “Barrabás, Barrabás!” E, quando o povo viu que os sacerdotes principais estavam decididos a conseguir levar Jesus à morte, rapidamente uniu-se ao pedido da execução dele e todos gritaram bem alto pela libertação de Barrabás.

185:5:5 19935 Havia poucos dias, essa mesma multidão tinha contemplado Jesus com um respeito temeroso; no entanto a multidão não via com respeito a alguém que, tendo alegado ser o Filho de Deus, agora se encontrava sob a custódia dos sacerdotes e dirigentes principais e, perante Pilatos, sendo julgado com risco de perder a sua vida. Jesus podia ser um herói aos olhos do povo quando estivera expulsando os cambistas e os comerciantes do templo, mas não quando era um prisioneiro que não resistia nas mãos dos seus inimigos e em um julgamento sob sentença de morte.

185:5:6 19936 Pilatos ficou indignado ao ver os sacerdotes principais clamando perdão para um assassino notório e ao mesmo tempo gritando para conseguir o sangue de Jesus. Ele viu a malícia e o ódio, percebendo o preconceito e a inveja deles. E por isso disse-lhes: “Como pudestes escolher a vida de um assassino em lugar da vida deste homem cujo pior crime é chamar-se a si próprio, em sentido simbólico, de rei dos judeus?” Mas essa afirmação de Pilatos não foi muito sábia. Os judeus eram um povo orgulhoso, por ora sujeito ao jugo político romano, mas esperando pela vinda de um Messias que os libertasse da escravidão gentia com uma grande demonstração de poder e de glória. Eles ressentiram-se, mais do que Pilatos poderia avaliar, com a insinuação de que este instrutor de maneiras suaves e de estranhas doutrinas, ora sob prisão e acusado de crimes dignos de pena de morte, fosse mencionado como “o rei dos judeus”. Eles consideravam essa observação como um insulto a tudo o que tinham como sagrado e honrado na sua existência nacional, e por isso todos eles soltavam o grito forte pela libertação de Barrabás e pela morte de Jesus.

185:5:7 19941 Pilatos sabia que Jesus era inocente das acusações apresentadas contra ele e, tivesse ele sido um juiz justo e corajoso, o teria absolvido e libertado. Mas ele estava com medo de desafiar esses judeus furiosos. Enquanto ele hesitava em cumprir com o seu dever, um mensageiro chegou e apresentou a ele uma mensagem selada da sua esposa, Cláudia.

185:5:8 19942 Aos que estavam reunidos diante dele, Pilatos indicou que gostaria de ler uma comunicação, recebida naquele momento, antes de continuar com a questão que tinha diante de si. Ao abrir a carta da sua esposa, Pilatos leu: “Oro para que nada tenhas a ver com este homem inocente e justo a quem eles chamam de Jesus. Eu sofri muito essa noite, em sonho, por causa dele”. Essa nota de Cláudia não apenas perturbou bastante a Pilatos, que por causa disso retardou o julgamento dessa questão, mas, infelizmente, também proporcionou um tempo considerável para os dirigentes judeus circularem livremente pela multidão e incitar o povo a pedir a libertação de Barrabás e clamar pela crucificação de Jesus.

185:5:9 19943 Finalmente, Pilatos voltou a tratar da solução do problema que tinha pela frente, indagando à assembléia mista de dirigentes judeus e à multidão em busca do perdão: “O que devo fazer com aquele que é chamado de rei dos judeus?” E todos gritaram em um só acorde: “Crucifica-o! Crucifica-o!” A unanimidade desse pedido feito por uma multidão com gente de todo tipo espantou o alarmado Pilatos, um juiz injusto e tomado pelo medo.

185:5:10 19944 Então, uma vez mais Pilatos disse: “Por que crucificaríeis este homem? Que mal ele fez? Quem virá até aqui para testemunhar contra ele?” Mas quando eles ouviram Pilatos falar em defesa de Jesus, eles apenas gritaram ainda mais e mais alto: “Crucifica-o! Crucifica-o!”

185:5:11 19945 Então, Pilatos apelou ainda uma outra vez, perguntando sobre a libertação de um prisioneiro na Páscoa, dizendo: “Uma vez mais eu vos pergunto, qual desses prisioneiros devo libertar para vós, nesta época da vossa Páscoa?” E de novo a multidão berrou: “Dá-nos Barrabás!”

185:5:12 19946 Então Pilatos disse: “Se eu libertar o assassino, Barrabás, o que farei com Jesus?” E, uma vez mais, a multidão esgoelou em uníssono: “Crucifica-o! Crucifica-o!”

185:5:13 19947 Pilatos estava aterrorizado com a insistência do clamor da multidão, agindo sob a liderança direta dos sacerdotes principais e dos conselheiros do sinédrio; ele decidiu, contudo, uma vez mais, ao menos, tentar apaziguar a multidão e salvar Jesus.

6. O ÚLTIMO APELO DE PILATOS


185:6:1 19948 Apenas os inimigos de Jesus participavam de tudo o que acontecia nessa manhã de sexta-feira diante de Pilatos. Os seus amigos, muitos, ou ainda não sabiam da sua prisão noturna e do julgamento bem cedo pela manhã, ou estavam escondidos para não serem também apreendidos e julgados merecedores da morte por acreditarem nos ensinamentos de Jesus. Na multidão, que agora clamava pela morte do Mestre, estavam apenas os seus inimigos jurados e o povo que não pensa e se deixa levar facilmente.

185:6:2 19951 Pilatos faria ainda um último apelo à piedade deles. Estando temeroso de desafiar o clamor dessa multidão desguiada que gritava pelo sangue de Jesus, ele ordenou aos guardas judeus e aos soldados romanos que levassem Jesus e que o açoitassem. Esse foi, em si mesmo, um procedimento injusto e ilegal, pois a lei romana estipulava que apenas os condenados à morte por crucificação fossem assim sujeitos a tal flagelo. Os guardas levaram Jesus ao pátio aberto do pretório para esse suplício. Ainda que os seus inimigos não houvessem testemunhado esse açoitamento, Pilatos o fez e, antes que tivessem terminado com esse abuso perverso, mandou aos açoitadores que parassem e indicou que Jesus deveria ser trazido a ele. Depois de atarem Jesus ao poste de flagelo e antes de golpearem-no com os seus chicotes cheios de nódulos, os açoitadores de novo colocaram nele o manto purpúreo e trançaram uma coroa de espinhos para colocá-la sobre a sua fronte. E depois de pôr na sua mão um talo de cana, simulando um cetro, eles ajoelharam-se diante dele e zombaram, dizendo: “Salve, rei dos judeus!” E cuspiram nele e bateram-lhe no rosto com as próprias mãos. E um deles, antes de voltarem com ele a Pilatos, tomou da mão de Jesus o talo e com ele bateu-lhe na cabeça.

185:6:3 19952 Então Pilatos conduziu para o lado de fora este prisioneiro sangrando e dilacerado e, apresentando-o perante a multidão variegada, disse: “Eis o homem! De novo eu declaro a vós que não vejo nenhum crime nele e, tendo açoitado-o, eu gostaria de libertá-lo”.

185:6:4 19953 E Jesus de Nazaré estava lá, vestido em um velho manto real purpúreo, com uma coroa de espinhos que feria a sua bondosa fronte. O seu rosto estava manchado de sangue e o seu corpo encontrava-se curvado pelo sofrimento e pela tristeza. Mas nada pode comover os corações insensíveis daqueles que são vítimas de um ódio emocional intenso e que são escravos do preconceito religioso. A visão dessa cena causou um forte estremecimento nos reinos de um vasto universo, mas não tocou os corações daqueles que tinham as mentes fixas na destruição de Jesus.

185:6:5 19954 Quando eles se recuperaram do primeiro choque por ver o estado do Mestre apenas gritaram ainda mais alto e mais prolongadamente: “Crucifica-o! Crucifica-o! Crucifica-o!”

185:6:6 19955 E agora Pilatos compreendeu que era inútil apelar para os supostos sentimentos de piedade deles. E, dando um passo adiante, disse: “Percebo que vós estais mesmo decididos que este homem deve morrer, mas o que foi que ele fez para merecer a morte? Quem irá declarar o seu crime?”

185:6:7 19956 Então o próprio sumo sacerdote deu um passo adiante e, subindo até Pilatos, declarou irado: “Temos uma lei sagrada, e por essa lei este homem deve morrer, porque ele se fez passar pelo Filho de Deus”. Quando Pilatos ouviu isso, ficou ainda mais amedrontado, não apenas com os judeus, mas, relembrando-se do bilhete da sua esposa e da mitologia grega, sobre os deuses descendo à Terra, ele temia agora pelo pensamento de que Jesus talvez pudesse ser um personagem divino. Ele acenou para a multidão acalmar-se, enquanto tomava Jesus pelo braço e de novo conduzia-o para dentro do edifício a fim de que pudesse interrogá-lo outra vez. Pilatos agora estava confundido pelo medo, desnorteado pela superstição e fustigado pela atitude obstinada do povaréu.

7. A ÚLTIMA ENTREVISTA COM PILATOS


185:7:1 19957 Quando, tremendo de emoção atemorizada, assentou-se ao lado de Jesus, Pilatos inquiriu: “De onde vens? Realmente, quem és tu? O que é isso que estão dizendo, que tu és o Filho de Deus?”

185:7:2 19961 Mas Jesus dificilmente podia responder a tais perguntas, pois elas eram feitas por um juiz hesitante, fraco, com medo dos homens, e que era injusto a ponto de sujeitá-lo ao açoite, mesmo depois de declarar que ele era inocente de qualquer crime, e antes mesmo de que tivesse sido ele devidamente sentenciado à morte. Jesus olhou para Pilatos bem de frente, mas não lhe respondeu. Então Pilatos disse: “Tu te recusas a falar comigo? Não consegues perceber que eu ainda tenho o poder de libertar-te ou de crucificar-te?” Então Jesus disse: “Tu não poderias ter nenhum poder sobre mim se isso não fosse permitido de cima. Nenhuma autoridade tu poderias exercer sobre o Filho do Homem, a menos que o Pai no céu o permitisse. Mas não tens tanta culpa, já que ignoras o evangelho. Aquele que me traiu e aquele que me entregou a ti, eles sim cometeram o maior pecado”.

185:7:3 19962 Essa última conversa com Jesus amedrontou profundamente a Pilatos. Esse covarde moral e esse juiz débil agora lidava com o duplo fardo do medo supersticioso de Jesus e do temor mortal dos líderes judeus.

185:7:4 19963 De novo Pilatos apareceu diante da multidão, dizendo: “Estou certo de que esse homem é apenas um transgressor religioso. Devíeis levá-lo e julgá-lo segundo a vossa lei. Por que devíeis esperar que eu consentisse na sua morte por ter ele entrado em choque com as vossas tradições?”

185:7:5 19964 Pilatos estava como que pronto para libertar Jesus quando Caifás, o sumo sacerdote, aproximou-se do covarde juiz romano e, agitando um dedo vingativo no rosto de Pilatos, disse, com palavras iradas que toda a multidão pôde ouvir: “Se libertares esse homem, não és amigo de César, e eu farei com que o imperador saiba de tudo”. Essa ameaça pública era demais para Pilatos. O medo pela sua situação pessoal agora eclipsava quaisquer outras considerações, e o covarde governador ordenou que Jesus fosse trazido diante do assento de julgamento. E enquanto o Mestre permanecia lá diante deles, Pilatos apontou para ele e disse em escárnio, “Aqui está o vosso rei”. E os judeus responderam: “Fora com ele. Crucifica-o!” E então, com muita ironia e sarcasmo, Pilatos disse: “Devo crucificar o vosso rei?” E os judeus responderam: “Sim, crucifica-o! Não temos outro rei além de César”. E foi então que Pilatos compreendeu que não havia esperança de salvar Jesus, já que ele não queria desafiar os judeus.

8. A TRÁGICA CAPITULAÇÃO DE PILATOS


185:8:1 19965 Ali estava o Filho de Deus encarnado como o Filho do Homem. Ele fora preso sem acusação de culpa; acusado sem evidências; julgado sem testemunhas; punido sem um veredicto; e, agora, estava para ser, em breve, condenado a morrer por um juiz injusto que confessava não ter encontrado nenhum erro nele. Se Pilatos pensara em apelar para o patriotismo deles referindo-se a Jesus como o “rei dos judeus”, ele equivocara-se redondamente. Os judeus não estavam esperando por nenhum rei como esse. A declaração dos sacerdotes principais e dos saduceus: “Não temos nenhum rei a não ser César”, foi um choque até para o povo irrefletido; mas agora, ainda que a multidão ousasse abraçar a causa do Mestre, era tarde demais para salvar Jesus.

185:8:2 19966 Pilatos temia um tumulto ou um motim. Ele não ousaria arriscar-se a ter uma tal perturbação durante a época da Páscoa em Jerusalém. Recentemente ele havia recebido uma reprimenda de César, e não se arriscaria a receber outra. A multidão aplaudiu quando ele ordenou a libertação de Barrabás. Então ele ordenou que lhe trouxessem uma bacia e um pouco de água para, ali, diante da multidão ele lavar as próprias mãos, dizendo: “Sou inocente do sangue deste homem. Estais decididos que ele deve morrer, mas eu não encontrei nenhuma culpa nele. E, pois, cuidai vós disso. Os soldados o levarão”. E então a multidão aplaudiu e replicou: “Que o seu sangue caia sobre nós e sobre os nossos filhos”.

DOCUMENTO 186

POUCO ANTES DA CRUCIFICAÇÃO
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Quando Jesus e os seus acusadores partiram para ver Herodes, o Mestre voltou-se para o apóstolo João e disse: “João, podes fazer mais por mim. Vai até a minha mãe e traze-a para ver-me, antes que eu morra”. Quando João ouviu o pedido do seu Mestre, embora ficasse relutante em deixá-lo a sós com os seus inimigos, apressou-se a ir à Betânia, onde toda a família de Jesus estava reunida, à espera, na casa de Marta e Maria, as irmãs de Lázaro a quem Jesus ressuscitou dos mortos.

186:0:2 19972 Por várias vezes durante a manhã, os mensageiros haviam trazido notícias a respeito do progresso do julgamento de Jesus, para Marta e Maria. Mas a família de Jesus não alcançou a Betânia até uns poucos minutos antes de João haver chegado, trazendo o pedido de Jesus para ver a sua mãe antes de ser levado à morte. Depois que João Zebedeu contou a eles tudo que tinha acontecido, desde a prisão de Jesus à meia-noite, Maria, a mãe dele, foi imediatamente, em companhia de João, ver o seu filho mais velho. No momento em que Maria e João chegaram à cidade, Jesus, acompanhado pelos soldados romanos que iam crucificá-lo, tinha chegado já ao Gólgota.

186:0:3 19973 Quando Maria, a mãe de Jesus, partiu com João para ver o seu filho, a sua irmã Rute negou-se a ficar para trás com o resto da família. E, já que ela estava decidida a acompanhar a sua mãe, o seu irmão Judá foi com ela. O restante da família do Mestre permaneceu na Betânia sob a liderança de Tiago, e quase a cada hora os mensageiros de Davi Zebedeu traziam a eles notícias sobre o andamento daquele assunto terrível que era a execução da sentença de morte do seu irmão mais velho, Jesus de Nazaré.

1. O FIM DE JUDAS ISCARIOTES


186:1:1 19974 Foi por volta de oito e meia, dessa sexta-feira pela manhã, que a audiência de Jesus perante Pilatos deu-se por terminada, e o Mestre foi colocado sob a custódia dos soldados romanos que deviam crucificá-lo. Tão logo os romanos tomaram posse de Jesus, o capitão dos guardas judeus marchou com os seus homens de volta para a sua sede no templo. O sumo sacerdote e os seus parceiros sinedristas seguiram atrás dos guardas, bem de perto, indo diretamente para o seu local usual de encontro na sala de pedra lavrada no templo. Ali eles encontraram muitos outros membros do sinédrio, esperando para saber o que tinha sido feito com Jesus. Enquanto Caifás estava ocupado em fazer o seu relatório para o sinédrio a respeito do julgamento e da condenação de Jesus, Judas apareceu diante deles para reclamar a sua recompensa pelo papel que teve na prisão e na sentença de morte do seu Mestre.

186:1:2 19975 Todos esses judeus detestavam Judas; eles olharam para o traidor apenas com sentimentos de total desprezo. Durante o julgamento de Jesus perante Caifás e durante o seu comparecimento diante de Pilatos, Judas esteve com a consciência afligida por causa da sua conduta de traidor. E estava também começando a ficar um tanto desiludido com a recompensa que ia receber como pagamento pelos seus serviços como traidor de Jesus. Ele não gostou da frieza e da indiferença das autoridades judias; entretanto esperava ser amplamente recompensado pela sua conduta covarde. Ele antecipava que fosse chamado perante uma reunião completa do sinédrio e que ali ouviria os elogios, enquanto eles confeririam a ele as honrarias adequadas como prova do grande serviço que ele se vangloriava haver prestado à sua nação. Imagineis, pois, a grande surpresa desse traidor egoísta, quando um servo do sumo sacerdote, tocando em seu ombro, chamou-o para que saísse da sala e foi dizendo: “Judas, eu fui indicado para pagar-te pela traição de Jesus. Aqui está a tua recompensa”. E falando assim, o servo de Caifás entregou a Judas uma bolsa que continha trinta moedas de prata – o preço, em vigor, de um escravo bom e saudável.

186:1:3 19981 Judas ficou atônito, aturdido. Ele correu para entrar na sala, mas foi barrado pelo porteiro. Ele queria apelar para o sinédrio, mas não quiseram recebê-lo. Judas não podia crer que esses dirigentes judeus tivessem esperado que ele traísse os seus amigos e o seu Mestre para depois oferecerem a ele trinta moedas de prata como recompensa. Estava humilhado, desiludido e totalmente oprimido. Ele saiu do templo, por assim dizer, em um transe. Automaticamente ele deixou a bolsa de dinheiro cair no fundo do seu bolso, aquele mesmo bolso onde, por tanto tempo, ele tinha levado a bolsa que continha os fundos apostólicos. E perambulou por toda a cidade atrás das multidões que estavam a caminho de presenciar as crucificações.

186:1:4 19982 A distância Judas viu que levantavam a cruz na qual Jesus estava pregado e, ao ver isso, correu de volta ao templo e, forçando a sua passagem junto ao porteiro, viu-se na presença do sinédrio, que ainda estava reunido. O traidor achava-se quase sem respiração e altamente perturbado, mas conseguiu balbuciar estas palavras: “Eu pequei porque traí contra sangue inocente. Vós me insultastes. Oferecestes dinheiro a mim como recompensa pelo meu serviço – o preço de um escravo. Arrependo-me de ter feito isso; aqui está o vosso dinheiro. Eu quero escapar da culpa de ter cometido esse ato”.

186:1:5 19983 Ao ouvirem Judas, os dirigentes dos judeus escarneceram dele. Um deles, assentado perto de onde estava Judas, acenou para que ele saísse da sala, dizendo: “O teu Mestre já foi executado pelos romanos, e quanto à tua culpa, o que é isso para nós? Cuida tu dela – e fora daqui!”

186:1:6 19984 Ao deixar a sala do sinédrio, ele retirou as trinta moedas de prata da bolsa e jogou-as, espalhando-as pelo assoalho do templo. Quando o traidor deixou o templo, ele encontrava-se quase fora de si. Judas estava agora passando pela experiência da compreensão da verdadeira natureza do pecado. Todo o encanto, o fascínio e a embriaguez da má ação tinham-se esvaído. Agora o pecador encontrava-se só e frente a frente com o veredicto do julgamento da sua alma desiludida e desapontada. O pecado era fascinante e aventuroso ao ser cometido, mas agora a colheita dos fatos nus e pouco românticos devia ser enfrentada.

186:1:7 19985 Este que fora um embaixador do Reino do céu na Terra, caminhava agora pelas ruas de Jerusalém, abandonado e só. O seu desespero era irremediável e quase absoluto. E ele continuou pela cidade e para fora dos seus muros, até a solidão terrível do vale do Hinom, onde subiu pelas rochas escarpadas e, tirando o cinturão do seu manto, atou uma das extremidades a uma árvore pequena, e a outra em volta do próprio pescoço e jogou-se no precipício. Antes de morrer, o nó feito pelas suas mãos nervosas desatou-se, e o corpo do traidor arremeteu-se, fazendo-se em pedaços quando caiu sobre as rochas pontiagudas embaixo.

2. A ATITUDE DO MESTRE


186:2:1 19991 Quando foi preso, Jesus sabia que o seu trabalho na Terra, na semelhança da carne mortal, havia sido concluído. Ele compreendeu plenamente a espécie de morte que teria e pouco preocupado ele estava com os detalhes do seu assim chamado julgamento.

186:2:2 19992 Perante o tribunal sinedrista Jesus recusou-se a dar respostas aos depoimentos dos testemunhos perjuros. Havia apenas uma pergunta que esclareceria para sempre uma resposta, feita fosse por um amigo ou um inimigo, e que era a que dizia respeito à natureza e divindade da sua missão na Terra. Quando perguntado se ele era o Filho de Deus, infalivelmente ele respondia. E imperturbavelmente ele recusou-se a falar quando em presença do curioso e perverso Herodes. Diante de Pilatos ele falou apenas quando achou que Pilatos, ou alguma outra pessoa sincera, poderia ainda ser ajudado a ter um conhecimento melhor da verdade, por meio do que ele diria. Jesus havia ensinado aos seus apóstolos a inutilidade de atirar as suas pérolas aos porcos e, agora, ele ousava praticar o que havia ensinado. A sua conduta nessa época exemplificava a submissão paciente da natureza humana, unida ao silêncio majestoso e à dignidade solene da natureza divina. Ele estava totalmente disposto a conversar com Pilatos sobre qualquer questão relacionada às acusações políticas levantadas contra ele – qualquer questão que ele reconhecesse como pertencendo à jurisdição do governador.

186:2:3 19993 Jesus estava convencido de que a vontade do Pai era de que ele se submetesse à seqüência natural e comum dos acontecimentos humanos, exatamente como qualquer outra criatura mortal tinha de fazer; e por isso recusou-se a empregar até mesmo os seus poderes puramente humanos de eloqüência persuasiva para influenciar a conseqüência das maquinações dos seus semelhantes mortais socialmente míopes e espiritualmente cegos. Embora Jesus tenha vivido e morrido em Urântia, toda a sua carreira humana, do princípio ao fim, foi um espetáculo destinado a influenciar e a instruir todo o universo da sua criação e da sua incessante sustentação.

186:2:4 19994 Esses judeus de pouca visão clamavam indecorosamente pela morte do Mestre, enquanto ele permanecia lá, em um silêncio terrível, olhando a cena da morte de uma nação – o próprio povo do seu pai.

186:2:5 19995 Jesus havia adquirido aquele tipo de caráter humano que conseguiria manter a própria compostura e afirmar a sua dignidade diante mesmo do insulto contínuo e gratuito. Ele não podia ser intimidado. Quando, pela primeira vez, foi atacado pelo servo de Anás, ele tinha apenas sugerido que valeria a pena convocar as testemunhas que poderiam atestar devidamente contra ele.

186:2:6 19996 Do princípio ao fim, no seu chamado julgamento diante de Pilatos, as hostes celestes observando os acontecimentos não puderam abster-se de transmitir ao universo uma descrição da cena de “Pilatos sendo julgado diante de Jesus”.

186:2:7 19997 Quando esteve diante de Caifás, e quando todos os testemunhos perjuros desmoronaram-se, Jesus não hesitou em responder à pergunta do sumo sacerdote, provendo assim com o seu próprio testemunho a base que desejavam para condená-lo por blasfêmia.

186:2:8 19998 O Mestre nunca manifestou o menor interesse pelos esforços bem-intencionados, mas acanhados, de Pilatos, para efetivar a sua libertação. Realmente tinha pena de Pilatos e sinceramente tentou esclarecer a sua mente obscurecida. E ficou totalmente passivo diante de todos os apelos do governador aos judeus para retirar as suas acusações criminais contra si. Durante toda a triste provação, comportou-se com uma dignidade simples e com uma majestade sem ostentação. Ele não quis nem mesmo realçar a insinceridade daqueles que queriam assassiná-lo, quando perguntaram se ele era o “rei dos judeus”. Aceitou essa designação com um mínimo de esforço para retificá-la, pois sabia que, conquanto tivessem escolhido rejeitá-lo, seria ele o último a representar para eles uma liderança nacional real, ainda que em um sentido espiritual.

186:2:9 20001 Jesus disse pouca coisa durante esses julgamentos, mas falou o suficiente para mostrar a todos os mortais a qualidade do caráter humano que pode ser aperfeiçoado por um homem, quando em ligação com Deus, e para revelar a todo o universo o modo pelo qual Deus pode tornar-se manifesto, na vida da criatura, quando tal criatura escolhe verdadeiramente fazer a vontade do Pai, transformando-se assim em um filho ativo do Deus vivo.

186:2:10 20002 O seu amor pelos mortais ignorantes é mostrado amplamente pela sua paciência e pela sua grande presença de espírito diante da zombaria, dos golpes e bofetadas dos soldados grosseiros e dos servos irrefletidos. Ele nem ficou com raiva quando eles vendaram os seus olhos e, ridicularizando-o, esbofetearam o seu rosto, exclamando: “Profetiza, então, quem de nós esbofeteou o teu rosto”.

186:2:11 20003 Pilatos falou mais verdadeiramente do que ele próprio podia supor quando, depois de Jesus ter sido açoitado, apresentou-o à multidão, exclamando: “Contemplai, aqui está o homem!” De fato, o governador romano, cheio de temores, mal sonhava que exatamente naquele momento o universo permanecia atento, presenciando essa cena única do seu amado Soberano, assim submetido à humilhação, aos escárnios e aos golpes dos seus súditos mortais pouco esclarecidos e degradados. E o que Pilatos disse ecoou em todo o Nebadon: “Contemplai Deus, e o homem!” Em todo um universo, milhões incontáveis desde aquele dia continuaram a contemplar aquele homem, enquanto o Deus de Havona, o dirigente supremo do universo dos universos, aceita o homem de Nazaré como a satisfação do ideal para as criaturas mortais desse universo local do tempo e do espaço. Na sua vida sem par, ele nunca deixou de revelar Deus para o homem. Agora, nesses episódios finais da sua carreira mortal e da sua morte subseqüente, ele fazia uma revelação nova e tocante do homem para Deus.

3. A GRANDE CONFIABILIDADE DE DAVI ZEBEDEU


186:3:1 20004 Pouco depois de Jesus ter sido entregue aos soldados romanos, na conclusão da audiência perante Pilatos, um destacamento de guardas do templo apressou-se até o Getsêmane para dispersar ou prender os seguidores do Mestre. Mas, muito antes da chegada deles, esses seguidores tinham já se dispersado. Os apóstolos retiraram-se para os esconderijos designados; os gregos separaram-se e foram para várias casas em Jerusalém; os outros discípulos desapareceram do mesmo modo. Davi Zebedeu acreditava que os inimigos de Jesus voltariam; e, assim, logo ele retirou umas cinco ou seis tendas para a ravina, perto de onde o Mestre tão freqüentemente ia orar e adorar. Ali ele propunha esconder e ao mesmo tempo manter um centro, ou uma estação coordenadora, para o serviço dos seus mensageiros. Davi mal tinha deixado o campo quando os guardas do templo chegaram. Não encontrando ninguém ali, eles contentaram-se em queimar o acampamento e então voltaram apressados para o templo. Ao ouvir o relato deles, o sinédrio ficou satisfeito de que os seguidores de Jesus, tão profundamente amedrontados e subjugados, houvessem fugido, eliminando qualquer perigo de revolta ou tentativa para resgatar Jesus das mãos dos seus executores. Eles podiam afinal respirar aliviadamente, e assim terminaram a reunião, cada homem tomando o seu caminho a fim de preparar-se para a Páscoa.

186:3:2 20005 Tão logo Jesus tinha sido entregue aos soldados romanos por Pilatos, para a crucificação, um mensageiro apressou-se até o Getsêmane para informar a Davi e, em cinco minutos, os corredores estavam a caminho de Betsaida, Pela, Filadélfia, Sidom, Síquem, Hebrom, Damasco e Alexandria. E esses mensageiros levaram as notícias de que Jesus estava para ser crucificado pelos romanos diante da exigência insistente dos dirigentes judeus.

186:3:3 20011 Durante esse dia trágico, até receber o aviso de que o Mestre tinha sido colocado na tumba, Davi enviara mensageiros a cada meia hora com relatórios aos apóstolos, aos gregos e à família terrena de Jesus, reunida na casa de Lázaro na Betânia. Quando os mensageiros partiram com a notícia de que Jesus tinha sido sepultado, Davi dispensou o grupo de corredores locais para a celebração da Páscoa e para o sábado de descanso, em seguida, instruiu-lhes para que se reportassem a ele discretamente no domingo pela manhã, na casa de Nicodemos, onde ele se propunha permanecer escondido por alguns dias com André e Simão Pedro.

186:3:4 20012 Esse Davi Zebedeu, com o seu peculiar modo de pensar, foi o único dos discípulos principais de Jesus que estava inclinado a ter uma visão ao pé da letra sobre a afirmação positiva do Mestre de que ele iria morrer e “ressuscitar ao terceiro dia”. Certa vez, Davi ouvira-o fazer essa predição e, tendo uma mente prática e que via as coisas literalmente, agora se propunha reunir os seus mensageiros no domingo, pela manhã bem cedo, na casa de Nicodemos, de modo tal que eles estivessem à mão para disseminar as novas, no caso de Jesus ressuscitar dos mortos. Davi logo descobriu que nenhum dos seguidores de Jesus estava esperando que ele retornasse tão cedo da sepultura; e por isso ele pouco disse sobre a sua crença e nada revelou sobre a mobilização, em sua força plena, dos mensageiros cedo no domingo, exceto para os corredores que tinham sido despachados na sexta-feira, à tarde, para as cidades distantes e para os centros de crentes.

186:3:5 20013 E, assim, esses seguidores de Jesus, espalhados por toda a Jerusalém e pelos seus arredores, naquela noite, compartilharam da Páscoa e no dia seguinte permaneceram em reclusão.

4. A PREPARAÇÃO PARA A CRUCIFICAÇÃO


186:4:1 20014 Depois que Pilatos lavou as suas mãos diante da multidão, buscando assim escapar da culpa por mandar um homem inocente para ser crucificado, só porque ele temia resistir ao clamor dos dirigentes judeus, ele mandou que o Mestre fosse entregue aos soldados romanos e deu instruções ao capitão deles para que o crucificasse imediatamente. Ao tomarem Jesus ao seu encargo, os soldados conduziram-no de volta ao pátio do pretório e, depois de remover o manto que Herodes tinha colocado sobre ele, eles vestiram-no com as suas próprias roupas. Esses soldados zombaram e escarneceram dele, mas não mais lhe infligiram nenhuma punição física. Jesus agora estava só com esses soldados romanos. Os seus amigos permaneciam escondidos; os seus inimigos tinham seguido o próprio caminho; até mesmo João Zebedeu não se encontrava mais a seu lado.

186:4:2 20015 Pilatos entregou Jesus aos soldados pouco depois das oito horas; e um pouco antes das nove eles partiram para o local da crucificação. Durante esse período de mais de meia hora, Jesus não falou sequer uma palavra. Os assuntos executivos de um grande universo ficaram praticamente em compasso de espera. Gabriel e os seus principais dirigentes de Nebadon encontravam-se reunidos aqui em Urântia, ou então acompanhando de perto os relatórios espaciais dos arcanjos, em um esforço de mantê-los informados sobre o que estava acontecendo ao Filho do Homem em Urântia.

186:4:3 20016 Quando os soldados ficaram prontos para partir com Jesus em direção ao Gólgota, eles começaram a ficar impressionados com a sua compostura incomum, a sua extraordinária dignidade e o seu silêncio sem queixas.

186:4:4 20017 Grande parte da demora em partir com Jesus para o local da crucificação foi devida à decisão de última hora do capitão de levar junto os dois ladrões que tinham sido condenados a morrer; posto que Jesus devia ser crucificado naquela manhã, o capitão romano julgou que esses dois podiam muito bem morrer com ele, em vez de esperar pelo fim das festividades da Páscoa.

186:4:5 20021 Tão logo os ladrões puderam ficar prontos, eles foram conduzidos ao pátio, onde, ao olharem para Jesus, um deles estava vendo-o pela primeira vez, mas o outro estivera, por várias vezes, ouvindo-o falar, não apenas no templo, mas, meses antes, no campo de Pela.

5. A MORTE DE JESUS EM RELAÇÃO À PÁSCOA


186:5:1 20022 Não há nenhuma relação direta entre a morte de Jesus e a Páscoa judaica. Verdade é que o Mestre entregou a sua vida na carne nesse dia, o Dia da Preparação para a Páscoa judaica, e por volta da hora do sacrifício dos cordeiros da Páscoa no templo. Mas a coincidência desses acontecimentos de nenhuma maneira indica que a morte do Filho do Homem na Terra tenha qualquer ligação com o sistema de sacrifícios dos judeus. Jesus era um judeu, e como Filho do Homem ele era um mortal dos reinos. Os acontecimentos já narrados, que conduziram a esse momento da crucificação iminente do Mestre, são suficientes para indicar que a sua morte por volta desse momento foi uma questão natural e manipulada pelos homens.

186:5:2 20023 Foi o homem, e não Deus, que planejou e executou a morte de Jesus na cruz. Verdade é que o Pai recusou-se a interferir na marcha dos acontecimentos humanos em Urântia, mas o Pai no Paraíso não decretou, nem exigiu ou solicitou a morte do seu Filho como foi executada na Terra. É um fato que, de alguma maneira, mais cedo ou mais tarde, Jesus teria tido que se despojar do corpo mortal, da sua encarnação nessa carne, mas ele poderia ter cumprido essa tarefa de inúmeros modos, sem que fosse necessário morrer em uma cruz entre dois ladrões. Tudo isso foi um feito do homem, não de Deus.

186:5:3 20024 Na época do batismo do Mestre, ele já havia concluído a técnica da experiência exigida na Terra e na carne, necessária para completar a sua sétima e última auto-outorga no universo. Nessa mesma época o dever de Jesus na Terra estava já cumprido. Daí em diante toda a vida que ele viveu e mesmo o modo da sua morte foram uma ministração puramente pessoal da sua parte para o bem-estar e para a elevação das suas criaturas mortais neste mundo e em outros mundos.

186:5:4 20025 O evangelho das boas-novas, de que o homem mortal pode, pela fé, tornar-se consciente espiritualmente de que é um filho de Deus, não depende em nada da morte de Jesus. É bem verdade, de fato, que todo esse evangelho do Reino foi imensamente iluminado pela morte do Mestre, no entanto foi muito mais iluminado pela sua vida.

186:5:5 20026 Tudo que o Filho do Homem disse ou fez na Terra embelezou grandemente as doutrinas da filiação a Deus e da fraternidade dos homens, mas essas relações essenciais entre Deus e os homens são inerentes aos fatos universais do amor de Deus pelas suas criaturas e à misericórdia inata dos Filhos divinos. Essas relações tocantes e divinamente belas, entre o homem e o seu Criador, neste mundo e em todos os outros, em todo o universo dos universos, têm existido desde a eternidade; e elas não são, em nenhum sentido, dependentes de tais atuações de auto-outorgas periódicas dos Filhos Criadores de Deus, que assim assumem a natureza e a semelhança das suas inteligências criadas, como uma parte do preço que devem pagar para a aquisição final da soberania ilimitada sobre os seus respectivos universos locais.

186:5:6 20027 O Pai no céu amava os homens mortais na Terra antes da vida e da morte de Jesus, em Urântia, tanto quanto ele ama depois dessa demonstração transcendental de co-participação entre o homem e Deus. Essa transação poderosa da encarnação do Deus de Nebadon, como um homem, em Urântia, não poderia aumentar os atributos do Pai eterno, infinito e universal, mas enriqueceu e iluminou a todos os outros administradores e criaturas do universo de Nebadon. Conquanto não há de ser por isso que o Pai do céu em nada mais nos amaria, é, todavia, em vista dessa autodoação de Michael que todas as outras inteligências celestes nos amam mais. E isso é assim porque Jesus não apenas fez uma revelação de Deus para o homem, mas porque, do mesmo modo, ele fez uma nova revelação do homem aos Deuses e às inteligências celestes do universo dos universos.

186:5:7 20031 Jesus não esteve na iminência de morrer em um sacrifício pelo pecado. Ele não iria expiar a culpa moral inata da raça humana. A humanidade não tem uma culpa racial perante Deus. A culpa é puramente uma questão de pecado pessoal e consciente, a rebelião deliberada contra a vontade do Pai e contra a administração dos seus Filhos.

186:5:8 20032 O pecado e a rebelião nada têm a ver com o plano fundamental das auto-outorgas para os Filhos do Paraíso de Deus, embora pareça a nós que o plano de salvação seja um aspecto provisional do plano das auto-outorgas.

186:5:9 20033 A salvação dada por Deus aos mortais de Urântia teria sido tão efetiva e inequivocamente segura se Jesus não tivesse sido levado à morte pelas mãos cruéis de mortais ignorantes. Se o Mestre tivesse sido favoravelmente recebido pelos mortais da Terra e se tivesse partido de Urântia por meio da renúncia voluntária da sua vida na carne, o fato do amor de Deus e da misericórdia do Filho – o fato da filiação a Deus – não teria, de nenhum modo, sido afetado. Vós mortais sois filhos de Deus, e apenas uma coisa é exigida para que essa verdade seja factual na vossa existência pessoal, e esta é a vossa fé nascida do espírito.

DOCUMENTO 187

A CRUCIFICAÇÃO
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Depois que os dois ladrões tinham sido preparados, sob o comando de um centurião, os soldados partiram para o local da crucificação. O centurião encarregado desses doze soldados era o mesmo capitão que havia conduzido os soldados romanos na noite anterior para prender Jesus no Getsêmane. Era costume dos romanos designar quatro soldados para cada pessoa a ser crucificada. Os dois ladrões foram devidamente açoitados antes de serem levados para a crucificação, mas a Jesus nenhuma punição física mais foi dada; o capitão sem dúvida julgou que ele havia já sido suficientemente açoitado, antes mesmo da sua condenação.

187:0:2 20042 Os dois ladrões crucificados com Jesus eram comparsas de Barrabás e, mais tarde, seriam executados até a morte com o seu líder, se este não tivesse sido libertado pelo perdão de Pilatos para a Páscoa. Jesus foi assim crucificado no lugar de Barrabás.

187:0:3 20043 O que Jesus, agora, está na eminência de realizar, ao submeter-se à morte na cruz, ele o faz segundo a sua própria vontade. Ao predizer essa experiência, ele afirma: “O Pai me ama e me sustenta porque eu estou disposto a entregar a minha própria vida. Mas eu a recuperarei novamente. Ninguém tira a minha vida de mim – eu a entrego por mim mesmo. Tenho autoridade para entregá-la, como tenho autoridade para retomá-la. Recebi esse mandato do meu Pai”.

187:0:4 20044 Era um pouco antes das nove horas dessa manhã quando os soldados saíram com Jesus do pretório, a caminho do Gólgota. Eles foram seguidos por algumas pessoas que secretamente simpatizavam com Jesus, mas a maior parte desse grupo de duzentas ou mais pessoas era de inimigos seus ou de curiosos vadios que meramente desejavam desfrutar do horror de presenciar as crucificações. Apenas uns poucos líderes judeus foram ver Jesus morrer na cruz. Sabendo que ele tinha sido entregue aos soldados romanos, por Pilatos, e que havia sido condenado a morrer, eles ocupavam-se com a sua reunião no templo, onde, por causa de tudo isso, discutiam o que deveria ser feito com os seus seguidores.

1. A CAMINHO DO GÓLGOTA


187:1:1 20045 Antes de deixar o pátio do pretório, os soldados colocaram a viga nos ombros de Jesus. Era costume obrigar o homem condenado a carregar a viga horizontal da cruz até o local da crucificação. Um homem condenado não carregava a cruz inteira, apenas essa travessa menor. As peças mais longas e verticais de madeira para as três cruzes tinham já sido transportadas para o Gólgota e, quando da chegada dos soldados e dos seus prisioneiros, achavam-se já firmemente fincadas no chão.

187:1:2 20046 De acordo com o costume, o capitão liderava a procissão, e devia carregar pequenas plaquetas brancas nas quais encontravam-se escritos a carvão os nomes dos criminosos e a natureza dos crimes pelos quais eles haviam sido condenados. Para os dois ladrões, o centurião tinha letreiros que traziam os seus nomes, sob os quais estava escrita uma palavra: “Bandido”. Era costume, depois que a vítima tinha sido pregada com cravos, à viga horizonal da cruz, e levantada até o seu local na viga vertical, pregar essa tabuleta no alto da cruz, pouco acima da cabeça do criminoso, para que todos os presentes pudessem conhecer o crime pelo qual o homem condenado estava sendo crucificado. A inscrição que o centurião levava para colocar na cruz de Jesus tinha sido escrita pelo próprio Pilatos, em latim, grego e aramaico, e nela se lia: “Jesus de Nazaré – o Rei dos Judeus”.

187:1:3 20051 Algumas das autoridades judaicas, que ainda estavam presentes quando Pilatos terminou essa inscrição, fizeram um protesto vigoroso contra chamar Jesus de “rei dos judeus”. Mas Pilatos lembrou-lhes que tal acusação era uma parte da incriminação que causara a condenação dele. Quando os judeus perceberam que não conseguiam impor-se a Pilatos para fazê-lo mudar de idéia, eles demandaram que pelo menos fosse modificada a inscrição, para constar: “Ele disse:‘eu sou o rei dos judeus’”. Pilatos, contudo, manteve-se inflexível; não alteraria a inscrição. A todas as outras súplicas ele apenas respondeu, “O que escrevi, está escrito”.

187:1:4 20052 Normalmente, o costume era ir até o Gólgota pela estrada mais longa, para que um grande número de pessoas pudesse ver o criminoso condenado, mas nesse dia eles foram pela estrada mais direta, até o portão de Damasco, que conduzia para fora da cidade pelo norte e, seguindo por essa estrada, eles chegaram logo ao Gólgota, o local oficial de crucificação de Jerusalém. Depois do Gólgota ficavam as vilas dos ricos, e do outro lado da estrada encontravam-se os túmulos de muitos judeus abastados.

187:1:5 20053 A crucificação não era uma forma judaica de punição. Tanto os gregos quanto os romanos aprenderam esse método de execução com os fenícios. Mesmo Herodes, com toda a sua crueldade, não recorreu à crucificação. Os romanos nunca crucificaram um cidadão romano; apenas os escravos e os povos subjugados eram submetidos a esse modo desonroso de morte. Durante o sitiamento de Jerusalém, exatamente quarenta anos depois da crucificação de Jesus, todo o Gólgota esteve coberto por milhares e milhares de cruzes nas quais, dia a dia, a flor da raça judaica pereceu. De fato foi uma colheita terrível pelo que se semeou nesse dia.

187:1:6 20054 Enquanto a procissão de morte passava ao longo das ruas estreitas de Jerusalém, muitas das mulheres judias, de coração enternecido, que haviam ouvido as palavras de encorajamento e de compaixão de Jesus, e que conheciam a sua vida de ministério de amor, não conseguiam deixar de chorar quando o viram sendo levado para uma morte tão ignóbil. Enquanto ele passava, muitas dessas mulheres deploravam e lamentavam. E, quando algumas delas ousaram aproximar-se e seguir junto ao seu lado, o Mestre voltou a sua cabeça para elas e disse: “Filhas de Jerusalém, não choreis por mim, choreis antes por vós próprias e pelos vossos filhos. A minha obra está praticamente finalizada – logo irei para o meu Pai –, mas os tempos de tribulações terríveis para Jerusalém estão apenas começando. Vede, estão chegando os dias nos quais vós devereis dizer: Abençoados sejam as mulheres estéreis e os seios que nunca foram sugados por crianças. Nesses dias vós orareis para que as pedras das montanhas caiam sobre vós, para que possais ser libertadas dos terrores que serão as vossas tribulações”.

187:1:7 20055 Essas mulheres de Jerusalém foram verdadeiramente corajosas de manifestar simpatia por Jesus, pois era estritamente contra a lei mostrar sentimentos amistosos por alguém que estava sendo conduzido à crucificação. Ao povaréu era permitido escarnecer, ridicularizar e zombar dos condenados, mas não era permitido que fosse expressa nenhuma simpatia por eles. Embora Jesus apreciasse a manifestação de simpatia, nessa hora escura em que os seus amigos estavam escondidos, ele não queria que essas mulheres de corações bondosos caíssem no desagrado das autoridades por ousar demonstrar compaixão por ele. Mesmo em momentos como esses, Jesus pensava pouco em si próprio, pensava mais nos dias terríveis de tragédia que viriam para Jerusalém e para toda a nação judaica.

187:1:8 20061 O Mestre andava penosamente pelo caminho da crucificação, pois ele estava muito cansado; estava quase exausto. E não tinha tido nem alimento, nem água, desde a Última Ceia na casa de Elias Marcos; nem lhe tinha sido permitido gozar de um momento de sono. Além disso, tinha sido realizado um interrogatório atrás do outro, até a hora da sua condenação, para não mencionar os açoites abusivos, o sofrimento físico e a perda de sangue conseqüente. A tudo isso ainda sobrepunham-se uma extrema angústia mental, a sua aguda tensão espiritual e um sentimento terrível de solidão humana.

187:1:9 20062 Pouco depois de passar pelo portão no caminho de saída da cidade, Jesus cambaleou, carregando a viga da cruz, a sua força física momentaneamente diminuiu e ele caiu sob o peso da sua pesada carga. Os soldados gritaram com ele e chutaram-no, mas ele não conseguia levantar-se. Quando o capitão viu isso, sabendo o que Jesus tinha já suportado, comandou os soldados para que desistissem. E então ordenou a um transeunte, um tal de Simão de Cirene, que tirasse a viga da cruz dos ombros de Jesus e obrigou-o a carregá-la pelo resto do caminho ao Gólgota.

187:1:10 20063 Esse homem, Simão, tinha vindo pela longa estrada de Cirene, no norte da África, para assistir à Páscoa. Ele estava alojado junto com os outros cireneus, no lado de fora dos muros da cidade, e encontrava-se a caminho dos serviços do templo na cidade, quando o capitão romano ordenou que ele carregasse a viga da cruz de Jesus. Simão permaneceu, durante todas as horas da morte do Mestre na cruz, conversando com muitos dos amigos e com os inimigos dele. Depois da ressurreição e antes de deixar Jerusalém, ele tornou-se um crente destemido do evangelho do Reino e, quando retornou para o seu lar, ele conduziu a sua família ao Reino celeste. Os seus dois filhos, Alexandre e Rufus, transformaram-se em instrutores muito eficientes do novo evangelho na África. Mas Simão nunca soube que Jesus, cujo fardo ele havia transportado, e o preceptor judeu, que certa vez tinha feito amizade com o seu filho ferido, eram a mesma pessoa.

187:1:11 20064 Pouco depois das nove horas essa procissão de morte chegou ao Gólgota, e os soldados romanos puseram-se a pregar os cravos dos dois ladrões e do Filho do Homem nas suas respectivas cruzes.

2. A CRUCIFICAÇÃO


187:2:1 20065 Os soldados primeiro amarraram os braços do Mestre com cordas à viga da cruz, e então eles pregaram-no, pelas mãos, à madeira. Depois de içarem essa viga até o poste, e depois de terem-na pregado com segurança na viga vertical da cruz, eles ataram e pregaram os seus pés na madeira, usando um grande cravo para penetrar ambos os pés. O braço vertical tinha um grande apoio, colocado na altura apropriada, que servia como uma espécie de selim para suportar o peso do corpo. A cruz não era alta, e os pés do Mestre ficaram a apenas um metro do solo. Ele estava possibilitado de ouvir, portanto, tudo o que era dito em menosprezo a ele, e podia ver claramente a expressão nos rostos de todos aqueles que tão impensadamente zombavam dele. E também todos os presentes puderam ouvir facilmente, e na íntegra, o que Jesus disse durante essas horas de prolongada tortura e de morte lenta.

187:2:2 20071 Era costume tirar todas as roupas daqueles que deviam ser crucificados, mas, posto que os judeus tinham fortes objeções quanto à exposição pública da forma humana desnuda, os romanos sempre providenciavam uma tanga adequada para todas as pessoas crucificadas em Jerusalém. Por isso, depois que as roupas de Jesus foram tiradas, ele ficou vestido desse modo antes de ter sido colocado na cruz.

187:2:3 20072 Recorria-se à crucificação para infringir uma punição cruel e demorada, a vítima algumas vezes ficando sem morrer por vários dias. Em Jerusalém havia um sentimento considerável de oposição à crucificação, e existia uma sociedade de mulheres judias que sempre enviava uma representante às crucificações, com o propósito de oferecer vinho drogado à vítima para minorar o seu sofrimento. Mas, quando Jesus provou desse vinho narcotizado, mesmo sedento como estava, ele recusou-se a bebê-lo. O Mestre escolheu manter a sua consciência humana até o final. Ele desejava encontrar a morte, ainda que de uma forma cruel e desumana como essa, e conquistá-la pela submissão voluntária à experiência humana plena.

187:2:4 20073 Antes de Jesus ser posto na cruz, os dois ladrões já tinham sido colocados nas suas cruzes, maldizendo todo o tempo e cuspindo nos seus executores. As únicas palavras de Jesus, quando o pregavam na viga da cruz, foram: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem”. Ele não poderia ter intercedido mais misericordiosa e amorosamente pelos seus executores, se tais pensamentos de devoção afetuosa não tivessem sido o motivo principal de toda a sua vida de serviço não egoísta. As idéias, os motivos e as aspirações de uma vida são abertamente revelados em uma crise.

187:2:5 20074 Depois de içarem o Mestre à cruz, o capitão pregou o título acima da sua cabeça, e lia-se em três línguas: “Jesus de Nazaré – Rei dos Judeus”. Os judeus ficaram enfurecidos, supondo ser isso um insulto. Pilatos estava agastado com os modos desrespeitosos deles; ele sentia que havia sido intimidado e humilhado, e escolheu, pois, esse meio para obter uma pequena vingança. Ele poderia ter escrito: “Jesus, um rebelde”. E ele sabia bem como esses judeus de Jerusalém detestavam até o nome de Nazaré, e estava determinado a humilhá-los assim. Sabia que eles também se sentiriam feridos no mais fundo ao verem esse galileu executado ser chamado de “Rei dos Judeus”.

187:2:6 20075 Muitos dos líderes judeus, ao saberem como Pilatos havia tentado escarnecer deles, colocando essa inscrição na cruz de Jesus, acorreram ao Gólgota, mas não ousaram tentar retirar a inscrição, pois os soldados romanos estavam de guarda. Não sendo capazes de remover o rótulo, esses líderes misturaram-se à multidão e fizeram o máximo para incitar a ridicularização e a zombaria, a fim de que ninguém levasse a sério a inscrição.

187:2:7 20076 O apóstolo João junto com Maria, a mãe de Jesus, Rute e Judá chegaram ao local pouco depois que Jesus tinha sido içado até a posição certa na cruz e exatamente quando o capitão estava pregando a inscrição por sobre a cabeça do Mestre. João foi o único dos onze apóstolos a testemunhar a crucificação e, mesmo assim, não esteve presente todo o tempo, pois logo depois de levar a mãe de Jesus até lá, correu de volta a Jerusalém a fim de buscar sua própria mãe e as amigas dela.

187:2:8 20077 Quando Jesus viu a sua mãe, com João e o seu irmão e a sua irmã, ele sorriu, mas não disse nada. Nesse meio tempo os quatro soldados designados para a crucificação do Mestre, como era de costume, tinham dividido entre si as roupas dele, um deles pegou as sandálias, um outro o turbante, outro ficou com o cinto e o quarto com o manto. Restava a túnica, uma veste sem costuras que chegava até os joelhos, e que iria ser cortada em quatro pedaços, mas, quando os soldados perceberam quão inusitada era aquela peça de roupa, decidiram disputá-la na sorte. Jesus via-os de cima enquanto dividiam as suas roupas, e a multidão estúpida zombava dele.

187:2:9 20081 Foi bom que os soldados romanos tivessem apropriado-se das roupas do Mestre. De outro modo, se os seus seguidores houvessem conseguido a posse dessas vestes, eles teriam sido tentados a recorrer à adoração supersticiosa de relíquias. O Mestre desejava que os seus seguidores nada tivessem de material que pudesse associar-se com a sua vida na Terra. Ele queria deixar à humanidade apenas a lembrança de uma vida humana dedicada ao ideal espiritual elevado de ter-se consagrado a fazer a vontade do Pai.

3. OS QUE VIRAM A CRUCIFICAÇÃO


187:3:1 20082 Por volta de nove e meia dessa manhã de sexta-feira, Jesus foi suspendido na cruz. Antes das onze horas, mais de mil pessoas estavam reunidas para assistir ao espetáculo da crucificação do Filho do Homem. Durante essas horas terríveis, as hostes invisíveis de um universo permaneceram em silêncio diante da visão desse extraordinário fenômeno em que o Criador experienciava a morte da criatura; a mais ignóbil, todavia, das mortes de um condenado criminoso.

187:3:2 20083 Perto da cruz, em um momento ou em outro, durante a crucificação, estavam Maria, Rute, Judá, João, Salomé (a mãe de João) e um grupo de mulheres, crentes sinceras, incluindo Maria, a mulher de Clopas e irmã da mãe de Jesus, Maria Madalena e Rebeca, que vivera em Séforis. Esses e outros amigos de Jesus mantiveram-se em silêncio diante da sua grande paciência e fortaleza contemplando os seus sofrimentos intensos.

187:3:3 20084 Muitos dos que passavam por ali balançavam as suas cabeças e proferiam insultos: “Tu que querias destruir o templo e construí-lo novamente em três dias, salva a ti próprio. Se tu és o Filho de Deus, por que não desces da tua cruz?” De um modo semelhante, alguns dos dirigentes dos judeus zombavam dele, dizendo: “Ele salvou os outros, mas a si ele não pode salvar”. Outros comentavam: “Se tu és o rei dos judeus, desce da cruz, e acreditaremos em ti”. E, depois, eles escarneceriam dele mais ainda, dizendo: “Ele confiou em Deus para libertá-lo. Ele até alegava ser o Filho de Deus – olhem para ele, agora –, sendo crucificado entre dois ladrões”. Até os dois ladrões zombavam dele e lançavam censuras sobre ele.

187:3:4 20085 Posto que Jesus não queria responder aos insultos, e por que, às onze horas e meia, aquele dia de preparativos especiais estava já quase pela metade, a maior parte da multidão galhofeira e sarcástica tinha retirado-se dali; menos do que cinqüenta pessoas permaneciam no local. Os soldados agora se preparavam para almoçar e para beber o seu vinho barato e acre, enquanto acomodavam-se para a longa vigília de morte. No momento em que partilhavam o vinho, fizeram ironicamente um brinde a Jesus, dizendo: “Saúde e boa sorte! Ao rei dos judeus”. E ficaram surpreendidos com o olhar tolerante do Mestre diante da ridicularização e zombaria deles.

187:3:5 20086 Quando Jesus os viu comer e beber, olhou para eles e disse: “Tenho sede”. Quando o capitão da guarda ouviu Jesus dizendo “tenho sede”, tirou um pouco do vinho da sua garrafa e, com a tampa esponjosa saturada do líquido, na ponta de uma lança, levou-a a Jesus para que molhasse os seus lábios secos.

187:3:6 20087 Jesus se propusera viver sem recorrer ao seu poder sobrenatural, e do mesmo modo escolheu morrer como um mortal comum, na cruz. Ele vivera como um homem e queria morrer como um homem – fazendo a vontade do Pai.

4. O LADRÃO NA CRUZ


187:4:1 20088 Um dos bandidos recriminou Jesus, dizendo: “Se tu és o Filho de Deus, por que não salva a ti e a nós?” Todavia, quando ele reprovou Jesus, o outro ladrão, que muitas vezes tinha ouvido o Mestre ensinando, disse: “Não tens nenhum medo, nem de Deus? Não vês que estamos sofrendo justamente pelas nossas ações, e que este homem sofre injustamente? Melhor seria buscarmos perdão pelos nossos pecados e salvação para as nossas almas”. Quando Jesus ouviu o ladrão dizendo isso, ele voltou o rosto na direção dele e sorriu com aprovação. Quando o malfeitor viu a face de Jesus voltada para ele, tomou coragem e, assoprando sobre a chama vacilante da própria fé, disse: “Senhor, lembra-te de mim quando chegares no teu Reino”. E então Jesus disse: “Em verdade, em verdade, hoje eu te digo que algum dia tu estarás comigo no Paraíso”.

187:4:2 20091 Em meio às dores da morte física, o Mestre ainda teve tempo para dar ouvidos à confissão de fé do bandido crente. Este ladrão ao tentar alcançar a salvação, encontrou a sua libertação. Muitas vezes, antes, havia sido levado a crer em Jesus, mas só nessas últimas horas de consciência ele voltava-se de todo coração para o ensinamento do Mestre. Quando viu o modo como Jesus encarava a morte na cruz, este ladrão não pôde mais opor resistência à convicção de que este Filho do Homem era de fato o Filho de Deus.

187:4:3 20092 Durante esse episódio da conversão do ladrão, feita por Jesus, e da sua recepção ao Reino, o apóstolo João estava ausente, tendo ido à cidade para trazer a sua mãe e as amigas dela até a cena da crucificação. Lucas posteriormente ouviu essa história contada pelo capitão romano da guarda, depois de convertido.

187:4:4 20093 O apóstolo João contou sobre a crucificação, como dela lembrava-se dois terços de século depois de ocorrida. Os outros registros foram baseados na descrição feita pelo centurião romano em serviço que, por causa do que viu e ouviu, posteriormente passou a crer em Jesus e veio a pertencer à irmandade plena do Reino do céu na Terra.

187:4:5 20094 Esse jovem homem, o ladrão arrependido, havia levado uma vida de violência e de banditismo, conduzido por aqueles que exaltam tal carreira de roubos como um protesto patriótico efetivo contra a opressão política e a injustiça social. E essa espécie de ensinamento, somada ao apelo da aventura, estimulou muitos jovens bem-intencionados a alistarem-se nessas ousadas expedições de saques. Esse jovem chegara a considerar Barrabás um herói. Agora percebia que se tinha equivocado. Ali na cruz e ao seu lado, ele via realmente um grande homem, um verdadeiro herói. Ali estava um herói que inflamava o seu fervor e inspirava-o em suas idéias mais elevadas, de dignidade moral, e vivificava todos os seus ideais de coragem, de virilidade e de bravura. Ao contemplar Jesus, brotou do seu coração um sentimento irresistível de amor, de lealdade e de verdadeira grandeza.

187:4:6 20095 Qualquer outra pessoa, em meio à multidão zombeteira, que tivesse experimentado o nascimento da fé dentro da sua alma e tivesse feito um apelo à misericórdia de Jesus, teria sido recebida com a mesma consideração afetuosa demonstrada para com o ladrão crente.

187:4:7 20096 Pouco depois da promessa do Mestre, de que algum dia eles encontrar-se-iam no Paraíso, feita ao ladrão arrependido, João voltou da cidade, trazendo consigo a sua mãe e um grupo de quase doze mulheres crentes. João retomou o seu lugar perto de Maria, mãe de Jesus, dando-lhe apoio. Ao lado dela estava o seu filho Judá. Quando Jesus contemplou essa cena, já era meio-dia e então disse à sua mãe: “Mulher, eis o teu filho!” E falando a João, ele pronunciou: “Meu filho, eis a tua mãe!” E então ele dirigiu-se a ambos, dizendo: “Desejo que partam deste lugar”. E assim João e Judá saíram do Gólgota levando Maria. João conduziu a mãe de Jesus até o local onde ele hospedava-se em Jerusalém e então se apressou a voltar até a cena da crucificação. Após a Páscoa, Maria voltou para Betsaida, onde viveu na casa de João pelo resto da sua vida natural. Maria não chegou a viver um ano mais, depois da morte de Jesus.

187:4:8 20101 Depois da saída de Maria, as outras mulheres afastaram-se até uma pequena distância e ficaram aguardando até que Jesus expirasse na cruz, e elas continuavam ainda lá quando o corpo do Mestre foi retirado para ser sepultado.

5. A ÚLTIMA HORA NA CRUZ


187:5:1 20102 Embora fosse cedo para acontecer um tal fenômeno nessa estação do ano, pouco depois das doze horas o céu escureceu em razão do aparecimento de fina areia no ar. O povo de Jerusalém sabia que isso significava a vinda de uma dessas tempestades de areia com vento quente, originária do deserto da Arábia. Antes da uma hora da tarde o céu estava tão escuro que escondia o sol, e o resto da multidão apressou-se de volta em direção à cidade. Quando o Mestre entregou a sua vida, pouco depois desse momento, menos do que trinta pessoas estavam presentes ali: apenas os três soldados romanos e um grupo de cerca de quinze crentes. Essas crentes eram todas mulheres, exceto dois deles, Judá, o irmão de Jesus, e João Zebedeu, que voltou à cena um pouco antes do Mestre expirar.

187:5:2 20103 Pouco depois de uma hora da tarde, em meio à escuridão que aumentava e naquela tempestade furiosa de areia, Jesus começou a ter a sua consciência humana em desvanecimento. As suas últimas palavras de misericórdia, de perdão e de conselho tinham sido ditas. O seu último desejo – a respeito de cuidarem da sua mãe – havia sido expresso. Durante essa hora de proximidade com a morte, a mente humana de Jesus recorreu à repetição de muitas passagens das escrituras hebraicas, particularmente os salmos. O último pensamento consciente do Jesus humano esteve ocupado com a repetição, na sua mente, de trechos do Livro dos Salmos, conhecidos agora como o vigésimo, o vigésimo primeiro e o vigésimo segundo salmos. Embora os seus lábios freqüentemente se movessem, ele estava muito fraco para proferir as palavras dessas passagens, que ele sabia de cor tão bem e que passavam pela sua mente. Umas poucas vezes apenas, aqueles que permaneciam ali captavam alguma articulação, tal como: “Eu sei que o Senhor salvará seus ungidos”; “A tua mão encontrará todos os meus inimigos” e “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” Jesus não teve nem por um momento a mais leve sombra de dúvida de que tinha vivido de acordo com a vontade do Pai; e nunca duvidou de que estava agora entregando a sua vida na carne de acordo com a vontade do Pai. Ele não sentia que o Pai o tinha abandonado; estava meramente recitando, para a sua consciência que desvanecia, muitas das escrituras e, entre elas, esse salmo, o vigésimo segundo, que começa por: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” E aconteceu que essa foi uma das três passagens ditas com clareza suficiente para ser ouvida por aqueles que permaneciam perto dele.

187:5:3 20104 O último pedido que o Jesus mortal fez aos seus semelhantes aconteceu por volta de uma e meia da tarde, quando, por uma segunda vez, ele disse: “Tenho sede”. E o mesmo capitão da guarda novamente umedeceu os lábios dele com a mesma tampa esponjosa umedecida com o vinho acre, comumente chamado de vinagre, naqueles dias.

187:5:4 20105 A tempestade de areia tornou-se mais intensa e os céus escureceram-se fortemente. Os soldados e o pequeno grupo de crentes ainda permaneciam ali. Os soldados acocoraram-se perto da cruz, apertando-se para proteger-se da areia cortante. De onde estavam, a mãe de João e os outros observavam a distância, de um certo modo abrigados por uma rocha saliente. Quando o Mestre finalmente deu o seu último suspiro, ao pé da sua cruz estavam presentes João Zebedeu, o seu irmão Judá, a sua irmã Rute, Maria Madalena e Rebeca, que vivera em Séforis.

187:5:5 20111 Era um pouco antes das três da tarde quando Jesus, com uma voz alta gritou: “Está acabado! Pai, nas tuas mãos, encomendo o meu espírito”. E depois de dizer isso, ele inclinou a sua cabeça e abandonou a luta pela vida. Quando o centurião romano viu como Jesus morreu, ele bateu no peito e disse: “Este foi de fato um homem reto; verdadeiramente ele deve ter sido um Filho de Deus”. E desde aquele momento ele começou a crer em Jesus.

187:5:6 20112 Jesus morreu com nobreza – como tinha vivido. Ele admitiu sem reservas a sua realeza e permaneceu senhor da situação durante todo esse trágico dia. Ele caminhou voluntariamente para a sua morte ignominiosa, após ter provido a segurança dos seus apóstolos escolhidos. Ele soube deter com sabedoria a violência encrenqueira de Pedro e providenciou para que João pudesse permanecer junto a ele até o fim da sua existência mortal. Ele revelou a sua verdadeira natureza ao sinédrio assassino e lembrou a Pilatos a fonte da sua autoridade soberana como Filho de Deus. Ele partiu para o Gólgota carregando a viga da sua própria cruz e terminou a sua auto-outorga de amor entregando o seu espírito de aquisição mortal ao Pai do Paraíso. Depois de uma vida assim – e de uma tal morte – o Mestre poderia apenas dizer: “Está acabado”.

187:5:7 20113 Como esse era o Dia da Preparação, tanto para a Páscoa quanto para o sábado, os judeus não queriam esses corpos expostos no Gólgota. E, por isso, foram a Pilatos pedir que as pernas desses três homens fossem quebradas e que fossem despachados, de modo a poderem ser tirados das suas cruzes e jogados no fosso dos criminosos, antes do pôr-do-sol. Ao ouvir esse pedido, Pilatos imediatamente enviou três soldados para quebrar as pernas deles e despachar Jesus e os dois bandidos.

187:5:8 20114 Quando esses soldados chegaram ao Gólgota, conseguiram fazer o que lhes havia sido pedido, porém apenas com os dois ladrões; para grande surpresa deles, Jesus já estava morto. Entretanto, para certificar-se da sua morte, um dos soldados cravou a sua lança do lado esquerdo. Embora fosse comum que as vítimas da crucificação permanecessem vivas na cruz por até dois ou três dias, a opressiva agonia emocional e a aguda angústia espiritual de Jesus levaram a sua vida mortal na carne ao fim em menos de cinco horas e meia.

6. APÓS A CRUCIFICAÇÃO


187:6:1 20115 Em meio à escuridão da tempestade de areia, por volta de três e meia da tarde, Davi Zebedeu enviou o último dos mensageiros levando a notícia da morte do Mestre. O último dos seus corredores, ele o despachou para a casa de Marta e Maria, na Betânia, onde ele supunha que a mãe de Jesus estivesse hospedada com o resto da sua família.

187:6:2 20116 Após a morte do Mestre, João mandou as mulheres, a cargo de Judá, para a casa de Elias Marcos, onde passaram o dia de sábado. O próprio João, que a essa altura era bem conhecido do centurião romano, permaneceu no Gólgota, até que José e Nicodemos chegassem à cena com uma ordem de Pilatos autorizando-os a tomar posse do corpo de Jesus.

187:6:3 20117 Assim terminou um dia de tragédia e de sofrimento para um vasto universo, cujas miríades de inteligências haviam-se estremecido com o espetáculo chocante da crucificação do seu amado Soberano, em sua encarnação humana; elas estavam aturdidas com essa exibição de insensibilidade mortal e de perversidade humana.

DOCUMENTO 188

O PERÍODO DENTRO DA TUMBA
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O corpo mortal de Jesus permaneceu durante um dia e meio no sepulcro de José. O período entre a sua morte na cruz e a sua ressurreição é um capítulo pouco conhecido para nós, da carreira terrena de Michael. Podemos narrar a colocação do Filho do Homem no sepulcro e incluir nesse registro os acontecimentos associados à sua ressurreição, mas não nos é possível proporcionar muita informação de natureza autêntica a respeito do que realmente aconteceu durante esse tempo, de cerca de trinta e seis horas, desde as três horas da tarde da sexta-feira até as três horas da manhã de domingo. Esse intervalo de tempo, na carreira do Mestre, começou pouco antes de ter sido ele descido da cruz pelos soldados romanos. Ele permaneceu suspenso na cruz por uma hora depois da sua morte. E teria sido retirado mais cedo, caso não houvessem protelado o golpe final nos dois ladrões.

188:0:2 20122 Os dirigentes dos judeus haviam planejado atirar o corpo de Jesus nos fossos abertos de Gehena, ao sul da cidade; era costume desfazer-se assim das vítimas da crucificação. Se esse plano tivesse sido cumprido, o corpo do Mestre teria estado exposto às bestas selvagens.

188:0:3 20123 Nesse meio tempo, José de Arimatéia, acompanhado por Nicodemos, foi até Pilatos para pedir que o corpo de Jesus lhes fosse entregue para um sepultamento adequado. Não era incomum que os amigos das pessoas crucificadas oferecessem subornos às autoridades romanas, para conseguirem o privilégio de ter a posse de tais corpos. José foi diante de Pilatos levando uma grande quantia em dinheiro, caso viesse a ser necessário pagar pela permissão de transladar o corpo de Jesus a um sepulcro privativo. Pilatos, contudo, não quis aceitar dinheiro para isso. Quando ouviu o pedido, ele rapidamente assinou a ordem que autorizava José a ir ao Gólgota e imediatamente tomar posse plena e completa do corpo do Mestre. Nesse meio tempo, com a tempestade de areia consideravelmente diminuída, um grupo de judeus, representando o sinédrio, tinha ido até o Gólgota a fim de certificar-se de que o corpo de Jesus, junto com o dos ladrões, havia sido lançado aos fossos públicos abertos.

1. O SEPULTAMENTO DE JESUS


188:1:1 20124 Quando José e Nicodemos chegaram ao Gólgota, eles encontraram os soldados descendo Jesus da cruz, e os representantes do sinédrio estavam por perto para assegurarem-se de que nenhum dos seguidores de Jesus tentaria impedir que o seu corpo fosse para as covas comuns dos criminosos. Quando José apresentou ao centurião a ordem de Pilatos para que o corpo do Mestre lhe fosse entregue, os judeus criaram um tumulto e reclamaram a sua posse. No seu desvario, eles tentaram apossar-se do corpo de modo violento, mas, quando fizeram isso, o centurião ordenou que quatro dos seus soldados, a seu lado, com as suas espadas desembainhadas, ficassem dois de cada lado rente ao corpo do Mestre que jazia no chão. O centurião ordenou aos outros soldados que deixassem de lado os dois ladrões e que afastassem esse grupo de judeus enfurecidos. Quando a ordem foi restabelecida, o centurião leu a permissão de Pilatos para os judeus e, dando um passo para o lado, disse a José: “Este corpo é teu para que faças com ele o que achares conveniente. Eu e os meus soldados estaremos aqui para assegurar que nenhum homem interfira”.

188:1:2 20131 Uma pessoa crucificada não podia ser enterrada em um cemitério judeu; havia uma lei que proibia estritamente esse procedimento. José e Nicodemos conheciam essa lei e, no caminho de saída do Gólgota, decidiram sepultar Jesus no sepulcro novo pertencente à família de José, cavado em rocha maciça e localizado a uma pequena distância ao norte do Gólgota e do outro lado da estrada que levava à Samaria. Ninguém havia sido ainda sepultado nessa tumba, e eles julgaram que seria apropriado que o Mestre descansasse ali. José realmente acreditava que Jesus ressuscitaria dos mortos; Nicodemos, entretanto, duvidava muito disso. Esses antigos membros do sinédrio haviam mantido mais ou menos em segredo a sua fé em Jesus, embora os seus companheiros sinedristas há muito suspeitassem deles, antes mesmo de terem eles retirado-se do conselho. A partir de então eles foram os discípulos mais declarados de Jesus em toda Jerusalém.

188:1:3 20132 Por volta de quatro e meia da tarde a procissão do enterro de Jesus de Nazaré partiu do Gólgota em direção ao túmulo de José, do outro lado da estrada. O corpo, envolto em um lençol de linho, foi levado por quatro homens, seguidos pelas mulheres da Galiléia, que mantiveram-se fiéis na vigília. Os mortais que carregaram o corpo material de Jesus até o sepulcro foram: José, Nicodemos, João e o centurião romano.

188:1:4 20133 Eles carregaram o corpo até dentro da tumba, uma câmara quadrada com cerca de três metros de lado, que prepararam apressadamente para o sepultamento. Na verdade, os judeus não enterravam de fato os seus mortos; eles os embalsamavam. José e Nicodemos haviam trazido consigo grandes quantidades de mirra e de babosa, e agora enrolavam o corpo com bandagens saturadas dessas soluções. Quando terminaram de embalsamá-lo, eles ataram um pano em volta do rosto, envolveram o corpo em um lençol de linho e, com reverência, colocaram-no em uma das plataformas da tumba.

188:1:5 20134 Após colocarem o corpo na tumba, o centurião fez um sinal para que os seus soldados ajudassem a rolar a pedra de fechamento, diante da entrada da tumba. Então alguns dos soldados partiram para Gehena, levando os corpos dos ladrões, enquanto outros voltaram entristecidos para Jerusalém, a fim de observar a festa de Páscoa de acordo com as leis de Moisés.

188:1:6 20135 O sepultamento de Jesus foi feito com uma pressa e com uma precipitação incomuns, porque aquele era o Dia da Preparação e o sábado estava aproximando-se rapidamente. Os homens voltaram apressadamente para a cidade; as mulheres, entretanto, permaneceram perto da tumba até que a noite escura tivesse chegado.

188:1:7 20136 Entretanto, enquanto tudo estava acontecendo, as mulheres permaneciam escondidas perto e à mão, de modo que viam todas as coisas; e observaram onde o Mestre havia sido sepultado. E escondiam-se assim porque não lhes era permitido que participassem junto com os homens de momentos como esses. Essas mulheres achavam que Jesus não tinha sido preparado apropriadamente para o sepultamento e, entre si, elas fizeram um acordo de voltar à casa de José, de descansar no sábado, de preparar especiarias e unções, e de retornar no domingo pela manhã para preparar o corpo do Mestre de modo apropriado para o descanso da morte. As mulheres que ficaram assim perto da tumba nessa sexta-feira à tarde foram: Maria Madalena, Maria, a esposa de Clopas, Marta, uma outra irmã da mãe de Jesus, e Rebeca, de Séforis.

188:1:8 20137 Com exceção de Davi Zebedeu e José de Arimatéia, poucos dos discípulos de Jesus realmente acreditaram ou compreenderam que ele devia ressuscitar da tumba ao terceiro dia.

2. GUARDANDO A TUMBA


188:2:1 20141 Se os seguidores de Jesus estavam desatentos à promessa que ele fizera de ressuscitar da cova, ao terceiro dia, os seus inimigos não estavam. Os sacerdotes principais, os fariseus e os saduceus lembraram de haver recebido relatórios nos quais ele dizia que iria ressuscitar dos mortos.

188:2:2 20142 Nessa sexta-feira à noite, depois da ceia de Páscoa, por volta da meia-noite, um grupo de líderes judeus reuniu-se na casa de Caifás e lá discutiram sobre os seus temores a respeito da afirmação do Mestre, de que iria ressuscitar dos mortos ao terceiro dia. Essa reunião terminou com o compromisso de que um comitê de sinedristas visitaria Pilatos, bem cedo no dia seguinte, levando o pedido oficial do sinédrio para que uma guarda romana fosse postada diante da tumba de Jesus a fim de impedir os seus amigos de forçarem a entrada. O porta-voz desse comitê disse a Pilatos: “Senhor, lembramo-nos de que esse farsante, Jesus de Nazaré, disse, quando ainda estava vivo: ‘Após três dias eu ressuscitarei’. E por isso estamos diante de ti a fim de pedir que emitas as ordens para que o sepulcro fique seguro contra os seus seguidores, ao menos até depois do terceiro dia. Tememos muito que os seus discípulos possam vir e levá-lo consigo à noite, e, então, proclamar ao povo que ele ressuscitou dos mortos. Se permitirmos que isso aconteça, será um erro muito pior do que deixar que ele vivesse”.

188:2:3 20143 Quando Pilatos ouviu esse pedido dos sinedristas, ele disse: “Dar-vos-ei uma guarda de dez soldados. Ide e fazei com que a tumba fique segura”. Eles foram de volta ao templo, recrutaram dez dos próprios guardas, e, então, marcharam para a tumba de José com esses dez guardas judeus e os dez soldados romanos, ainda nesse sábado de manhã, para colocá-los de vigia diante da tumba. Esses homens rolaram uma outra pedra diante da tumba e colocaram o selo de Pilatos nas pedras e em torno delas, para que não fossem mexidas sem o seu conhecimento. E esses vinte homens permaneceram de vigia até a hora da ressurreição, com os judeus levando-lhes comida e bebida.

3. DURANTE O SÁBADO


188:3:1 20144 Durante esse dia de sábado, os discípulos e os apóstolos permaneceram escondidos, enquanto toda Jerusalém falava da morte de Jesus na cruz. Um milhão e meio de judeus, quase, estavam presentes então em Jerusalém nessa ocasião, vindos de todas as partes do império romano e da Mesopotâmia. Era o começo da semana da Páscoa, e todos esses peregrinos que se encontravam na cidade saberiam da ressurreição de Jesus e levariam essa notícia quando voltassem aos seus lares.

188:3:2 20145 Na noite de sábado, bem tarde, João Marcos convocou os onze apóstolos secretamente para virem à casa do seu pai, onde, pouco antes da meia-noite, todos se haviam reunido na mesma sala de cima, onde haviam compartilhado da Última Ceia com o seu Mestre duas noites antes.

188:3:3 20146 Maria, a mãe de Jesus, com Rute e Judá, voltou à Betânia para juntar-se à sua família, antes de escurecer, nessa tarde de sábado. Davi Zebedeu ficou na casa de Nicodemos, onde tinha marcado de reunir-se com os seus mensageiros, no domingo pela manhã, bem cedo. As mulheres da Galiléia, que estiveram preparando especiarias, para de novo embalsamar o corpo de Jesus, permaneciam na casa de José de Arimatéia.

188:3:4 20147 Não estamos plenamente habilitados para explicar o que aconteceu exatamente a Jesus de Nazaré durante esse período de um dia e meio, no qual se supõe que ele tenha estado descansando na tumba de José. Aparentemente ele teve, na cruz, a mesma morte natural que qualquer mortal teria tido em circunstâncias semelhantes. Ouvimo-lo dizendo: “Pai, nas tuas mãos encomendo o meu espírito”. E não entendemos plenamente o significado de tal afirmação, posto que o seu Ajustador do Pensamento há muito fora personalizado e, por isso, mantinha uma existência independente do ser mortal de Jesus. O Ajustador Personalizado do Mestre, de nenhum modo, poderia ser afetado pela sua morte física na cruz. O que Jesus colocou nas mãos do Pai deve ter sido, ali, naquele momento, a contraparte espiritual do trabalho inicial do Ajustador na espiritualização da mente mortal, de modo a proporcionar uma transferência transcrita da experiência humana para os mundos das mansões. Deve ter havido alguma realidade espiritual, na experiência de Jesus, que tenha sido análoga à natureza espiritual, ou alma, dos mortais das esferas, cuja fé é crescente. Entretanto essa é, meramente, a nossa opinião – pois realmente não sabemos o que Jesus encomendou ao seu Pai.

188:3:5 20151 Sabemos que a forma física do Mestre descansou na tumba de José até cerca das três horas na manhã de domingo, mas não estamos plenamente seguros a respeito do status da personalidade de Jesus, durante aquele período de trinta e seis horas. Algumas vezes, chegamos a ousar explicar essas coisas para nós próprios, do modo como a seguir está exposto:

188:3:6 20152 1. A consciência de Criador de Michael deve ter estado ampla e totalmente livre e independente da sua mente mortal ligada à encarnação física.

188:3:7 20153 2. Sabemos que o Ajustador do Pensamento que servira a Jesus esteve presente na Terra durante esse período, pessoalmente encarregado do comando das hostes celestes reunidas.

188:3:8 20154 3. A identidade espiritual adquirida pelo homem de Nazaré, que foi edificada durante a sua vida na carne, primeiro, por meio dos esforços diretos do seu Ajustador do Pensamento e, mais tarde, pelo perfeito ajustamento, feito por ele próprio, entre as necessidades físicas e os quesitos espirituais para a existência mortal ideal, como se tornou concretizada pela sua escolha incessante da vontade do Pai, deve ter sido consignada à custódia do Pai do Paraíso. Se essa realidade espiritual retornou ou não para tornar-se uma parte da personalidade ressuscitada, não sabemos, mas cremos que sim. Todavia, no universo, existem aqueles que sustentam que essa identidade-alma de Jesus esteja agora repousando no “seio do Pai”; para ser, subseqüentemente, liberada para liderar o Corpo de Finalidade de Nebadon, no seu destino ainda não desvelado, ligado aos universos incriados, dos reinos ainda não organizados do espaço exterior.

188:3:9 20155 4. Julgamos que a consciência humana ou mortal de Jesus tenha estado adormecida durante essas trinta e seis horas. Temos motivos para crer que o Jesus humano nada soubesse sobre o que estava ocorrendo no universo, durante esse período. Para a consciência mortal, não há registro de lapso de tempo; a ressurreição da vida seguiu ao sono da morte como que no mesmo instante.

188:3:10 20156 E isso parece ser tudo o que podemos colocar nestes registros a respeito do status de Jesus durante esse período na tumba. Há uma série de fatos correlatos, aos quais podemos fazer alusão, embora dificilmente sejamos competentes para intentar interpretá-los.

188:3:11 20157 No vasto pátio das salas de ressurreição do primeiro mundo das mansões de Satânia, pode ser agora vista uma magnífica estrutura memorial material-moroncial conhecida como o “Memorial de Michael”, agora com o selo de Gabriel. Esse memorial foi criado pouco depois que Michael partiu deste mundo, e ele traz esta inscrição: “Em comemoração à estada mortal de Jesus de Nazaré em Urântia”.

188:3:12 20161 Existem registros comprovando que, durante esse período, o conselho supremo de Salvington, composto de cem membros, realizou uma reunião executiva em Urântia sob a presidência de Gabriel. Também há arquivos mostrando que os Anciães dos Dias de Uversa comunicaram-se com Michael a respeito do status do universo de Nebadon, durante esse tempo.

188:3:13 20162 Sabemos que uma mensagem, pelo menos, foi passada entre Michael e Emanuel, em Salvington, enquanto o corpo do Mestre jazia na tumba.

188:3:14 20163 Há bons motivos para acreditar que alguma personalidade assentou-se na posição de Caligástia, no conselho sistêmico dos Príncipes Planetários, em Jerusém, que se reuniu enquanto o corpo de Jesus permanecia na tumba.

188:3:15 20164 Os arquivos de Edêntia indicam que o Pai da Constelação de Norlatiadeque esteve em Urântia, e que ele recebeu instruções de Michael durante esse tempo na tumba.

188:3:16 20165 E há muitas outras evidências a sugerir que nem toda a personalidade de Jesus esteve adormecida e inconsciente durante esse tempo de morte física aparente.

4. O SIGNIFICADO DA MORTE NA CRUZ


188:4:1 20166 Embora não tenha sido para expiar a culpa racial, que o homem mortal teria, que Jesus passou pela morte na cruz; nem para providenciar nenhuma espécie de aproximação efetiva a um Deus por outro lado ofendido e implacável; e embora o Filho do Homem não tenha oferecido a si próprio em sacrifício para apaziguar a ira de Deus, e abrir o caminho para que o homem pecador obtivesse a salvação; não obstante essas idéias de expiação e de propiciação serem errôneas, no entanto, há significações ligadas a essa morte de Jesus na cruz que não deveriam ser negligenciadas. É um fato que Urântia tornou-se conhecida, em outros planetas habitados vizinhos, como o “Mundo da Cruz”.

188:4:2 20167 Jesus desejava viver uma vida mortal plena na carne, em Urântia. A morte é, comumente, uma parte da vida. A morte é o último ato no drama mortal. Nos vossos bem-intencionados esforços de escapar dos erros supersticiosos de uma interpretação falsa do significado da morte na cruz, deveríeis ser cuidadosos para não cometer o grande erro de deixar de perceber o verdadeiro significado e a importância autêntica da morte do Mestre.

188:4:3 20168 O homem mortal nunca foi propriedade dos arquifarsantes. Jesus não morreu para resgatar o homem das garras dos governantes apóstatas e dos príncipes caídos das esferas. O Pai nos céus nunca idealizou uma injustiça tão crassa quanto condenar uma alma mortal pelas más ações dos seus ancestrais. Nem a morte do Mestre na cruz foi um sacrifício que representasse um esforço para pagar a Deus um débito contraído pela raça da humanidade.

188:4:4 20169 Antes de Jesus ter vivido na Terra, talvez poderíeis justificar-vos por crerdes em um Deus assim, mas não depois de o Mestre ter vivido e morrido entre os seus semelhantes mortais. Moisés ensinou sobre a dignidade e a justiça de um Deus Criador; mas Jesus retratou o amor e a misericórdia do Pai celeste.

188:4:5 201610 A natureza animal – a tendência para as más ações – pode ser hereditária, mas o pecado não é transmitido de pai para filho. O pecado é o ato de rebelião consciente e deliberada, da parte da criatura individual volitiva, contra a vontade do Pai e contra as leis dos Filhos.

188:4:6 20171 Jesus viveu e morreu por um universo inteiro, não apenas pelas raças deste mundo. Se bem que os mortais dos reinos tivessem a salvação, mesmo antes de Jesus ter vivido e morrido em Urântia, contudo é fato que a sua auto-outorga neste mundo iluminou grandemente o caminho da salvação; a sua morte fez muito para deixar definitivamente clara a certeza da sobrevivência dos mortais depois da morte na carne.

188:4:7 20172 Embora muito dificilmente seja adequado falar de Jesus como alguém que se tenha sacrificado, como um resgatador ou um redentor, é totalmente correto referir-se a ele como um salvador. Para sempre ele deixou o caminho da salvação (da sobrevivência) mais claro e certo; ele mostrou de um modo melhor e mais correto o caminho da salvação a todos os mortais de todos os mundos do universo de Nebadon.

188:4:8 20173 Uma vez que tenhais captado a idéia de Deus como um Pai verdadeiro e cheio de amor, conceito este que é o único que Jesus sempre ensinou, deveis imediatamente, e com toda a consistência, abandonar, na totalidade, todas aquelas noções primitivas sobre Deus, como um monarca ofendido, um governante austero e Todo-Poderoso, cujo deleite maior é descobrir a vós, súditos Seus, em más ações, e assegurar que sejais adequadamente punidos, a menos que um ser, quase igual a Ele próprio, voluntarie-se para sofrer por vós, para morrer como um substituto e no vosso lugar. Toda a idéia da redenção e da expiação é incompatível com o conceito de Deus, do modo como foi ensinado e exemplificado por Jesus de Nazaré. O amor infinito de Deus não é secundário a nada na natureza divina.

188:4:9 20174 Todo esse conceito de expiação e de salvação pelo sacrifício tem as suas raízes e a sua base no egoísmo. Jesus ensinou que o serviço ao semelhante é o conceito mais elevado da fraternidade dos crentes do espírito. A salvação deveria ser tida como certa por aqueles que crêem na paternidade de Deus. A principal preocupação do crente não devia ser o desejo egoísta da salvação pessoal, mas, sim, o impulso não egoísta de amar ao semelhante e, conseqüentemente, de servir ao próximo como Jesus amou e serviu aos homens mortais.

188:4:10 20175 Os crentes autênticos não se preocupam tanto com as punições futuras para o pecado. O crente real está preocupado apenas com o seu distanciamento momentâneo de Deus. Verdade é que pais sábios podem castigar os seus filhos, mas a tudo isso eles fazem por amor e com o propósito de corrigir. Eles não punem com raiva, nem castigam por represália.

188:4:11 20176 Ainda que Deus fosse um monarca austero e legalizador de um universo no qual a justiça reinasse suprema, ele certamente não estaria satisfeito com o esquema infantil de substituir um ofensor culpado por um sofredor inocente.

188:4:12 20177 A grande coisa sobre a morte de Jesus, no que se relaciona ao enriquecimento da experiência humana e à ampliação do caminho da salvação, não é o fato da sua morte, mas antes a maneira magnífica e o espírito sem par com o qual ele enfrentou a morte.

188:4:13 20178 Toda essa idéia da redenção na expiação coloca a salvação em um plano de irrealidade; tal conceito é puramente filosófico. A salvação humana é real; é baseada em duas realidades que podem ser captadas pela fé da criatura e daí tornam-se incorporadas à experiência individual humana: o fato da paternidade de Deus e a verdade correlata, da fraternidade dos homens. É verdade, afinal, que sereis “perdoados das vossas dívidas, assim como perdoardes aos vossos devedores”.

5. AS LIÇÕES DA CRUZ


188:5:1 20179 A cruz de Jesus representa a medida plena da devoção suprema do verdadeiro pastor, até mesmo pelos membros indignos do seu rebanho. Ela coloca, para sempre, todas as relações entre Deus e o homem na base da família. Deus é o Pai; o homem é o Seu filho. O amor, o amor de um pai pelo seu filho, torna-se a verdade central nas relações universais de Criador e criatura – não a justiça de um rei que busca a satisfação nos sofrimentos e nas punições do súdito que comete o mal.

188:5:2 20181 A cruz mostra, para sempre, que a atitude de Jesus para com os pecadores não foi nem de condenação nem de indulgência, mas de salvação eterna por amor. Jesus é verdadeiramente um salvador, no sentido de que a sua vida e a sua morte conquistam os homens para a bondade e para a sobrevivência justa. Jesus tanto ama os homens que o seu amor desperta uma resposta de amor no coração humano. O amor é verdadeiramente contagioso e eternamente criativo. A morte de Jesus na cruz exemplifica um amor que é suficientemente forte e divino para perdoar o pecado e para absorver toda a maldade. Jesus revelou para este mundo uma qualidade mais elevada de retidão do que a justiça – a mera diferença técnica entre o certo e o errado. O amor divino não perdoa os erros meramente; ele absorve-os e, de fato, destrói-os. O perdão do amor transcende totalmente o perdão da misericórdia. A misericórdia põe de lado a culpabilidade do mal; o amor, todavia, destrói o pecado para sempre e toda a fraqueza resultante dele. Jesus trouxe um novo método de viver para Urântia. Ele nos ensinou, não a resistir ao mal, mas a encontrar, por intermédio dele, Jesus, uma bondade que destrói eficazmente o mal. O perdão de Jesus não é a condescendência da remissão; é a salvação da condenação. A salvação não menospreza os erros; endireita-os. O verdadeiro amor não faz concessões nem indulgências ao ódio; ele o destrói. O amor de Jesus nunca está satisfeito apenas com o mero perdão. O amor do Mestre implica a reabilitação, na sobrevivência eterna. É perfeitamente correto falar de salvação como redenção, se com isso vos referirdes a essa eterna reabilitação.

188:5:3 20182 Com o poder do seu amor pessoal pelos homens, Jesus pôde romper a influência do pecado e do mal. E com isso ele libertou os homens para escolher melhores modos de viver. Jesus retratou uma libertação do passado que em si mesma promete um triunfo para o futuro. O perdão dado assim provê a salvação. A beleza do amor divino, quando plenamente aceito no coração humano, destrói, para sempre, a fascinação do pecado e o poder do mal.

188:5:4 20183 Os sofrimentos de Jesus não se limitaram à crucificação. Na realidade, Jesus de Nazaré passou mais de vinte e cinco anos na cruz de uma vida mortal intensa e real. O valor real da cruz consiste no fato de que essa foi a expressão suprema e final do seu amor, a completa revelação da sua misericórdia.

188:5:5 20184 Em milhões de mundos habitados, dezenas de trilhões de criaturas em evolução, que podem ter sido tentadas a desistir da luta moral e abandonar a boa luta da fé, lançaram um novo olhar para Jesus na cruz e então continuaram no seu caminho, inspiradas pela visão de Deus entregando a sua vida encarnada em devoção ao serviço não egoísta do homem.

188:5:6 20185 O triunfo da morte na cruz está resumido no espírito da atitude de Jesus para com aqueles que o atacavam. Ele fez da cruz um símbolo eterno do triunfo do amor sobre o ódio, e da vitória da verdade sobre o mal, quando ele orou: “Pai, perdoa-os, pois eles não sabem o que fazem”. Essa devoção do amor contagiou todo um vasto universo; os discípulos contraíram-na do seu Mestre. O primeiro instrutor desse evangelho, que foi chamado a entregar a sua vida nesse serviço, disse, quando o apedrejavam até a morte: “Que esse pecado não recaia sobre eles”.

188:5:7 20186 A cruz exerce um apelo supremo sobre o que há de melhor no homem, porque revela alguém que estava disposto a entregar a sua vida no serviço dos seus semelhantes.

188:5:8 20191 Amor maior que esse nenhum homem pode ter: o de alguém que está disposto a entregar a sua vida pelos seus amigos – Jesus tinha o amor que o fazia disposto a entregar a própria vida pelos seus inimigos, um amor maior do que qualquer amor que até então tinha sido conhecido na Terra.

188:5:9 20192 Em outros mundos, tanto quanto em Urântia, esse espetáculo sublime da morte do Jesus humano numa cruz no Gólgota estimulou as emoções dos mortais, ao mesmo tempo em que despertou a mais elevada devoção dos anjos.

188:5:10 20193 A cruz é aquele símbolo elevado do serviço sagrado, da devoção da vida de uma pessoa ao bem-estar e à salvação do semelhante. A cruz não é o símbolo do sacrifício do Filho de Deus inocente no lugar dos pecadores culpados, feito para apaziguar a ira de um Deus ofendido. A cruz, ao contrário, permanece para sempre, na Terra e em todo um vasto universo, como um símbolo sagrado dos bons doando a si próprios aos maus e com isso salvando-os por meio dessa mesma devoção de amor. A cruz vale verdadeiramente como insígnia da mais alta forma de serviço generoso, da devoção suprema na doação total de uma vida de retidão ao serviço sincero da ministração, até à morte, a morte na cruz. E a própria visão desse grande símbolo da vida de auto-outorga e de entrega de Jesus nos inspira verdadeiramente, a todos nós, a querer fazer a mesma coisa.

188:5:11 20194 Quando os homens e as mulheres, que sabem pensar, contemplam a Jesus oferecendo sua vida na cruz, dificilmente se permitirão queixar-se de novo, diante mesmo dos sofrimentos mais severos da vida, e, muito menos, diante de pequenos embaraços e de mágoas puramente fictícias. A sua vida foi tão gloriosa e a sua morte tão triunfante que ficamos todos seduzidos e com a disposição de compartilhar de ambas. Toda a doação da auto-outorga de Michael exerce um verdadeiro poder de atração, desde os dias da sua juventude até o espetáculo opressivo da sua morte na cruz.

188:5:12 20195 Então, assegurai-vos de que, ao contemplardes a cruz como uma revelação de Deus, não a enxergueis com os olhos do homem primitivo nem do ponto de vista do homem bárbaro mais recente, que consideravam Deus como sendo um Soberano implacável que exerce uma justiça severa e uma aplicação rígida da lei. Assegurai-vos, antes, de verdes na cruz a manifestação final do amor e a devoção de Jesus à missão da sua vida de auto-outorga às raças mortais do seu vasto universo. Vede na morte do Filho do Homem o auge do desdobramento do amor divino do Pai pelos Seus filhos das esferas mortais. A cruz assim retrata a devoção da vontade afetuosa e a concessão da salvação voluntária àqueles que estão dispostos, por ato de vontade, a receber tais dádivas e tal devoção. Nada há na cruz que tivesse sido pedido pelo Pai – apenas tudo aquilo que Jesus deu, com toda a disposição da sua vontade, e aquilo que se recusou a evitar.

188:5:13 20196 Se o homem não pode valorar Jesus de algum outro modo, nem compreender o significado da sua auto-outorga na Terra, ele pode, ao menos, compreender a irmandade companheira dos seus sofrimentos mortais. Nenhum homem jamais pode temer que o Criador desconheça a natureza ou a extensão das aflições temporais próprias dele.

188:5:14 20197 Sabemos que a morte na cruz não existiu para efetivar a reconciliação do homem com Deus, mas sim para estimular o entendimento que o homem pode ter do amor eterno do Pai e da misericórdia sem fim do seu Filho; e para difundir essas verdades universais a um universo inteiro.

DOCUMENTO 189

A RESSURREIÇÃO
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Logo após o enterro de Jesus, na sexta-feira à tarde, o dirigente dos arcanjos de Nebadon, então presente em Urântia, convocou o seu conselho de ressurreição das criaturas de vontade, adormecidas, e começou a fazer considerações sobre uma possível técnica para a reconstituição de Jesus. Esses filhos reunidos do universo local, criaturas de Michael, realizaram isso sob a sua própria responsabilidade; Gabriel não os havia reunido. Por volta da meia-noite tinham chegado à conclusão de que a criatura nada poderia fazer para facilitar a ressurreição do Criador. Eles estavam dispostos a aceitar o conselho de Gabriel, que os instruíra para que, desde que Michael havia “dado a sua vida por seu livre-arbítrio, também teria o poder para retomá-la de novo de acordo com a sua própria determinação”. Pouco depois da suspensão desse conselho de arcanjos, Portadores da Vida e seus vários colaboradores, no trabalho de reabilitação da criatura e da criação moroncial, o Ajustador Personalizado de Jesus, estando no comando pessoal das hostes celestes, então reunidas em Urântia, naquela vigília ansiosa, disse estas palavras a todos:

189:0:2 20202 “Nenhum de vós nada pode fazer para ajudar o vosso Criador-pai, no seu retorno à vida. Como um mortal deste reino, ele experimentou o falecimento dos mortais; como Soberano de um universo ele ainda vive. O que vós observais é o trânsito mortal de Jesus de Nazaré, da vida na carne para a vida na morôncia. O trânsito espiritual desse Jesus foi completado no momento em que eu me separei da sua personalidade e tornei-me o vosso diretor temporário. O vosso Criador-pai escolheu passar pela experiência inteira das suas criaturas mortais, do nascimento nos mundos materiais, da morte natural e da ressurreição da morôncia até o status de uma existência espiritual verdadeira. Estais observando uma certa fase dessa experiência, mas não podeis participar dela. As coisas que normalmente fazeis pela criatura, não podeis fazer pelo Criador. Um Filho Criador tem, dentro de si próprio, o poder de outorgar-se, à semelhança de quaisquer dos seus filhos criados; ele tem dentro de si o poder para dispor da sua vida observável e para retomá-la novamente; e ele tem esse poder pela via do comando direto do Pai do Paraíso, e eu sei do que estou falando. ”

189:0:3 20203 Quando ouviram o Ajustador Personalizado dizendo isso, todos eles assumiram uma atitude de expectativa ansiosa, desde Gabriel até o mais humilde querubim. Eles viram o corpo mortal de Jesus no sepulcro; eles detectaram evidências de atividades do seu amado Soberano, no universo; e, não compreendendo tais fenômenos, esperaram pacientemente pelo que sobreviria.

1. O TRÂNSITO MORONCIAL


189:1:1 20204 Às duas e quarenta e cinco do domingo de manhã, a comissão de encarnação do Paraíso, formada por sete personalidades não identificadas do Paraíso, chegou ao local e imediatamente desmembrou-se em torno do sepulcro. Às duas horas e cinqüenta minutos, vibrações intensas de atividades materiais e moronciais combinadas começaram a emanar do novo sepulcro de José, e às três horas e dois minutos, nessa manhã de domingo, 9 de abril do ano 30 d. C. , a forma moroncial ressuscitada e a personalidade de Jesus de Nazaré saíram do sepulcro.

189:1:2 20211 Depois de ressuscitado, Jesus emergiu do sepulcro; o corpo de carne no qual ele tinha vivido e trabalhado na Terra por quase trinta e seis anos ainda jazia lá no nicho do sepulcro, envolto no lençol de linho, exatamente como tinha sido colocado, para descansar, por José e pelos seus amigos, na sexta-feira à tarde. Nem a pedra diante da entrada do sepulcro havia sido movida para nada; o selo de Pilatos permanecia intacto ainda; os soldados ainda estavam de guarda. Os guardiães do templo tinham estado em vigia contínua; a guarda romana tinha sido mudada à meia-noite. Nenhum desses vigias suspeitava de que o objeto da sua vigia tinha levantado-se em uma nova forma mais elevada de existência; e de que o corpo que eles estavam guardando agora não era senão um envelope exterior descartado que não tinha mais nenhuma ligação com a personalidade moroncial liberada e ressuscitada de Jesus.

189:1:3 20212 A humanidade é lenta para perceber que, em tudo o que é pessoal, a matéria é o esqueleto da morôncia, e que ambos são uma sombra refletida da realidade espiritual que perdura. Quanto tempo terá de passar até que vós considereis o tempo como a imagem em movimento da eternidade e o espaço como uma sombra fugaz das realidades do Paraíso?

189:1:4 20213 Até onde podemos julgar, nenhuma criatura deste universo, nem personalidade alguma de outro universo, nada teve a ver com essa ressurreição moroncial de Jesus de Nazaré. Na sexta-feira ele entregou a sua vida como um mortal deste reino; no domingo de manhã, ele retomou-a, de novo, como um ser moroncial do sistema de Satânia em Norlatiadeque. Há muito sobre a ressurreição de Jesus que nós não compreendemos. Mas sabemos que ocorreu como declaramos e por volta da hora indicada. Podemos também registrar que todos os fenômenos conhecidos, relacionados com esse trânsito mortal, ou ressurreição moroncial, aconteceram exatamente ali no novo sepulcro de José, onde o material mortal de Jesus permanecia envolto em trajes mortuários.

189:1:5 20214 Sabemos que nenhuma criatura do universo local participou desse despertar moroncial. Percebemos as sete personalidades do Paraíso em torno do sepulcro, mas não as vimos fazer nada para o despertar do Mestre. Tão logo Jesus apareceu ao lado de Gabriel, bem acima do sepulcro, as sete personalidades do Paraíso indicaram sobre a sua intenção de partir imediatamente para Uversa.

189:1:6 20215 Esclareçamos definitivamente o conceito da ressurreição de Jesus fazendo as seguintes afirmações:

189:1:7 20216 1. O seu corpo material ou físico não era uma parte da personalidade ressuscitada. Quando Jesus saiu do sepulcro, o seu corpo de carne permaneceu intacto no sepulcro. Ele emergiu da tumba sem mover as pedras diante da entrada e sem romper os selos de Pilatos.

189:1:8 20217 2. Ele não emergiu do sepulcro como um espírito, nem como Michael de Nebadon; ele não apareceu na forma do Soberano Criador, tal como fora antes da sua encarnação à semelhança da carne mortal em Urântia.

189:1:9 20218 3. Ele saiu do sepulcro de José na própria semelhança das personalidades moronciais dos que, como os seres moronciais ascendentes ressuscitados, emergem das salas de ressurreição do primeiro mundo das mansões deste sistema local de Satânia. E a presença do monumento em memória de Michael, no centro do imenso pátio das salas de ressurreição de mansônia número um, leva-nos a conjecturar que a ressurreição do Mestre em Urântia foi de algum modo promovida a partir daquele que é o primeiro mundo das mansões do sistema.

189:1:10 20221 O primeiro ato de Jesus, depois de levantar do sepulcro, foi o de saudar Gabriel e instruí-lo a continuar na função de executivo dos assuntos do universo entregue a Emanuel e, então, ele solicitou ao dirigente dos Melquisedeques que transmitisse a sua saudação fraternal a Emanuel. Pediu ao Altíssimo de Edêntia pela autorização dos Anciães dos Dias para o seu trânsito mortal; e, voltando-se para os grupos moronciais, dos sete mundos das mansões, aqui reunidos para saudar e dar as boas-vindas ao seu Criador, como criatura da sua própria ordem, Jesus disse as primeiras palavras da sua carreira pós-mortal. Disse o Jesus moroncial: “Tendo terminado a minha vida na carne, eu permanecerei aqui por um breve período na forma transitória para que eu possa conhecer melhor, e mais completamente, a vida das minhas criaturas ascendentes e para que em seguida eu revele a vontade do meu Pai no Paraíso”.

189:1:11 20222 Depois de ter falado, Jesus sinalizou para o Ajustador Personalizado, e para todas as inteligências do universo, que estavam reunidas em Urântia para presenciar a ressurreição, a fim de que fossem imediatamente despachadas para cumprir os seus respectivos compromissos no universo.

189:1:12 20223 Jesus começava agora os contatos de nível moroncial, sendo apresentado, como criatura, aos requisitos da vida que ele tinha escolhido viver por um curto tempo em Urântia. Essa iniciação ao mundo moroncial necessitou de um período de mais de uma hora do tempo terreno e foi por duas vezes interrompida pelo seu desejo de comunicar-se com as suas antigas companheiras na carne, quando elas vieram de Jerusalém para espiar com admiração dentro do sepulcro vazio e descobrir o que consideraram uma evidência da sua ressurreição.

189:1:13 20224 E agora se completa o trânsito mortal de Jesus – a ressurreição moroncial do Filho do Homem. E começou a experiência transitória do Mestre, como personalidade a meio caminho entre o material e o espiritual. E a tudo isso ele fez por meio do poder inerente a si próprio; nenhuma personalidade prestou-lhe qualquer assistência. Agora ele vive como Jesus moroncial e na medida em que começa essa vida moroncial, o corpo material da sua carne está lá, exatamente como antes, na tumba. Os soldados continuavam de guarda e o selo do governador nas pedras ainda não havia sido rompido.

2. O CORPO MATERIAL DE JESUS


189:2:1 20225 Às três e dez, enquanto o Jesus ressuscitado se confraternizava com as personalidades moronciais reunidas, vindas dos sete mundos das mansões de Satânia, o dirigente dos arcanjos – os anjos da ressurreição – aproximou-se de Gabriel e pediu-lhe o corpo mortal de Jesus. E o dirigente dos arcanjos disse: “Podemos não participar da ressurreição moroncial da experiência de auto-outorga de Michael, nosso soberano, mas gostaríamos de ter os seus restos mortais sob a nossa custódia para dissolução imediata. Não nos propomos empregar a nossa técnica de desmaterialização; meramente queremos invocar o processo do tempo acelerado. Suficiente é que tenhamos visto já o Soberano viver e morrer em Urântia; as hostes dos céus seriam poupadas da recordação de ter de suportar a visão da degradação lenta da forma humana do Criador e Sustentador de um universo. Em nome das inteligências celestes de todo o Nebadon, peço um mandato dando a mim a custódia do corpo mortal de Jesus de Nazaré e o poder de procedermos à sua dissolução imediata”.

189:2:2 20231 E depois de conferenciarem, Gabriel e o decano Altíssimo de Edêntia, foi dada ao porta-voz dos arcanjos das hostes celestes a permissão para que ele dispusesse dos restos físicos de Jesus como ele julgasse conveniente.

189:2:3 20232 Depois de concedido esse pedido, ao dirigente dos arcanjos, ele convocou para ajudá-lo muitos dos seus companheiros, junto com uma numerosa hoste de representantes de todas as ordens de personalidades celestes e então, com o auxílio das criaturas intermediárias de Urântia, eles deram prosseguimento à tomada de posse do corpo físico de Jesus. Esse corpo de morte era uma criação puramente material; era físico e real; não poderia ser removido do sepulcro, como havia sido removida a forma moroncial da ressurreição, escapando do selo sepulcral. Com a ajuda de algumas personalidades moronciais auxiliares, a forma moroncial, em um momento, pode se fazer como espírito, de um modo tal que se torne indiferente à matéria comum, enquanto em um outro momento ela pode tornar-se discernível e contatável para os seres materiais, como os mortais deste reino.

189:2:4 20233 Enquanto eles se preparavam para remover o corpo de Jesus do sepulcro, antes de dispor dele de um modo preparatório para dar-lhe uma dissolução quase instantânea condigna e de modo reverente, foi designado às criaturas secundárias de Urântia que rolassem as pedras afastando-as da entrada da tumba. A maior dessas duas pedras era circular e imensa, muito semelhante a uma roda de moinho e se movia em um sulco marcado na rocha, de um modo tal que podia ser rolada para frente e para trás, a fim de abrir ou fechar a tumba. Quando os guardas judeus vigilantes e os soldados romanos, sob a luz escassa na madrugada, viram essa imensa pedra começar a rolar saindo da entrada do sepulcro, aparentemente por si mesma – sem quaisquer meios visíveis a explicar esse movimento –, eles foram tomados pelo medo e pelo pânico e correram, abandonando depressa o local. Os judeus correram para as suas casas, voltando depois para reportar o acontecido ao seu capitão no templo. Os romanos correram para a fortaleza de Antônia e contaram o que tinham visto ao centurião, tão logo ele chegou ao seu posto.

189:2:5 20234 Os líderes judeus começaram uma sórdida operação para livrar-se supostamente de Jesus oferecendo subornos ao traidor Judas, e agora, ao defrontar-se com essa situação embaraçosa, em vez de pensar em punir os guardas que desertaram seu posto, recorreram ao expediente de subornar esses guardas e os soldados romanos. Pagaram a cada um desses vinte homens uma quantia em dinheiro e instruíram-nos a dizer a todos: “Enquanto dormíamos durante a noite, os seus discípulos precipitaram-se sobre nós e levaram o corpo”. E os líderes judeus fizeram promessas solenes aos soldados de defendê-los perante Pilatos, caso chegasse ao conhecimento do governador que eles tinham aceitado um suborno.

189:2:6 20235 A crença cristã na ressurreição de Jesus tem sido baseada no fato do “sepulcro vazio”. Foi real e verdadeiramente um fato que o sepulcro estivesse vazio, mas essa não é a verdade da ressurreição. A tumba estava real e verdadeiramente vazia quando os primeiros crentes chegaram, mas esse fato, associado ao da indubitável ressurreição do Mestre, levou à formulação de uma crença que não era verdadeira: o ensinamento de que o corpo material e mortal de Jesus levantou-se da cova. A verdade relacionada às realidades espirituais e aos valores eternos nem sempre pode ser deduzida de uma combinação de fatos aparentemente reais. Ainda que os fatos individualmente possam ser materialmente verdadeiros, não significa que a conjunção de um agrupamento de fatos deva necessariamente conduzir a conclusões espiritualmente verdadeiras.

189:2:7 20236 O sepulcro de José estava vazio, não porque o corpo de Jesus tenha se recuperado ou ressuscitado, mas porque as hostes celestes tiveram o seu pedido concedido, o pedido de dar a ele uma dissolução especial e única, um retorno do “pó ao pó”, sem a intervenção das demoras do tempo e sem a operação dos processos ordinários e visíveis da decadência mortal e da decomposição material.

189:2:8 20241 Os restos mortais de Jesus passaram pelo mesmo processo natural de desintegração dos seus elementos que caracteriza todos os corpos humanos na Terra, exceto que, do ponto de vista do tempo, esse modo natural de dissolução foi violentamente acelerado, apressado chegando até mesmo a ser quase instantâneo.

189:2:9 20242 As verdadeiras evidências da ressurreição de Michael são espirituais, pela sua natureza, ainda que esse ensinamento seja corroborado pelo testemunho de muitos mortais do reino, que se encontraram, reconheceram e comungaram com o Mestre ressuscitado na forma moroncial. Ele tornou-se parte da experiência pessoal de quase mil seres humanos, antes de finalmente deixar Urântia.

3. A RESSURREIÇÃO DISPENSACIONAL


189:3:1 20243 Pouco depois das quatro e meia, na manhã desse domingo, Gabriel convocou os arcanjos até perto de si e preparou-se para inaugurar a ressurreição geral da terminação da dispensação Adâmica em Urântia. Quando a vasta hoste de serafins e de querubins, envolvida nesse grande acontecimento, estava organizada em formação apropriada, o Michael moroncial apareceu diante de Gabriel, dizendo: “Do mesmo modo que o meu Pai tem vida em Si próprio, ele a deu ao Filho para que tivesse vida em si próprio. Embora eu não tenha ainda reassumido plenamente o exercício da jurisdição do universo, essa limitação auto-imposta de nenhum modo restringe o outorgamento da vida aos meus filhos adormecidos; que comece o chamado da lista de ressurreição do planeta”.

189:3:2 20244 O circuito dos arcanjos, então, operou pela primeira vez a partir de Urântia. Gabriel e a hoste de arcanjos transportaram-se ao local da polaridade espiritual do planeta; e, quando Gabriel deu o sinal, foi transmitida ao primeiro mundo das mansões do sistema a voz de Gabriel, dizendo: “Por mandato de Michael, que levantem os mortos de uma dispensação de Urântia!” Então todos os sobreviventes das raças humanas de Urântia, que tinham estado adormecidos desde os dias de Adão, e que não tinham ainda ido a julgamento, apareceram nas salas de ressurreição de mansônia, prontos para a sua investidura moroncial. E em um instante de tempo os serafins e os seus colaboradores estavam prontos para partir em direção aos mundos das mansões. Normalmente esses guardiães seráficos, anteriormente designados à custódia grupal desses mortais sobreviventes, teriam estado presentes no momento do seu despertar nas salas de ressurreição de mansônia, mas eles estavam neste mundo, nesse momento, por causa da necessidade aqui, da presença de Gabriel, relacionada com a ressurreição moroncial de Jesus.

189:3:3 20245 Não obstante haver inúmeros indivíduos que, tendo guardiães seráficos pessoais e tendo atingido o nível requerido de progresso da personalidade espiritual, foram para mansônia durante as idades posteriores ao tempo de Adão e Eva e, ainda que tenha havido muitas ressurreições especiais e milenares dos filhos de Urântia, esta era a terceira lista de chamada planetária, ou seja, aquela que completava a lista de ressurreições dispensacionais. A primeira ocorreu na época da chegada do Príncipe Planetário; a segunda, durante a época de Adão; e esta, a terceira, que assinalava a ressurreição moroncial, o trânsito mortal, de Jesus de Nazaré.

189:3:4 20246 Quando o sinal da ressurreição planetária foi recebido pelo dirigente dos arcanjos, o Ajustador Personalizado do Filho do Homem renunciou à sua autoridade sobre as hostes celestes reunidas em Urântia, transferindo todos esses filhos do universo local, de volta para as jurisdições dos seus respectivos comandantes. E depois de fazer isso ele partiu para Salvington a fim de registrar com Emanuel o fim completo do trânsito mortal de Michael. E ele foi seguido imediatamente por toda a hoste celeste que não estava requisitada para servir em Urântia. Mas Gabriel permaneceu em Urântia com o Jesus moroncial.

189:3:5 20251 E é esse o relato dos acontecimentos da ressurreição de Jesus, segundo foram vistos por aqueles que os presenciaram, como realmente ocorreram, livres das limitações da visão humana, parcial e restrita.

4. A DESCOBERTA DA TUMBA VAZIA


189:4:1 20252 Nesse domingo de madrugada, tendo em vista que nos aproximávamos da hora da ressurreição de Jesus, deve ser relembrado que os dez apóstolos estavam hospedados na casa de Elias e Maria Marcos, onde estavam dormindo na sala de cima, descansando nos mesmos leitos em que se reclinaram no período da Última Ceia com o seu Mestre. Nesse domingo, pela manhã, eles estavam todos reunidos lá, exceto Tomé. Tendo estado com eles por uns poucos minutos, quando se reuniram no sábado até tarde da noite, era demais para Tomé ver os apóstolos e, mais ainda, suportar o pensamento do que tinha acontecido a Jesus. Ele deu uma olhada nos seus companheiros e imediatamente deixou a sala, indo para a casa de Simão, em Betfagé, onde contava poder afundar-se no abismo da sua tristeza a sós. Todos os apóstolos sofriam, nem tanto pela dúvida e desespero quanto pelo temor, a pena e a vergonha.

189:4:2 20253 Na casa de Nicodemos reuniram-se, com Davi Zebedeu e José de Arimatéia, entre doze e quinze dos discípulos de Jesus, dos mais proeminentes de Jerusalém. Na casa de José de Arimatéia estavam entre quinze e vinte das principais mulheres crentes. E essas mulheres encontravam-se na casa de José, sozinhas, e, como elas tinham estado juntas durante as horas do dia de sábado e na noite seguinte, elas permaneciam sem saber da guarda militar de vigia no sepulcro; e tampouco sabiam que uma segunda pedra tinha sido rolada na frente da tumba; nem que ambas as pedras tinham sido colocadas sob o selo de Pilatos.

189:4:3 20254 Um pouco antes das três horas nesse domingo de manhã, quando os primeiros sinais do dia começaram a surgir no lado leste, cinco daquelas mulheres partiram para a tumba de Jesus. Elas tinham preparado uma boa quantidade de loções balsâmicas especiais, e levavam consigo muitas bandagens de linho. O seu propósito era preparar melhor o corpo de Jesus, com os ungüentos fúnebres, envolvendo-o cuidadosamente com novas bandagens.

189:4:4 20255 As mulheres que saíram para a missão de ungir o corpo de Jesus foram as seguintes: Maria Madalena, Maria, a mãe dos gêmeos Alfeus, Salomé, a mãe dos irmãos Zebedeus, Joana, a mulher de Cuza, e Susana, a filha de Ezra de Alexandria.

189:4:5 20256 Eram cerca de três e meia quando as cinco mulheres, carregadas com os seus ungüentos, chegaram diante da tumba vazia. Enquanto passavam pelo portão de Damasco, elas encontraram inúmeros soldados correndo para a cidade, relativamente tomados de pânico, e isso as levou a parar por uns poucos minutos; mas, vendo que nada mais acontecia, retomaram a sua caminhada.

189:4:6 20257 E ficaram muito surpresas ao ver a pedra rolada para fora da entrada do sepulcro pois até, enquanto estavam vindo, entre si, disseram: “Quem nos ajudará a rolar a pedra?” Então elas puseram a sua carga no chão e começaram a olhar, umas para as outras, temerosas e em grande espanto. Enquanto estavam ali de pé, atônitas, tremendo de medo, Maria Madalena aventurou-se a contornar a pedra menor e ousou entrar no sepulcro aberto. Essa tumba de José ficava no seu jardim, nas colinas, do lado leste da estrada, e também dava face para o lado leste. A essa hora, apenas a luz da madrugada de um novo dia permitia a Maria ver o local onde o corpo do Mestre tinha sido colocado e discernir que ele não mais estava ali. No recesso da pedra, onde haviam deitado Jesus, Maria viu apenas o pano dobrado, em que a sua cabeça esteve repousando e as bandagens, com as quais tinha sido envolto, intactas e dispostas sobre a pedra, tal qual estiveram antes de as hostes celestes terem levado o corpo. O lençol que o cobria encontrava-se aos pés do nicho fúnebre.

189:4:7 20261 Depois de permanecer na entrada da tumba por uns poucos momentos (ela não havia visto nada claramente, tão logo entrara na tumba), Maria viu que o corpo de Jesus não se encontrava lá e que no seu lugar estavam apenas alguns tecidos fúnebres, e ela soltou um grito de alarme e angústia. Todas a mulheres ficaram extremamente nervosas; tinham estado nos seus limites de tensão desde que encontraram os soldados em pânico na entrada da cidade e, quando Maria soltou o grito de angústia, elas ficaram aterrorizadas e saíram dali mais do que depressa. E não pararam até que tivessem corrido por todo o caminho, até o portão de Damasco. Nesse momento Joana deu por si, de que elas tinham abandonado Maria; e reuniu as suas companheiras e voltaram ao sepulcro.

189:4:8 20262 À medida que se aproximaram do sepulcro, a amedrontada Madalena, que ficara ainda mais aterrorizada quando não encontrou suas irmãs esperando por ela, ao sair da tumba, agora corria para elas, exclamando agitadamente: “Ele não está lá – eles levaram-no embora!” E ela as conduziu de volta ao sepulcro, e todas entraram e viram que estava vazio.

189:4:9 20263 Todas as cinco mulheres então se sentaram na pedra próxima da entrada para conversarem sobre a situação. Ainda não lhes havia ocorrido que Jesus tinha ressuscitado. Elas estiveram sozinhas todo o sábado, e conjecturaram que o corpo tivesse sido removido para outro local de descanso. Mas, quando elas refletiram sobre tal solução para o seu dilema, não conseguiram explicação para o fato de os tecidos funerais estarem tão arrumados; como poderia o corpo ter sido removido, já que as próprias bandagens nas quais estivera envolto tinham sido deixadas na mesma posição e aparentemente intactas na prateleira mortuária?

189:4:10 20264 Enquanto essas mulheres estavam sentadas ali durante aqueles momentos da madrugada desse novo dia, elas viram a um canto um vulto estranho, calado e imóvel. Por um momento ficaram de novo amedrontadas, mas Maria Madalena, correndo até lá e dirigindo-se a ele como se fosse o jardineiro, disse: “Para onde tu levaste o Mestre? Onde o puseram? Dize-nos para que possamos ir lá buscá-lo”. Quando o estranho não respondeu a Maria, ela começou a chorar. Então Jesus falou a elas, dizendo: “A quem procurais?” Maria disse: “Procuramos por Jesus, que foi colocado para descansar na tumba de José, mas ele se foi. Sabes para onde o levaram?” Então Jesus disse: “E esse Jesus não vos disse, na Galiléia mesmo, que ele morreria, mas que ele se levantaria novamente?” Essas palavras assombraram as mulheres, mas o Mestre estava tão mudado que elas ainda não o reconheciam, de costas que estava para a escassa luz. E enquanto elas pesavam as suas palavras, ele dirigiu-se a Madalena com uma voz familiar, dizendo: “Maria”. E quando então ouviu essa palavra, dita com uma compaixão tão bem conhecida e em saudação afetuosa, ela soube que era a voz do Mestre, e correu para ajoelhar-se aos seus pés, ao mesmo tempo em que exclamava: “Meu Senhor, e meu Mestre!” E todas as outras mulheres reconheceram que era o Mestre que estava diante delas na forma glorificada, e elas depressa se ajoelharam diante dele.

189:4:11 20271 Esses olhos humanos tornaram-se capazes de ver a forma moroncial de Jesus mediante a ministração especial dos transformadores e das criaturas intermediárias em conjunção com algumas das personalidades moronciais que então acompanhavam Jesus.

189:4:12 20272 Quando Maria tentou abraçar os seus pés, Jesus disse: “Não me toques, Maria, pois eu não sou mais como tu me conheceste na carne. Nesta forma eu permanecerei convosco, por uma temporada, antes de ascender ao Pai. Mas agora ide, todas vós, e dizei aos meus apóstolos – e a Pedro – que eu ressuscitei, e que vós já falastes comigo”.

189:4:13 20273 Após recuperarem-se do choque de um tal assombro, essas mulheres apressaram-se de volta à cidade e para a casa de Elias Marcos, onde contaram aos dez apóstolos tudo o que lhes tinha acontecido; mas os apóstolos não estavam inclinados a acreditar nelas. A princípio pensaram que as mulheres tinham tido uma visão, mas quando Maria Madalena repetiu as palavras com as quais Jesus tinha dirigido-se a elas, e quando Pedro ouviu o seu nome ser pronunciado, ele correu para fora da sala de cima, seguido por João, em grande pressa para chegar ao sepulcro e ver essas coisas por si próprio.

189:4:14 20274 As mulheres repetiram a história daquela conversa com Jesus para os outros apóstolos, mas eles não acreditariam; e eles não iriam ver por si próprios, como o tinham feito Pedro e João.

5. PEDRO E JOÃO NA TUMBA


189:5:1 20275 Enquanto os dois apóstolos corriam para o Gólgota até a tumba de José, os pensamentos de Pedro alternavam-se entre o medo e a esperança; ele temia encontrar o Mestre, mas a sua esperança era estimulada pela história de que Jesus tinha mandado uma palavra especial para ele. E ele achava-se quase persuadido de que Jesus estava realmente vivo; relembrou-se da sua promessa de que iria ressuscitar no terceiro dia. Por mais estranho que possa parecer, essa promessa não havia sido lembrada por Pedro, desde a crucificação até este momento, em que ele corria para o norte, atravessando Jerusalém. À medida que João apressadamente saía da cidade, um estranho êxtase feito de júbilo e de esperança inundava a sua alma. Ele estava quase convencido de que aquelas mulheres realmente viram o Mestre ressuscitado.

189:5:2 20276 João, sendo mais jovem do que Pedro, ultrapassou-o e chegou primeiro à tumba. João permaneceu junto à entrada, olhando para dentro da tumba, que estava exatamente como Maria a havia descrito. Logo Simão Pedro chegou correndo e, entrando, viu a mesma tumba vazia com as mortalhas arrumadas de um modo peculiar. Quando Pedro saiu, João entrou e igualmente viu tudo por si próprio, e então eles sentaram-se na pedra para refletir sobre o que significava tudo o que eles haviam visto e ouvido. E enquanto estavam sentados lá, reviraram nas suas mentes por completo o que tinha sido dito a eles sobre Jesus, mas não conseguiam perceber claramente o que havia acontecido.

189:5:3 20277 Pedro inicialmente sugeriu que a tumba tinha sido saqueada, que inimigos haviam roubado o corpo, talvez tivessem subornado os guardas. Mas João ponderou que a tumba não teria sido deixada tão arrumada se o corpo tivesse sido roubado, e também levantou a questão de como as bandagens foram deixadas para trás, e tão intactas aparentemente. E de novo ambos voltaram à tumba para examinar mais de perto as mortalhas. Quando saíam da tumba pela segunda vez, eles encontraram Maria Madalena que retornara e chorava diante da entrada. Maria tinha ido até os apóstolos acreditando que Jesus tinha levantado-se da cova, mas quando todos eles recusaram-se a acreditar no que ela contou, ficou deprimida e em desespero. Queria voltar para junto da tumba, onde ela pensou ter ouvido a voz familiar de Jesus.

189:5:4 20278 Enquanto Maria permanecia ali, depois de Pedro e João terem ido embora, de novo o Mestre apareceu para ela, dizendo: “Não fiques em dúvida; tem a coragem de crer no que viste e ouviste. Volta aos meus apóstolos e de novo dize a eles que eu ressuscitei, que eu aparecerei para eles e que logo irei ter com eles na Galiléia como prometi”.

189:5:5 20281 Maria apressou-se a voltar à casa de Marcos e disse aos apóstolos que novamente havia ela conversado com Jesus, mas eles não acreditariam nela. E quando Pedro e João voltaram, eles pararam de ridicularizá-la e ficaram cheios de temor e de apreensão.

DOCUMENTO 190

AS APARIÇÕES MORONCIAIS DE JESUS
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O Jesus ressuscitado prepara-se agora para passar um curto período de tempo em Urântia, com o propósito de experienciar a carreira moroncial ascendente de um mortal dos reinos. Ainda que esse período de vida moroncial esteja para ser passado no mundo da sua encarnação mortal, contudo, sob todos os pontos de vista, será a contraparte da experiência dos mortais de Satânia que passam pela vida moroncial progressiva dos sete mundos das mansões de Jerusém.

190:0:2 20292 Todo esse poder que é inerente a Jesus – o dom da vida –, e que o capacitou a ressuscitar dos mortos, é a dádiva mesma da vida eterna que ele outorga aos crentes dos reinos e que assegura, ainda agora, a sua ressurreição dos vínculos da morte natural.

190:0:3 20293 Os mortais dos reinos levantar-se-ão na manhã da ressurreição com o mesmo tipo de corpo de transição, ou moroncial, que Jesus teve quando se levantou da tumba naquela manhã de domingo. Esses corpos não têm sangue circulando, e tais seres não se servem de alimentos materiais comuns; contudo, essas formas moronciais são reais. Quando os vários crentes viram Jesus, depois da sua ressurreição, eles realmente o viram; eles não foram vítimas enganadas de visões ou alucinações.

190:0:4 20294 Uma fé inquebrantável na ressurreição de Jesus foi a característica cardinal da fé em todas as ramificações do ensinamento inicial do evangelho. Em Jerusalém, na Alexandria, na Antióquia e na Filadélfia, todos os educadores do evangelho unem-se nesta fé implícita na ressurreição do Mestre.

190:0:5 20295 Ao examinarmos o papel proeminente que Maria Madalena teve ao proclamar a ressurreição do Mestre, deveria ficar registrado que Maria era a porta-voz principal para o corpo de mulheres, como Pedro o foi para os apóstolos. Maria não era uma dirigente das mulheres que trabalhavam para o Reino, mas era a sua instrutora principal e sua porta-voz para o público. Maria tornara-se uma mulher muito circunspecta, de tal modo que a sua ousadia de falar com um homem, a quem ela considerou como sendo o jardineiro de José, apenas indica o quanto estava aterrorizada por ter encontrado a tumba vazia. Foram a profundidade e a agonia do seu amor, a plenitude da sua devoção, que a levaram a esquecer, por um momento, o a convenção que impunha a proibição à mulher judia de abordar um homem estranho.

1. OS ARAUTOS DA RESSURREIÇÃO


190:1:1 20296 Os apóstolos não queriam que Jesus os deixasse; e por isso não deram importância a todas as suas afirmações sobre a própria morte, nem às suas promessas de ressuscitar. Eles não estavam esperando a ressurreição tal como ela veio e recusaram-se a acreditar nela até confrontarem-se compulsivamente com a evidência irrefutável e com a prova absoluta das suas próprias experiências.

190:1:2 20301 Quando os apóstolos se recusaram a crer naquilo que as cinco mulheres relataram quanto a terem visto e falado com Jesus, elas se retiraram: Maria Madalena voltou ao sepulcro e as outras foram de volta para a casa de José, onde estas últimas contaram a sua experiência para a filha dele e para as outras mulheres. E as mulheres acreditavam naquilo que diziam. Pouco depois das seis horas, a filha de José de Arimatéia e as quatro mulheres que haviam visto Jesus seguiram para a casa de Nicodemos, e ali relataram todos esses acontecimentos a José, a Nicodemos, a Davi Zebedeu e aos outros homens reunidos lá. Nicodemos e os outros duvidaram da sua história, duvidaram de que Jesus tivesse ressuscitado dos mortos; e conjecturavam se os judeus não teriam removido o corpo. José e Davi estavam dispostos a acreditar no que ouviram, tanto que se apressaram a ir para fora, inspecionar a tumba, e encontraram tudo exatamente como as mulheres haviam descrito. E eles foram os últimos a ver o sepulcro assim, pois o sumo sacerdote enviou o capitão dos guardas do templo para a tumba, às sete horas e trinta minutos, a fim de retirar de lá as mortalhas. O capitão enrolou-as todas no lençol de linho e atirou-as dentro de um precipício próximo.

190:1:3 20302 Do sepulcro, Davi e José foram imediatamente para a casa de Elias Marcos, onde se mantiveram em conferência com os dez apóstolos na sala de cima. Apenas João Zebedeu estava disposto a acreditar, ainda que vagamente, que Jesus tinha ressuscitado dos mortos. Pedro acreditou a princípio, mas, quando não encontrou o Mestre, caiu em uma dúvida profunda. Eles estavam todos dispostos a acreditar que os judeus haviam retirado o corpo de lá. Davi não argumentaria com eles, mas, quando saiu, ele disse: “Vós sois os apóstolos e devíeis compreender essas coisas. Não discutirei convosco; entretanto, agora volto para a casa de Nicodemos, onde marquei de me reunir com os mensageiros esta manhã, e, quando eles estiverem reunidos, eu os enviarei para a sua última missão, como arautos da ressurreição do Mestre. Eu ouvi o Mestre dizer que, depois de morrer, ele iria ressuscitar ao terceiro dia, e eu creio nele”. E assim falando aos deprimidos e abandonados embaixadores do Reino, este chefe autoconvocado da comunicação e da informação despediu-se dos apóstolos. Quando saía da sala de cima, ele deixou a bolsa de Judas, contendo todos os fundos apostólicos, no colo de Mateus Levi.

190:1:4 20303 Eram aproximadamente nove horas e trinta minutos quando o último dos vinte e seis mensageiros de Davi chegou à casa de Nicodemos. Davi prontamente os reuniu no espaçoso pátio e disse-lhes:

190:1:5 20304 “Homens e irmãos, durante todo esse tempo, vós tendes servido a mim, de acordo com um juramento feito a mim e a vós próprios, uns aos outros, e eu vos conclamo a testemunhar que eu nunca antes coloquei informação falsa nas vossas mãos. Estou a ponto de enviar-vos para a vossa última missão como mensageiros voluntários do Reino e, assim fazendo, eu vos libero dos vossos juramentos e dissolvo o corpo de mensageiros. Homens, eu declaro a vós que terminamos nosso trabalho. O Mestre não mais tem necessidade de mensageiros mortais; ele ressuscitou dos mortos. Ele nos disse, antes de o terem prendido, que iria morrer e que levantaria de novo ao terceiro dia. Eu vi a tumba – está vazia. Conversei com Maria Madalena e quatro outras mulheres, que falaram com Jesus. Agora eu desfaço este grupo, me despeço de vós e vos envio para as vossas respectivas tarefas, e a mensagem que devereis levar aos crentes é: ‘Jesus ressuscitou dos mortos; a tumba está vazia’”.

190:1:6 20305 A maioria daqueles que estavam presentes trataram de persuadir Davi a não fazer isso. Mas não conseguiram influenciá-lo. Então procuraram dissuadir os mensageiros, mas eles não deram ouvidos às palavras de dúvida. E assim, pouco antes das dez horas da manhã desse domingo, esses vinte e seis corredores saíram como os primeiros arautos do poderoso fato verdadeiro do Jesus ressuscitado. E eles começaram essa missão como haviam iniciado tantas outras, cumprindo o seu juramento feito junto a Davi Zebedeu e entre eles próprios. Esses homens tinham grande confiança em Davi. Eles partiram para essa tarefa sem ao menos parar para falar com aqueles que haviam visto Jesus; pois eles acreditaram o suficiente na palavra de Davi. A maioria deles confiava no que Davi lhes havia dito e, mesmo aqueles que duvidavam, de algum modo, levaram a mensagem com a mesma certeza e com a mesma rapidez.

190:1:7 20311 Os apóstolos, do corpo espiritual do Reino, nesse dia, estavam reunidos na sala de cima, onde manifestavam temor e expressavam dúvidas, enquanto aqueles leigos, representando a primeira tentativa de socialização do evangelho do Mestre, pela irmandade dos homens, sob as ordens do seu destemido e eficiente líder, corriam para proclamar o ressuscitado Salvador de um mundo e de um universo. E eles engajaram-se nesse serviço memorável, antes mesmo que os seus representantes escolhidos se mostrassem dispostos a acreditar na sua palavra ou a aceitar as provas das testemunhas.

190:1:8 20312 Esses vinte e seis mensageiros foram despachados para a casa de Lázaro, na Betânia, e para todos os centros dos crentes, de Berseba, no sul de Damasco, e a Sidom, ao norte; e de Filadélfia, no leste, até Alexandria, no oeste.

190:1:9 20313 Quando Davi deixou os seus irmãos, foi até a casa de José em busca da sua mãe, e então os dois seguiram até Betânia para juntarem-se à família de Jesus, que os aguardava. Davi hospedou-se com Marta e Maria, na Betânia, até elas desfazerem-se das suas posses terrenas e depois ele as acompanhou em sua viagem para unirem-se ao seu irmão, Lázaro, na Filadélfia.

190:1:10 20314 Cerca de uma semana depois, João Zebedeu levou Maria, a mãe de Jesus, até a sua casa em Betsaida. Tiago, o irmão mais velho de Jesus, permaneceu com a sua família em Jerusalém. Rute ficou na Betânia com as irmãs de Lázaro. O restante da família de Jesus voltou para a Galiléia. Davi Zebedeu saiu da Betânia com Marta e Maria, indo para a Filadélfia, no princípio de junho, no dia seguinte ao do seu casamento com Rute, a irmã mais nova de Jesus.

2. AS APARIÇÕES DE JESUS NA BETÂNIA


190:2:1 20315 Da época da ressurreição moroncial até a hora da sua ascensão espiritual às alturas, Jesus fez dezenove aparições isoladas, na forma visível, para os seus crentes na Terra. Ele não apareceu para os seus inimigos, nem para aqueles que não poderiam fazer um uso espiritual da sua manifestação na forma visível. A sua primeira aparição foi para as cinco mulheres no sepulcro; a sua segunda, para Maria Madalena, também no sepulcro.

190:2:2 20316 A terceira aparição ocorreu por volta do meio-dia nesse domingo, na Betânia. Pouco depois do meio-dia, Tiago, o irmão mais velho de Jesus, estava no jardim de Lázaro, de pé, diante da tumba vazia do irmão ressuscitado de Marta e Maria, repassando na sua mente as novidades trazidas uma hora atrás, pelo mensageiro de Davi. Tiago inclinara-se sempre a acreditar na missão do seu irmão mais velho na Terra, mas havia muito tempo que perdera o contato com o trabalho de Jesus e, assim, tinha deixado dominar-se por graves incertezas sobre as últimas afirmações dos apóstolos, de que Jesus era o Messias. Toda a família estava estupefata e bastante confundida pelas notícias trazidas pelo mensageiro. E, quando Tiago ainda encontrava-se diante da tumba vazia de Lázaro, Maria Madalena chegou e, sobressaltada, relatou à família as suas experiências daquela madrugada no sepulcro de José. Antes que ela tivesse terminado, chegaram Davi Zebedeu e a sua mãe. Rute acreditou, é claro, nesse relato, e também Judá, depois de conversar com Davi e Salomé.

190:2:3 20321 Nesse meio tempo, quando procuraram por Tiago, e antes de encontrarem-no, enquanto permanecia ali no jardim próximo da tumba, Tiago apercebeu-se de uma presença próxima, como se alguém tivesse tocado no seu ombro; e, quando ele voltou-se para olhar, pôde ver a aparição gradual de uma estranha forma ao seu lado. Ele ficou por demais atônito para falar e amedrontado demais para fugir. E então a estranha forma expressou-se com estas palavras: “Tiago, vim com a finalidade de chamar-te para o serviço do Reino. Dá as tuas mãos sinceramente aos teus irmãos e segue os meus passos". Quando Tiago ouviu o seu nome sendo pronunciado, ele soube que era o seu irmão mais velho, Jesus, que se dirigia a ele. Todos eles apresentavam dificuldades, maiores ou menores, para reconhecer a forma moroncial do Mestre, mas poucos encontravam dificuldade para reconhecer a sua voz e identificar, de algum outro modo, a sua encantadora personalidade, uma vez que ele tivesse começado a comunicar-se com eles.

190:2:4 20322 Quando Tiago percebeu que Jesus estava dirigindo-se a ele, quase caiu de joelhos, exclamando: “Meu pai e meu irmão”; mas Jesus solicitou-lhe que ficasse de pé enquanto ele lhe falava. E caminharam pelo jardim conversando por quase três minutos; falaram sobre as experiências de tempos atrás e anteciparam os acontecimentos do futuro próximo. À medida que se aproximaram da casa, Jesus disse: “Adeus, Tiago, até quando eu os vir a todos juntos”.

190:2:5 20323 Tiago correu para a casa, enquanto eles o procuravam em Betfage, exclamando: “Acabo de ver Jesus e de falar com ele, até mesmo conversei com ele. Não está morto; ele ressuscitou! E desapareceu diante de mim, dizendo: ‘Adeus, até quando eu os vir a todos juntos’”. Mal acabou de falar e Judá chegou e, então, em consideração a este, ele contou novamente a experiência que teve com Jesus no jardim. E todos começaram a acreditar na ressurreição de Jesus. Tiago agora anunciava que não iria voltar para a Galiléia, e Davi exclamou: “Ele está sendo visto não apenas por mulheres exaltadas; mesmo os homens de corações fortes começaram a vê-lo. Espero, eu próprio, vê-lo também”.

190:2:6 20324 E Davi não teve de esperar muito, pois a quarta aparição de Jesus para o reconhecimento mortal ocorreu pouco antes das duas horas, nessa mesma casa de Marta e Maria, quando ele surgiu, bem visivelmente, diante da sua família terrena e dos seus amigos, ao todo vinte pessoas. O Mestre apareceu na porta aberta, dos fundos, dizendo: “A paz esteja convosco. Saudações para aqueles que estiveram próximos de mim na carne e irmandade para os meus irmãos e irmãs no Reino do céu. Como pudestes duvidar? Por que titubeastes por tanto tempo, até escolher seguir de todo coração a luz da verdade? Vinde, pois, todos vós à irmandade do Espírito da Verdade, no Reino do Pai”. Quando eles começaram a recobrar-se do choque inicial e do próprio espanto, e iam aproximar-se dele como que para abraçá-lo, ele desapareceu das suas vistas.

190:2:7 20325 Todos queriam correr para a cidade e contar aos apóstolos hesitantes sobre o que havia acontecido, mas Tiago os conteve. Apenas a Maria Madalena foi permitido voltar à casa de José. Tiago proibiu que eles colocassem abertamente de público que essa visita moroncial havia acontecido, por causa de algumas coisas que Jesus tinha dito a ele enquanto conversavam no jardim. Mas Tiago nunca revelou mais nada sobre a conversa com o Mestre ressuscitado nesse dia na casa de Lázaro, na Betânia.

3. NA CASA DE JOSÉ


190:3:1 20331 A quinta manifestação moroncial de Jesus, para o reconhecimento aos olhos dos mortais, aconteceu na presença de umas vinte e cinco mulheres crentes reunidas na casa de José de Arimatéia, por volta das quatro horas e quinze minutos, nessa mesma tarde de domingo. Maria Madalena havia retornado à casa de José, apenas alguns minutos antes dessa aparição. Tiago, o irmão de Jesus, havia solicitado que nada fosse dito aos apóstolos a respeito da aparição do Mestre na Betânia. Ele não tinha pedido a Maria que se abstivesse de contar o ocorrido às suas irmãs crentes. Assim, depois de ter pedido segredo a todas as mulheres, Maria relatou o que havia acontecido enquanto ela esteve com a família de Jesus na Betânia. E, estando ela no meio mesmo desse relato emocionante, um silêncio súbito e solene caiu sobre elas; e elas contemplaram bem próximo de si a forma totalmente visível de Jesus ressuscitado. Ele saudou-as dizendo: “A paz esteja convosco. Na comunhão do Reino não haverá judeus nem gentios, nem ricos nem pobres, nem livres ou escravos, nem homem ou mulher. Vós também sois chamadas a tornar pública a boa-nova da liberdade da humanidade por meio do evangelho da filiação a Deus no Reino do céu. Ide a todo o mundo proclamar este evangelho e confirmá-lo para os crentes na fé. E enquanto fazeis isso, não vos esqueçais de ministrar aos doentes e fortalecer os que estão fracos e cheios de temor. E eu estarei sempre convosco, até mesmo nos confins da Terra”. E depois de falar assim, ele desapareceu da vista delas, enquanto as mulheres caíram com os seus rostos no chão e adorando-o em silêncio.

190:3:2 20332 Das cinco aparições moronciais de Jesus ocorridas até esse momento, Maria Madalena tinha testemunhado quatro.

190:3:3 20333 Como resultado do envio dos mensageiros durante o meio da tarde e em conseqüência do vazamento inconsciente de indicações a respeito dessa aparição de Jesus na casa de José, um rumor chegou até os dirigentes judeus, durante o anoitecer, sobre o que estava sendo relatado em toda a cidade, de que Jesus tinha ressuscitado e de que muitas pessoas estavam declarando tê-lo visto. Os sinedristas encontravam-se profundamente perturbados com esses rumores. Depois de uma rápida conversa com Anás, Caifás convocou uma reunião do sinédrio para as oito horas, naquela noite. Foi nessa reunião que tomou-se a decisão de expulsar das sinagogas qualquer pessoa que fizesse menção à ressurreição de Jesus. Foi sugerido mesmo que qualquer um, que afirmasse tê-lo visto, deveria ser condenado à morte; essa proposta, contudo, não chegou a ser votada, já que a reunião dispersou-se em uma confusão que beirava ao pânico. Eles tinham ousado pensar que haviam acabado com Jesus. Mas estavam a ponto de descobrir que as dificuldades reais que teriam com o homem de Nazaré estavam apenas começando.

4. APARIÇÃO AOS GREGOS


190:4:1 20334 Por volta das quatro horas e trinta minutos, na casa de um certo Flávio, o Mestre fez a sua sexta aparição moroncial para cerca de quarenta gregos crentes reunidos lá. Enquanto estavam empenhados em discutir os relatos da ressurreição do Mestre, ele manifestou-se em meio a eles, a despeito das portas estarem fechadas com ferrolhos seguros, e dirigindo-se a eles, ele disse: “A paz esteja convosco. Embora o Filho do Homem tenha aparecido na Terra entre os judeus, ele veio para ministrar a todos os homens. No Reino do meu Pai não haverá nem judeus nem gentios; vós sereis todos irmãos – os filhos de Deus. Ide, portanto, a todo o mundo, proclamar este evangelho da salvação, como vós o recebestes dos embaixadores do Reino, e eu os aceitarei em comunhão, na irmandade dos filhos, pela fé na verdade do Pai”. E tendo falado-lhes assim, ele os deixou; e não mais o viram. Passaram toda a noite dentro da casa; estavam por demais tomados por um temor respeitoso e por um medo espantado, e não se aventuraram a sair. E nenhum desses gregos dormiu naquela noite; permaneceram acordados, falando sobre essas coisas e esperando que o Mestre pudesse novamente vir a estar com eles. Nesse grupo achavam-se muitos dos gregos que tinham estado no Getsêmane, na ocasião em que os soldados prenderam Jesus, e Judas o traiu com um beijo.

190:4:2 20341 Os rumores da ressurreição de Jesus e os relatos a respeito das muitas aparições para os seus seguidores estão espalhando-se rapidamente, e toda a cidade encontra-se tomada por uma forte emoção. O Mestre apareceu já para a sua família, para as mulheres e para os gregos e, dentro em pouco, ele manifestar-se-á em meio aos apóstolos. O sinédrio logo irá começar a considerar os novos problemas que, de um modo tão repentino se precipitaram sobre os governantes judeus. Jesus pensa muito nos seus apóstolos, mas deseja que sejam deixados a sós por algumas horas mais, em reflexão solene e em considerações profundas, antes de estar com eles.

5. A CAMINHADA COM OS DOIS IRMÃOS


190:5:1 20342 Em Emaús, cerca de onze quilômetros a oeste de Jerusalém, viviam dois irmãos pastores, que tinham passado a semana da Páscoa em Jerusalém assistindo aos sacrifícios, aos cerimoniais e às festas. Cleofas, o mais velho, acreditava parcialmente em Jesus; ao menos tinha sido expulso da sinagoga. O seu irmão, Jacó, não era crente, se bem que tivesse ficado bastante perplexo com o que tinha ouvido sobre os ensinamentos e trabalhos do Mestre.

190:5:2 20343 Nesse domingo, à tarde, a uns cinco quilômetros para fora de Jerusalém e a uns poucos minutos antes das cinco horas, enquanto esses dois irmãos caminhavam na estrada para Emaús, eles falavam com grande convicção sobre Jesus, dos seus ensinamentos, do seu trabalho e, mais especialmente, a respeito dos rumores de que a sua tumba estava vazia e de que algumas das mulheres tinham conversado com ele. Cleofas estava a meio caminho de acreditar nesses relatos, mas Jacó insistia em que tudo era provavelmente uma fraude. Enquanto eles conversavam e debatiam desse modo, a caminho de casa, a manifestação moroncial de Jesus, a sua sétima aparição, veio junto a eles à medida que caminhavam. Cleofas muitas vezes ouvira Jesus ensinar e comera com ele nas casas dos crentes de Jerusalém em várias ocasiões. Mas ele não reconheceu o Mestre nem mesmo quando ele falou abertamente com eles.

190:5:3 20344 Depois de caminhar um pequeno trecho do caminho com eles, Jesus perguntou: “Quais palavras estavam sendo trocadas entre vós, com tamanha convicção, quando eu cheguei?” E quando Jesus falou, eles pararam e olharam para ele com uma triste surpresa. Disse Cleofas: “Como pode ser que estejas em Jerusalém e não saibas das coisas que aconteceram recentemente?” Então o Mestre perguntou: “Que coisas?” Cleofas replicou: “Se não sabes sobre essas questões, és o único em Jerusalém que não ouviu os rumores a respeito de Jesus de Nazaré, que era um profeta de palavra e de feitos poderosos perante Deus e todo o povo. Os sacerdotes principais e os nossos governantes entregaram-no aos romanos e exigiram que o crucificassem. E, assim, muitos de nós estivemos esperando que ele fosse aquele que iria libertar Israel do jugo dos gentios. Mas isso não é tudo. É já o terceiro dia, desde que ele foi crucificado, e algumas mulheres nos deixaram estupefatos ao declarar que, muito cedo nesta manhã, elas foram ao seu sepulcro e o encontraram vazio. E essas mesmas mulheres insistiram que conversaram com esse homem; elas sustentam que ele ressuscitou dos mortos. E quando as mulheres relataram isso aos homens, dois dos seus apóstolos correram à tumba e, do mesmo modo, encontraram-no vazio” – e aqui Jacó interrompeu o seu irmão para dizer: “Mas eles não viram Jesus”.

190:5:4 20351 Enquanto caminhavam juntos, Jesus disse a eles: “Quão vagarosos sois para compreender a verdade! Quando me dizeis que as vossas discussões são sobre os ensinamentos e o trabalho desse homem, então, eu posso esclarecê-los, já que estou mais do que familiarizado com esses ensinamentos. Não vos lembrais de que esse Jesus sempre ensinava que o seu Reino não era deste mundo e que todos os homens, sendo filhos de Deus, deveriam encontrar a libertação e a liberdade no júbilo espiritual, na comunhão e na irmandade do serviço amoroso a este novo Reino da verdade do amor do Pai dos céus? Não lembrais como esse Filho do Homem proclamou a salvação de Deus, a todos os homens, ministrando aos doentes e aflitos e libertando aqueles que estavam nas correntes do medo e escravizados pelo mal? Não sabeis que esse homem de Nazaré disse aos seus discípulos que deveria ir a Jerusalém, que seria entregue aos seus inimigos, que o levariam à morte, e que se levantaria no terceiro dia? Não vos foi dito tudo isso? E nunca lestes nas escrituras a respeito desse dia da salvação para os judeus e para os gentios, onde se diz que nele todas as famílias da Terra serão abençoadas; que ele ouvirá o apelo dos necessitados e salvará as almas dos pobres que o procuram; que todas as nações o chamarão de abençoado? Que esse Libertador será como a sombra de uma grande rocha em uma terra exaurida. Que ele alimentará o rebanho como um verdadeiro pastor, tomando as ovelhas nos seus braços e carregando-as ternamente no seu colo. Que ele abrirá os olhos dos cegos espirituais e trará os prisioneiros do desespero à liberdade plena e à luz; que todos aqueles que se encontram na escuridão verão a grande luz da salvação eterna. Que ele medicará os corações partidos, proclamará a liberdade aos aprisionados do pecado, e abrirá a prisão para aqueles que estão escravizados pelo medo e tolhidos pelo mal. Que ele confortará àqueles que estão de luto e outorgará a eles o júbilo da salvação no lugar da pena e do pesar. Que ele será o desejo de todas as nações e o júbilo eterno daqueles que buscam a retidão. Que esse Filho da verdade e da retidão se elevará sobre o mundo, com luz curativa e poder salvador; e até mesmo que ele salvará o seu povo dos pecados; que ele realmente buscará e salvará os que estão perdidos. Que ele não destruirá os fracos, e sim ministrará a salvação a todos os que têm fome e sede de retidão. Que aqueles que acreditam nele terão vida eterna. Que ele irá verter o seu espírito sobre toda a carne, e que esse Espírito da Verdade será para cada crente como uma fonte de água, fazendo jorrar a vida eterna. Não compreendestes quão grande foi o evangelho do Reino que esse homem entregou a vós? Não percebeis quão grande é a salvação que vem a vós?”

190:5:5 20352 Nesta altura eles estavam chegando perto da cidade onde esses dois irmãos moravam. Nenhuma palavra esses dois homens disseram, desde que Jesus havia começado a ensinar a eles, enquanto caminhavam juntos pela estrada. Logo chegaram em frente à sua humilde morada e Jesus estava para deixá-los, indo estrada abaixo, mas eles solicitaram-lhe que entrasse e ficasse com eles. Eles insistiram, como era quase já o cair da noite, que ele permanecesse lá com eles. Finalmente Jesus consentiu e, logo que eles entraram na casa, sentaram-se para comer. Deram a ele o pão para abençoar e, quando ele começou a parti-lo e a entregá-lo a eles, os olhos dos dois abriram-se, e Cleofas reconheceu que o convidado deles era o próprio Mestre. E quando ele disse: “É o Mestre” – o Jesus moroncial desapareceu da vista deles.

190:5:6 20361 E então eles comentaram um com o outro: “Não é de espantar que os nossos corações estivessem queimando dentro de nós quando ele nos falou, enquanto caminhávamos pela estrada, e enquanto ele abria ao nosso entendimento os ensinamentos das escrituras!”

190:5:7 20362 Eles não se detiveram para comer. Tinham visto o Mestre moroncial e saíram correndo da casa, de volta a Jerusalém, para difundir a boa-nova do Salvador ressuscitado.

190:5:8 20363 Por volta das nove horas, naquela noite, e pouco antes do Mestre aparecer aos dez apóstolos, esses dois irmãos emocionados irromperam na sala de cima, indo ao encontro dos apóstolos, declarando que eles haviam visto Jesus e conversado com ele. E contaram tudo o que Jesus tinha dito a eles e que eles não haviam reconhecido quem ele era, até o momento em que ele partiu o pão.

DOCUMENTO 191

AS APARIÇÕES AOS APÓSTOLOS E AOS OUTROS LÍDERES
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O Domingo da Ressurreição foi um dia terrível na vida dos apóstolos; dez deles passaram a maior parte desse dia na sala de cima, com as portas fechadas. Eles poderiam ter saído de Jerusalém, mas receavam ser presos pelos agentes do sinédrio, caso fossem encontrados nas ruas. Tomé estava remoendo-se sozinho com os seus problemas, em Betfagé. Ele teria feito melhor, se tivesse permanecido com os seus companheiros apóstolos, pois podia tê-los ajudado a dirigir as suas discussões por caminhos mais úteis.

191:0:2 20372 Durante todo o dia, João alimentou a idéia de que Jesus tinha ressuscitado dos mortos. Ele lembrou que, em nada menos do que cinco vezes diferentes, o Mestre afirmara que ressuscitaria e que em pelo menos três vezes ele aludira ao terceiro dia. A atitude de João tinha uma influência considerável sobre todos, e especialmente sobre o seu irmão Tiago e sobre Natanael. João os teria influenciado mais se não fosse ele o membro mais jovem do grupo.

191:0:3 20373 O isolamento deles tinha muito a ver com os seus problemas. João Marcos mantinha-os em contato com os acontecimentos no templo e informava-lhes sobre os muitos rumores que se difundiam na cidade, mas não ocorreu a ele reunir notícias sobre os grupos diferentes de crentes, para os quais Jesus tinha já aparecido. Esse era o tipo de serviço que até então havia sido prestado pelos mensageiros de Davi, mas eles todos estavam fora, no seu último compromisso como arautos da ressurreição, junto àqueles grupos de crentes que moravam longe de Jerusalém. Pela primeira vez, em todos esses anos, os apóstolos compreenderam o quanto eles dependiam dos mensageiros de Davi para a sua informação diária, a respeito dos assuntos do Reino.

191:0:4 20374 Como era já típico nele, durante todo o dia, Pedro vacilou emocionalmente, entre a fé e a dúvida, a respeito da ressurreição do Mestre. Pedro não podia esquecer a visão das mortalhas dispostas na tumba, como se o corpo de Jesus tivesse evaporado de dentro delas. “Mas”, raciocinava Pedro, “se ele ressuscitou e se ele pôde mostrar-se às mulheres, porque não se mostra a nós, seus apóstolos?” Pedro ficava cada vez mais pesaroso, quando pensava que talvez Jesus não tivesse vindo a eles devido à sua presença entre os apóstolos, porque ele havia negado a Jesus, naquela noite no pátio de Anás. E então ele reconfortava-se com as palavras trazidas pelas mulheres: “Ide contar aos meus apóstolos – e a Pedro”. Contudo, encontrar encorajamento nessa mensagem implicava que ele tivesse de acreditar que as mulheres tinham realmente visto e ouvido o Mestre ressuscitado. Assim, Pedro alternou-se entre a fé e a dúvida, durante o dia inteiro, até um pouco depois das oito horas, quando se aventurou a ir até o pátio. Pedro pensava em separar-se dos apóstolos para não impedir que Jesus viesse até eles, por causa da sua renegação ao Mestre.

191:0:5 20375 Tiago Zebedeu, a princípio, defendia que deviam todos ir até a tumba; era firmemente a favor de fazer algo para ir ao fundo do mistério. Foi Natanael que os impediu de irem a público, como queria Tiago, e ele o fez relembrando-lhes da advertência de Jesus contra colocar em perigo indevidamente as próprias vidas nesses momentos. Por volta do meio-dia, Tiago tinha deixado estabelecido, com os outros, que todos aguardariam mantendo-se vigilantes. Ele pouco falou; estava tremendamente desapontado porque Jesus não se mostrara a eles, e não sabia das muitas aparições do Mestre aos outros grupos e indivíduos.

191:0:6 20381 André prestou muita atenção a tudo nesse dia. Estava excessivamente perplexo com a situação e se, de dúvidas ele as tinha mais do que as suas próprias, no entanto ao menos desfrutava de um certo sentimento de liberdade em relação às responsabilidades de ter de liderar os seus companheiros apóstolos. Ele estava de fato grato por ter sido liberado pelo Mestre do peso da liderança, antes de cair nesse período de desorientação.

191:0:7 20382 Mais do que uma vez, durante as horas longas e estafantes desse dia trágico, a única influência que dava força ao grupo era a contribuição freqüente do conselho filosófico característico de Natanael. Ele fora realmente a influência controladora sobre os dez, durante todo o dia. Nem por uma vez ele se exprimiu a si próprio, a respeito de crer ou não crer na ressurreição do Mestre. Mas, à medida que o dia passava, ele ficava cada vez mais inclinado a acreditar que Jesus tinha cumprido a sua promessa de ressurreição.

191:0:8 20383 Simão zelote estava por demais oprimido para participar das discussões. A maior parte do tempo ele ficava reclinado em um estofado, a um canto da sala, com o rosto voltado para a parede; ele não havia falado mais do que meia dúzia de vezes durante todo o dia. O conceito que fazia do Reino tinha ido por terra, e ele não podia vislumbrar que a ressurreição do Mestre poderia materialmente mudar a situação. O seu desapontamento era por demais pessoal e ao mesmo tempo demasiadamente agudo para conseguir recuperar-se logo, mesmo diante de um fato tão estupendo quanto a ressurreição.

191:0:9 20384 Ainda que pareça estranho, Filipe, que geralmente expressava-se pouco, falou muito durante a tarde desse dia. Pouco disse pela manhã, mas durante toda a tarde fez perguntas aos outros apóstolos. Pedro sempre ficava irritado com as perguntas de Filipe, mas os outros as encaravam com bom humor. Filipe estava particularmente desejoso de saber, no caso de Jesus ter realmente saído da tumba, se o seu corpo traria as marcas físicas da crucificação.

191:0:10 20385 Mateus estava bastante confuso; escutava as discussões dos seus companheiros, mas passava a maior parte do tempo repassando mentalmente o problema futuro das finanças deles. À parte a suposta ressurreição de Jesus, Judas fora embora; Davi tinha passado sem a menor cerimônia os fundos para ele; e estavam todos sem um líder com autoridade. E antes de chegar a considerar seriamente os argumentos dos demais sobre a ressurreição, Mateus tinha já visto o Mestre face a face.

191:0:11 20386 Os gêmeos Alfeus participavam pouco dessas discussões sérias; estavam bastante ocupados com as suas ministrações costumeiras. Um deles expressou a atitude de ambos quando disse, em resposta a uma pergunta feita por Filipe: “Nós não compreendemos a ressurreição, mas a nossa mãe diz que falou com o Mestre, e nós acreditamos nela”.

191:0:12 20387 Tomé estava em meio a um dos seus típicos ataques de depressão desesperada. Dormiu uma parte do dia e caminhou pelas colinas no resto do tempo. Sentia uma grande necessidade de unir-se aos seus amigos apóstolos, mas o desejo de ficar só era mais forte.

191:0:13 20388 O Mestre retardou a sua primeira aparição moroncial aos apóstolos por várias razões. Primeira, ele queria que eles tivessem tempo, depois de terem ouvido sobre a sua ressurreição, de pensar bem sobre o que ele lhes dissera sobre a sua morte e sobre a ressurreição quando ainda estava com eles na carne. O Mestre queria que Pedro vencesse algumas das dificuldades que lhe eram peculiares, antes de manifestar-se a todos eles. Em segundo lugar, desejava que Tomé estivesse com eles no momento da sua primeira aparição. João Marcos localizou Tomé na casa do irmão de Simão em Betfagé, nesse domingo pela manhã, trazendo uma informação sobre isso aos apóstolos, por volta das onze horas. A qualquer hora durante esse dia, Tomé teria voltado até eles, se Natanael ou quaisquer dois outros apóstolos tivessem ido buscá-lo. Ele realmente queria retornar, mas tendo saído como o fez, na noite anterior, era orgulhoso demais para voltar por sua própria conta tão cedo. No dia seguinte, ele estava tão deprimido que demorou quase uma semana para tomar a decisão de retornar. Os apóstolos esperavam por ele, e ele desejava que os seus irmãos o procurassem e lhe pedissem para voltar. Tomé, assim, permaneceu longe dos seus companheiros até o próximo sábado à noite, quando, depois que caiu a noite, Pedro e João foram a Betfagé e o trouxeram de volta. E essa também era uma razão pela qual eles não foram imediatamente para a Galiléia, depois que Jesus apareceu pela primeira vez para eles; eles não iriam sem Tomé.

1. A APARIÇÃO A PEDRO


191:1:1 20391 Eram quase oito e meia da noite desse domingo quando Jesus apareceu para Simão Pedro no jardim da casa de Marcos. Essa foi a sua oitava manifestação moroncial. Pedro estivera vivendo sob uma pesada carga de dúvida e de culpa, desde que havia negado o Mestre. Durante todo o dia de sábado e nesse domingo, ele lutou contra o medo de que talvez não fosse mais um apóstolo. Estava tremendo de horror pela sorte de Judas e chegou mesmo a pensar que também ele havia traído o seu Mestre. Durante toda essa tarde ele pensou que poderia ser a sua presença junto aos apóstolos que estivesse impedindo Jesus de aparecer para eles, desde, claro está, que ele tivesse ressuscitado dos mortos. E foi para Pedro, em tal estado mental e de alma, que Jesus apareceu enquanto o apóstolo deprimido perambulava entre as flores e os arbustos.

191:1:2 20392 Quando Pedro pensou no olhar amoroso do Mestre ao passar pelo portal de Anás, e enquanto remoía na sua mente aquela mensagem maravilhosa que foi trazida para ele logo cedo naquela manhã, pelas mulheres que vieram da tumba vazia: “Ide contar aos meus apóstolos – e a Pedro” –, e, assim, enquanto ele contemplava essas demonstrações de misericórdia, a sua fé começou a superar as suas dúvidas, e ele permaneceu quieto, cerrando os punhos, e dizendo em voz alta: “Acredito que ele tenha ressuscitado dos mortos; irei dizer isto aos meus irmãos”. E, ao dizer isso, subitamente apareceu em frente dele a forma de um homem, que dirigiu-se a ele em um tom familiar, dizendo: “Pedro, o inimigo desejou levar-te, mas eu não desistiria de ti. Eu sabia que não era de coração que tu me havias negado; e, portanto, eu o perdoei antes mesmo de me pedires; mas agora tu deves parar de pensar em ti próprio e nas complicações do momento, enquanto te preparas para levar as boas-novas do evangelho para aqueles que estão na escuridão. Não deves mais ficar preocupado com o que possas obter do Reino, mas deves antes te empenhar naquilo que tu podes dar àqueles que vivem em extrema miséria espiritual. Prepara-te, Simão, portanto, para a batalha de um novo dia, para a luta contra as trevas espirituais e as dúvidas malignas das mentes naturais dos homens”.

191:1:3 20393 Pedro e o Jesus moroncial caminharam pelo jardim e conversaram sobre coisas do passado, do presente e do futuro, por quase cinco minutos. Então o Mestre desapareceu da vista dele, dizendo: “Adeus, Pedro; até que eu te veja junto com os teus irmãos”.

191:1:4 20394 Por um momento, Pedro foi vencido pela compreensão de que tinha falado com o Mestre ressuscitado, e que poderia estar certo de que era ainda um embaixador do Reino. Ele tinha acabado de ouvir o Mestre glorificado exortando-o a ir pregar o evangelho. E, com tudo isso dentro do seu coração, ele correu até a sala de cima e, ante a presença dos seus companheiros apóstolos, em uma excitação resfolegante, exclamou: “Eu vi o Mestre; ele estava no jardim. Falei com ele e ele perdoou-me”.

191:1:5 20401 A declaração de Pedro, de que ele havia visto Jesus no jardim, causou uma profunda impressão nos seus companheiros apóstolos, e eles estavam já quase prontos para acabar com as suas dúvidas quando André levantou-se e os advertiu para que não se deixassem influenciar muito pelo relato do seu irmão. André sugeriu que Pedro tinha já antes visto coisas que não eram reais. E, ainda que André não tivesse feito alusão direta à visão da noite no mar da Galiléia, em que Pedro dizia ter visto o Mestre vindo para eles, caminhando sobre as águas, ainda assim ele disse o suficiente para fazer entender a todos os presentes que ele tinha em mente esse incidente. Simão Pedro ficou muito magoado com a insinuação do seu irmão e imediatamente caiu em um silêncio ressentido. Os gêmeos ficaram condoídos por Pedro, e ambos aproximaram-se para expressar a sua compaixão, e dizer que acreditavam nele, e para reafirmar que a própria mãe deles também tinha visto o Mestre.

2. A PRIMEIRA APARICÃO AOS APÓSTOLOS


191:2:1 20402 Pouco depois das nove horas, naquela noite, depois da partida de Cleofas e Jacó, enquanto os gêmeos Alfeus confortavam Pedro, e Natanael queixava-se de André, e quando os dez apóstolos estavam lá reunidos, na sala de cima, com todas as portas fechadas com o ferrolho, por medo de serem presos; o Mestre, na forma moroncial, subitamente apareceu em meio a eles, dizendo: “Que a paz esteja convosco. Por que ficais tão amedrontados, quando eu apareço, como se tivésseis visto um espírito? Eu não vos disse sobre essas coisas quando estava presente entre vós, na carne? Não vos disse que os sumos sacerdotes e os governantes me entregariam para ser morto, que um de vós me trairia e que, no terceiro dia, me ressuscitaria? De onde, pois, vêm todas as vossas dúvidas e para que toda essa discussão sobre os relatos das mulheres, de Cleofas e de Jacó, e mesmo de Pedro? Por quanto tempo ireis duvidar das minhas palavras e recusar a acreditar nas minhas promessas? E, agora, que de fato me estais vendo, acreditareis? Mesmo agora, um de vós está ausente. Quando estiverdes juntos novamente e depois que todos souberem, com certeza, que o Filho do Homem ressuscitou da tumba, ide então até a Galiléia. Tenhais fé em Deus; tenhais fé uns nos outros; e assim entrareis no novo serviço do Reino do céu. Eu permanecerei em Jerusalém convosco até que estejais prontos para ir à Galiléia. Deixo a minha paz convosco”.

191:2:2 20403 Depois de ter-lhes falado, o Jesus moroncial desapareceu, instantaneamente, da vista deles. E eles todos caíram com os rostos no chão, louvando a Deus e venerando o Mestre, que havia desaparecido. Essa foi a nona aparição moroncial do Mestre.

3. COM AS CRIATURAS MORONCIAIS


191:3:1 20404 O dia seguinte, segunda-feira, foi passado totalmente com as criaturas moronciais, então presentes em Urântia. Como participantes da experiência de transição-moroncial do Mestre, tinham vindo para Urântia mais de um milhão de diretores moronciais e colaboradores, junto com mortais de transição de várias ordens dos sete mundos das mansões de Satânia. O Jesus moroncial permaneceu com essas inteligências esplêndidas por quarenta dias. Ele deu-lhes ensinamentos e aprendeu dos seus diretores sobre a vida de transição moroncial, tal como é vivida pelos mortais dos mundos habitados de Satânia, enquanto passam pelas esferas moronciais do sistema.

191:3:2 20411 Por volta da meia-noite, dessa segunda-feira, a forma moroncial do Mestre estava ajustada para a transição até o segundo estágio da progressão moroncial. Quando voltou a aparecer para os seus filhos mortais na Terra, o fez como um ser moroncial do segundo estágio. Quanto mais o Mestre progredia na carreira moroncial, mais difícil ficava, tecnicamente, para as inteligências moronciais e seus colaboradores transformadores, fazer com que o Mestre ficasse visível diante dos olhos mortais e materiais.

191:3:3 20412 Jesus fez o trânsito para o terceiro estágio moroncial na sexta-feira, 14 de abril; para o quarto estágio na segunda, 17 de abril; para o quinto estágio no sábado, 22 de abril; para o sexto estágio na quinta-feira, 27 de abril; para o sétimo estágio na terça-feira, 2 de maio; para a cidadania de Jerusém no domingo, 7 de maio; e dirigiu-se para o abraço dos Altíssimos de Edêntia no domingo, 14 de maio.

191:3:4 20413 Michael de Nebadon, desse modo, completou o seu serviço de experiência no universo; pois, nas suas auto-outorgas anteriores, já havia experimentado plenamente a vida dos mortais ascendentes do tempo e do espaço, desde a permanência na sede central da constelação mesma até o serviço do superuniverso. E foi por meio dessas mesmas experiências moronciais que o Filho Criador de Nebadon realmente completou, e terminou aceitavelmente, a sua sétima e final auto-outorga no universo.

4. A DÉCIMA APARIÇÃO (NA FILADÉLFIA)


191:4:1 20414 A décima manifestação moroncial de Jesus, para o reconhecimento mortal, ocorreu um pouco depois das oito horas, na terça-feira, 11 de abril, na Filadélfia, onde ele se mostrou a Abner e a Lázaro e a uns cento e cinqüenta dos seus companheiros, incluindo mais de cinqüenta das setenta pessoas do corpo evangélico. Essa aparição ocorreu pouco depois da abertura de um encontro especial na sinagoga, convocado por Abner para discutir a crucificação de Jesus e os relatos mais recentes da ressurreição, que tinham sido trazidos pelos mensageiros de Davi. Posto que o ressuscitado Lázaro era agora um membro desse grupo de crentes, não se fazia difícil para eles acreditarem nos relatos de que Jesus tinha ressuscitado dos mortos.

191:4:2 20415 A reunião na sinagoga estava sendo aberta por Abner e Lázaro, que se encontravam, de pé, juntos no púlpito, quando toda a audiência de crentes viu a forma do Mestre aparecer subitamente. Ele avançou de onde tinha aparecido, entre Abner e Lázaro, que não haviam observado a sua presença e, saudando a assembléia, disse:

191:4:3 20416 “Que a paz esteja convosco. Todos vós sabeis que temos um Pai nos céus e que não há senão um evangelho do Reino: o das boas-novas da dádiva da vida eterna, que os homens recebem pela fé. Enquanto rejubilais na vossa lealdade ao evangelho, orai ao Pai da verdade para que dissemine nos vossos corações um amor maior pelos vossos irmãos. Deveis amar a todos os homens como eu vos amei; deveis servir a todos os homens como eu vos servi. Com compreensão, compaixão e afeição fraternal, recebei em comunhão a todos os vossos irmãos que estão dedicados à proclamação das boas-novas, sejam eles judeus ou gentios, gregos ou romanos, persas ou etíopes. João proclamou o Reino com antecipação, vós tendes pregado o evangelho em poder; os gregos já pregam as boas-novas; e, em breve, irei enviar o Espírito da Verdade até as almas de todos os meus irmãos que de uma maneira pouco egoísta têm dedicado as suas vidas ao esclarecimento dos seus companheiros que estão nas trevas espirituais. Sois vós os filhos da luz; portanto, não caiais nos emaranhados do desentendimento da suspeita mortal e da intolerância humana. Se fordes enobrecidos, pela graça da fé, por amardes os que não crêem, não deveríeis também igualmente amar aqueles que são os vossos companheiros e que crêem na família da fé, que está crescendo? Lembrai-vos, na mesma medida em que amardes uns aos outros, todos os homens saberão que sois discípulos meus.

191:4:4 20421 “Ide, então, ao mundo inteiro, proclamar este evangelho da paternidade de Deus e da irmandade dos homens a todas as nações e raças, e sejais sempre sábios na vossa escolha dos métodos para apresentar as boas-novas às raças e tribos diferentes da humanidade. Vós recebestes este evangelho do Reino de graça e do mesmo modo vós dareis as boas-novas a todas as nações. Não temais a resistência do mal, pois estou sempre convosco, até o fim mesmo dos tempos. E a minha paz eu a deixo convosco”.

191:4:5 20422 E ao dizer: “A minha paz eu a deixo convosco”, ele desapareceu da vista de todos. Com exceção de uma das suas aparições na Galiléia, na qual o viram mais de quinhentos crentes de uma só vez, esse grupo na Filadéfia abrangia o maior número de mortais que o viram em uma única ocasião.

191:4:6 20423 Cedo, na manhã seguinte, enquanto os apóstolos ainda permaneciam em Jerusalém aguardando a recuperação emocional de Tomé, esses crentes da Filadélfia saíram para proclamar que Jesus de Nazaré tinha ressuscitado dentre os mortos.

191:4:7 20424 O dia seguinte, quarta-feira, Jesus passou todo o tempo na companhia dos seus companheiros moronciais e, durante as horas do meio da tarde, ele recebeu os delegados moronciais, visitantes dos mundos das mansões de todos os sistemas locais de esferas habitadas, de toda a constelação de Norlatiadeque. E todos se rejubilaram de conhecer o seu Criador, como um da sua própria ordem de inteligências do universo.

5. A SEGUNDA APARIÇÃO AOS APÓSTOLOS


191:5:1 20425 Tomé passou uma semana a sós, consigo próprio, nas colinas ao redor do monte das Oliveiras. Durante esse tempo ele viu apenas os que estavam na casa de Simão e João Marcos. Eram nove horas do sábado, 15 de abril, quando os dois apóstolos encontraram-no e o levaram de volta até o ponto de encontro deles, na casa de Marcos. No dia seguinte, Tomé ouviu a narrativa das histórias das várias aparições do Mestre, mas recusou-se firmemente a acreditar. Ele sustentou que Pedro, com o seu entusiasmo, os havia levado todos a pensar que haviam visto o Mestre. Natanael deu-lhe várias razões, mas isso de nada valeu. Havia uma teimosia emocional associada à sua habitual mania de duvidar, e esse estado mental, combinado com a sua tristeza por tê-los abandonado, conspirava para criar uma situação de isolamento que até mesmo o próprio Tomé não entendia totalmente. Ele havia-se separado dos seus companheiros, tomando o seu próprio caminho e, agora, ainda que estivesse de volta ao seio deles, inconscientemente tendia a assumir uma atitude de descontentamento. Ele era vagaroso demais para se render; e não gostava de ceder. Sem ter a intenção, ele realmente estava gostando da atenção que lhe estava sendo dedicada; e experimentava uma satisfação inconsciente pelos esforços que todos os seus companheiros faziam para convencê-lo e convertê-lo. Havia sentido saudades deles por uma semana inteira, e experimentava um prazer considerável com a persistência daquelas atenções.

191:5:2 20426 Estavam todos fazendo a refeição da noite, pouco depois das seis horas, achando-se assentados Pedro, de um lado de Tomé, e Natanael, do outro, quando o apóstolo que duvidava disse: “Não acreditarei, a menos que eu veja o Mestre com os meus próprios olhos e ponha o meu dedo na marca dos pregos”. E estavam sentados assim, nessa ceia, as portas encontrando-se fechadas e travadas com segurança, quando o Mestre moroncial de súbito apareceu na parte interna da curvatura da mesa e, de pé, diretamente em frente de Tomé, disse:

191:5:3 20431 “A paz esteja convosco. Por uma semana inteira permaneci aqui aguardando poder aparecer novamente quando estivésseis todos presentes, para que pudésseis uma vez mais ouvir sobre a missão de ir a todo o mundo e pregar o evangelho do Reino. E, de novo, eu vos digo: Como o Pai me enviou ao mundo, eu vos envio. Como revelei o Pai, vós revelareis o amor divino, não apenas com palavras, mas na vossa vida diária. Eu vos envio, não para amar as almas dos homens, mas para amar os homens. Vós não ireis apenas proclamar as alegrias dos céus, como também exibireis, na vossa experiência diária, essas realidades espirituais da vida divina, pois, pela fé, já tendes a vida eterna, como uma dádiva de Deus. Se mantiverdes essa fé, quando o poder do alto, o Espírito da Verdade, vier sobre vós, não ireis mais esconder a vossa luz aqui atrás dessas portas fechadas; vós ireis tornar conhecidos o amor e a misericórdia de Deus, para toda a humanidade. Por medo agora fugis dos fatos de uma experiência desagradável, mas, quando houverdes sido batizados pelo Espírito da Verdade, vós ireis, brava e jubilosamente, sair para encontrar as novas experiências de proclamar as boas-novas da vida eterna, no Reino de Deus. Podeis permanecer aqui na Galiléia, por um curto período, enquanto estiverdes recuperando-vos do choque da transição entre a falsa segurança da autoridade do tradicionalismo e a nova ordem da autoridade dos fatos, da verdade e da fé, nas realidades supremas da experiência de viver. A vossa missão para com o mundo está fundada no fato de que eu vivi, no vosso meio, uma vida de revelação de Deus; na verdade de que vós e todos os outros homens sois os filhos de Deus; e que consistirá na vida que vivereis entre os homens – a experiência factual e viva de amar os homens e de servir a eles, do mesmo modo que eu vos amei e servi a vós. Que a fé revele a vossa luz ao mundo; que a revelação da verdade abra os olhos cegos pela tradição; que o vosso serviço de amor destrua efetivamente o preconceito engendrado pela ignorância. Aproximando-vos assim dos vossos semelhantes, em compaixão compreensiva e com uma devoção sem egoísmo, vós ireis conduzi-los ao conhecimento salvador do amor do Pai. Os judeus têm enaltecido a bondade; os gregos têm exaltado a beleza; os hindus têm pregado a devoção; os antigos ascetas têm ensinado a reverência; os romanos têm exigido a lealdade; mas, quanto a mim, quero a vida dos meus discípulos, uma vida mesma a serviço do amor pelos vossos irmãos na carne. ”

191:5:4 20432 Depois de dizer essas palavras, o Mestre olhou bem no rosto de Tomé e disse: “E tu, Tomé, que disseste que não acreditarias a menos que pudesses ver-me e colocar o teu dedo nas marcas dos cravos em minhas mãos, agora tu me contemplaste e ouviste as minhas palavras; e embora não vejas nenhuma marca de cravos nas minhas mãos, pois eu ressuscitei na forma que vós também ireis ter quando partirdes deste mundo, o que irás tu dizer aos teus irmãos? Tu irás reconhecer a verdade, pois no teu coração tu já começaste a crer, mesmo quando tão resolutamente afirmaste que não acreditarias. As tuas dúvidas, Tomé, do mesmo modo obstinado que se afirmam, elas também desaparecem. Tomé, eu peço-te que não te falte a fé, mas que acredites – e eu sei que tu acreditarás, e ainda de todo o coração”.

191:5:5 20433 Quando Tomé ouviu essas palavras, ele caiu de joelhos diante do Mestre moroncial e exclamou: “Eu creio! Meu Senhor e meu Mestre!” E então Jesus disse a Tomé: “Tu creste, Tomé, porque me viste e me ouviste realmente. Abençoados sejam aqueles que, nas idades que virão, acreditarão mesmo que não tenham visto com os olhos da carne e escutado com os ouvidos mortais”.

191:5:6 20434 E então, enquanto a forma do Mestre movia-se para mais perto da cabeceira da mesa, ele dirigiu-se a todos, dizendo: “E agora ide todos para a Galiléia, onde eu irei em breve aparecer para vós”. E depois de ter dito isso ele desapareceu da vista deles.

191:5:7 20441 Agora os onze apóstolos estavam totalmente convencidos de que Jesus tinha ressuscitado dos mortos e, muito cedo na manhã seguinte, antes do nascer do dia, eles partiram para a Galiléia.

6. AS APARIÇÕES EM ALEXANDRIA


191:6:1 20442 Enquanto os onze apóstolos estavam a caminho da Galiléia, chegando ao fim da sua viagem, na terça-feira, 18 de abril, por volta das oito e meia da noite, Jesus apareceu para Rodam e mais oitenta outros crentes, em Alexandria. Essa foi a décima segunda aparição do Mestre, na forma moroncial. Jesus apareceu diante desses gregos e judeus no exato momento em que o relato sobre a crucificação estava sendo concluído por um dos mensageiros de Davi. Esse mensageiro, sendo o quinto da série de corredores de Jerusalém a Alexandria, tinha chegado em Alexandria mais tarde e, imediatamente depois de ter a sua mensagem entregue a Rodam, ficou decidida uma convocação dos crentes para receberem, do próprio mensageiro, essa palavra trágica. Por volta das oito horas, o mensageiro, Natam, de Busiris, veio diante desse grupo e contou com detalhes tudo o que tinha sido dito a ele pelo corredor anterior. Natam terminou a sua narrativa tocante com estas palavras: “Mas Davi, que nos envia estas palavras, relata que o Mestre, ao prever a sua morte, declarou que iria ressuscitar”. E mal Natam falou, o Mestre moroncial apareceu ali, para ser visto plenamente por todos. E quando Natam sentou-se, Jesus disse:

191:6:2 20443 “Que a paz esteja convosco. Aquilo para o que o meu Pai enviou-me a este mundo, para que ficasse estabelecido, não se refere apenas a uma raça, a uma nação nem a um grupo especial de instrutores ou de pregadores. Este evangelho do Reino pertence aos judeus tanto quanto aos gentios, aos ricos tanto quanto aos pobres, aos livres e aos prisioneiros, aos homens e mulheres e até mesmo às crianças pequenas. E vós todos deveis proclamar este evangelho, de amor e de verdade, por meio da vida que viveis na carne. Vós deveis amar uns aos outros com um afeto novo e surpreendente, assim como eu vos tenho amado. Vós servireis à humanidade com uma devoção estupenda, assim como eu tenho servido a vós. E, quando os homens vos virem amando-os assim, e quando eles contemplarem o modo fervoroso com o qual servis a eles, perceberão que vós vos tornastes companheiros de fé do Reino do céu, e seguirão o Espírito da Verdade que vêem nas vossas vidas, para encontrarem a salvação eterna.

191:6:3 20444 “Assim como o Pai enviou-me a este mundo, assim agora eu vos envio. Vós sois todos chamados a levar as boas-novas até aqueles que se encontram nas trevas. Esse evangelho do Reino pertence a todos que acreditam nele; e não será entregue apenas à custódia dos sacerdotes. Logo, o Espírito da Verdade virá sobre vós, e vos conduzirá a toda a verdade. Ide, portanto, em pregação deste evangelho, por todo o mundo e considerai sempre que eu estou convosco, até o fim mesmo dos tempos”.

191:6:4 20445 Depois de ter falado assim, o Mestre desapareceu da vista de todos. Toda noite aqueles crentes permaneceram juntos ali, rememorando as próprias experiências, como crentes do Reino, e escutando as muitas palavras de Rodam e dos seus colaboradores. E todos eles acreditaram que Jesus tinha ressuscitado dos mortos. E podeis imaginar a surpresa do arauto de Davi, com a nova da ressurreição, que chegou dois dias depois de tudo isso, quando eles responderam ao seu anúncio dizendo: “Sim, sabemos, pois nós o vimos. Ele apareceu para nós anteontem”.

DOCUMENTO 192

APARIÇÕES NA GALILÉIA
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Quando os apóstolos saíram de Jerusalém para a Galiléia, os líderes judeus haviam-se acalmado consideravelmente. Posto que Jesus aparecia apenas para a sua família de crentes no Reino, e já que os apóstolos estavam escondidos e não faziam nenhuma pregação pública, os governantes dos judeus concluíram que o movimento do evangelho afinal estava efetivamente derrotado. Eles estavam, é claro, desconcertados por causa dos rumores que se disseminavam cada vez mais de que Jesus tinha ressuscitado dos mortos e, de fato, eles dependiam dos guardas subornados para contradizer essas notícias mediante a repetição da história de que um bando dos seus seguidores havia levado o corpo.

192:0:2 20452 Desse momento em diante, até que os apóstolos fossem dispersados na maré montante da perseguição, Pedro foi reconhecido de maneira geral como o líder do corpo apostólico. Jesus nunca deu a ele tal autoridade, e os seus companheiros apóstolos nunca o elegeram formalmente para essa posição de responsabilidade; ele assumiu-a naturalmente e a mantinha pelo consentimento comum e também porque era o principal pregador dentre eles. Desse momento em diante a pregação pública tornava-se a função principal dos apóstolos. Após o seu retorno da Galiléia, Matias, a quem eles escolheram para tomar o lugar de Judas, tornou-se o tesoureiro.

192:0:3 20453 Durante a semana, eles permaneceram em Jerusalém, Maria, a mãe de Jesus, passou boa parte do tempo com as mulheres crentes que estavam alojadas na casa de José de Arimatéia.

192:0:4 20454 Nessa segunda-feira pela manhã, quando os apóstolos partiram para a Galiléia, João Marcos foi atrás deles. Continuou seguindo-os até fora da cidade e, quando haviam já passado por Betânia, ele aproximou-se atrevidamente, confiando que eles não o mandariam de volta.

192:0:5 20455 Os apóstolos pararam diversas vezes no caminho da Galiléia para contar a história do seu Mestre ressuscitado e conseqüentemente não chegaram em Betsaida senão muito tarde na noite da quarta-feira. E já era meio-dia da quinta-feira quando eles todos acordaram e aprontaram-se para compartilhar o desjejum.

1. A APARIÇÃO JUNTO AO LAGO


192:1:1 20456 Sexta-feira, 21 de abril, por volta das seis da manhã, o Mestre moroncial fez a sua décima terceira aparição, a primeira para os dez apóstolos na Galiléia, no momento em que o barco deles aproximou-se da margem, perto do local em que em geral se aportava em Betsaida.

192:1:2 20457 Depois que os apóstolos tinham passado a tardinha e as primeiras horas da noite de quinta-feira, na casa de Zebedeu, à espera, Simão Pedro sugeriu que fossem pescar. Quando Pedro propôs a pescaria, todos os apóstolos decidiram ir junto. Durante toda a noite eles jogaram as redes, mas não pegaram nenhum peixe. Não se importavam muito de não terem pescado nada, pois tinham muitas experiências interessantes sobre as quais falar; coisas que lhes haviam acontecido muito recentemente em Jerusalém. Todavia, quando veio a luz do dia, eles decidiram voltar a Betsaida. E quando se aproximavam da margem, eles viram alguém de pé na praia, perto da amarração dos barcos, junto a uma fogueira. Inicialmente eles pensaram que fosse João Marcos que estivesse ali para dar as boas-vindas a eles e à sua pesca, mas, quando chegaram mais perto da margem, viram que estavam enganados – o homem era alto demais para ser João. Não ocorreu a nenhum deles que a pessoa na margem fosse o Mestre. Não compreendiam de todo por que Jesus queria encontrar-se com eles nos locais abertos das suas atividades anteriores e em contato com a natureza, longe dos ambientes fechados de Jerusalém e das suas associações trágicas de temor, traição e morte. Ele tinha dito a eles que, se fossem à Galiléia, os encontraria lá e estava para ali cumprir aquela promessa.

192:1:3 20461 Quando jogaram a âncora e se preparavam para entrar no pequeno barco a fim de irem até a margem, o homem na praia interpelou-os: “Rapazes, pegaram alguma coisa?” E quando eles responderam: “Não”, ele falou de novo: “Jogai a rede do lado direito do barco, e encontrareis os peixes”. Ainda que não soubessem que era Jesus que se tinha dirigido a eles, em uníssono jogaram a rede como lhes tinha sido instruído e imediatamente ela ficou cheia, e tanto que quase não foram capazes de içá-la. Ora, João Zebedeu era de percepção rápida e, quando viu a rede tão pesada e carregada, ele percebeu que era o Mestre quem tinha falado a eles. Quando esse pensamento veio à sua mente, ele inclinou-se e sussurrou a Pedro: “É o Mestre”. Pedro sempre fora um homem de agir sem indecisão e de devoção impetuosa; assim, quando João sussurrou aquilo no seu ouvido, rapidamente ele levantou-se e de um pulo jogou-se na água para chegar mais rápido ao lado do Mestre. Os seus irmãos chegaram pouco depois, dentro do barco pequeno, arrastando a rede de peixes atrás de si.

192:1:4 20462 Nessa altura, João Marcos já estava de pé e, vendo os apóstolos acercando-se da margem com a rede carregada, correu até a praia para saudá-los; e, quando viu onze homens em vez de dez, supôs que aquele a quem não reconhecia seria o Jesus ressuscitado e, diante dos dez, que permaneciam atônitos e em silêncio, o jovem correu até junto ao Mestre e, ajoelhando-se aos seus pés, disse: “Meu Senhor e meu Mestre”. E então Jesus falou, não como o tinha feito em Jerusalém, quando os saudou dizendo: “A paz esteja convosco”; mas, com um tom familiar ele dirigiu-se a João Marcos: “Bem, João, estou contente de ver-te novamente e nesta alegre Galiléia, onde podemos reunir-nos com tranqüilidade. Fica conosco, João, e toma a tua refeição matinal”.

192:1:5 20463 Enquanto Jesus falava com o jovem, os dez apóstolos estavam tão surpresos e atônitos que se esqueceram de puxar a rede de peixes para a praia. E então Jesus disse: “Trazei o vosso peixe e preparai algum para comermos. Já temos a fogueira e muito pão. ”

192:1:6 20464 No momento em que João Marcos homenageava o Mestre, Pedro, por um momento, chocou-se com a visão dos carvões de fogo reluzentes ali na praia; a cena rememorava tão vividamente para ele o fogo da meia-noite no pátio de Anás, onde ele tinha negado ao Mestre, mas ele sacudiu-se e, ajoelhando-se aos pés do Mestre, exclamou: “Meu Senhor e meu Mestre!”

192:1:7 20465 Então Pedro juntou-se aos camaradas que traziam a rede. Quando eles colocaram a pesca em terra firme, contaram os peixes, e havia 153 dos grandes. E então novamente foi cometido o erro de chamar a isso de uma outra pescaria milagrosa. Não havia nenhum milagre ligado a esse episódio. Tinha sido meramente um exercício de presciência do Mestre. Ele sabia que o peixe estava lá e desse modo indicou aos apóstolos onde jogar a rede.

192:1:8 20471 Jesus dirigiu-se a eles, dizendo: “Vinde agora, todos vós, para comer. Até mesmo os gêmeos devem sentar-se enquanto eu converso convosco; João Marcos preparará o peixe”. João Marcos trouxe sete peixes de bom tamanho, que o Mestre colocou no fogo e, quando estavam cozidos, o rapaz serviu-os a cada um dos dez. Então Jesus partiu o pão e passou-o a João, que, por sua vez, o serviu aos apóstolos famintos. Quando todos eles estavam servidos, Jesus chamou João Marcos para sentar-se enquanto ele próprio servia o peixe e o pão ao rapaz. E enquanto comiam, Jesus conversou com eles e rememorou as suas muitas experiências na Galiléia e nesse mesmo lago.

192:1:9 20472 Essa foi a terceira vez que Jesus manifestou-se aos apóstolos como um grupo. Quando Jesus primeiro dirigiu-se a eles, perguntando se tinham pegado algum peixe, eles nem suspeitavam de quem fosse, porque era um fato comum para esses pescadores no mar da Galiléia, ao chegarem à terra, ouvir uma pergunta assim, feita pelos mercadores de peixe de Tariquéia, que normalmente estavam por ali para comprar o pescado fresco destinado aos estabelecimentos que secavam o peixe.

192:1:10 20473 Jesus conversou com os dez apóstolos e João Marcos por mais de uma hora, e então ele caminhou pela praia, falando com dois a dois deles – mas não eram os mesmos dois que ele tinha antes enviado para pregar juntos. Todos os onze apóstolos tinham vindo de Jerusalém juntos, mas, quando se aproximavam da Galiléia, Simão zelote ficou mais deprimido ainda de modo que, ao chegarem a Betsaida, ele deixou os irmãos e retornou para a sua casa.

192:1:11 20474 Antes de deixá-los nessa manhã, Jesus indicou que dois dos apóstolos deviam oferecer-se para ir até Simão zelote e trazê-lo de volta naquele mesmo dia. Pedro e André cuidaram disso.

2. CONVERSANDO COM OS APÓSTOLOS DOIS A DOIS


192:2:1 20475 Quando tinham acabado de comer, e enquanto os outros permaneciam sentados em volta da fogueira, Jesus chamou Pedro e João para que fossem com ele dar uma caminhada pela praia. Enquanto caminhavam, Jesus perguntou a João: “João, tu me amas?” E quando João respondeu: “Sim, Mestre, com todo o meu coração”, o Mestre disse: “Então, João, deixa de lado a tua intolerância e aprende a amar os homens como eu te amei. Devota a tua vida a provar que o amor é a maior coisa neste mundo. É o amor de Deus que compele os homens a buscar a salvação. O amor é o ancestral de toda a bondade espiritual, a essência do que é verdadeiro e belo”.

192:2:2 20476 Jesus então se voltou para Pedro e perguntou: “Pedro, tu me amas?” Pedro respondeu: “Senhor, sabes que eu te amo com toda a minha alma”. Então Jesus disse: “Se me amas, Pedro, alimenta as minhas ovelhas. Não negligencies a ministração aos fracos, aos pobres e aos jovens. Prega o evangelho sem medo e sem preferências; lembra-te sempre de que Deus não tem preferência por ninguém. Serve aos teus semelhantes como eu tenho servido a ti; perdoa os teus companheiros mortais como eu te perdoei. Que a experiência te ensine o valor da meditação e o poder da reflexão inteligente”.

192:2:3 20477 Após terem andado até um pouco mais adiante, o Mestre voltou-se para Pedro e perguntou: “Pedro, realmente me amas?” Nesse momento Simão disse: “Sim, Senhor, sabes que te amo, Mestre”. E novamente disse Jesus: “Então cuida bem do meu rebanho. Sê um pastor bom e verdadeiro para as ovelhas. Não traias a confiança que depositarem em ti. Não te deixes tomar de surpresa na mão do inimigo. Fica de guarda a todo instante – vigia e ora”.

192:2:4 20478 Quando eles tinham dado uns poucos passos mais, Jesus voltou-se para Pedro e, pela terceira vez, perguntou: “Pedro, tu me amas verdadeiramente?” E Pedro então, levemente ferido pela desconfiança aparente que o Mestre teria tido dele, disse, com muita emoção: “Senhor, sabes de todas as coisas e, portanto, sabes que real e verdadeiramente eu te amo”. Então Jesus disse: “Alimenta as minhas ovelhas. Não te esqueças do rebanho. Sê um exemplo e uma inspiração para todos os teus irmãos pastores. Ama o rebanho como eu te amei e te devota ao bem-estar dele como eu devotei a minha vida ao teu bem-estar. E segue os meus passos até o fim”.

192:2:5 20481 Pedro interpretou essa última convocação ao pé da letra – como se devesse continuar seguindo atrás dele – e dirigindo-se a Jesus, apontou para João, perguntando: “Se eu seguir a ti, o que fará esse homem?” E então, percebendo que Pedro não havia compreendido suas palavras, Jesus disse: “Pedro, não te preocupes com o que os teus irmãos farão. Se eu quiser que João permaneça aqui, até quando eu voltar, depois que tu fores embora, em que isso te importa? Apenas estejas seguro de seguir os meus passos”.

192:2:6 20482 Essa observação difundiu-se entre os irmãos e foi recebida como uma declaração feita por Jesus de que João não morreria antes que o Mestre retornasse, como muitos pensavam e esperavam, para estabelecer o Reino em poder e glória. E foi essa interpretação das palavras de Jesus que teve um papel importante para trazer Simão zelote de volta ao serviço e mantê-lo servindo.

192:2:7 20483 Quando eles voltaram para junto dos outros, Jesus saiu para caminhar e conversar com André e Tiago. Eles estavam a uma curta distância, quando Jesus disse a André: “André, tu confias em mim?” E quando o antigo dirigente dos apóstolos ouviu Jesus fazer uma tal pergunta, ele parou e respondeu: “Sim, Mestre, confio em ti com toda a certeza, e tu sabes que confio”. Então Jesus disse: “André, se confias em mim, confia ainda mais nos teus irmãos – até mesmo em Pedro. Eu confiei a liderança dos teus irmãos a ti, certa vez. Agora, que te deixo para ir ao meu Pai, deves confiar nos outros. Quando os teus irmãos começarem a dispersar-se por aí em virtude de amargas perseguições, sê um conselheiro sábio e de muita consideração para com Tiago, o meu irmão na carne, quando colocarem nos ombros dele cargas tão pesadas que ele não terá experiência suficiente para suportar. E então continua confiando, pois não te faltarei. Quando tu tiveres terminado a tua tarefa aqui na Terra, tu virás até a mim”.

192:2:8 20484 Nesse momento Jesus voltou-se para Tiago, perguntando: “Tiago, tu confias em mim?” E é claro que Tiago respondeu: “Sim, Mestre, eu confio em ti de todo o meu coração”. Então disse Jesus: “Tiago, se confiares mais em mim, tu serás menos impaciente com os teus irmãos. Se confiares em mim, isso te ajudará a ser compassivo com a irmandade dos crentes. Aprende a pesar as conseqüências das tuas palavras e atos. Lembra-te de que a colheita é feita segundo o que se planta. Ora pela tranqüilidade de espírito e cultiva a paciência. Essas graças, com a fé viva, sustentar-te-ão quando vier a hora de beber da taça do sacrifício. Mas nunca te desanimes; quando terminares aqui na Terra, também tu virás ter comigo”.

192:2:9 20485 Em seguida Jesus conversou com Tomé e Natanael. A Tomé ele disse: “Tomé, tu serves a mim?” Tomé respondeu: “Sim, Senhor, sirvo a ti agora e para sempre”. Então Jesus disse: “Se quiseres servir a mim, serve aos meus irmãos na carne como eu servi a ti. E não te canses desse bem-servir, mas persevera como quem foi ordenado por Deus para esse serviço de amor. Quando tiveres acabado o teu serviço comigo na Terra, servirás a mim na glória. Tomé, tu deves parar de duvidar; tu deves crescer na fé e no conhecimento da verdade. Acredita em Deus como uma criança, mas pára de agir tão infantilmente. Tem coragem; sê forte na fé e poderoso no Reino de Deus”.

192:2:10 20491 Nisso, dirigindo-se a Natanael, o Mestre indagou: “Natanael, é a mim que serves?” E o apóstolo respondeu: “Sim, Mestre, e com toda minha afeição”. Então disse Jesus: “Se serves, pois, a mim com todo o coração, assegura-te de te consagrares ao bem-estar dos meus irmãos na Terra, com uma afeição incansável. Põe amizade no teu conselho e amor na tua filosofia. Serve ao teu semelhante como eu servi a ti. Sê fiel aos homens como eu vigiei por ti. Sê menos crítico; espera menos de alguns homens, e assim diminuirás a extensão da tua decepção. E quando o trabalho cá embaixo terminar, irás servir a mim no alto”.

192:2:11 20492 Depois disso, o Mestre conversou com Mateus e Filipe. A Filipe ele disse: “Filipe, tu obedeces a mim?” Filipe respondeu: “Sim, Senhor, obedecerei a ti ainda que me custe a vida”. Então disse Jesus: “Se queres obedecer-me, então vai às terras dos gentios e proclama este evangelho. Os profetas disseram-te que obedecer é melhor do que sacrificar. Pela fé tu te tornaste um filho do Reino, conhecedor de Deus. Não há senão uma lei a ser obedecida – que é o comando de seguir proclamando o evangelho do Reino. Pára de temer os homens; sê destemido ao pregar as boas-novas da vida eterna aos teus semelhantes, os quais permanecem languidamente nas trevas e que têm fome da luz da verdade. Filipe, não terás mais de ocupar-te com o dinheiro e com os bens. Agora és livre para pregar as boas-novas, como os teus irmãos. E irei antes de ti e estarei contigo até o fim”.

192:2:12 20493 Já, falando a Mateus, o Mestre perguntou: “Mateus, está no teu coração obedecer a mim?” Mateus respondeu: “Sim, Senhor, estou plenamente dedicado a fazer a tua vontade”. Então disse o Mestre: “Mateus, se quiseres obedecer-me, vá ensinar a todos os povos este evangelho do Reino. Não mais proporcionarás aos teus irmãos as coisas materiais da vida; de agora em diante tu também irás proclamar as boas-novas da salvação espiritual. De agora em diante não tenhas em vista senão obedecer à missão de pregar este evangelho do Reino do Pai. Como eu fiz a vontade do Pai na Terra, do mesmo modo tu irás cumprir a missão divina. Lembra-te, tanto o judeu como o gentio são teus irmãos. Não temas nenhum homem quando estiveres proclamando as verdades salvadoras do evangelho do Reino do céu. E para onde eu for, virás também em breve”.

192:2:13 20494 E então ele caminhou e conversou com os gêmeos Alfeus, Tiago e Judas, e falando a ambos, ele perguntou: “Tiago e Judas, vós acreditais em mim?” E ambos responderam: “Sim, Mestre, nós acreditamos”. Em seguida ele disse: “Vou deixar-vos em breve. Vedes que já vos deixei na carne. Permanecerei apenas um curto tempo nesta forma, antes de ir para o meu Pai. Vós acreditais em mim – sois meus apóstolos, e sempre o sereis. Continuai acreditando e lembrando da vossa ligação comigo quando eu não estiver mais aqui, e quando, por acaso, voltardes ao trabalho que fazíeis antes de virdes viver comigo, não permitais nunca que uma mudança das vossas tarefas exteriores influencie a vossa lealdade. Tende fé em Deus até o fim dos vossos dias na Terra. Nunca esqueçais de que, sendo filhos de Deus pela fé, todo o trabalho honesto do Reino é sagrado. Nada que um filho de Deus faça, pode ser comum. Trabalhai, portanto, de agora em diante, para Deus. E, quando terminardes esse trabalho, eu tenho outros mundos melhores onde, do mesmo modo, trabalhareis para mim. E em todos esses trabalhos, neste mundo e noutros mundos, eu trabalharei convosco, e o meu espírito residirá em vós”.

192:2:14 20495 Eram quase dez horas quando Jesus voltou da sua conversa com os gêmeos Alfeus e, ao deixar os apóstolos, ele disse: “Adeus, até que os encontre a todos no monte da vossa ordenação, amanhã ao meio-dia”. Depois de assim falar, ele desapareceu da vista deles.

3. NO MONTE DA ORDENAÇÃO


192:3:1 20501 Ao meio-dia do sábado, 22 de abril, os onze apóstolos reuniram-se como indicado no monte perto de Cafarnaum, e Jesus apareceu entre eles. Essa reunião ocorreu no mesmo monte em que o Mestre os havia designado como seus apóstolos e como embaixadores do Reino do Pai na Terra. E essa foi a décima quarta manifestação moroncial do Mestre.

192:3:2 20502 Naquela ocasião os onze apóstolos ajoelharam-se em um círculo em volta do Mestre e ouviram-no repetir as missões deles, viram-no reproduzir a cena de ordenação, do mesmo modo como eles foram selecionados para o trabalho especial do Reino. E tudo isso foi para eles como uma memória da sua primeira consagração ao serviço do Pai, exceto pela oração do Mestre. Quando o Mestre – o Jesus moroncial – agora orava, foi em um tom de majestade e com palavras tais de poder que os apóstolos nunca tinham antes ouvido. O Mestre agora falava com os governantes dos universos, como quem, no seu próprio universo, tivesse recebido nas suas mãos todo o poder e autoridade. E esses onze homens nunca esqueceram a experiência de re-consagração moroncial à promessa anterior, como embaixadores. O Mestre passou apenas uma hora nesse monte com os seus embaixadores e, depois de fazer uma despedida afetuosa a todos, ele desapareceu das suas vistas.

192:3:3 20503 E ninguém durante toda uma semana viu Jesus. Os apóstolos realmente não tinham a menor idéia do que fazer, não sabendo se o Mestre tinha ido para o Pai. Nesse estado de incerteza permaneceram em Betsaida. Tinham medo de ir pescar, e de que então ele viesse falar com eles, e que deixassem de vê-lo. Durante toda essa semana Jesus esteve ocupado com as criaturas moronciais na Terra e com os assuntos da transição moroncial que ele estava experienciando neste mundo.

4. A REUNIÃO À BEIRA DO LAGO


192:4:1 20504 A notícia das aparições de Jesus estava espalhando-se pela Galiléia, e a cada dia um número maior de crentes chegava à casa de Zebedeu para perguntar sobre a ressurreição do Mestre e para saber a verdade sobre essas tão faladas aparições. Pedro, no início da semana, comunicou que uma reunião pública aconteceria junto ao lago no próximo sábado, às três da tarde.

192:4:2 20505 E assim, no sábado, 29 de abril, às três horas, mais de quinhentos crentes dos arredores de Cafarnaum estavam reunidos em Betsaida para ouvir Pedro pregando o seu primeiro sermão público desde a ressurreição. O apóstolo conseguiu o melhor de si e, quando acabou o seu eloqüente discurso, poucos dos seus ouvintes duvidavam de que o Mestre tivesse ressuscitado dos mortos.

192:4:3 20506 Pedro terminou o seu sermão dizendo: “Nós afirmamos que Jesus de Nazaré não está morto; declaramos que ele levantou-se da tumba; proclamamos que o vimos e falamos com ele”. No momento em que ele acabara de fazer essa declaração de fé, lá ao seu lado, em plena vista de toda aquela gente, o Mestre apareceu na forma moroncial e, dirigindo-se a eles em um tom familiar, disse: “A paz esteja convosco, e a minha paz eu a deixo convosco”. Depois de aparecer e de assim falar a eles, ele desapareceu da vista de todos. Essa foi a décima quinta manifestação moroncial do Jesus ressuscitado.

192:4:4 20511 Devido a certas coisas ditas aos onze apóstolos enquanto estavam em conferência com o Mestre, no monte da ordenação, os apóstolos tiveram a impressão de que o seu Mestre iria em breve fazer uma aparição pública diante de um grupo de crentes da Galiléia, e que, depois que o tivesse feito, eles deveriam voltar para Jerusalém. Em conseqüência disso, logo cedo no dia seguinte, domingo, 30 de abril, os onze deixaram Betsaida indo para Jerusalém. Ensinaram e pregaram bastante no caminho, Jordão abaixo, e desse modo não chegaram na casa dos Marcos em Jerusalém a não ser na quarta-feira, 3 de maio, bem tarde.

192:4:5 20512 Esse foi um triste retorno ao lar para João Marcos. Poucas horas antes de chegar em casa, o seu pai, Elias Marcos, morreu repentinamente de uma hemorragia no cérebro. Se bem que o pensamento da certeza da ressurreição dos mortos tivesse confortado em muito os apóstolos na sua tristeza, ao mesmo tempo eles lamentaram verdadeiramente a perda do seu bom amigo, que os tinha apoiado fortemente mesmo nas horas de grandes problemas e decepções. João Marcos fez o que pôde para confortar a sua mãe e, falando por ela, convidou os apóstolos a continuarem fazendo da sua casa o seu lar. E os onze fizeram dessa sala de cima o seu centro de apoio até depois do Dia de Pentecostes.

192:4:6 20513 Os apóstolos propositalmente haviam chegado em Jerusalém depois do cair da noite para não serem vistos pelas autoridades judaicas. Nem apareceram publicamente no funeral de Elias Marcos. Durante o dia seguinte inteiro permaneceram silenciosamente reclusos nessa memorável sala de cima.

192:4:7 20514 Na quinta-feira à noite os apóstolos tiveram um encontro maravilhoso nessa sala de cima e todos se comprometeram a sair na pregação pública do novo evangelho do Senhor ressuscitado, exceto Tomé, Simão zelote e os gêmeos Alfeus. Tinham já sido dados os primeiros passos no sentido da troca do evangelho do Reino – a filiação a Deus e a irmandade dos homens – pela proclamação da ressurreição de Jesus. Natanael fez oposição a essa mudança no contexto da sua mensagem pública, mas ele não podia contrariar a eloqüência de Pedro, nem deter o entusiasmo dos discípulos, especialmente o das mulheres crentes.

192:4:8 20515 E assim, sob a vigorosa liderança de Pedro e antes que o Mestre ascendesse ao Pai, os seus bem-intencionados representantes começaram aquele processo sutil de substituir gradual e seguramente a religião de Jesus por uma forma nova e alterada de religião sobre Jesus.

DOCUMENTO 193

ÚLTIMAS APARIÇÕES E ASCENSÃO
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A décima sexta manifestação moroncial de Jesus ocorreu na sexta-feira, 5 de maio, no jardim de Nicodemos, por volta das nove horas da noite. Nessa noite os crentes de Jerusalém haviam feito a primeira tentativa de congregarem-se, desde a ressurreição. Reunidos ali, naquele momento, estavam os onze apóstolos, o grupo das mulheres e amigos e cerca de cinqüenta outros discípulos importantes do Mestre, incluindo alguns gregos. Esses crentes estiveram conversando informalmente, por mais de meia hora; nisso, subitamente, o Mestre moroncial surgiu, plenamente visível, e começou imediatamente a instruí-los. Disse Jesus:

193:0:2 20522 “Que a paz esteja convosco. Este é o grupo mais representativo de crentes – apóstolos e discípulos, tanto de homens quanto de mulheres – para o qual eu apareci, desde o tempo da minha libertação da carne. Agora eu vos conclamo a testemunhar o que eu vos disse de antemão, que minha permanência entre vós deveria ter um fim; eu vos disse que, em breve, deveria voltar para o Pai. E, naquele momento, eu vos disse claramente que os principais sacerdotes e governantes dos judeus me entregariam, para que eu fosse levado à morte, e que eu ressuscitaria do túmulo. E por que, então, vos permitistes ficar assim desconcertados, quando tudo isso de fato veio a acontecer? E por que ficastes tão surpresos quando me levantei do túmulo ao terceiro dia? Não acreditastes em mim, porque ouvistes as minhas palavras sem compreender o significado delas.

193:0:3 20523 “E agora vós deveríeis dar ouvidos às minhas palavras, para que não cometais novamente o erro de escutar os meus ensinamentos com a mente, enquanto nos vossos corações deixais de compreender os significados. Desde o começo da minha passagem, como um de vós, eu vos transmiti que o meu único propósito era revelar o meu Pai do céu para os filhos Dele, na Terra. Eu vivi a auto-outorga da revelação de Deus, para que vós pudésseis experienciar a carreira de conhecimento de Deus. Eu revelei Deus como vosso Pai no céu, eu revelei-vos como filhos de Deus na Terra. É um fato que Deus vos ama, filhos Seus. Pela fé, na minha palavra, esse fato torna-se uma verdade eterna e viva nos vossos corações. Quando, pela fé viva, vos tornais divinamente conscientes de Deus, vós então nasceis do espírito tal como filhos da luz e da vida, e da vida eterna mesmo, por meio da qual vós ascendereis, no universo dos universos, e atingireis a experiência de encontrar a Deus, o Pai, no Paraíso.

193:0:4 20524 “Eu exorto-vos a lembrar-vos sempre de que a vossa missão, entre os homens, é de proclamar o evangelho do Reino – a realidade da paternidade de Deus e a verdade da filiação do homem. Proclamai toda a verdade das boas-novas, não uma parte apenas do evangelho da salvação. A vossa mensagem não mudou com a experiência da minha ressurreição. A filiação a Deus, pela fé, é ainda a verdade salvadora do evangelho do Reino. Vós deveis sair e pregar o amor de Deus e o serviço aos homens. O que o mundo mais necessita saber é: que os homens são filhos de Deus e que, pela fé, eles podem de fato compreender, e experimentar diariamente essa verdade enobrecedora. A minha auto-outorga deveria ajudar todos os homens a saber que eles são os filhos de Deus, mas esse conhecimento não será suficiente se eles não conseguirem captar pessoalmente, por meio da fé, a verdade salvadora de que eles são os filhos espirituais vivos do Pai eterno. O evangelho do Reino interessa-se pelo amor do Pai e pelo serviço aos seus filhos na Terra.

193:0:5 20531 “Aqui, entre vós, compartilhais do conhecimento de que eu ressuscitei dos mortos, e isso não é estranho. Eu tenho o poder de sacrificar a minha vida e de retomá-la; o Pai dá esse poder aos Seus Filhos do Paraíso. Vós deveríeis animar-vos, nos vossos corações, pelo conhecimento de que os mortos de uma idade entraram na ascensão eterna logo depois que eu deixei o novo túmulo de José. Eu vivi a minha vida na carne para mostrar como vós podeis, por meio do serviço do amor, tornar-vos reveladores de Deus para os vossos semelhantes, do mesmo modo que, amando-vos e servindo a vós, eu me tornei o revelador de Deus para vós. Entre vós eu vivi como o Filho do Homem, para que vós e todos os outros homens soubesseis que todos são de fato os filhos de Deus. E, portanto, ide agora a todo o mundo pregar este evangelho do Reino do céu a todos os homens. Amai a todos os homens, como eu vos tenho amado; servi aos vossos semelhantes mortais, como eu vos servi. De graça recebestes e de graça deveis dar. Apenas permanecereis aqui em Jerusalém até que eu vá para o Pai, e até que eu vos envie o Espírito da Verdade. Ele irá conduzir-vos até a verdade mais ampla, e eu irei convosco a todo o mundo. Estarei sempre convosco, e a minha paz eu a deixo convosco”.

193:0:6 20532 Quando o Mestre acabou de falar-lhes, ele desapareceu da sua vista. E já era quase o romper do dia quando esses crentes dispersaram-se; mas permaneceram juntos durante toda a noite, falando com seriedade sobre as exortações do Mestre e refletindo sobre tudo o que havia sucedido a eles. Tiago Zebedeu e outros dos apóstolos expuseram-lhes sobre a experiência deles com o Mestre moroncial na Galiléia e explicaram como ele havia, por três vezes, aparecido a eles.

1. A APARIÇÃO EM SICHAR


193:1:1 20533 Por volta das quatro horas da tarde de sábado, 13 de maio, o Mestre apareceu para Nalda e cerca de vinte e cinco crentes samaritanos perto do poço de Jacó, em Sichar. Os crentes tinham o hábito de encontrar-se nesse lugar, perto de onde Jesus havia falado a Nalda a respeito da água da vida. Nesse dia, exatamente quando eles acabaram as suas discussões sobre a descrição da ressurreição, Jesus apareceu de súbito diante deles e então disse:

193:1:2 20534 “Que a paz esteja convosco. Vós vos rejubilais de saber que eu sou a ressurreição e a vida, mas isso de nada vos valerá, a menos que nasçais primeiro do espírito eterno, chegando, por meio disso, a possuir pela fé o dom da vida eterna. Se fordes os filhos, pela fé, do meu Pai, vós nunca morrereis; vós nunca ireis perecer. O evangelho do Reino vos ensinou que todos os homens são filhos de Deus. E essas boas-novas, a respeito do amor do Pai celeste pelos seus filhos na Terra, devem ser levadas a todo o mundo. É chegada a hora em que vós não ireis adorar a Deus apenas em Gerizim ou em Jerusalém, mas sim onde estiverdes e como estiverdes, em espírito e em verdade. É a vossa fé que salva as vossas almas. A salvação é a dádiva de Deus a todos os que são os filhos Dele. E não vos deixeis enganar; ao mesmo tempo em que a salvação é uma dádiva livre de Deus e é concedida a todos aqueles que a aceitam pela fé, em seguida virá a experiência de conceber os frutos dessa vida espiritual, tal como é vivida na carne. A aceitação da doutrina da paternidade de Deus implica que vós aceitais também, graciosamente, a verdade conseqüente que é a irmandade dos homens. E se o homem é o vosso irmão, ele é mais do que o vosso semelhante, a quem o Pai exige que ameis como a vós próprios. Sendo da vossa própria família, não só amareis ao vosso próprio irmão com uma afeição familiar, mas também servireis a ele como serviríeis a vós próprios. E assim amareis e servireis ao vosso irmão porque, sendo meus irmãos, vós fostes amados e servidos por mim. Ide, então, a todo o mundo falar dessas boas-novas a todas as criaturas de todas as raças, tribos e nações. O meu espírito preceder-vos-á, e eu estarei para sempre convosco”.

193:1:3 20541 Esses samaritanos ficaram bastante atônitos com a aparição do Mestre e partiram apressados para as cidades e aldeias vizinhas, divulgando as novas de que haviam visto Jesus e que ele tinha falado a eles. E essa foi a décima sétima aparição moroncial do Mestre.

2. A APARIÇÃO NA FENÍCIA


193:2:1 20542 A décima oitava aparição moroncial do Mestre aconteceu em Tiro, na terça-feira, 16 de maio, um pouco antes das nove horas da noite. De novo aparecia ele, ao final de uma reunião de crentes, pouco antes de dispersarem-se, dizendo:

193:2:2 20543 “A paz esteja convosco. Vós vos rejubilais de saber que o Filho do Homem ressuscitou dos mortos, porque por meio disso sabeis que vós e os vossos irmãos também sobreviverão ao falecimento mortal. Mas essa sobrevivência depende de que tenhais nascido previamente para o espírito da busca da verdade e do encontro com Deus. O pão e a água da vida são dados apenas àqueles que têm fome da verdade e sede de retidão – por Deus. O fato de que os mortos ressuscitam não é o evangelho do Reino. Essas grandes verdades e esses fatos do universo relacionam-se, todos, com este evangelho, pois são uma parte do resultado da crença nas boas-novas e porque estão incluídas na experiência subseqüente daqueles que, pela fé, se tornam, de fato e na verdade, os filhos perenes do Deus eterno. Meu Pai enviou-me ao mundo para proclamar a todos os homens essa salvação da filiação. E assim eu vos envio ao mundo para pregardes essa salvação da filiação. A salvação é uma dádiva livre de Deus, mas aqueles que nascem do espírito, imediatamente, começarão a mostrar os frutos do espírito no serviço pleno de amor às criaturas semelhantes. E os frutos do espírito divino, que são gerados nas vidas dos mortais nascidos do espírito e sabedores de Deus, são: serviço pleno de amor, devoção não egoísta, lealdade corajosa, eqüidade sincera, honestidade esclarecida, esperança imorredoura, confiança segura, ministração misericordiosa, bondade infalível, tolerância plena do perdão e paz duradoura. Se os crentes declarados não conceberem esses frutos do espírito divino nas suas vidas, eles estão mortos; o Espírito da Verdade não está neles; eles são ramos infrutíferos da videira viva, e logo eles serão podados. O meu Pai exige dos filhos da fé que eles dêem muitos frutos do espírito. Contudo, se vós não derdes frutos, Ele cavará em volta das vossas raízes e podará os vossos ramos infrutíferos. Cada vez mais deveis dar frutos do espírito no vosso progresso para dentro do Reino de Deus, na direção do céu. Vós podeis entrar no Reino como crianças, mas o Pai exige que cresçais, por meio da graça, até a estatura plena da maturidade espiritual. E quando fordes longe dar a todas as nações a boa-nova deste evangelho, eu vos precederei e o meu Espírito da Verdade habitará nos vossos corações. A minha paz eu a deixo convosco”.

193:2:3 20544 E então o Mestre desapareceu da vista deles. No dia seguinte, aqueles que levariam essa história a Sidom, e mesmo até Antióquia e Damasco, saíram de Tiro. Jesus tinha estado com esses crentes quando ele estivera na carne, e eles o reconheceram, muito rapidamente, quando Jesus começou a dar-lhes ensinamentos. Ainda que os seus amigos não conseguissem reconhecer a sua forma moroncial prontamente, assim que ela se tornava visível, eles nunca demoraram para identificar a sua personalidade logo que ele começava a falar.

3. A ÚLTIMA APARIÇÃO EM JERUSALÉM


193:3:1 20551 Cedo pela manhã, na quinta-feira, 18 de maio, Jesus fez a sua última aparição na Terra enquanto personalidade moroncial. No momento em que os onze apóstolos iam sentar-se para o desjejum, na sala de cima da casa de Maria Marcos, Jesus apareceu para eles e disse:

193:3:2 20552 “A paz esteja convosco. Eu pedi-vos que permanecêsseis aqui em Jerusalém até que eu ascendesse ao Pai, e até que eu enviasse a vós o Espírito da Verdade, que em breve será vertido sobre toda a carne, e que vos irá dotar com o poder do alto”. Simão zelote interrompeu Jesus, perguntando: “Então, Mestre, tu irás restaurar o Reino; e nós veremos a glória de Deus manifestada na Terra?” Quando Jesus ouviu a pergunta de Simão, respondeu: “Simão, tu ainda te aténs às tuas idéias antigas sobre o Messias judeu e o reino material. Mas tu receberás um poder espiritual, quando o espírito tiver descido sobre ti, e logo irás a todo o mundo pregar este evangelho do Reino. Do mesmo modo que o Pai enviou-me ao mundo, eu vos envio. E desejo que todos vós ameis uns aos outros e confieis uns nos outros. Judas não mais está conosco, porque o seu amor esfriou e porque ele recusou-se a confiar em vós, os leais irmãos dele. Não lestes nas escrituras onde está escrito: ‘Não é bom para o homem ficar sozinho. Nenhum homem vive para si próprio’? E também onde é dito: ‘Aquele que gostaria de ter amigos deve mostrar-se amigável’? E eu não vos enviei longe para ensinar, dois a dois, para que vós não vos tornásseis solitários e para que não caísseis nos erros e tristezas do isolamento? Vós também sabeis que, quando eu estava na carne, eu não me permiti permanecer só por períodos longos. Desde o princípio da nossa associação eu sempre vim mantendo dois ou três de vós constantemente ao meu lado ou muito perto e à mão, até mesmo quando eu comungava com o Pai. Entregai-vos, portanto, confiando uns nos outros. E isso se faz ainda mais necessário, pois, neste dia, vou deixar-vos sós no mundo. A hora é chegada; estou na eminência de ir para o Pai”.

193:3:3 20553 Quando acabou de falar, fez um sinal para que saíssem com ele e os conduziu ao monte das Oliveiras, onde fez a sua despedida preparatória antes de partir de Urântia. Essa foi uma caminhada solene ao monte das Oliveiras. Nenhuma palavra foi pronunciada por qualquer pessoa, desde o momento em eles deixaram a sala superior, até que Jesus parou junto com eles no monte das Oliveiras.

4. AS CAUSAS DA QUEDA DE JUDAS


193:4:1 20554 Foi na primeira parte da mensagem de adeus do Mestre aos seus apóstolos que ele fez alusão à perda de Judas e mostrou o destino trágico do companheiro de trabalho traidor, como uma advertência solene contra os perigos do isolamento social e fraternal. Pode ser de muita ajuda aos crentes, neste e nos tempos futuros, que um breve exame das causas da queda de Judas seja feito, à luz das observações do Mestre e tendo em vista os esclarecimentos acumulados dos séculos seguintes.

193:4:2 20555 Olhando essa tragédia de um modo retrospectivo, concebemos que, primariamente, se Judas desviou-se para o erro, foi porque era muito marcadamente uma personalidade isolada, uma personalidade fechada em si e distante dos contatos sociais comuns. Ele recusou-se persistentemente a confiar nos seus amigos apóstolos ou a confraternizar-se livremente com eles. Mas ser um tipo isolado de personalidade não teria, em si e por si só, forjado tal erro de Judas, não fosse pelo fato de que ele também não cresceu em amor e em graça espiritual. E então, como se para agravar ainda mais um ponto fraco, ele deu abrigo persistente a ressentimentos e deu forças a inimigos psicológicos, tais como a vingança e a aspiração generalizada de “tirar a diferença” com alguém, por todas as suas decepções.

193:4:3 20561 Essa combinação infeliz de peculiaridades individuais e de tendências mentais conspirou para destruir um homem bem-intencionado que não conseguiu vencer esses males com amor, fé e confiança. Que Judas não tivesse necessariamente de seguir esse caminho do erro é bem comprovado pelos casos de Tomé e de Natanael: ambos foram também amaldiçoados pela mesma espécie de desconfiança e por um desenvolvimento exagerado das tendências individualistas. Mesmo André e Mateus apresentavam muitas tendências nessa direção; mas todos esses homens cresceram no seu amor por Jesus e pelos companheiros apóstolos, cada vez mais e não menos, com o passar do tempo. Eles cresceram em graça e no conhecimento da verdade. Eles tornaram-se cada vez mais confiantes nos seus irmãos e aos poucos desenvolveram a capacidade de confiar nos companheiros. Judas recusou-se com persistência a confiar nos seus irmãos. Quando, por causa do acúmulo dos seus conflitos emocionais, ele sentia-se compelido a buscar o alívio em alguma expressão própria, ele invariavelmente buscava o conselho pouco sábio, e recebia o consolo dos seus parentes não espiritualizados ou de conhecidos casuais que, ou eram indiferentes, ou mesmo hostis, ao bem-estar e ao progresso das realidades espirituais do Reino do céu, do qual ele era um dos consagrados doze embaixadores na Terra.

193:4:4 20562 Judas encontrou a derrota nas suas batalhas de lutas terrenas por causa da fraqueza do seu caráter e dos seguintes fatores, nas suas tendências pessoais:

193:4:5 20563 1. Ele era um ser humano do tipo isolado. Ele era altamente individualista e escolheu tornar-se uma espécie de pessoa confirmadamente fechada e anti-social.

193:4:6 20564 2. Quando era criança, a vida se fez fácil demais para ele. Ele ressentia-se amargamente ao ser contrariado. A sua expectativa era a de ganhar sempre; ele era um péssimo perdedor.

193:4:7 20565 3. Ele nunca adquiriu uma técnica filosófica para defrontar-se com a decepção. Em vez de aceitar os malogros como um aspecto regular e comum da existência humana, ele recorria infalivelmente à prática de culpar alguém em particular, ou os seus companheiros, como um grupo, por todas as suas dificuldades e frustrações pessoais.

193:4:8 20566 4. Ele era dado a manter ressentimentos; e estava sempre alimentando idéias de vingança.

193:4:9 20567 5. Ele não gostava de enfrentar os fatos com sinceridade; ele era desonesto na sua atitude para com as situações da vida.

193:4:10 20568 6. Ele não gostava de discutir os seus problemas pessoais com os seus companheiros próximos; ele recusava-se a falar sobre as suas dificuldades com os seus amigos verdadeiros e com aqueles que o amavam de fato. Em todos os anos da sua relação, nem por uma vez ele recorreu ao Mestre com um problema puramente pessoal.

193:4:11 20569 7. Ele nunca aprendeu que as recompensas verdadeiras, pelo viver com nobreza são, afinal, prêmios espirituais, os quais nem sempre são distribuídos durante essa curta vida na carne.

193:4:12 205610 Como resultado do isolamento persistente da sua personalidade, as suas mágoas multiplicaram-se, as suas tristezas cresceram, as suas ansiedades aumentaram e o seu desespero aprofundou-se a um ponto quase intolerável.

193:4:13 20571 Conquanto esse apóstolo autocentrado e ultra-individualista tenha tido muitos problemas psíquicos, emocionais e espirituais, as suas principais dificuldades foram: na personalidade, ele era isolado; na mente, ele era vingativo e cheio de suspeição; no temperamento, ele era áspero e dado à desforra; emocionalmente, ele era sem amor e incapaz de perdoar; socialmente, ele não confiava e permanecia fechado em si próprio; no espírito, ele tornou-se arrogante e egoisticamente ambicioso; na vida, ele ignorava aqueles que o amavam; e, na morte, ele ficou sem amigos.

193:4:14 20572 Esses, pois, são os fatores mentais e as más influências que, juntas, explicam porque um crente de Jesus, outrora bem-intencionado e também sincero, mesmo depois de vários anos de ligação íntima com a personalidade transformadora de Jesus, abandonou os seus companheiros, repudiou uma causa santa, renunciou à sua sagrada convocação e traiu o seu Mestre divino.

5. A ASCENSÃO DO MESTRE


193:5:1 20573 Eram quase sete horas e meia da manhã dessa quinta-feira, 18 de maio, quando Jesus chegou à rampa oeste do monte das Oliveiras, com os seus onze apóstolos silenciosos e um tanto desorientados. Desse local, a dois terços da subida até o alto da montanha, eles podiam contemplar Jerusalém e o Getsêmane. Jesus agora se preparava para dar o seu último adeus aos apóstolos antes de deixar Urântia. Enquanto Jesus permanecia ali diante deles, eles ajoelharam-se em volta dele em um círculo, sem que fossem mandados, e o Mestre disse:

193:5:2 20574 “Eu vos pedi que ficassem em Jerusalém até que fôsseis dotados com o poder do alto. E agora eu estou a ponto de deixar-vos e de ascender ao meu Pai e, muito em breve, nós enviaremos o Espírito da Verdade a este mundo onde estive; e, quando ele houver chegado, vós ireis começar a nova proclamação do evangelho do Reino, primeiro em Jerusalém e depois nas partes mais distantes do mundo. Amai aos homens com o amor com que eu vos amei, e servi aos semelhantes mortais como eu servi a vós. Pelos frutos do espírito nas vossas vidas, levai as almas a acreditar na verdade de que o homem é um filho de Deus, e de que os homens são irmãos. Lembrai-vos de tudo o que eu vos ensinei e da vida que eu vivi entre vós. O meu amor vos abriga, o meu espírito residirá convosco e a minha paz habitará em vós. Adeus”.

193:5:3 20575 Depois que o Mestre moroncial assim falou, ele desapareceu da vista deles. Essa assim chamada ascensão de Jesus não foi de nenhum modo diferente dos seus outros desaparecimentos da vista mortal, durante os quarenta dias da sua carreira moroncial em Urântia.

193:5:4 20576 O Mestre foi para Edêntia, passando por Jerusém, onde os Altíssimos, sob a observação do Filho do Paraíso, liberaram Jesus de Nazaré do estado moroncial e, por meio dos canais espirituais da ascensão, devolveram-lhe o status de filiação do Paraíso e a soberania suprema em Salvington.

193:5:5 20577 Eram cerca de sete horas e quarenta e cinco minutos dessa manhã quando o Jesus moroncial desapareceu da vista dos seus onze apóstolos, para iniciar a ascensão à mão direita do seu Pai, a fim de receber a confirmação formal da sua soberania completa do universo de Nebadon.

6. PEDRO CONVOCA UMA REUNIÃO


193:6:1 20578 Atuando sob as instruções de Pedro, João Marcos e outros foram reunir os principais discípulos na casa de Maria Marcos. Lá pelas dez horas e trinta minutos, cento e vinte dos mais notáveis discípulos de Jesus que viviam em Jerusalém tinham-se reunido para ouvir o relato da mensagem de despedida do Mestre e para saber da sua ascensão. Entre esses estava Maria, a mãe de Jesus. Ela havia retornado de Jerusalém com João Zebedeu, quando os apóstolos vieram de volta da sua recente viagem à Galiléia. Logo depois de Pentecostes, ela retornaria à casa de Salomé, na Betsaida. Tiago, o irmão de Jesus, também estava presente a esse encontro, a primeira conferência dos discípulos do Mestre a ser convocada depois do fim da sua carreira planetária.

193:6:2 20581 Simão Pedro tomou a si a incumbência de falar pelos seus amigos apóstolos e fez um relato apaixonado do último encontro dos onze, com o seu Mestre e, de modo bastante tocante, retratou o adeus final do Mestre e o seu desaparecimento para a ascensão. Foi um encontro como não houvera nenhum igual antes neste mundo. Essa parte do encontro durou quase uma hora. Pedro então explicou que eles haviam decidido escolher um sucessor para Judas Iscariotes, e que um recesso seria concedido para que os apóstolos pudessem decidir entre os dois homens que tinham sido sugeridos para essa posição: Matias e Justo.

193:6:3 20582 Os onze apóstolos então desceram e, lá embaixo, concordaram em tirar a sorte para determinar qual dentre esses homens deveria tornar-se um apóstolo e servir no lugar de Judas. A sorte escolheu Matias, e ele foi declarado como o novo apóstolo. Foi devidamente instalado no seu posto e então apontado como tesoureiro. Mas Matias teve pouca participação nas atividades subseqüentes dos apóstolos.

193:6:4 20583 Logo depois de Pentecostes os gêmeos voltaram para as suas casas na Galiléia. Simão zelote esteve afastado por algum tempo antes de sair pregando o evangelho. Tomé distanciou-se por um período menor e então reassumiu os seus ensinamentos. Natanael divergia cada vez mais de Pedro a respeito da pregação sobre Jesus, em lugar de proclamar o evangelho anterior do Reino. Esse desacordo tornou-se tão intenso, por volta de meados do mês seguinte, que Natanael retirou-se, indo para a Filadélfia visitar Abner e Lázaro; e, depois de permanecer lá, por mais de um ano, ele foi para as terras além da Mesopotâmia pregar o evangelho, como ele entendia que devia ser.

193:6:5 20584 Isso deixou apenas seis dos doze apóstolos originais, como participantes da cena da proclamação inicial do evangelho em Jerusalém: Pedro, André, Tiago, João, Filipe e Mateus.

193:6:6 20585 Por volta do meio-dia, os apóstolos voltaram para os seus irmãos na sala de cima e anunciaram que Matias havia sido escolhido como o novo apóstolo. E então Pedro convocou os crentes para que orassem, a fim de ficarem preparados para receber a dádiva do espírito que o Mestre havia prometido enviar.

DOCUMENTO 194

O OUTORGAMENTO DO ESPÍRITO DA VERDADE
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Por volta de uma hora, no momento em que cerca de cento e vinte crentes estavam empenhados na oração, todos se aperceberam de uma estranha presença na sala. Ao mesmo tempo os discípulos tornaram-se todos conscientes de uma sensação nova e profunda de alegria espiritual, de segurança e de confiança. Essa consciência nova de força espiritual foi imediatamente seguida por um forte impulso de sair e de proclamar publicamente a palavra do Reino de Deus e as boas-novas de que Jesus tinha ressuscitado de entre os mortos.

194:0:2 20592 Pedro levantou-se e declarou que aquilo devia ser a vinda do Espírito da Verdade, que o Mestre lhes havia prometido; e propôs que fossem ao templo e iniciassem a proclamação das boas-novas confiadas às suas mãos. E todos fizeram aquilo que Pedro havia sugerido.

194:0:3 20593 Esses homens haviam sido instruídos e treinados no sentido de que a palavra de Deus, que iriam pregar, fosse a paternidade de Deus e a filiação do homem, mas, exatamente nesse momento, de êxtase espiritual e de triunfo pessoal, tudo o que esses homens conseguiam pensar, como sendo a melhor informação, como a grande nova, foi no fato de o Mestre estar ressuscitado. E assim eles saíram, dotados de um poder vindo do alto, pregando as boas-novas ao povo – e mesmo a salvação por meio de Jesus –, contudo, não intencionalmente, caíram no erro de substituir a mensagem em si do próprio evangelho, por alguns dos fatos ligados ao evangelho. Sem assim o querer, Pedro caiu nesse erro; os outros o seguiram; e até mesmo Paulo, que criou uma religião recente baseada numa nova versão das boas-novas.

194:0:4 20594 O evangelho do Reino de Deus é: o fato da paternidade de Deus, combinado com a verdade resultante da filiação-irmandade dos homens. O cristianismo, como se desenvolveu a partir desse dia, é: o fato de Deus, enquanto Pai do Senhor Jesus Cristo, em associação com a experiência da crença-comunhão com o Cristo ressuscitado e glorificado.

194:0:5 20595 Não é de se estranhar que esses homens, impregnados pelo espírito, se tivessem agarrado à oportunidade de expressar os seus sentimentos de triunfo sobre as forças que tinham tentado destruir o seu Mestre, deixando de lado, desse modo, a influência dos seus ensinamentos. Em momentos como aqueles era mais fácil lembrarem-se da sua ligação pessoal com Jesus e enlevarem-se com a segurança de que o Mestre ainda estava vivo, de que a sua amizade com ele não tinha chegado ao fim; e de que o espírito tinha realmente vindo sobre eles tal como fora prometido por ele.

194:0:6 20596 Esses crentes sentiram-se subitamente transladados para um outro mundo, em uma nova existência na alegria, poder e glória. O Mestre tinha dito a eles que o Reino viria com um poder, e alguns deles pensaram que estavam começando a vislumbrar o que ele havia desejado expressar.

194:0:7 20597 E quando tudo isso é levado em consideração, não fica difícil entender o modo como esses homens puseram-se a pregar um novo evangelho sobre Jesus, em lugar da sua mensagem anterior da paternidade de Deus e da irmandade entre os homens.

1. O SERMÃO DE PENTECOSTES


194:1:1 20601 Os apóstolos haviam permanecido escondidos por quarenta dias. Ocorreu que esse era o dia do festival de Pentecostes, e milhares de visitantes de todas as partes do mundo estavam em Jerusalém. Muitos vieram para essa festa, mas a maioria havia permanecido na cidade desde a Páscoa. E, agora, os amedrontados apóstolos saíam de uma reclusão de semanas, para aparecerem ousadamente no templo, onde começaram a pregar a nova mensagem de um Messias ressuscitado. E todos os discípulos estavam igualmente conscientes de que tinham recebido algum novo dom espiritual de visão interior e de poder.

194:1:2 20602 Eram aproximadamente duas horas quando Pedro postou-se exatamente naquele mesmo lugar em que o seu Mestre tinha ensinado da última vez, nesse templo, e que pronunciou o chamamento, cheio de paixão, que resultou na conquista de mais de duas mil almas. O Mestre havia ido embora, mas eles descobriram subitamente que esse relato sobre Jesus exercia um grande poder junto ao povo. E não era de se admirar que eles estivessem sendo levados agora, a continuar proclamando aquilo que justificava a sua devoção anterior a Jesus e que, ao mesmo tempo, fosse o que forçava todos a acreditar nele. Seis dos apóstolos participaram desse encontro: Pedro, André, Tiago, João, Filipe e Mateus. Eles conversaram por mais de uma hora e meia e pronunciaram mensagens em grego, hebreu e aramaico, bem como umas poucas palavras noutras línguas das quais tinham algum conhecimento.

194:1:3 20603 Os líderes dos judeus estavam estupefatos diante da audácia dos apóstolos, mas, por causa do grande número dos que acreditavam no seu relato, temiam incomodá-los.

194:1:4 20604 Lá pelas quatro e meia, mais de dois mil novos crentes seguiram os apóstolos até as águas de Siloé, onde Pedro, André, Tiago e João batizaram-nos em nome do Mestre. E estava escuro quando eles acabaram de batizar essa multidão.

194:1:5 20605 Pentecostes era a grande festa do batismo, o tempo de dar as boas-vindas aos prosélitos convertidos de fora, aqueles gentios que desejavam servir a Yavé. Era, portanto, mais fácil que um grande número, tanto de judeus quanto de gentios crentes, se submetesse ao batismo nesse dia. Ao fazer isso, eles não estavam de nenhum modo desligando-se da fé judaica. Mesmo algum tempo depois, esses crentes em Jesus, continuram sendo uma seita dentro do judaísmo. Todos eles, incluindo os apóstolos, permaneciam leais aos requisitos essenciais do sistema cerimonial judaico.

2. O SIGNIFICADO DE PENTECOSTES


194:2:1 20606 Jesus viveu na Terra e ensinou um evangelho que redimiu a humanidade da superstição de que o homem era um filho do mal; e elevou-o à dignidade de filho de Deus pela fé. A mensagem de Jesus, tal como ele a pregou e viveu-a nos seus dias, foi uma solução eficaz para as dificuldades do homem, na época em que foi proposta. E agora, que ele deixou pessoalmente o mundo, ele envia no seu lugar o Espírito da Verdade, que está destinado a viver no homem e, a cada nova geração, a restabelecer a mensagem de Jesus, de um modo tal que cada grupo novo de mortais, a surgir na face da Terra, tenha uma versão nova e atualizada da palavra de Deus, como um esclarecimento pessoal e um guiamento grupal, que se constituirá em uma solução efetiva para as dificuldades espirituais variadas e sempre novas. A primeira missão desse espírito é, está claro, fomentar e personalizar a verdade, pois é a compreensão da verdade que constitui a mais elevada forma de liberdade humana.

194:2:2 20607 Em seguida, o propósito desse espírito é destruir o sentimento de orfandade do crente. Tendo Jesus estado entre os homens, todos os crentes iriam experienciar uma sensação de solidão, não tivesse o Espírito da Verdade vindo para residir nos corações dos homens.

194:2:3 20611 Esse outorgamento, do espírito do Filho preparou efetivamente todas as mentes dos homens comuns para a dádiva posterior do espírito do Pai (o Ajustador) a toda a humanidade. Num certo sentido, esse Espírito da Verdade é o espírito, tanto do Pai Universal como do Filho Criador.

194:2:4 20612 Não cometais o erro de esperar ter uma consciência intelectualmente forte e nítida do Espírito da Verdade efundido. O espírito nunca cria uma consciência de si mesmo, mas cria uma consciência de Michael, o Filho. Desde o princípio, Jesus ensinou que o espírito não falaria de si mesmo. A prova, entretanto, do vosso envolvimento com o Espírito da Verdade, não há de ser encontrada na vossa consciência desse espírito, mas, muito mais intensamente, na vossa experiência de uma irmandade mais elevada com Michael.

194:2:5 20613 O espírito veio também para ajudar os homens a relembrarem-se das palavras do Mestre e compreenderem-nas, bem como para iluminá-los, na re-interpretação da vida dele na Terra.

194:2:6 20614 Em seguida o Espírito da Verdade veio para ajudar aos que acreditam a testemunhar sobre as realidades dos ensinamentos de Jesus e da sua vida, como ele a viveu na carne e como ele novamente a vive, de modo renovado e pujante, no indivíduo que crê, em cada nova geração de filhos de Deus plenificados pelo espírito.

194:2:7 20615 Assim, torna-se, pois, evidente que o Espírito da Verdade vem, realmente, para conduzir todos os que crêem, a toda a verdade, ao conhecimento expansivo da experiência da consciência espiritual viva e crescente, na realidade da filiação ascendente e eterna a Deus.

194:2:8 20616 Jesus viveu uma vida que é uma revelação do homem submetido à vontade do Pai, e não um exemplo que todo homem deva literalmente tentar seguir. Essa vida na carne, junto com a sua morte na cruz e a ressurreição subseqüente, tornou-se atualmente um novo evangelho para o resgate, que é assim pago com o fim de retomar o homem, de volta, das garras do mal – da condenação de um Deus ofendido. Entretanto, mesmo tendo a palavra de Deus sido grandemente distorcida, permanece o fato de que essa nova mensagem sobre Jesus traz em si muitas verdades e os ensinamentos fundamentais das suas primeiras palavras ao Reino. E, mais cedo ou mais tarde, essas verdades ocultas, da paternidade de Deus e da irmandade dos homens, emergirão para transformar efetivamente a civilização de toda a humanidade.

194:2:9 20617 Mas esses erros do intelecto não interferem, de modo algum, no grande progresso de crescimento, em espírito, dos que crêem. Menos de um mês depois do outorgamento do Espírito da Verdade, os apóstolos fizeram um progresso espiritual maior do que durante os quase quatro anos de convívio amoroso pessoal com o Mestre. Nem a substituição da verdade do evangelho salvador, que é a filiação a Deus, pelo fato da ressurreição de Jesus, tampouco, interferiu na rápida difusão dos seus ensinamentos; ao contrário, o fato de que os novos ensinamentos, sobre a sua pessoa e sobre a sua ressurreição, ofuscaram a mensagem de Jesus parece ter facilitado grandemente a pregação das boas-novas.

194:2:10 20618 O termo “batismo do espírito”, que veio a ter um uso tão geral nessa época, significou meramente a recepção consciente dessa dádiva do Espírito da Verdade e a tomada de consciência desse novo poder espiritual, como uma ampliação de todas as influências espirituais experienciadas até então pelas almas conscientes de Deus.

194:2:11 20621 Desde o outorgamento do Espírito da Verdade, está o homem sujeito ao ensinamento e ao guiamento de um dom espiritual tríplice: o espírito do Pai, o Ajustador do Pensamento; o espírito do Filho, o Espírito da Verdade; o espírito do Espírito, o Espírito Santo.

194:2:12 20622 De um certo modo, a humanidade está sujeita à influência dupla, de apelo sétuplo, das influências espirituais do universo. As raças evolucionárias primevas, de mortais, estão submetidas ao contato progressivo com os sete espíritos ajudantes da mente do Espírito Materno do universo local. À medida que o homem progride, escala acima, em inteligência e em percepção espiritual, vão chegando até ele e residindo nele as sete influências dos espíritos superiores. E esses sete espíritos, dos mundos em avanço, são:

194:2:13 20623 1. O espírito outorgado, do Pai Universal – o Ajustador do Pensamento.

194:2:14 20624 2. A presença espiritual do Filho Eterno – a gravidade espiritual do universo dos universos; e o canal certo para a comunhão de todos os espíritos.

194:2:15 20625 3. A presença espiritual do Espírito Infinito – o espírito-mente de toda a criação, a fonte espiritual da semelhança intelectual de todas as inteligências progressivas.

194:2:16 20626 4. O espírito do Pai Universal e do Filho Criador – o Espírito da Verdade, geralmente visto como o espírito do Filho do Universo.

194:2:17 20627 5. O espírito do Espírito Infinito e do Espírito Materno do Universo – o Espírito Santo, geralmente considerado o espírito do Espírito do Universo.

194:2:18 20628 6. O espírito-mente do Espírito Materno do Universo – os sete espíritos ajudantes da mente do universo local.

194:2:19 20629 7. O espírito do Pai, dos Filhos e dos Espíritos – o espírito, com um nome novo, dos mortais ascendentes dos reinos, depois da fusão da sua alma mortal, nascida do espírito, com o Ajustador do Pensamento; e após terem-se elevado, subseqüentemente, até a divindade e atingido a glorificação, por meio do status que atingem, no Corpo de Finalidade do Paraíso.

194:2:20 206210 E assim o outorgamento do Espírito da Verdade trouxe ao mundo e aos seus povos o último dom do espírito, destinado a ajudar na busca ascendente de Deus.

3. O QUE OCORREU EM PENTECOSTES


194:3:1 206211 Muitos ensinamentos estranhos e raros estão ligados às primeiras narrativas do Dia de Pentecostes. Os acontecimentos deste dia, em que o Espírito da Verdade, o novo mestre, veio para morar com a humanidade, tornaram-se confusos, em épocas posteriores, por causa das explosões tolas de uma emoção exagerada. A missão principal dessa efusão do espírito do Pai e do Filho é a de ensinar aos homens sobre as verdades do amor do Pai e da misericórdia do Filho. Essas são as verdades da divindade que o homem pode compreender muito melhor que todos os outros traços do caráter divino. O Espírito da Verdade ocupa-se, principalmente, da revelação da natureza do espírito do Pai e do caráter moral do Filho. O Filho Criador, quando esteve encarnado, revelou Deus aos homens; o Espírito da Verdade, no coração, revela o Filho Criador aos homens. Quando o homem colhe, na sua vida “os frutos do espírito”, ele está simplesmente comprovando as características que o Mestre manifestou na sua própria vida terrena. Quando Jesus esteve na Terra, ele viveu a sua vida como uma personalidade – Jesus de Nazaré. Como espírito residente do “novo instrutor”, desde Pentecostes, o Mestre tem sido capaz de viver a sua vida novamente na experiência de todos os crentes que aprenderam e assimilaram a verdade.

194:3:2 206212 Muitas das coisas que acontecem no decurso de uma vida humana são duras para serem compreendidas, difíceis de serem reconciliadas com a idéia de que este é um universo no qual prevalece

194:3:3 20631 a verdade e no qual a retidão triunfa. Muito freqüentemente parece que o insulto, as mentiras, a desonestidade e a falta de retidão – o pecado – prevalecem. E a fé, afinal, triunfa sobre o mal, o pecado e a iniqüidade? Sim, triunfa. E a vida e a morte de Jesus são a prova eterna de que a verdade da bondade e a fé, na criatura conduzida pelo espírito, serão justificadas sempre. Quando crucificado, chegaram a zombar de Jesus na cruz dizendo: “Vamos ver se Deus virá para libertá-lo”. E o dia da crucificação ficou escuro, mas, na manhã da ressurreição, estava gloriosamente luminoso; e ainda mais brilhante e mais cheio de júbilo esteve o Dia de Pentecostes. As religiões do desespero pessimista buscam obter a liberação das cargas da vida, elas almejam a extinção em um repouso e em um sonho sem fim. Essas religiões são as do medo e do pavor primitivos. A religião de Jesus é uma palavra nova de fé, que há de ser proclamada à humanidade, em meio à sua luta. Essa nova religião está fundada na fé, na esperança e no amor.

194:3:4 20632 A vida mortal deu os mais duros, cruéis e amargos golpes em Jesus; e este homem recebeu todos os golpes desesperados, com fé, coragem e com a determinação inarredável de cumprir a vontade do Pai. Jesus aceitou a vida, em toda a sua realidade terrível, com mestria – até mesmo na morte. Ele não usou a religião como uma liberação para a vida. A religião de Jesus não procura escapar desta vida, com o fito de desfrutar da felicidade de uma outra existência. A religião de Jesus proporciona a felicidade e a paz de uma outra existência espiritual que eleva e enobrece a vida que os homens vivem agora na carne.

194:3:5 20633 Se a religião é um ópio para o povo, assim não é a religião de Jesus. Na cruz ele recusou-se a beber a droga mortal, e o seu espírito, efusionado em toda a carne, é uma influência mundial poderosa que conduz o homem à elevação e que o leva a progredir. O impulso espiritual para o progresso é a força mais poderosa presente neste mundo; aquele que é o verdadeiro crente no aprendizado da verdade é a alma que progride ativa e dinamicamente sobre a Terra.

194:3:6 20634 No Dia de Pentecostes, a religião de Jesus quebrou todas as restrições das nações e as prisões raciais. Para sempre será verdade que “onde está o espírito do Senhor, há liberdade”. Nesse dia, o Espírito da Verdade tornou-se a dádiva pessoal do Mestre a cada mortal. Esse espírito foi concedido com o propósito de qualificar os crentes mais eficazmente, para que preguem a palavra do Reino de Deus, mas eles confundiram a experiência, de receber o espírito efusionado, com uma parte do novo evangelho que eles estavam formulando inconscientemente.

194:3:7 20635 Não desconsidereis o fato de que o Espírito da Verdade foi outorgado a todos aqueles que têm uma crença sincera; essa dádiva do espírito não veio apenas para os apóstolos. Todos os cento e vinte homens e mulheres reunidos na sala superior receberam o novo mestre, como o receberam todos os homens honestos de coração em todo o mundo. Esse novo mestre foi concedido à humanidade e cada alma o recebeu na proporção do seu amor pela verdade e da sua capacidade de apreender e compreender as realidades espirituais. Afinal, a verdadeira religião libera-se da custódia dos sacerdotes e de todas as castas sagradas e encontra a sua manifestação real nas almas individuais dos homens.

194:3:8 20636 A religião de Jesus desenvolve o tipo mais elevado de civilização humana, pois cria o tipo mais elevado de personalidade espiritual e proclama a condição sagrada da pessoa. A vinda do Espírito da Verdade, em Pentecostes, tornou possível uma religião que não é nem radical nem conservadora; não é nem a velha nem a nova, que não irá ser dominada nem pelos velhos nem pelos jovens. O fato da vida terrena de Jesus proporciona um ponto fixo para a ancoragem do tempo, enquanto o outorgamento do Espírito da Verdade proporciona a expansão eterna e o crescimento interminável da religião que ele viveu e da palavra de Deus por ele proclamada. O espírito guia para dentro de toda a verdade; ele é o mestre de uma religião que expande e cresce sempre, de progresso sem fim e de revelação do divino. Esse novo mestre desvelará, para sempre, ao crente em busca a verdade, tudo aquilo que esteve tão divinamente velado e contido na pessoa e na natureza do Filho do Homem.

194:3:9 20641 As manifestações ligadas ao outorgamento do “novo mestre”, e o modo como os homens de várias raças e nações, reunidas em Jerusalém, receberam a pregação dos apóstolos, indicam a universalidade da religião de Jesus. O evangelho do Reino de Deus não se devia identificar com nenhuma raça, cultura ou língua em particular. Esse Dia de Pentecostes testemunhou um grande esforço do espírito, no sentido de liberar a religião de Jesus dos seus elos herdados dos judeus. Mesmo após essa demonstração da efusão do espírito sobre toda a carne, os apóstolos, no princípio, ainda tentaram impor os quesitos do judaísmo aos convertidos. E até mesmo Paulo teve problemas com os seus irmãos de Jerusalém, porque ele se recusou a submeter os gentios às práticas judaicas. Nenhuma religião revelada pode difundir-se pelo mundo inteiro se comete o grave erro de se deixar permear por uma cultura nacional ou de se ligar a práticas raciais, sociais ou econômicas.

194:3:10 20642 O outorgamento do Espírito da Verdade foi independente de todas as formas, cerimônias, lugares sagrados e comportamentos especiais da parte daqueles que receberam, em plenitude, a sua manifestação. Quando o espírito veio sobre as pessoas reunidas no salão superior, elas estavam simplesmente sentadas lá, tendo acabado de orar em silêncio. O espírito foi concedido tanto no campo como na cidade. Não foi necessário que os apóstolos se dirigissem a um local isolado, durante anos de meditação solitária, para que recebessem o espírito. Para todo o sempre, Pentecostes desligou a experiência espiritual, da noção de que houvesse locais especialmente favorecidos.

194:3:11 20643 Pentecostes com o seu dom espiritual estava destinada a desligar a religião do Mestre de qualquer dependência de força física; os mestres dessa nova religião estão agora equipados com armas espirituais. Devem sair para conquistar o mundo com o perdão infalível, com uma boa vontade incomparável e amor abundante. Eles estão equipados para sobrepor o bem ao mal, para vencer o ódio pelo amor, para destruir o temor com uma fé corajosa na verdade. Jesus já havia ensinado aos seus seguidores que a sua religião nunca era passiva; e que os seus discípulos deviam ser sempre ativos e positivos nas suas ministrações de misericórdia e nas suas manifestações de amor. Esses crentes já não consideravam Yavé como o “Senhor das Hostes”. Eles agora consideravam a Deidade eterna como o “Deus, e Pai do Senhor Jesus Cristo”. Pelo menos esse progresso eles fizeram, ainda que não tenham apreendido, inteiramente, a verdade de que Deus é também o Pai de todos os indivíduos.

194:3:12 20644 Pentecostes dotou o homem mortal com o poder de perdoar as agressões pessoais, de manter-se doce em meio à injustiça mais grave, de permanecer firme em face do perigo mais tremendo, e de desafiar os males do ódio e da ira, por meio de atos audazes de amor e de paciência. Urântia passou, na sua história, pela destruição de guerras grandes e arrasadoras. Todos os participantes dessas lutas terríveis encontraram a derrota. Houve apenas um vitorioso; houve apenas um, que saiu dessas lutas amargas com a sua reputação mais elevada – e este foi Jesus de Nazaré e a sua palavra divina, de sobrepujar o mal com o bem. O segredo de uma civilização melhor está contido nos ensinamentos do Mestre, sobre a irmandade dos homens, a boa vontade do amor e da confiança mútua.

194:3:13 20651 Até Pentecostes, a religião tinha revelado apenas o homem à procura de Deus; desde Pentecostes, permanece o homem na busca de Deus, mas brilha sobre o mundo o espetáculo de Deus, que também busca o homem e que, tão logo o tenha achado, envia o Seu espírito para residir dentro dele.

194:3:14 20652 Antes dos ensinamentos de Jesus, que culminaram em Pentecostes, as mulheres tinham pouca ou nenhuma posição espiritual, segundo os pequenos dogmas das religiões mais antigas. Depois de Pentecostes, na irmandade do Reino, as mulheres colocaram-se perante Deus em igualdade com os homens. Entre os cento e vinte que receberam essa visitação especial do espírito, estavam muitas das mulheres discípulas e elas compartilharam dessas bênçãos igualmente com os crentes homens. Não mais pode o homem presumir monopolizar o ministério dos serviços religiosos. O fariseu poderia continuar a agradecer a Deus por não “ter nascido mulher, nem leproso, nem gentio”, mas entre os seguidores de Jesus, a mulher foi para sempre libertada de todas as discriminações baseadas no sexo. Pentecostes pôs fim a todas as discriminações religiosas fundadas em distinções raciais, diferenças culturais, castas sociais, ou preconceito de sexo. Não é de se estranhar que os crentes da nova religião clamassem aos brados: “Onde está o espírito do Senhor, lá está a liberdade”.

194:3:15 20653 Tanto a mãe quanto um irmão de Jesus estavam presentes entre os cento e vinte crentes e, como membros desse grupo comum de discípulos eles também receberam o espírito efundido. Eles não receberam, de tal dom do bem, nada mais do que os seus semelhantes. Nenhuma dádiva especial foi conferida aos membros da família terrena de Jesus. Pentecostes marcou o fim dos sacerdócios especiais e de toda a crença em famílias sagradas.

194:3:16 20654 Antes de Pentecostes os apóstolos tinham renunciado a muitas coisas por Jesus. Tinham sacrificado os seus lares, famílias, amigos, bens mundanos e posição. Em Pentecostes eles entregaram-se a Deus; e o Pai e o Filho responderam, dando-se ao homem – enviando os Seus espíritos para residir dentro do homem. Essa experiência de perder o eu, e de encontrar o espírito, não foi apenas a da emoção; foi um ato de auto-rendimento inteligente e de consagração sem reservas.

194:3:17 20655 Pentecostes foi o chamado à unidade espiritual, entre os que acreditam na palavra sagrada. Quando o espírito desceu sobre os discípulos, em Jerusalém, a mesma coisa aconteceu na Filadélfia, Alexandria e em todos os outros lugares onde estavam os crentes verdadeiros. Era verdade, literalmente, que “havia uma só alma e um coração, na multidão dos crentes”. A religião de Jesus é a mais poderosa influência unificadora que o mundo jamais conheceu.

194:3:18 20656 Pentecostes teve o propósito de minimizar a presunção dos indivíduos, grupos, nações e raças. A tensão desse sentimento de presunção aumenta tanto que, periodicamente, desemboca em guerras destrutivas. A humanidade pode ser unificada apenas pelo enfoque espiritual; e o Espírito da Verdade é, neste mundo, uma influência que é universal.

194:3:19 20657 A vinda do Espírito da Verdade purifica o coração humano e conduz a pessoa que o recebe, a formular um único propósito de vida, na vontade de Deus e para o bem-estar dos homens. O espírito material do egoísmo foi engolfado por esse novo outorgamento de altruísmo. Pentecostes, então e agora, significa que o Jesus da história tornou-se o Filho divino da experiência vivente. A exultação, que esse espírito traz ao ser efundido, e, quando é experimentado conscientemente na vida humana, é um tônico para a saúde, um estímulo para a mente e uma energia infalível para a alma.

194:3:20 20658 A prece não trouxe o espírito no Dia de Pentecostes; mas teve muito a ver com a determinação da capacidade de receptividade que caracterizou cada indivíduo crente. A prece não conduz o coração divino à generosidade da dádiva da graça, mas muito freqüentemente forma canais mais largos e mais profundos pelos quais a graça e os outorgamentos divinos podem fluir até os corações e as almas daqueles que assim lembram-se de manter uma comunhão ininterrupta com o seu Criador, por meio da prece sincera e da adoração verdadeira.

4. OS PRIMÓRDIOS DA IGREJA CRISTÃ


194:4:1 20661 Quando Jesus foi subitamente aprisionado pelos seus inimigos e tão rapidamente crucificado, entre os dois ladrões, os seus apóstolos e discípulos ficaram inteiramente desmoralizados. O pensamento de que o Mestre houvesse sido preso, amarrado, açoitado e crucificado, era demais, até mesmo para os apóstolos. Eles esqueceram-se dos seus ensinamentos e das suas advertências. Ele podia, de fato, ter sido “um profeta poderoso nos feitos e nas palavras, perante Deus e todo o povo”, mas dificilmente seria o Messias que restauraria o reino de Israel, e disso é que eles tinham esperança.

194:4:2 20662 Então veio a ressurreição, que os livra do desespero e que os leva de volta à sua fé na divindade do Mestre. De novo e de novo eles falam com ele; e ele os leva ao monte das Oliveiras, onde ele despede-se e lhes diz que está indo de volta ao Pai. Ele lhes tinha dito para permanecer em Jerusalém, até serem dotados com o poder – até que o Espírito da Verdade viesse. E, no Dia de Pentecostes, este novo mestre vem; e eles saem imediatamente para pregar o seu evangelho, com um novo poder. São os seguidores audazes e valentes de um Senhor vivo, não de um líder morto e derrotado. O Mestre vive nos corações desses evangelistas; Deus não é uma doutrina nas suas mentes; tornou-Se uma presença viva nas suas almas.

194:4:3 20663 “Dia a dia eles continuaram perseverando unânimes no templo e repartindo o pão nas suas casas. Comiam juntos com alegria e simplicidade de coração, louvando a Deus e em favores com todo o povo. Estavam todos preenchidos pelo espírito e falavam da palavra de Deus com ousadia. E as multidões dos que acreditavam estavam com um único coração e uma só alma; e nenhum deles dizia que as suas coisas pertenciam apenas a ele; e possuíam todas as coisas dividindo-as”.

194:4:4 20664 O que aconteceu àqueles homens a quem Jesus havia ordenado que saíssem para pregar a palavra do Reino de Deus, a paternidade de Deus e a irmandade entre os homens? Eles têm um novo evangelho; estão ardentes pelo fogo de uma nova experiência; estão repletos de uma energia espiritual nova. A sua mensagem transformou-se subitamente na proclamação do Cristo que ressuscitou: “Jesus de Nazaré, um homem que Deus aprovou por meio de obras poderosas e prodigiosas; a ele, que foi enviado com conhecimento prévio e com o conselho determinado de Deus, vós o crucificastes e matastes. As coisas que Deus havia prenunciado pela boca de todos os profetas, Ele as cumpriu. A esse Jesus, Deus o ressuscitou. Deus o fez tanto Senhor quanto Cristo. Tendo sido, pela mão direita de Deus, exaltado e tendo recebido do Pai a promessa do espírito, ele derrama sobre vós, isso que vedes e ouvis. Arrependei, para que sejam apagados os vossos pecados; para que o Pai, pois, possa enviar o Cristo, antes anunciado a vós, o mesmo Jesus; a quem os céus devem receber até os tempos da restauração de todas as coisas”.

194:4:5 20665 O evangelho do Reino, a mensagem de Jesus, subitamente havia sido transformada no evangelho do Senhor Jesus Cristo. Eles agora proclamavam os fatos da sua vida, morte e ressurreição e pregavam a esperança de um pronto retorno dele a este mundo, para concluir o trabalho que começara. Assim a mensagem dos primeiros crentes tinha a ver com a pregação sobre os fatos da sua primeira vinda e com o ensinamento da esperança da sua segunda vinda, um evento que eles consideravam estar muito próximo.

194:4:6 20671 Cristo estava a ponto de se transformar no credo da igreja que rapidamente se formava. Jesus vive; ele morreu pelos homens; ele trouxe o espírito; e ele virá de novo. Jesus preencheu todos os pensamentos dos homens e determinou todo o seu conceito novo sobre Deus e sobre tudo o mais. Eles estavam por demais entusiasmados com a nova doutrina de que “Deus é Pai do Senhor Jesus” para preocuparem-se com a velha mensagem de que “Deus é o Pai amantíssimo de todos os homens”, e mesmo de cada indivíduo. É bem verdade que uma manifestação maravilhosa de amor fraternal e de uma boa vontade inigualável surgiu nas primeiras comunidades de crentes. Mas era uma irmandade de crentes em Jesus, não uma comunidade de irmãos na família do Reino do Pai nos céus. A boa vontade deles cresceu do amor nascido do conceito da auto-doação de Jesus e não do reconhecimento da irmandade do homem mortal. Contudo, estavam repletos de alegria e viveram vidas tão novas e únicas que todos os homens foram atraídos para os seus ensinamentos sobre Jesus. Cometeram o grande erro de tomar os comentários vivos e ilustrativos a respeito do evangelho do Reino de Deus, pelo evangelho em si, mas ainda assim aquela era a maior religião que a humanidade havia conhecido até então.

194:4:7 20672 Inequivocamente, uma nova comunidade estava surgindo no mundo. "A multidão de crentes continuava perseverante nos ensinamentos e na comunhão com os apóstolos, na partilha do pão e nas orações. Eles chamavam-se de irmão e irmã entre si, saudavam-se com um beijo sagrado e ministravam aos pobres. Era uma comunidade de vida, bem como de adoração. Não eram comunitários por obrigação, mas pelo desejo de compartilhar os seus bens com os seus irmãos de crença. Eles esperavam, confiantes, que Jesus fosse retornar, para completar o estabelecimento do Reino do Pai, ainda naquela geração. Essa espontaneidade ao compartilhar as posses terrenas não era um aspecto direto do ensinamento de Jesus, ela surgiu porque esses homens e mulheres confiavam sinceramente que ele retornaria a qualquer dia, para completar o seu trabalho e consumar o Reino. Mas os resultados finais, desse experimento bem-intencionado de amor fraternal irrefletido, foram desastrosos e trouxeram sofrimentos. Milhares de crentes honestos venderam as suas propriedades e dispuseram de todos os seus bens capitais e outros bens produtivos. Com o passar do tempo, os recursos minguantes daquele sistema cristão de “compartilhar por igual” chegaram ao fim – mas o mundo não. Muito cedo os crentes em Antióquia estavam fazendo uma coleta para que os demais crentes, em Jerusalém, não morressem de fome.

194:4:8 20673 Naqueles dias eles celebraram a Ceia do Senhor, do modo como foi estabelecida; quer dizer, reuniram-se para uma refeição social de bom companheirismo e compartilharam do sacramento ao final da refeição.

194:4:9 20674 Inicialmente eles batizavam em nome de Jesus; passaram quase vinte anos antes que começassem a batizar em “nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”. O batismo era o único quesito para admissão à comunidade de crentes. Não tinham ainda nenhuma organização; era simplesmente a irmandade de Jesus.

194:4:10 20675 Essa seita de Jesus estava crescendo rapidamente e uma vez mais os saduceus preocupavam-se com ela. Os fariseus pouco se incomodavam com a situação, vendo que nenhum dos ensinamentos, de nenhum modo, interferia com a observância das leis judaicas. Mas os saduceus começaram a encarcerar os líderes da seita de Jesus, até que fossem convencidos a aceitar os conselhos de Gamaliel, um dos rabinos líderes, que lhes aconselhou: “Afastem-se desses homens e deixem-nos em paz, pois se esse conselho ou essa obra for dos homens, derrubar-se-á por si; mas, se for de Deus, não sereis capaz de derrubá-la, e que não sejais apanhados lutando contra Deus”. Eles decidiram seguir o conselho de Gamaliel e sobreveio um período de paz e calma em Jerusalém, durante o qual o novo evangelho sobre Jesus espalhou-se rapidamente.

194:4:11 20681 E assim tudo andava bem em Jerusalém, até a época da chegada dos gregos, em grande número, vindos de Alexandria. Dois dos alunos de Rodam chegaram em Jerusalém e converteram muitos entre os helenistas. Entre os seus primeiros convertidos estavam Estevão e Barnabé. Esses hábeis gregos não tinham o ponto de vista dos judeus e não se adequaram tão bem ao seu modo de adoração e a outras práticas cerimoniais. E foram os feitos desses crentes gregos que acabaram com as relações pacíficas entre a irmandade de Jesus e os fariseus e saduceus. Estevão e o seu companheiro grego começaram a pregar mais conforme o que Jesus ensinara, e isso os colocou em conflito imediato com os potentados judeus. Num dos sermões públicos de Estevão, quando ele chegou ao ponto objetável do discurso, eles dispensaram todas as formalidades do julgamento e começaram a apedrejá-lo ali mesmo, até a morte.

194:4:12 20682 Estevão, o líder da colônia grega dos crentes de Jesus em Jerusalém, assim tornou-se o primeiro mártir da nova fé e a causa específica para que acontecesse a organização formal da igreja cristã inicial. Essa nova crise levou ao reconhecimento de que os crentes não podiam continuar como uma seita dentro da fé judaica. Todos eles concordaram que deviam separar-se dos não crentes; e um mês depois da morte de Estevão a igreja em Jerusalém foi organizada, sob a liderança de Pedro; e Tiago, o irmão de Jesus, passou a ser o seu dirigente titular.

194:4:13 20683 E então irromperam as novas e incansáveis perseguições feitas pelos judeus, de modo que os instrutores ativos da nova religião sobre Jesus, que subseqüentemente em Antióquia foi denominada de cristianismo, saíram até os confins do império proclamando Jesus. Para levar essa mensagem, antes do tempo de Paulo, a liderança estava nas mãos dos gregos; e esses primeiros missionários, como também os posteriores, seguiram a rota antiga dos passos de Alexandre, indo até a Antioquia, por Gaza e Tiro e, depois, até a Macedônia, pela Ásia Menor; e então para Roma e na direção de todos os confins do império.

DOCUMENTO 195

DEPOIS DE PENTECOSTES
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Os resultados da pregação de Pedro, no Dia de Pentecostes, foram tais que decidiram sobre as políticas futuras e determinaram os planos da maioria dos apóstolos, nos seus esforços para proclamar o evangelho do Reino. Pedro foi o verdadeiro fundador da igreja cristã; Paulo levou a mensagem cristã aos gentios, e os crentes gregos difundiram-na por todo o império romano.

195:0:2 20692 Embora o povo hebreu, limitado às tradições e dominado pelos sacerdotes, como povo, se recusasse a aceitar, fosse o evangelho de Jesus, da paternidade de Deus e da irmandade dos homens, fosse a proclamação de Pedro e de Paulo, da ressurreição e da ascensão de Cristo (o cristianismo subseqüente), todo o restante do império romano acabou sendo receptivo aos ensinamentos cristãos que evoluíam. Nesse momento a civilização ocidental estava intelectualmente cansada da guerra e encontrava-se também profundamente cética a respeito de todas as religiões e filosofias existentes sobre o universo. Os povos do mundo ocidental, os beneficiários da cultura grega, tinham uma respeitada tradição de um passado grandioso. Eles podiam contemplar a herança de grandes realizações na filosofia, na arte, na literatura e nos progressos políticos. Mas, ao lado de todas essas realizações, eles não tinham tido nenhuma religião que satisfizesse à alma. Os seus anseios espirituais permaneciam insatisfeitos.

195:0:3 20693 E subitamente, sobre esse cenário da sociedade humana, foram lançados os ensinamentos de Jesus, adotados na mensagem cristã. Uma nova ordem de vida foi, assim, apresentada aos corações insaciados desses povos do Ocidente. Essa situação significava um conflito imediato entre as práticas religiosas mais antigas e a nova versão cristianizada da mensagem de Jesus ao mundo. Um tal conflito resultaria em uma vitória definida, fosse da nova crença, ou da mais antiga, ou fosse em algum grau de concessões feitas por alguma dessas partes. A história mostra que a luta levou à um comprometimento sob a forma de concessões. O cristianismo presumiu abranger coisas demasiadamente maiores do que qualquer povo pudesse assimilar em uma ou duas gerações. Não tratava-se de uma chamada espiritual simples, como a que Jesus havia apresentado à alma dos homens; abrangia, desde muito cedo, uma atitude sobre os rituais religiosos, a educação, a magia, a medicina, a arte, a literatura, a legislação, o governo, a moral, a regulamentação do sexo, a poligamia e, em um grau limitado, até mesmo a escravidão. O cristianismo não veio meramente como uma nova religião – como algo pelo qual todo império romano e todo Oriente estivessem esperando – mas como uma nova ordem de sociedade humana. E, com uma tal pretensão, precipitou rapidamente o colapso moral-social das idades. Os ideais de Jesus, tal como foram reinterpretados pela filosofia grega e socializados pela cristandade, desafiavam agora, com ousadia, as tradições da raça humana, incorporados na ética, na moralidade e na religião da civilização ocidental.

195:0:4 20694 De início, o cristianismo conseguiu convertidos apenas nos estratos sociais e econômicos mais baixos. Mas, por volta do segundo século, o melhor da elite da cultura greco-romana, se voltava cada vez mais para essa nova ordem de crença cristã, para esse novo conceito de propósito de vida e meta de existência.

195:0:5 20701 Como é que essa nova mensagem, de origem judaica, que quase fracassara na sua terra de nascimento, capturou tão rápida e eficazmente o melhor mesmo das mentes do império romano? O triunfo do cristianismo sobre as religiões filosóficas e os cultos dos mistérios deveu-se aos fatores:

195:0:6 20702 1. A organização. Paulo era um grande organizador e os seus sucessores mantiveram o ritmo que ele estabeleceu.

195:0:7 20703 2. O cristianismo estava profundamente helenizado. Abrangia o melhor da filosofia grega, bem como a nata da teologia hebraica.

195:0:8 20704 3. Mas, melhor do que tudo, trazia em si um ideal novo e grande, o eco da vida auto-outorgada de Jesus e o reflexo da sua mensagem de salvação, para toda a humanidade.

195:0:9 20705 4. Os líderes cristãos estavam dispostos a fazer concessões ao mitraísmo, pois a melhor metade dos que haviam aderido ao cristianismo fora conquistada ao culto da Antióquia.

195:0:10 20706 5. Do mesmo modo, a próxima e mais recente das gerações de líderes da cristandade fez outras concessões mais ao paganismo, tanto que até Constantino, o imperador romano, foi conquistado para a nova religião.

195:0:11 20707 E os cristãos fizeram uma barganha astuta com os pagãos, pois adotaram a pompa ritualística dos pagãos obrigando-os a aceitar a versão helenizada do cristianismo paulino. O acordo que fizeram com os pagãos foi melhor do que aquele que concluíram com o culto mitraico, mas, mesmo naquele compromisso inicial de concessão, eles saíram mais do que vencedores, pois tiveram êxito em eliminar as imoralidades grosseiras e também numerosas outras práticas repreensíveis do mistério persa.

195:0:12 20708 Esses líderes iniciais da cristandade, sabiamente ou não, comprometeram deliberadamente os ideais de Jesus, em um esforço para salvar e promover muitas das suas idéias, e nisso eles tiveram um êxito eminente. Mas não vos enganeis! Esses ideais do Mestre, ainda que comprometidos, estão latentes no seu evangelho e terminarão por fazer valer todo o seu poder diante do mundo.

195:0:13 20709 Por meio dessa paganização do cristianismo, a velha ordem teve muitas vitórias menores, de natureza ritualista, mas os cristãos ganharam a ascendência, pois:

195:0:14 207010 1. Foi tocada uma nota da moral humana, uma nota nova e de conotação enormemente mais elevada.

195:0:15 207011 2. Um conceito novo e ampliado de Deus foi passado ao mundo.

195:0:16 207012 3. A esperança de imortalidade tornou-se um ponto de reafirmação, dentro de uma religião reconhecida.

195:0:17 207013 4. Jesus de Nazaré foi dado à alma sedenta do homem.

195:0:18 207014 Muitas das grandes verdades, ensinadas por Jesus, foram quase perdidas nesses comprometimentos iniciais, mas elas ainda permanecem como que adormecidas nessa religião de cristianismo paganizado, que é, por sua vez, a versão paulina da vida e dos ensinamentos do Filho do Homem. E o cristianismo, mesmo antes de ser paganizado, foi profundamente helenizado. O cristianismo deve muito aos gregos, bastante mesmo. Um grego, vindo do Egito, foi que muito corajosamente levantou-se em Nicéia e tão destemidamente desafiou a assembléia, que o concílio não ousou obscurecer o conceito da natureza de Jesus; pois a verdade mesma da auto-outorga tinha estado em perigo de ser perdida para o mundo. O nome desse grego foi Atanásio e, não fosse a eloqüência e lógica desse crente, a força persuasiva de Ários teria triunfado.

1. A INFLUÊNCIA DOS GREGOS


195:1:1 20711 A helenização da cristandade, na realidade, começou naquele dia memorável em que o apóstolo Paulo, diante do conselho de Areópagos, em Atenas, falou aos atenienses sobre “o Deus Desconhecido”. Lá, à sombra da Acrópolis, esse cidadão romano proclamou aos gregos a sua versão da nova religião, que tinha tido origem na terra judaica da Galiléia. E havia coisas estranhamente semelhantes entre a filosofia grega e muitos dos ensinamentos de Jesus. Eles tinham uma meta em comum – ambos visavam o soerguimento do indivíduo. Os gregos, por meio da emergência social e política do indivíduo; e Jesus, por meio da emergência moral e espiritual do homem. Os gregos ensinavam o liberalismo intelectual que conduzia à liberdade política; Jesus ensinava o liberalismo espiritual que conduzia à liberdade religiosa. Essas duas idéias colocadas juntas constituíam um novo e poderoso código para a liberdade humana, e prognosticavam, para o homem, a sua liberdade social, política e espiritual.

195:1:2 20712 O cristianismo veio à existência e triunfou sobre todas a religiões, então em contenda, principalmente por causa de duas coisas:

195:1:3 20713 1. A mente grega estava disposta a tomar emprestadas idéias novas e boas, ainda que fosse dos judeus.

195:1:4 20714 2. Paulo e os seus sucessores estavam dispostos a comprometerem-se, mas fazendo concessões astuciosas e sagazes; eles eram negociantes teológicos perspicazes.

195:1:5 20715 Na época, Paulo dirigiu-se a Atenas pregando “Cristo, e o Cristo Crucificado”, os gregos estavam espiritualmente sedentos; encontravam-se em uma busca inquiridora, interessada e, na realidade, à procura da verdade espiritual. Nunca vos esqueçais de que a princípio os romanos combateram o cristianismo, enquanto os gregos adotaram-no, e de que foram os gregos que literalmente forçaram os romanos, subseqüentemente, a aceitar essa nova religião, já então modificada como uma parte da cultura grega.

195:1:6 20716 Os gregos veneravam a beleza, os judeus a santidade; mas ambos os povos amavam a verdade. Durante séculos os gregos pensaram e debateram seriamente sobre todos os problemas humanos – sociais, econômicos, políticos e filosóficos –, exceto sobre a religião. Poucos entre os gregos haviam dado atenção maior à religião; eles não levavam muito a sério nem a própria religião. Durante séculos os judeus haviam negligenciado esses outros campos do pensamento ao devotar as suas mentes à religião. Eles levavam a própria religião bastante a sério, talvez até em demasia. Iluminado pelo conteúdo da mensagem de Jesus, o produto de séculos de pensamento desses dois povos, agora unidos, transformavam-se na força motriz de uma nova ordem de sociedade humana e, em uma certa medida, de uma nova ordem de crença e de prática humana religiosa.

195:1:7 20717 A influência da cultura grega tinha já penetrado as terras do Mediterrâneo Oriental, quando Alexandre expandiu a civilização helênica no mundo do Oriente próximo. Os gregos saíam-se muito bem com a sua religião e a sua política, enquanto estiveram organizados em pequenas cidades-Estado, mas, quando o rei macedônio ousou expandir a Grécia, como um império, que se estendia do Adriático ao rio Indus, os problemas começaram. A arte e a filosofia da Grécia estavam perfeitamente à altura da expansão imperial, mas não era bem assim com a administração política grega, nem com a religião. Depois que as cidades-Estado da Grécia conseguiram expandir-se como império, os seus deuses paroquiais pareciam um pouco esquisitos. Os gregos realmente estavam procurando um Deus único, um Deus maior e melhor, quando a versão cristianizada da antiga religião judaica chegou a eles.

195:1:8 20721 O império helenista, enquanto tal, não podia durar. A sua influência cultural continuou, mas só durou até assegurar para si o gênio político romano do Ocidente, para a administração do império, e depois que obteve do Oriente uma religião cujo Deus único possuía a dignidade imperial.

195:1:9 20722 No primeiro século depois de Cristo, a cultura helênica havia já atingido os seus níveis mais elevados; o seu retrocesso tinha começado; o aprendizado avançava, mas a genialidade declinava. Foi nessa mesma época que as idéias e os ideais de Jesus, que estavam parcialmente incorporados ao cristianismo concorreram para salvar a cultura e o conhecimento gregos.

195:1:10 20723 Alexandre havia atacado o Oriente com a dádiva cultural da civilização da Grécia; Paulo assaltou o Ocidente com a versão cristã do evangelho de Jesus. E em todos os lugares em que a cultura grega prevaleceu, em todo o Ocidente, também o cristianismo helenizado criou raiz.

195:1:11 20724 A versão oriental da mensagem de Jesus, não obstante ter permanecido mais fiel aos ensinamentos dele, continuou seguindo a atitude de Abner de não fazer comprometimentos sob forma de concessões. E nunca progrediu como o fez a versão helenizada permanecendo enfim perdida no movimento islâmico.

2. A INFLUÊNCIA ROMANA


195:2:1 20725 Os romanos incorporaram a cultura grega na totalidade, colocando governos representativos em lugar de governos por áreas. E em breve essa mudança favoreceu o cristianismo, pois Roma trouxe a todo o mundo ocidental uma nova tolerância para línguas, povos e mesmo religiões estrangeiras.

195:2:2 20726 Grande parte da perseguição inicial aos cristãos, em Roma, foi devido apenas ao uso infeliz que faziam do termo “reino” nas suas pregações. Os romanos eram tolerantes com toda e qualquer religião, mas ressentiam-se muito de qualquer coisa que tivesse o sabor de rivalidade política. E, assim, quando essas perseguições iniciais, devido tão somente a mal-entendidos, tiveram fim, o campo para a propagação religiosa encontrava-se bem aberto. Os romanos estavam interessados na administração política; eles não se importavam muito com a arte nem com a religião, eram tolerantes com ambas de um modo extraordinário.

195:2:3 20727 A lei oriental era severa e arbitrária; a lei grega era fluida e artística; a lei romana era dignificada e inspiradora de respeito. A educação romana induzia uma lealdade inédita e impassível. Os romanos do período inicial eram indivíduos politicamente devotados e consagrados de um modo sublime. Eram honestos, zelosos e dedicados aos seus ideais, mas não tinham uma religião digna de ser chamada como tal. Não é de se admirar que os instrutores gregos tivessem sido capazes de persuadi-los a aceitar o cristianismo de Paulo.

195:2:4 20728 E esses romanos eram um grande povo. Eles puderam governar o Ocidente porque se governavam bem a si próprios. Uma honestidade sem par, uma tal devoção e um autocontrole tão decidido, formavam o solo ideal para receber e para fazer crescer a cristandade.

195:2:5 20729 Foi fácil para esses greco-romanos tornarem-se tão espiritualmente devotados a uma igreja institucionalizada, quanto o eram politicamente ao Estado. Os romanos combateram a igreja apenas quando temeram que ela estivesse competindo com o Estado. Roma, tendo uma filosofia nacional tímida e pouca cultura nativa, tomou a cultura grega como sua própria e fez de Cristo, com valentia, a sua própria filosofia moral. O cristianismo converteu-se na cultura moral de Roma, mas dificilmente tornou-se a sua religião, no sentido de ser, para aqueles que abraçaram a nova religião, uma experiência individual de crescimento espiritual, a religião de um modo pleno. É verdade, de fato, que muitos indivíduos a penetraram com mais profundidade, saindo da superfície de toda essa religião-estatal, e encontraram alimento para as suas almas nos valores reais dos significados, mascarados detrás das verdades latentes do cristianismo helenizado e paganizado.

195:2:6 20731 Os estóicos e o seu apelo inflexível à “natureza e à consciência” tinham preparado bem toda a Roma para receber Cristo, pelo menos em um sentido intelectual. O romano era, por natureza e por educação, um legislador; ele venerava até mesmo as leis da natureza. E agora, no cristianismo, ele divisava as leis de Deus nas leis da natureza. Um povo que pôde produzir Cícero e Virgílio estava amadurecido para o cristianismo helenizado de Paulo.

195:2:7 20732 E, pois, esses gregos romanizados forçaram tanto os judeus quanto os cristãos a filosofarem a própria religião, a coordenarem as idéias dessa religião e a sistematizarem os seus ideais, a adaptarem as práticas religiosas às correntes predominantes de vida. E tudo isso foi enormemente ajudado pela tradução das escrituras hebraicas para o grego e pela redação do Novo Testamento, na língua grega.

195:2:8 20733 Contrariamente aos judeus e a muitos outros povos, os gregos vinham, há muito tempo, crendo provisoriamente na imortalidade, em alguma espécie de sobrevivência após a morte e, já que esse era o núcleo mesmo do ensinamento de Jesus, era certo que o cristianismo tivesse um forte apelo para eles.

195:2:9 20734 Uma sucessão de vitórias da cultura grega e da política romana havia consolidado as terras do Mediterrâneo como um império, com uma língua e uma cultura, e preparou o mundo ocidental para um só Deus. O judaísmo contribuiu com esse Deus, mas o judaísmo não era aceitável como uma religião para esses gregos romanizados. Filo ajudou alguns a mitigarem as suas objeções, mas o cristianismo revelou a eles um conceito melhor de um Deus único, e eles o abraçaram prontamente.

3. SOB O IMPÉRIO ROMANO


195:3:1 20735 Após a consolidação do governo político romano e depois da disseminação do cristianismo, os cristãos se viram com um Deus, um grande conceito religioso, mas sem um império. Os greco-romanos se viram com um grande império, mas sem um Deus para servir como conceito religioso adequado à adoração do império e à sua unificação espiritual. Os cristãos aceitaram o império; o império adotou o cristianismo. Os romanos forneceram uma unidade de governo político; os gregos, uma unidade de cultura e de instrução; o cristianismo, uma unidade de prática e de pensamento religioso.

195:3:2 20736 Roma suplantou a tradição do nacionalismo por meio do universalismo imperial e, pela primeira vez na história, tornou possível que raças e nações diferentes, pelo menos nominalmente, aceitassem uma religião única.

195:3:3 20737 O cristianismo ganhou a preferência em Roma em uma época em que havia uma grande luta entre os ensinamentos enérgicos dos estóicos e as promessas de salvação dos cultos dos mistérios. O cristianismo chegou com o conforto repousante e com o poder libertador para um povo espiritualmente sedento, cuja língua não tinha nenhuma palavra para “ausência de egoísmo”.

195:3:4 20738 O que deu maior poder à cristandade foi o modo pelo qual os seus crentes viveram vidas de serviço e, mesmo, o modo pelo qual morreram pela própria fé, durante os tempos iniciais de perseguições drásticas.

195:3:5 20739 O ensinamento a respeito do amor de Cristo pelas crianças logo colocou um fim à prática disseminada de expor as crianças à morte, quando não eram desejadas, particularmente as meninas.

195:3:6 20741 O plano inicial do culto cristão foi tomado, em sua quase totalidade, ao das sinagogas judaicas, e modificado pelo ritual mitraico; posteriormente, muito do fausto pagão foi acrescentado a ele. A espinha dorsal da igreja cristã inicial consistia de prosélitos gregos do judaísmo, que se cristianizaram.

195:3:7 20742 O segundo século depois de Cristo foi o melhor período, em toda a história do mundo, para uma boa religião fazer progressos no mundo ocidental. Durante o primeiro século, a cristandade tinha preparado-se, por meio de lutas e de concessões, para criar raízes e espalhar-se rapidamente. A cristandade adotou o imperador; mais tarde, o imperador adotou o cristianismo. Essa foi uma grande época para uma nova religião ser disseminada. Existia liberdade religiosa; as viagens se haviam generalizado e inexistiam entraves para o livre pensamento.

195:3:8 20743 O ímpeto espiritual de aceitar nominalmente o cristianismo helenizado chegou a Roma tarde demais para impedir o declínio moral já bem avançado, ou para compensar a deterioração racial já bem estabelecida e crescente. Essa nova religião era uma necessidade cultural para a Roma imperial, e é uma grande infelicidade que não se tenha tornado um meio de salvação espiritual em um sentido mais amplo.

195:3:9 20744 Mesmo uma boa religião não podia salvar um grande império dos resultados óbvios da falta de participação do indivíduo nos assuntos do governo, do excesso de paternalismo, do exagero e da grosseria dos abusos na coleta dos impostos, do comércio desequilibrado com o Levante, que acabou com o ouro, da loucura dos prazeres, do clichê da padronização romana, da degradação da mulher, da escravidão e da decadência racial, das epidemias físicas, e de uma igreja estatal que se tornou institucionalizada quase até o ponto da esterilidade espiritual.

195:3:10 20745 Em Alexandria, contudo, as condições não eram assim tão desfavoráves. As primeiras escolas continuavam mantendo muitos dos ensinamentos de Jesus sem comprometimentos e concessões. Pantaenos ensinou a Clemente, e passou a colaborar com Natanael, proclamando Cristo na Índia. Embora alguns dos ideais de Jesus tenham sido sacrificados na edificação do cristianismo, deveria aqui, com toda a justiça, ficar registrado que, ao final do segundo século, praticamente todas as grandes mentes do mundo greco-romano, passaram a ser cristãs. O triunfo estava próximo de ser completo.

195:3:11 20746 E esse império romano perdurou tempo suficiente para assegurar a sobrevivência do cristianismo, mesmo depois do império entrar em colapso. Mas nós temos conjecturado, freqüentemente, sobre o que teria acontecido a Roma e ao mundo, caso tivesse sido aceito o evangelho do Reino em lugar do cristianismo grego.

4. A IDADE DAS TREVAS NA EUROPA


195:4:1 20747 A igreja, estando subordinada à sociedade e aliada à política, ficava condenada a compartilhar do declínio intelectual e espiritual da chamada “idade das trevas” européia. Nessa época, a religião tornou-se mais e mais monástica, ascética e regulamentada. Num sentido espiritual, o cristianismo estava hibernando. Durante esse período, existiu, junto com essa religião adormecida e secularizada, uma corrente contínua de misticismo, uma experiência espiritual fantástica que beirou à irrealidade e que, filosoficamente, foi semelhante ao panteísmo.

195:4:2 20748 Nesses séculos de trevas e de desespero, de novo a religião passou a ser algo de segunda mão. O indivíduo se encontrava quase perdido diante da autoridade super-ofuscante da tradição e do ditatorialismo da igreja. Uma nova ameaça espiritual surgiu na criação de uma galáxia de “santos”, os quais, se presumia, tinham influência especial nas cortes divinas, e que, por isso, se se apelasse eficazmente para eles, seriam capazes de interceder pelo homem perante os Deuses.

195:4:3 20751 Mas a cristandade estava tão suficientemente socializada e paganizada que, conquanto fosse impotente para frustrar a vinda da idade das trevas, encontrava-se mais bem preparada para sobreviver a esse período prolongado de trevas morais e de estagnação espiritual. E o cristianismo perdurou durante a longa noite da civilização ocidental e funcionava ainda como uma influência moral no mundo quando do alvorecer da renascença. A reabilitação do cristianismo, depois de passar pela idade das trevas, resultou na vinda à existência de numerosas seitas de ensinamentos cristãos, as crenças adequando-se aos tipos especiais – o intelectual, o emocional e o espiritual – de personalidades humanas. E muitos desses grupos especiais de cristãos, ou de famílias religiosas, ainda persistiam à época em que se fazia a apresentação deste documento.

195:4:4 20752 O cristianismo traz em si a história de ter-se originado de uma transformação não intencional, da religião de Jesus, em uma religião sobre Jesus. E ainda apresenta a história de ter experimentado a helenização, a paganização, a secularização, a institucionalização, a deterioração intelectual, a decadência espiritual, a hibernação moral, a ameaça de extinção, o rejuvenescimento posterior, a fragmentação e, mais recentemente, uma relativa reabilitação. Essa genealogia indica a vitalidade inerente e a posse de vastos recursos de recuperação. E esse mesmo cristianismo está agora presente no mundo civilizado de povos do mundo ocidental e tem à frente uma luta pela existência que é ainda menos auspiciosa do que aquelas crises acidentadas que caracterizaram as suas batalhas passadas para conseguir o predomínio.

195:4:5 20753 A religião confronta-se agora com o desafio de um novo tempo de mentes científicas e de tendências materialistas. Nessa luta gigantesca entre o secular e o espiritual, a religião de Jesus finalmente irá triunfar.

5. OS PROBLEMAS MODERNOS


195:5:1 20754 O século vinte trouxe ao cristianismo e a todas as outras religiões novos problemas para serem resolvidos. Quanto mais alto ascende uma civilização, mais premente torna-se o dever de “primeiro buscar as realidades do céu” em todos os esforços do homem para estabilizar a sociedade e facilitar a solução dos seus problemas materiais.

195:5:2 20755 A verdade, muitas vezes, torna-se confusa e até enganosa, quando é desmembrada, fracionada, isolada e demasiadamente analisada. A verdade viva ensina, ao buscador da verdade, corretamente, apenas quando ela é abraçada em plenitude e como uma realidade espiritual viva, não como um fato dentro de uma ciência material, nem como uma inspiração de uma arte intermediária.

195:5:3 20756 A religião é a revelação ao homem do seu destino eterno e divino. A religião é uma experiência puramente pessoal e espiritual e deve ser, sempre, diferenciada de outras formas elevadas de pensamento, tais como:

195:5:4 20757 1. A atitude lógica do homem para com as coisas da realidade material.

195:5:5 20758 2. A apreciação estética que o homem tem da beleza, em contraste com a fealdade.

195:5:6 20759 3. O reconhecimento ético que o homem tem das obrigações sociais e do dever político.

195:5:7 207510 4. Mesmo o senso de moralidade humana, em si e por si próprio, não é religioso.

195:5:8 207511 A religião está destinada a encontrar aqueles valores no universo que exigem fé, confiança e certeza; a religião culmina na adoração. A religião descobre, para a alma, aqueles valores supremos que estão em contraposição aos valores relativos descobertos pela mente. Um tal discernimento interior supra-humano só pode ser alcançado por meio da experiência religiosa verdadeira.

195:5:9 207512 Não se pode sustentar um sistema social duradouro, sem uma moralidade baseada em realidades espirituais, assim como não se poderia sustentar o sistema solar sem a gravidade.

195:5:10 20761 Não tenteis satisfazer a curiosidade, nem gratificar todos os desejos latentes de aventura que surgem na alma, em uma curta vida na carne. Sede pacientes! Não vos deixeis ceder à tentação de lançar-vos em um mergulho desregrado de aventuras baratas e sórdidas. Domai as vossas energias e refreai as vossas paixões; sede calmos enquanto aguardais o desdobrar majestático de uma carreira interminável de aventuras progressivas e de descobertas emocionantes.

195:5:11 20762 Na confusão sobre a origem do homem, não percais de vista o seu destino eterno. Não vos esqueçais de que Jesus amou até mesmo às crianças pequenas, e de que, para sempre, ele deixou claro o grande valor da personalidade humana.

195:5:12 20763 Ao observardes o mundo, lembrai-vos de que as manchas negras do mal, que vós vedes, se destacam sobre o fundo branco do bem último. Vós não vedes meramente manchas brancas do bem, mostrando-se miseravelmente sobre o fundo negro do mal.

195:5:13 20764 Quando há tantas verdades e tão boas a se fazerem públicas e proclamadas, por que deveriam os homens insistir tanto no mal do mundo, só porque ele parece ser um fato? As belezas dos valores espirituais da verdade geram mais prazer e são mais enaltecedoras do que o fenômeno do mal.

195:5:14 20765 Na religião, Jesus defendeu e seguiu o método da experiência, do mesmo modo que a ciência moderna busca a técnica pela experimentação. Nós encontramos Deus por meio dos guiamentos do discernimento espiritual interior, mas nós nos aproximamos desse discernimento da alma por meio do amor pelo belo, da busca da verdade, da lealdade ao dever e da adoração da bondade divina. Mas de todos esses valores, o amor é o guia verdadeiro para o discernimento autêntico.

6. O MATERIALISMO


195:6:1 20766 Os cientistas precipitaram, involuntariamente, a humanidade em um pânico materialista; eles deram início a uma irrefletida corrida ao banco moral dos tempos, mas esse banco de experiência humana tem vastos recursos espirituais; ele pode suportar as demandas que lhe estão sendo feitas. Apenas os homens irrefletidos entram em pânico com os ativos espirituais da raça humana. Quando o pânico materialista-secular tiver chegado ao fim, a religião de Jesus não terá ido à bancarrota. O banco espiritual do Reino do céu estará pagando, com fé, esperança e certeza moral, a todos aqueles que recorrerem a ele “em Seu nome”.

195:6:2 20767 Não importa quais possam ser os conflitos aparentes entre o materialismo e os ensinamentos de Jesus, vós podeis permanecer seguros de que, nas idades que virão, os ensinamentos do Mestre triunfarão completamente. Na realidade, a verdadeira religião não irá envolver-se em nenhuma controvérsia com a ciência, pois não se ocupa em absoluto com as coisas materiais. Para a religião a ciência é simplesmente indiferente, apesar de ter uma simpatia por ela, enquanto se preocupa supremamente com o cientista.

195:6:3 20768 A busca do conhecimento meramente, sem a interpretação da sabedoria que o acompanha e sem o discernimento interior espiritual da experiência religiosa, finalmente leva ao pessimismo e ao desespero humano. Uma dose de conhecimento, se pequena, é algo verdadeiramente desconcertante.

195:6:4 20769 Na época em que estes documentos foram escritos, o pior da era materialista já havia chegado ao fim; o dia de uma melhor compreensão já está no seu alvorecer. As mentes mais elevadas do mundo científico não são mais totalmente materialistas na sua filosofia, e o grosso e comum do povo ainda inclina-se nessa direção em conseqüência de ensinamentos anteriores. Mas essa idade de realismo físico é apenas um episódio passageiro na vida do homem sobre a Terra. A ciência moderna deixou a verdadeira religião – os ensinamentos de Jesus, como traduzidos nas vidas dos seus crentes – intocados. Tudo o que a ciência fez foi destruir as ilusões infantis das falsas interpretações da vida.

195:6:5 20771 A ciência é uma experiência quantitativa, a religião é uma experiência qualitativa, no que concerne à vida do homem na Terra. A ciência lida com os fenômenos; a religião, com as origens, os valores e as metas. Designar causas como explicação de fenômenos físicos é confessar ignorância das ultimidades e, ao fim, apenas leva o cientista diretamente de volta à primeira grande causa – o Pai Universal do Paraíso.

195:6:6 20772 A passagem violenta, de uma era de milagres para uma idade de máquinas, revelou-se como sendo de todo desconcertante para o homem. A engenhosidade e a habilidade das falsas filosofias do mecanismo desmentem as pretensões puramente mecanicistas. A agilidade fatalista da mente de um materialista contradiz, para sempre, as suas afirmações de que o universo é um fenômeno energético cego e sem propósito.

195:6:7 20773 O naturalismo mecanicista de alguns homens, supostamente instruídos, e o secularismo impensado, do homem nas ruas, estão ambos ocupados exclusivamente com as coisas; eles estão desprovidos de todos os valores reais, das recompensas e das satisfações de uma natureza espiritual, assim como estão despojados de fé, de esperança e de certezas eternas. Um dos grandes problemas da vida moderna é que o homem pensa que ele é ocupado demais para encontrar tempo para a meditação espiritual e para a devoção religiosa.

195:6:8 20774 O materialismo reduz o homem a um autômato sem alma e faz dele um mero símbolo aritmético, incluído, sem ter poder, na fórmula matemática de um universo pouco romântico e muito mecânico. Mas de onde provém todo esse vasto universo de matemáticas, sem um Mestre Matemático? A ciência pode discorrer sobre a conservação da matéria, mas a religião torna válida a conservação das almas humanas – ela preocupa-se com a experiência delas ligada às realidades espirituais e aos valores eternos.

195:6:9 20775 O sociólogo materialista de hoje observa uma comunidade, faz um relatório sobre ela e deixa o povo como ele o encontrou. Há dezenove séculos, alguns galileus pouco instruídos observaram Jesus dando a sua vida, como uma contribuição espiritual para a experiência interior do homem, e então eles saíram da Galiléia e viraram todo o império romano de cabeça para baixo.

195:6:10 20776 Os líderes religiosos, contudo, estão cometendo um grande erro quando tentam convocar o homem moderno para a batalha espiritual, com um soar medieval de trombetas. A religião deve prover-se de lemas novos e atuais. Nem a democracia, nem qualquer outra panacéia política tomarão o lugar do progresso espiritual. As religiões falsas podem representar uma fuga da realidade, mas com o seu evangelho Jesus conduziu o homem mortal à entrada de uma realidade eterna de progresso espiritual.

195:6:11 20777 Dizer que a mente “surgiu” da matéria nada explica. Se o universo fosse apenas um mecanismo e a mente uma parte da matéria, nós nunca teríamos duas interpretações diferentes de qualquer fenômeno observado. Os conceitos da verdade, da beleza e da bondade não são inerentes, seja à física seja à química. Uma máquina não pode conhecer, e muito menos conhecer a verdade, ter fome de retidão, nem valorizar a bondade.

195:6:12 20778 A ciência pode ser física, mas a mente do cientista que discerne a verdade é de todo supramaterial. A matéria não conhece a verdade, nem pode amar a misericórdia nem se comprazer com as verdades espirituais. As convicções morais baseadas no esclarecimento espiritual, e com raízes na experiência humana, são tão reais e certas quanto as deduções matemáticas baseadas nas observações físicas, mas em um nível diferente, mais elevado.

195:6:13 20779 Se os homens não passassem de máquinas, eles reagiriam mais ou menos uniformemente a um universo material. Não existiria a individualidade, e muito menos a personalidade.

195:6:14 207710 A existência do mecanismo absoluto do Paraíso, no centro do universo dos universos, na presença da volição inqualificável da Segunda Fonte e Centro, torna para sempre certo que as causas determinantes não sejam a lei exclusiva do cosmo. O materialismo existe, mas ele não é exclusivo; o mecanismo existe, mas ele não é inqualificável; o determinismo existe, mas ele não está só.

195:6:15 20781 O universo finito da matéria tornar-se-ia finalmente uniforme e determinista, não fosse a presença combinada da mente e do espírito. A influência da mente cósmica injeta constantemente a própria espontaneidade nos mundos materiais.

195:6:16 20782 A liberdade, ou a iniciativa, em qualquer reino da existência, é diretamente proporcional ao grau de influência espiritual e de controle da mente-cósmica; e isto é, na experiência humana, o grau de realidade com que vós fazeis a “vontade do Pai”. E assim, uma vez que vós começais a encontrar a Deus, esta é a prova conclusiva de que Deus já vos encontrou.

195:6:17 20783 A busca sincera da bondade, da beleza e da verdade conduz a Deus. E cada descoberta científica demonstra a existência tanto da liberdade, quanto da uniformidade no universo. O descobridor estava livre para fazer a descoberta. A coisa descoberta é real e aparentemente uniforme, ou então não poderia ter-se tornado conhecida como uma coisa.

7. A VULNERABILIDADE DO MATERIALISMO


195:7:1 20785 Quão tolo é, para o homem de mente material, permitir que teorias vulneráveis, como as de um universo mecanístico, privem-no dos recursos espirituais vastos da experiência pessoal da verdadeira religião. Os fatos nunca contradizem a fé espiritual real; as teorias podem contradizer. Melhor seria se a ciência ficasse devotada à destruição da superstição, em vez de ficar tentando arruinar a fé religiosa – a crença humana nas realidades espirituais e nos valores divinos.

195:7:2 20786 A ciência deveria fazer materialmente, pelo homem, o que a religião faz por ele, espiritualmente: ampliar o horizonte da vida e torna a sua personalidade mais abrangente. A verdadeira ciência não pode manter uma disputa duradoura com a religião verdadeira. O “método científico” é meramente um padrão intelectual de avaliação, com o qual se medem as aventuras materiais e as realizações físicas. Mas, como é material e totalmente intelectual, ele passa a ser inteiramente inútil na avaliação das realidades espirituais e das experiências religiosas.

195:7:3 20787 A incoerência do mecanismo moderno é tal que: se o universo fosse meramente material e o homem apenas uma máquina, o homem seria completamente incapaz de se reconhecer como tal e, do mesmo modo, esse homem-máquina seria totalmente inconsciente do fato da existência de um tal universo material. O desalento e o desespero materialista da ciência mecanicista fracassou por não reconhecer o fato de que a mente do cientista é residida por um espírito, e, que é, o discernimento supramaterial, mesmo, dessa mente, que está a formular tal conceito errôneo e auto-contraditório de um universo materialista.

195:7:4 20788 Os valores do Paraíso, de eternidade e de infinitude, de verdade, de beleza e bondade, estão ocultos dentro dos fatos dos fenômenos dos universos do tempo e do espaço. Mas é necessário o olho da fé, ao mortal nascido do espírito, para detectar e discernir esses valores espirituais.

195:7:5 20789 As realidades e os valores do progresso espiritual não são uma “projeção psicológica” – um mero sonho diurno glorificado da mente material. Tais coisas são as antecipações espirituais do Ajustador residente, o espírito de Deus vivendo na mente do homem. E que as vossas incursões, fraca e confusamente visualizadas adentro da teoria da “relatividade”, não perturbem os vossos conceitos da eternidade e da infinitude de Deus. E, todas as vezes que fordes solicitados a respeito da necessidade da vossa auto-expressão, não cometais o erro de omitir a expressão do Ajustador, a manifestação do vosso eu melhor e mais real.

195:7:6 20791 Se esse fosse um universo apenas material, o homem material nunca seria capaz de alcançar o conceito do caráter mecanicista de uma existência, assim tão exclusivamente material. Esse conceito mecanicista do universo é, em si mesmo um fenômeno não material da mente, e toda a mente é de origem não material; não importando quão radicalmente ela possa parecer ser condicionada materialmente e controlada mecanicamente.

195:7:7 20792 O mecanismo mental parcialmente evoluído, do homem mortal, não é superdotado de consistência e sabedoria. A vaidade do homem freqüentemente ultrapassa a sua razão e ilude a sua lógica.

195:7:8 20793 O próprio pessimismo do materialista mais pessimista é, em si e por si próprio, prova suficiente de que o universo do pessimista não é totalmente material. O otimismo e o pessimismo são, ambos, reações conceituais em uma mente consciente dos valores, tanto quanto dos fatos. Se o universo fosse verdadeiramente o que o materialista considera que ele seja, o homem, como máquina humana, seria então desprovido de todo o reconhecimento consciente daquele fato mesmo. Sem a consciência do conceito de valor, dentro da mente nascida do espírito, o homem não poderia reconhecer de nenhuma maneira o fato do materialismo do universo, e os fenômenos mecanicistas da operação do universo. Uma máquina não pode ser consciente da natureza ou do valor de uma outra máquina.

195:7:9 20794 Uma filosofia mecanicista da vida e do universo não pode ser científica, porque a ciência reconhece apenas as coisas materiais e os fatos, lidando apenas com eles. A filosofia é, inevitavelmente, supracientífica. O homem é um fato material da natureza, mas a sua vida é um fenômeno que transcende os níveis materiais da natureza, pois ela tem os atributos de controle da mente e as qualidades criativas do espírito.

195:7:10 20795 O esforço sincero do homem para transformar-se em um mecanicista representa o fenômeno trágico do esforço fútil daquele homem para cometer o suicídio intelectual e moral. Mas ele não o pode fazer.

195:7:11 20796 Se o universo fosse apenas material e se o homem fosse apenas uma máquina, não haveria a ciência para encorajar o cientista a postular essa mecanização do universo. Máquinas não podem medir, classificar, nem avaliar a si próprias. Uma tal obra do trabalho da ciência poderia apenas ser executada por alguma entidade que tenha um status supramaquinal.

195:7:12 20797 Se a realidade do universo é ser apenas uma imensa máquina, então o homem deve estar do lado de fora do universo e separado dele, pois só assim o homem pode reconhecer tal fato e tornar-se consciente e dono de um discernimento de uma tal avaliação.

195:7:13 20798 Se o homem é apenas uma máquina, por meio de qual técnica é que ele chega a acreditar ou a proclamar saber que ele próprio é apenas uma máquina? A experiência de uma avaliação autoconsciente, do próprio eu, nunca é um atributo de uma mera máquina. Um mecanicista autoconsciente e reconhecido é a melhor resposta possível ao mecanicismo. Se o materialismo fosse um fato, não poderia haver nenhum mecanicista autoconsciente. E também é verdade que antes de cometer atos imorais alguém deve ser primeiro uma pessoa moral.

195:7:14 20799 A própria pretensão do materialismo implica uma consciência supramaterial da mente, e que presume afirmar tais dogmas. Um mecanismo poderia deteriorar-se, mas nunca progredir. Máquinas não pensam, criam, sonham, aspiram, idealizam, anseiam pela verdade, nem têm sede de retidão. Elas não motivam as suas vidas com a paixão de servir a outras máquinas, nem de escolher como meta própria de progresso eterno a tarefa sublime de encontrar a Deus e de esforçar-se para ser igual a Ele. Máquinas nunca tomam posições intelectuais, emocionais, estéticas, éticas, morais ou espirituais.

195:7:15 207910 A arte prova que o homem não é mecanístico, mas não prova que ele é espiritualmente imortal. A arte é a morôncia do mortal, o domínio intermediário entre o homem, o ser material, e o homem, o ser espiritual. A poesia é um esforço para escapar-se das realidades materiais e aproximar-se dos valores espirituais.

195:7:16 20801 Numa civilização evoluída, a arte humaniza a ciência, enquanto, por sua vez, ela é espiritualizada pela religião verdadeira – o discernimento dos valores espirituais e eternos. A arte representa a avaliação humana e tempo-espacial da realidade. A religião é o abraço divino dos valores cósmicos e denota progresso eterno na ascensão e na expansão espiritual. A arte do tempo é perigosa apenas quando se torna cega para os padrões espirituais dos arquétipos divinos que a eternidade reflete como sombras da realidade do tempo. A arte verdadeira é a manipulação eficiente das coisas materiais da vida; a religião é a transformação enobrecedora dos fatos materiais da vida, e nunca cessa na sua avaliação espiritual da arte.

195:7:17 20802 Quão tolo é presumir que um autômato poderia conceber uma filosofia do automatismo, e quão ridículo seria supor que pudesse presumir formar o conceito de outros autômatos companheiros e irmãos!

195:7:18 20803 Qualquer interpretação científica do universo material torna-se sem valor, a menos que venha do devido reconhecimento ao cientista. Nenhuma apreciação da arte será genuína a menos que seja acompanhada do reconhecimento do artista. Nenhuma avaliação da moral vale a pena, a menos que inclua o moralista. Nenhum reconhecimento da filosofia será edificante, se ignorar o filósofo, e a religião não pode existir sem a experiência real do religioso que, nessa e por meio dessa mesma experiência, está buscando encontrar a Deus e conhecê-lo. Do mesmo modo, o universo dos universos fica sem significado se separado do EU SOU, o Deus infinito que o fez e que continuamente o administra.

195:7:19 20804 Os mecanicistas – humanistas – tendem a se alienar, junto com as correntes materiais. Os idealistas e os espiritualistas ousam usar os seus remos com inteligência e vigor para, aparentemente, modificar o curso puramente material das correntes da energia.

195:7:20 20805 A ciência vive por meio das matemáticas da mente; a música expressa o bater do tempo das emoções. A religião é o ritmo espiritual da alma, em harmonia tempo-espacial com as medidas melódicas mais elevadas e eternas da Infinitude. A experiência religiosa é algo na vida humana que é verdadeiramente supramatemático.

195:7:21 20806 Para a linguagem, um alfabeto representa o mecanismo do materialismo, enquanto as palavras que exprimem os significados de mil pensamentos, grandes idéias e ideais nobres – de amor e ódio, de covardia e coragem –, representam as atuações da mente, dentro do escopo definido tanto pela lei material, quanto pela espiritual, dirigido pela afirmação da vontade da personalidade e limitado pelo dom inerente à situação.

195:7:22 20807 O universo não é como as leis, mecanismos e constantes de uniformidades que o cientista descobre e que acaba por considerar como sendo ciência. O universo é mais como um cientista curioso, pensador, que escolhe, que é criativo e que combina e discrimina e que, assim, observa os fenômenos do universo e classifica os fatos matemáticos inerentes às fases mecanicistas do lado material da criação. O universo não é, também, como a arte do artista; mas é mais como o artista que pesquisa, sonha, aspira e avança e que busca transcender o mundo das coisas materiais, em um esforço para alcançar uma meta espiritual.

195:7:23 20808 O cientista, não a ciência, percebe a realidade de um universo de energia e de matéria, que evolui e que avança. O artista, não a arte, demonstra a existência do mundo transitório moroncial, que se interpõe entre a existência material e a liberdade espiritual. O religioso, não a religião, prova a existência das realidades do espírito e os valores divinos que devem ser encontrados ao longo do progresso para a eternidade.

8. O TOTALITARISMO SECULAR


195:8:1 20811 Mesmo depois de estarem, o materialismo e o mecanicismo, mais ou menos superados, a influência devastadora do secularismo, do século vinte, contudo, ainda estará frustrando a experiência espiritual de milhões de almas desprecavidas.

195:8:2 20812 O secularismo moderno tem sido fomentado por duas influências mundiais. O pai do secularismo foi a estreiteza e o afastamento de Deus, da chamada ciência do século dezenove e do século vinte – a ciência ateísta. A mãe do secularismo moderno foi a igreja cristã medieval totalitarista. O secularismo teve o seu início como um protesto que surgiu contra o domínio quase completo da igreja cristã institucionalizada, sobre a civilização ocidental.

195:8:3 20813 Na época desta revelação, o clima intelectual e filosófico predominante, tanto na vida européia como na vida americana, é decididamente secular – humanista. Durante trezentos anos, o pensamento ocidental vem se mostrando progressivamente mais secularizado e leigo. A religião tornou-se uma influência cada vez mais apenas só de nome, um exercício muito mais de ritual. A maioria daqueles que se professam cristãos, na civilização ocidental, na verdade são inconscientemente leigos ou secularizados.

195:8:4 20814 Foi necessária uma grande força, uma influência poderosa, para libertar o pensamento e o viver dos povos ocidentais da garra paralisadora de uma dominação totalitária eclesiástica. O secularismo rompeu com os grilhões do controle da igreja e, agora, por sua vez, ele ameaça estabelecer um tipo novo e sem Deus de domínio sobre os corações e mentes do homem moderno. Um estado político tirânico e ditatorial é a herança direta do materialismo científico e do secularismo filosófico. Assim que o secularismo liberta o homem da dominação da igreja institucionalizada, ele vende o homem para a servidão escrava do estado totalitarista. O secularismo liberta o homem da escravidão eclesiástica apenas para traí-lo, entregando-o à tirania da escravidão política e econômica.

195:8:5 20815 O materialismo nega a Deus, o secularismo simplesmente O ignora; ao menos essa foi a atitude inicial. Mais recentemente, o secularismo comprometeu-se numa atitude mais militante, assumindo tomar o lugar da religião de cuja servidão totalitarista ele fugiu certa vez. O secularismo do século vinte tende a afirmar que o homem não precisa de Deus. Mas tomai cuidado! Essa filosofia, sem Deus, da sociedade humana levará apenas à intranqüilidade, à animosidade, à infelicidade, à guerra e a um desastre mundial.

195:8:6 20816 O secularismo nunca poderá trazer a paz à humanidade. Nada pode tomar o lugar de Deus na sociedade humana. Mas prestai bastante atenção! Não vos apresseis em abandonar os benefícios da revolta secular contra o totalitarismo eclesiástico. A civilização ocidental desfruta hoje de muitas liberdades e satisfações, resultadas na revolta secular. O grande erro do secularismo foi que, ao revoltar-se contra o controle, quase total, da autoridade religiosa sobre a vida, e depois de alcançar a libertação dessa tirania eclesiástica, os secularistas passaram a instituir uma revolta contra o próprio Deus, algumas vezes tacitamente, abertamente em outras.

195:8:7 20817 À revolta secularista vós deveis a criatividade espantosa do industrialismo norte-americano e o progresso material sem precedentes da civilização ocidental. E, porque a revolta secularista foi muito longe e perdeu de vista a verdadeira religião e a Deus, seguiram-se também uma colheita inesperada de guerras mundiais e uma falta de estabilidade internacional.

195:8:8 20818 Não é necessário que se sacrifique a fé em Deus para que se possa desfrutar das bênçãos da revolta secularista moderna: a tolerância, o serviço social, o governo democrático e as liberdades civis. Não foi necessário aos secularistas antagonizar a verdadeira religião para promover a ciência e para avançar com a educação.

195:8:9 20821 Contudo, o secularismo não é o único progenitor de todos esses ganhos recentes na ampliação da vida. Por detrás dos ganhos do século vinte não estão apenas a ciência e o secularismo, mas também os trabalhos espirituais, não reconhecidos nem considerados, da vida e dos ensinamentos de Jesus de Nazaré.

195:8:10 20822 Sem Deus, sem religião, o secularismo científico não pode nunca coordenar as suas forças, harmonizar os seus interesses, as suas raças e os seus nacionalismos, divergentes e competitivos. Essa sociedade humana secularista, não obstante os seus feitos materialistas sem paralelos, está desintegrando-se vagarosamente. A força coesiva principal a resistir a essa desintegração, de antagonismos, é o nacionalismo. E o nacionalismo é a maior barreira para a paz mundial.

195:8:11 20823 A fraqueza inerente ao secularismo é que ele se descarta da ética e da religião, a troco de política e de poder. Vós simplesmente não podeis estabelecer a irmandade dos homens se ignorardes ou se negardes a paternidade de Deus.

195:8:12 20824 O otimismo secular social e político é uma ilusão. Sem Deus, nem a independência, nem a liberdade, nem a propriedade, nem a riqueza conduzirão à paz.

195:8:13 20825 A secularização completa da ciência, da educação, da indústria e da sociedade pode conduzir apenas ao desastre. No primeiro terço do século vinte, os urantianos mataram mais seres humanos do que os que foram mortos durante toda a dispensação cristã até aquela época. E isso é apenas o começo da pavorosa ceifa do materialismo e do secularismo; destruições ainda mais terríveis ainda estão para vir.

9. O PROBLEMA DO CRISTIANISMO


195:9:1 20826 Não negligencieis o valor da vossa herança espiritual, o rio da verdade correndo pelos séculos, mesmo pelos tempos estéreis de uma idade materialista e secular. Em todos os vossos esforços condignos para livrar-vos das crenças supersticiosas das idades passadas, certificai-vos de que conservais a verdade eterna. Mas sede pacientes! Quando a revolta atual, da superstição, estiver terminada, as verdades do evangelho de Jesus persistirão gloriosamente, iluminando um caminho novo e melhor.

195:9:2 20827 Mas o cristianismo paganizado e socializado permanece com a necessidade de um novo contato com os ensinamentos reais de Jesus, não comprometidos por concessões; pois ele definha na falta de uma nova visão da vida do Mestre na Terra. Uma revelação nova e mais plena da religião de Jesus está destinada a vencer num império de secularismo materialista e a derrotar uma corrente mundial de naturalismo mecanicista. Urântia está agora agitada e à beira de uma das suas épocas mais assombrosas e encantadoras de reajustamento social, de estimulação moral e de iluminação espiritual.

195:9:3 20828 Os ensinamentos de Jesus, ainda que grandemente modificados, sobreviveram aos cultos dos mistérios da sua época natal, à ignorância e à superstição da idade medieval das trevas, e estão, ainda agora, triunfando lentamente sobre o materialismo, o mecanicismo e o secularismo do século vinte. E esses tempos de grandes provações, e de ameaças de derrotas, são sempre tempos de grandes revelações.

195:9:4 20829 A religião necessita de novos líderes, de homens e mulheres espirituais, que ousarão depender apenas de Jesus e dos seus ensinamentos incomparáveis. Se o cristianismo persistir em negligenciar a sua missão espiritual e em continuar a ocupar-se de problemas sociais e materiais, o renascimento espiritual deve esperar a vinda desses novos instrutores da religião de Jesus, que irão devotar-se exclusivamente à regeneração espiritual dos homens. E, então, essas almas nascidas do espírito irão rapidamente preencher os quesitos de liderança e de inspiração, para a reorganização social, moral, econômica e política do mundo.

195:9:5 20831 A idade moderna recusar-se-á a aceitar uma religião que seja inconsistente com os fatos e fora de harmonia com as suas concepções mais elevadas da verdade, da beleza e da bondade. É chegada a hora de uma redescoberta dos fundamentos verdadeiros e originais do cristianismo atual distorcido por concessões – a vida verdadeira e os ensinamentos de Jesus.

195:9:6 20832 O homem primitivo viveu uma vida de servidão supersticiosa ao medo religioso. O homem moderno, civilizado, tem pavor do pensamento de cair no domínio de fortes convicções religiosas. O homem pensante tem sempre temido estar aprisionado a uma religião. Quando uma religião forte e atuante ameaça dominá-lo, ele invariavelmente tenta racionalizá-la, tradicionalizá-la e institucionalizá-la, esperando com isso ter o controle dela. Com esse procedimento, até mesmo uma religião revelada torna-se feita pelo homem e dominada pelo homem. Os homens e as mulheres modernas, de inteligência, fogem da religião de Jesus, por causa do medo que têm do que ela fará a eles – e com eles. E todos esses medos são bem fundados. A religião de Jesus de fato domina e transforma os seus crentes, exigindo que os homens dediquem suas vidas a buscar um conhecimento do que é a vontade do Pai no céu, exigindo que as energias da vida sejam consagradas ao serviço altruísta da irmandade dos homens.

195:9:7 20833 Os homens e as mulheres egoístas simplesmente não pagarão esse preço, nem mesmo pelo maior tesouro espiritual jamais oferecido ao homem mortal. Só quando o homem se tiver tornado desiludido o bastante, por desapontamentos tristes que acompanham as buscas tolas e decepcionantes do egoísmo, e depois da descoberta da esterilidade da religião formalizada, é que ele dispor-se-á a voltar-se, de todo o coração, para o evangelho do Reino, a religião de Jesus de Nazaré.

195:9:8 20834 O mundo necessita mais de uma religião de primeira mão. Mesmo o cristianismo – a melhor das religiões do século vinte – não é apenas uma religião sobre Jesus, mas é amplamente uma religião na qual os homens experimentam coisas por inermédio de outras pessoas. Eles tomam a sua religião totalemnte como é passada pelos instrutores religiosos consagrados. Que despertar experimentaria o mundo, se pudesse tão somente ver Jesus como ele realmente viveu na Terra, e conhecer, de primeira mão, os ensinamentos dados pela sua própria vida! As palavras que descrevem as coisas belas não conseguem emocionar como as próprias coisas, nem podem as palavras de um credo inspirar as almas dos homens como a experiência de conhecer a presença de Deus. Mas a fé atenta sempre manterá a porta da esperança da alma do homem aberta para a entrada das realidades espirituais eternas dos valores divinos dos mundos além deste.

195:9:9 20835 A cristandade tem ousado rebaixar o nível dos seus ideais diante do desafio da usura humana, da loucura das guerras e do desejo ardente de poder; mas a religião de Jesus permanece sendo a convocação espiritual imaculada e transcendente, apelando para o que há de melhor no homem, para que ele se eleve acima de todos esses legados de evolução animal e, por meio da graça, para que alcance as alturas morais do verdadeiro destino humano.

195:9:10 20836 O cristianismo está ameaçado de morte lenta, pelo formalismo, pela super-organização, pelo intelectualismo e por outras tendências não espirituais. A moderna igreja cristã não é a irmandade de crentes dinâmicos à qual Jesus encarregou continuadamente com a missão de efetuar a transformação espiritual das gerações sucessivas da humanidade.

195:9:11 20837 O chamado cristianismo tornou-se um movimento social e cultural, tanto quanto uma crença e uma prática religiosa. As correntes do cristianismo moderno drenam muitos antigos pântanos pagãos e muitos marasmos bárbaros; muitas bacias culturais antigas vertem as suas águas nessa corrente cultural de hoje, bem como os mananciais dos altos platôs galileus os quais se supõe que sejam a sua fonte exclusiva.


10. O FUTURO


195:10:1 20841 O cristianismo de fato prestou um grande serviço a este mundo, mas agora é Jesus que se faz mais necessário. O mundo necessita ver Jesus vivendo novamente na Terra, na experiência de mortais nascidos do espírito e que efetivamente revelem o Mestre a todos os homens. É inútil falar de um renascimento da primitiva cristandade; vós deveis seguir para frente, partindo de onde estais. A cultura moderna deve tornar-se espiritualmente batizada com uma nova revelação da vida de Jesus e iluminada por um novo entendimento do seu evangelho de salvação eterna. E quando Jesus tornar-se elevado assim, ele atrairá todos os homens para si. Os discípulos de Jesus, mais do que conquistadores, deveriam ser fontes transbordantes de inspiração e de vida elevada para todos os homens. A religião é apenas um humanismo elevado, até que seja tornado divino pela descoberta da realidade da presença de Deus, na experiência pessoal.

195:10:2 20842 A beleza e a sublimidade, a humanidade e a divindade, a simplicidade, singularidade e a unicidade da vida de Jesus na Terra apresentam um quadro tão impressionante e tão atraente de salvação do homem e de revelação de Deus, que os teólogos e os filósofos de todos os tempos deveriam ficar efetivamente impedidos de ousar formar credos ou de criar sistemas teológicos de servidão espiritual a partir dessa auto-outorga transcendental de Deus, na forma do homem. Em Jesus, o universo produziu um homem mortal em quem o espírito do amor triunfou sobre as limitações materiais do tempo e suplantou o fato da origem física.

195:10:3 20843 Tende sempre em mente que Deus e os homens necessitam uns dos outros. Eles são mutuamente necessários para a realização plena e final da experiência eterna da personalidade, no destino divino da finalidade do universo.

195:10:4 20844 “O Reino de Deus está dentro de vós” foi provavelmente a maior afirmação que Jesus fez, junto com a declaração de que o seu Pai é um espírito vivo cheio de amor.

195:10:5 20845 Ao conquistar almas para o Mestre, não é a primeira légua, a da obrigação, do dever ou da convenção, que irá transformar o homem e o seu mundo, mas é mais a segunda légua, a de serviço livre, de devoção e amor à liberdade, a que representa o esforço semelhante ao de Jesus, para alcançar o irmão no amor e para colocá-lo sob a guia espiritual, na direção da meta divina mais elevada da existência mortal. O cristianismo, ainda hoje, percorre, com disposição, a primeira légua; mas a humanidade definha e tropeça nas trevas morais, porque há tão poucos homens fazendo a segunda légua – tão poucos seguidores professos de Jesus e que realmente vivem e amam, como ele ensinou os seus discípulos a viver, a amar e a servir.

195:10:6 20846 O chamamento à aventura de edificar uma nova e transformada sociedade humana, por meio do renascimento espiritual da irmandade, no Reino de Jesus, deveria comover e apaixonar a todos aqueles que crêem nele, de um modo como os homens não se comovem desde os dias em que eles perambulavam pela Terra como companheiros dele na carne.

195:10:7 20847 Nenhum sistema social ou regime político que nega a realidade de Deus pode contribuir de uma maneira construtiva e duradoura para o avanço da civilização humana. A cristandade, tal como está hoje subdividida e secularizada, representa o maior de todos os obstáculos ao avanço da humanidade; e isso é verdade, especialmente no que concerne ao Oriente.

195:10:8 20848 O domínio eclesiástico é, agora e sempre, incompatível com aquela fé viva, com o crescimento do espírito e com a experiência original, e de primeira mão, dos camaradas de fé, de Jesus, na irmandade dos homens, na associação espiritual do Reino do céu. O desejo louvável de conservar as tradições das realizações passadas, muitas vezes, leva à defesa de sistemas obsoletos de adoração. O desejo bem-intencionado, de realimentar sistemas antigos de pensamento, efetivamente, impede a promoção eficaz de meios e métodos novos e adequados que satisfaçam os anseios espirituais das mentes que se expandem e que avançam, dos homens modernos. Do mesmo modo, as igrejas cristãs do século vinte permanecem como grandes obstáculos, ainda que totalmente inconscientes, ao avanço imediato do evangelho verdadeiro – os ensinamentos de Jesus de Nazaré.

195:10:9 20851 Muitas pessoas sinceras, que de bom grado ofereceriam a sua lealdade ao Cristo do evangelho, acham bastante difícil sustentar, com entusiasmo, uma igreja que demonstra tão pouco do espírito da vida e dos ensinamentos dele, a qual, lhes foi ensinado erroneamente, que ele teria fundado. Jesus não fundou a chamada igreja cristã, mas, de todos os modos coerentes com a sua natureza, ele fomentou-a como sendo o melhor expoente existente do trabalho da sua vida na Terra.

195:10:10 20852 Se a igreja cristã apenas ousasse esposar o programa do Mestre, milhares de jovens, aparentemente indiferentes, apressar-se-iam a alistar-se em tal empreendimento espiritual, e eles não hesitariam em ir até o fim nessa grande aventura.

195:10:11 20853 A cristandade se defronta seriamente com a condenação que está incorporada em um dos seus próprios slogans: “Uma casa dividida, contra si própria, não poderá sobreviver”. O mundo não-cristão dificilmente render-se-á a uma cristandade dividida em seitas. O Jesus vivo é a única esperança de uma unificação possível da cristandade. A verdadeira igreja – a fraternidade de Jesus – é invisível, é espiritual e é caracterizada pela unidade, não necessariamente pela uniformidade. A uniformidade seria uma marca, para o mundo físico, de natureza mecanicista. A unidade espiritual é fruto da união de fé com o Jesus vivo. A igreja visível deveria recusar-se a continuar impedindo o progresso da irmandade invisível e espiritual do Reino de Deus. E essa fraternidade está destinada a tornar-se um organismo vivo, ao contrário de uma organização social institucionalizada. Ela pode, muito bem, servir-se dessas organizações sociais, mas não deve ser suplantada por elas.

195:10:12 20854 Apesar de tudo, mesmo o cristianismo do século vinte não deve ser menosprezado. Ele é o produto do gênio moral dos homens sabedores de Deus, de muitas raças, durante muitas idades, e tem sido verdadeiramente um dos grandes poderes para o bem na Terra e, portanto, nenhum homem deveria considerá-lo superficialmente e sem o devido apreço, não obstante os seus defeitos inerentes e adquiridos. O cristianismo ainda consegue movimentar as mentes dos homens de reflexão, por meio de emoções morais poderosas.

195:10:13 20855 E não há uma desculpa para o envolvimento da igreja no comércio e na política; alianças ímpias como essas são traições flagrantes ao Mestre. E os amantes genuínos da verdade tardarão a esquecer que essa poderosa igreja institucionalizada tem, freqüentemente, ousado sufocar fés recém-nascidas e perseguir àqueles que conceberam a verdade e que, na oportunidade, apareceram em vestimentas não-ortodoxas.

195:10:14 20856 Infelizmente, é bem verdade que essa igreja não teria sobrevivido, caso não tivesse havido homens no mundo que preferissem esse estilo de adoração. Muitas almas, espiritualmente indolentes, têm a necessidade ardente de uma religião antiga e autoritária, de tradição sagrada nos rituais. A evolução humana e o progresso espiritual dificilmente são suficientes para capacitar todos os homens a prescidirem de uma autoridade religiosa. E a fraternidade invisível do Reino pode muito bem incluir esses grupos familiares de várias classes e temperamentos sociais, caso estejam dispostos apenas a tornarem-se filhos de Deus, guiados pelo espírito. Mas, nessa fraternidade de Jesus, não há lugar para a rivalidade sectária, para amargas rixas grupais, nem para afirmações de superioridade moral e de infalibilidade espiritual.

195:10:15 20861 Esses vários agrupamentos de cristãos podem servir para acomodar numerosos tipos diferentes de possíveis crentes, entre os vários povos da civilização ocidental, mas essa divisão da cristandade representa uma grande fraqueza, quando ela intenta levar o evangelho de Jesus aos povos orientais. Aquelas raças ainda não compreendem que possa haver uma religião de Jesus separadamente, e de algum modo à parte, do cristianismo, que cada vez mais está tornando-se uma religião a respeito de Jesus.

195:10:16 20862 A grande esperança para Urântia está na possibilidade de uma nova revelação de Jesus, com uma apresentação nova e ampliada da sua mensagem de salvação, que espiritualmente unisse, no serviço amoroso, as numerosas famílias daqueles que atualmente são os seus professos seguidores.

195:10:17 20863 Mesmo a educação secular poderia ajudar, nesse grande renascimento espiritual, caso ela desse mais atenção ao trabalho de ensinar aos jovens como efetuar um planejamento de vida e realizar progressos de caráter. O propósito de toda a educação deveria ser fomentar e realizar o propósito supremo da vida, o desenvolvimento de uma personalidade na grandeza e no equilíbrio. Há uma grande necessidade do ensino da disciplina da moral, em lugar de tanta autogratificação. Com essa base, e por meio do seu incentivo espiritual a religião pode contribuir para a ampliação e o enriquecimento da vida mortal, e mesmo para a segurança e o engrandecimento da vida eterna.

195:10:18 20864 O cristianismo é uma religião gerada por adequações extemporâneas, e por isso deve operar em baixa velocidade. As atuações em alta velocidade espiritual devem esperar a nova revelação e uma aceitação mais geral da verdadeira religião de Jesus. O cristianismo, contudo, é uma religião poderosa, visto que os discípulos comuns de um carpinteiro crucificado lançaram os ensinamentos que conquistaram o mundo romano, em trezentos anos, e então triunfaram sobre os bárbaros, que arruinaram Roma. Esse mesmo cristianismo predominou – absorvendo e engrandendo – sobre toda a corrente de teologia hebraica e de filosofia grega. E então, quando essa religião cristã entrou em coma, durante mais de mil anos, em resultado de uma dose excessiva de mistérios e paganismo, ela ressuscitou e virtualmente reconquistou todo o mundo ocidental. O cristianismo contém o suficiente dos ensinamentos de Jesus para imortalizar-se.

195:10:19 20865 Se o cristianismo pudesse abranger mais dos ensinamentos de Jesus, daria uma ajuda bem maior ao homem moderno para resolver os seus problemas novos e cada vez mais complexos.

195:10:20 20866 O cristianismo sofre de uma grande limitação, porque se tornou identificado, nas mentes de todo o mundo, com uma parte do sistema social, da vida industrial e dos padrões morais da civilização ocidental; e assim o cristianismo parece ter patrocinado, involuntariamente, uma sociedade que titubeia sob a culpa de tolerar a ciência sem idealismo, a política sem princípios, a riqueza sem o trabalho, o prazer sem restrições, o conhecimento sem caráter, o poder sem consciência e a indústria sem moralidade.

195:10:21 20867 A esperança, para o cristianismo moderno, é a de que ele possa cessar de apadrinhar os sistemas sociais e as políticas industriais da civilização ocidental e, ao mesmo tempo, a de que ele humildemente se curve diante dessa cruz que ele louva com tanta valentia, e que passe a aprender de novo, de Jesus de Nazaré, sobre as maiores verdades que o homem mortal pôde jamais escutar – o evangelho vivo da paternidade de Deus e da irmandade dos homens.

DOCUMENTO 196

A FÉ DE JESUS
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Jesus gozava de uma fé sublime, e de todo o seu coração, em Deus. Ele experimentou os altos e baixos comuns da existência mortal, mas nunca duvidou religiosamente da certeza da vigilância e do guiamento de Deus. A sua fé era fruto do discernimento nascido da atividade da presença divina do seu Ajustador residente. A sua fé não era nem tradicional nem meramente intelectual; era totalmente pessoal e puramente espiritual.

196:0:2 20872 O Jesus humano via Deus como sendo santo, justo e grande, bem como verdadeiro, belo e bom. Todos esses atributos da divindade, ele os focalizava na sua mente como a “vontade do Pai no céu”. O Deus de Jesus era, ao mesmo tempo, “O Santo de Israel” e “O Pai vivo e amoroso do céu”. O conceito de Deus, como um Pai, não era original de Jesus, mas ele exaltou e elevou essa idéia como uma experiência sublime, realizando uma nova revelação de Deus e proclamando que todo ser mortal é um filho desse Pai de amor, um filho de Deus.

196:0:3 20873 Jesus não se apegou à fé em Deus como o faria uma alma que se debate em luta contra o universo, ou que se agarra à luta de morte contra um mundo hostil e pecaminoso; ele não recorreu à fé meramente como uma consolação em meio a dificuldades, ou como um conforto em meio à ameaça do desespero; a fé não era apenas uma compensação ilusória para as realidades desagradáveis e os sofrimentos da vida. Ao enfrentar todas as dificuldades naturais e as contradições temporais da existência mortal, ele experimentou a tranqüilidade da confiança suprema e inquestionável em Deus e sentiu a imensa emoção de viver, pela fé, na própria presença do Pai celeste. E essa fé triunfante foi uma experiência viva de realização real do espírito. A grande contribuição de Jesus para os valores da experiência humana não foi ele ter revelado tantas idéias novas sobre o Pai no céu, mas foi mais por ele ter tão magnífica e humanamente demonstrado um tipo novo e mais elevado de fé viva em Deus. Nunca, em todos os mundos deste universo, na vida de qualquer mortal, Deus tornou-se uma tão viva realidade como na experiência humana de Jesus de Nazaré.

196:0:4 20874 Na vida do Mestre, em Urântia, este e todos os outros mundos da criação local descobriram um tipo novo e mais elevado de religião, baseada em relações espirituais pessoais com o Pai Universal e totalmente validada pela autoridade suprema da experiência pessoal genuína. Essa fé viva de Jesus era mais do que uma reflexão intelectual, e não era uma meditação mística.

196:0:5 20875 A teologia pode fixar, formular, definir e dogmatizar a fé, mas, na vida humana de Jesus, a fé era pessoal, viva, original, espontânea e puramente espiritual. Essa fé não era uma reverência à tradição, nem uma mera crença intelectual que ele mantinha como um credo sagrado, mas era mais uma experiência sublime e uma convicção profunda, que o mantinha em segurança. A sua fé era tão real e todo-inclusiva que varreu para longe, absolutamente, quaisquer dúvidas espirituais e destruiu efetivamente todos os desejos conflitantes. Nada foi capaz de afastá-lo da ancoragem espiritual dessa fé fervorosa, sublime e destemida. Mesmo na derrota aparente ou nas fortes dores do desapontamento e do desespero ameaçador, ele permaneceu calmamente na presença divina, livre de medo e totalmente consciente da invencibilidade espiritual. Jesus desfrutou da certeza revigorante da posse da fé inflexível e, em cada uma das situações de provação, ele demonstrou infalivelmente uma lealdade inquestionável à vontade do Pai. E essa fé magnífica não se intimidou, mesmo diante da ameaça cruel e esmagadora de uma morte ignominiosa.

196:0:6 20881 Em um gênio religioso, uma fé espiritual muito forte, com freqüência, leva diretamente ao fanatismo desastroso, ao exagero do ego religioso, mas não aconteceu assim com Jesus. Ele não foi afetado desfavoravelmente, na sua vida prática, pela sua extraordinária fé e pela realização espiritual, porque essa exaltação espiritual era uma expressão totalmente inconsciente e espontânea, na sua alma, da sua experiência pessoal com Deus.

196:0:7 20882 A fé espiritual ardente e indomável de Jesus nunca se tornou fanática, pois nunca chegou a afetar os seus julgamentos intelectuais equilibrados a respeito dos valores correspondentes das situações sociais, econômicas e morais, práticas e comuns da vida. O Filho do Homem era uma personalidade humana esplendidamente unificada; ele era um ser divino perfeitamente dotado; ele era também magnificamente coordenado, como combinação de ser humano e divino, funcionando na Terra como uma personalidade única. O Mestre sempre coordenava a fé da alma com o juízo da sabedoria da experiência amadurecida. A fé pessoal, a esperança espiritual e a devoção moral foram sempre correlacionadas em uma unidade religiosa, sem par, de associação harmoniosa com a compreensão profunda da realidade e da sacralidade de todas as lealdades humanas – a honra pessoal, o amor familiar, a obrigação religiosa, o dever social e a necessidade econômica.

196:0:8 20883 A fé de Jesus visualizou todos os valores do espírito como sendo encontrados no Reino de Deus; e por isso ele disse: “Buscai primeiro o Reino do céu”. Jesus viu, na fraternidade avançada e ideal do Reino, a realização e o cumprimento da “vontade de Deus”. A essência mesma da oração que ele ensinou aos seus discípulos foi: “Que venha a nós o vosso Reino; que a vossa vontade seja feita”. E assim, tendo concebido o Reino como consistindo da vontade de Deus, ele devotou-se à causa da sua realização com um auto-esquecimento espantoso e um entusiasmo incontido. Mas, durante toda a sua intensa missão e na sua vida extraordinária, a fúria do fanático nunca esteve presente, nem a insignificância, de fachada, do egotista religioso.

196:0:9 20884 A vida inteira do Mestre foi condicionada, consistentemente, por essa fé viva, por essa experiência religiosa sublime. Essa atitude espiritual dominou totalmente o seu pensamento e o seu sentimento, a sua crença e a sua oração, o seu ensinamento e a sua pregação. Essa fé pessoal de um filho, na certeza e na segurança do guiamento e da proteção do Pai celeste, conferiu à sua vida única um dom profundo de realidade espiritual. E ainda, a despeito dessa profunda consciência de relação íntima com a divindade, esse galileu, esse Galileu de Deus, quando era chamado de Bom Mestre, imediatamente dizia: “Por que me chamais de bom?” Quando nós nos defrontamos com um auto-esquecimento tão esplêndido, começamos a compreender como o Pai Universal achou possível manifestar, tão plenamente, a Si próprio, nele e revelar-Se por meio dele aos mortais dos reinos.

196:0:10 20885 Jesus levou a Deus, como homem deste reino, a maior de todas as oferendas: a consagração e a dedicação da sua própria vontade ao serviço majestoso de fazer a vontade divina. Jesus sempre interpretou, e de um modo consistente, a religião, nos termos totais da vontade do Pai. Quando estudardes a carreira do Mestre, no que diz respeito à prece ou a qualquer outro aspecto da vida religiosa, não procureis tanto o que ele ensinou, mas deveis procurar o que ele fez. Jesus nunca orou por dever religioso. Para ele, a prece era uma expressão sincera da atitude espiritual, uma declaração de lealdade da alma, uma demonstração da devoção pessoal, uma expressão da gratidão, um modo de evitar a tensão emocional, uma prevenção para os conflitos, uma exaltação intelectiva, um enobrecimento do desejo, uma demonstração da decisão moral, um enriquecimento do pensamento, um revigoramento das inclinações mais elevadas, uma consagração do impulso, um esclarecimento de pontos de vista, uma declaração de fé, uma rendição transcendental da vontade, uma afirmação sublime de confiança, uma revelação de coragem, a proclamação da descoberta, uma confissão de devoção suprema, a validação da consagração, uma técnica de ajustamento das dificuldades e a mobilização poderosa, dos poderes combinados da alma, para suportar todas as tendências humanas para o egoísmo, o mal e o pecado. Ele viveu exatamente uma vida na prece e na consagração devotada a fazer a vontade do seu Pai e terminou a sua vida de modo triunfante, exatamente com uma dessas orações. O segredo da sua vida religiosa sem par foi essa consciência da presença de Deus; e ele a alcançou por meio da oração inteligente e da adoração sincera – de comunhão ininterrupta com Deus – e não por indicações, vozes, visões, nem por práticas religiosas extraordinárias.

196:0:11 20891 Na vida terrena de Jesus, a religião foi uma experiência viva, um movimento direto e pessoal da reverência espiritual à prática da retidão. A fé de Jesus deu frutos transcendentais do espírito divino. A sua fé não era imatura e crédula como a de uma criança, mas, sob muitos pontos de vista, ela assemelhou-se à confiança, sem suspeitas, da mente infantil. Jesus confiou em Deus, do mesmo modo que uma criança confia em um pai. Ele tinha uma profunda confiança no universo – exatamente a confiança que uma criança tem no ambiente dos seus pais. A fé de Jesus, uma fé de todo o coração, na bondade fundamental do universo, em muito se assemelhou à confiança que a criança tem na segurança no seu meio ambiente terreno. Ele dependeu do Pai celeste, tal uma criança se apóia no seu pai terreno, e a sua fé fervorosa nunca, nem por um momento, duvidou da certeza de que o Pai celeste velava por ele. Ele não se perturbava seriamente com temores, dúvidas e ceticismos. A descrença não inibiu a expressão livre e original da sua vida. Ele combinou a coragem sólida e inteligente de um homem amadurecido, com o otimismo sincero e crente de uma criança confiante. A sua fé cresceu a um nível tão elevado de confiança que era desprovida de temores.

196:0:12 20892 A fé de Jesus alcançou a pureza da confiança de uma criança. A sua fé era tão absoluta e desprovida de dúvidas que se fazia sensível ao encanto do contato com os companheiros e às maravilhas do universo. O seu senso de dependência do divino era tão completo e tão confiante, que trazia a alegria e a certeza de uma segurança pessoal absoluta. Não havia nada de hesitante e simulado na sua experiência religiosa. Nessa inteligência gigantesca de um homem adulto, a fé da criança reinava, suprema, em todas as questões relacionadas à consciência religiosa. Não é estranho que uma vez tenha ele dito: “Se não vos tornardes como crianças pequenas, não entrareis no Reino”. Não obstante a fé de Jesus ser como a de uma criança, não era infantil em nenhum sentido.

196:0:13 20893 Jesus não exige que os seus discípulos acreditem nele, mas que eles acreditem junto com ele, que acreditem na realidade do amor de Deus e, com toda a confiança, que aceitem a certeza da segurança da filiação ao Pai celeste. O Mestre deseja que todos os seus seguidores compartilhem totalmente da sua fé transcendente. Jesus, de um modo muito tocante, desafiou os seus seguidores, não apenas a acreditarem naquilo em que ele acreditava, mas também a acreditarem como ele acreditava. Esta é a significação plena da sua única e suprema exigência: “Siga-me”.

196:0:14 20901 A vida terrena de Jesus foi devotada a um grande propósito – fazer a vontade do Pai, viver a vida humana, religiosamente e pela fé. A fé de Jesus foi confiante como a de uma criança, mas sem a menor presunção. Ele tomou decisões firmes e viris, enfrentou corajosamente múltiplas decepções, suplantou com resolução dificuldades extraordinárias e cumpriu inabalavelmente os rudes requisitos do dever. Foi necessária uma vontade forte e uma confiança firme para acreditar no que Jesus acreditava, e como ele acreditava.

1. JESUS – O HOMEM


196:1:1 20902 A devoção de Jesus à vontade do Pai, e ao serviço do homem, representava mais do que a decisão mortal e a determinação humana; foi uma consagração, de todo o seu coração, a essa outorga de amor sem reservas. Não importa quão grande seja o fato da soberania de Michael, vós não deveis privar os homens do Jesus humano. O Mestre ascendeu ao alto como um homem, tanto quanto um Deus; ele pertence aos homens; e os homens pertencem a ele. Que pena que a própria religião fosse ser tão mal interpretada a ponto de esconder dos mortais atribulados o Jesus humano! Que as discussões sobre a humanidade ou sobre a divindade do Cristo não obscureçam a verdade salvadora de que Jesus de Nazaré foi um homem religioso que, pela fé, chegou a conhecer e a fazer a vontade de Deus; ele foi o homem mais religioso que já viveu em Urântia.

196:1:2 20903 Os tempos amadureceram o suficiente, a ponto de se poder constatar a ressurreição simbólica do Jesus humano, saindo do seu túmulo, dentre as tradições teológicas e os dogmas religiosos de dezenove séculos. Jesus de Nazaré não deve mais ser sacrificado, nem mesmo ao conceito esplêndido do Cristo glorificado. Que serviço transcendente seria prestado se, por intermédio dessa revelação, o Filho do Homem fosse retirado do túmulo da teologia tradicional para ser apresentado como o Jesus vivo, à igreja que leva o seu nome, e para todas as outras religiões! Seguramente a irmandade cristã de crentes não hesitaria em fazer os ajustes de fé, e de práticas de vida, que a capacitassem a poder “seguir ao” Mestre na demonstração da sua vida verdadeira de devoção religiosa, a fazer a vontade do seu Pai, e à consagração ao serviço desinteressado dos homens. Será que aqueles que chamam a si de cristãos professos temem criar uma irmandade auto-suficiente e de respeitabilidade social não consagrada, será que temem o desajuste econômico egoísta? Acaso a cristandade institucionalizada teme que a autoridade eclesiástica tradicional esteja em perigo, ou mesmo que seja arruinada, se o Jesus da Galiléia for restabelecido nas mentes e nas almas dos homens mortais, como o ideal de vida religiosa pessoal? Em verdade, os reajustes sociais, as transformações econômicas, o rejuvenescimento moral e as revisões religiosas da civilização cristã seriam drásticas e revolucionárias se a religião viva de Jesus pudesse subitamente suplantar a religião teológica sobre Jesus.

196:1:3 20904 “Seguir Jesus” significa compartilhar pessoalmente a fé religiosa dele e entrar no espírito da vida do Mestre, consagrada ao serviço desinteressado dos homens. Uma das coisas mais importantes, na vida humana, é encontrar aquilo em que Jesus acreditava, é descobrir seus ideais e lutar para a realização do seu propósito elevado de vida. De todo o conhecimento humano, o que é de maior valor é poder conhecer a vida religiosa de Jesus e como ele viveu-a.

196:1:4 20905 O povo comum ouviu Jesus com alegria, e será de novo sensível à apresentação da sua vida humana sincera de motivação religiosa consagrada, se essas verdades forem novamente proclamadas ao mundo. O povo ouvia-o com alegria porque ele era um deles, um leigo despretensioso; o maior de todos os instrutores religiosos era, em verdade, um leigo.

196:1:5 20911 Não deveria ser a meta dos crentes do Reino imitar literalmente os aspectos exteriores da vida de Jesus na carne, mas sim compartilhar a sua fé; confiar em Deus como ele confiou em Deus e acreditar nos homens como ele acreditou nos homens. Jesus nunca discutiu, fosse sobre a paternidade de Deus, fosse sobre a irmandade dos homens; ele foi uma ilustração viva da primeira, e uma comprovação profunda da segunda.

196:1:6 20912 Exatamente como os homens devem progredir, da consciência do humano à compreensão e realização do divino, assim Jesus ascendeu, desde a natureza de homem à consciência da natureza de Deus. E o Mestre fez essa grande ascensão, do humano ao divino, por meio da realização conjunta da fé do seu intelecto mortal e dos atos do seu Ajustador residente. A compreensão factual do alcançar da totalidade da divindade (ao mesmo tempo plenamente consciente da realidade da sua humanidade) foi acompanhada de sete estágios de consciência da fé de divinização progressiva. Esses estágios de auto-realização progressiva ficaram marcados pelos acontecimentos extraordinários seguintes, na experiência de auto-outorga do Mestre:

20913 1. A chegada do Ajustador do Pensamento.

20914 2. O mensageiro de Emanuel, que apareceu para ele em Jerusalém quando ele tinha cerca de doze anos de idade.

20915 3. As manifestações que acompanharam o seu batismo.

20916 4. As experiências no monte da Transfiguração.

20917 5. A ressurreição moroncial.

20918 6. A ascensão espiritual.

20919 7. O abraço final do Pai do Paraíso, conferindo-lhe a soberania ilimitada do seu universo.

2. A RELIGIÃO DE JESUS


196:2:1 209110 Algum dia, uma reforma na igreja cristã poderia causar um impacto suficientemente profundo de retomada dos ensinamentos religiosos inalterados de Jesus, o autor, a fonte e a realização da nossa fé. Vós podeis pregar uma religião sobre Jesus, mas, por força, vós deveis viver a religião de Jesus. No entusiasmo de Pentecostes, Pedro inaugurou involuntariamente uma nova religião, a religião do Cristo ressuscitado e glorificado. Mais tarde, o apóstolo Paulo transformou esse novo evangelho no cristianismo, uma religião que incorporava as suas próprias visões teológicas e que retratava a sua própria experiência pessoal com o Jesus da estrada de Damasco. A boa-nova do evangelho do Reino fundamenta-se na experiência religiosa pessoal do Jesus da Galiléia; o cristianismo baseia-se quase que exclusivamente na experiência religiosa pessoal do apóstolo Paulo. A quase totalidade do Novo Testamento é devotada, não a retratar a vida religiosa, significativa e inspiradora, de Jesus, mas a uma discussão da experiência religiosa de Paulo e a um retrato das suas convicções religiosas pessoais. As únicas exceções notáveis, dentro dessa afirmação, afora certas partes de Mateus, de Marcos e de Lucas, são o Livro dos Hebreus e a Epístola de Tiago. Mesmo Pedro, nos seus escritos, apenas uma vez reflete a vida pessoal religiosa do seu Mestre. O Novo Testamento é um documento cristão esplêndido, mas é um documento que pouco tem de Jesus.

196:2:2 209111 A vida de Jesus na carne retrata um crescimento religioso transcendente, desde as idéias iniciais do pavor primitivo e da reverência humana, passando por anos de comunhão espiritual pessoal, até que ele finalmente chegue àquele estado avançado e elevado de consciência da sua unidade com o Pai. E assim, em uma curta vida, Jesus passou por aquela experiência religiosa de progresso espiritual que o homem começa, na Terra, e que comumente completa apenas ao concluir a sua longa permanência nas escolas de aprendizado espiritual, nos níveis sucessivos da sua carreira pré-paradisíaca. Jesus progrediu, partindo de uma consciência puramente humana, das certezas da fé da experiência religiosa pessoal, até as alturas espirituais sublimes da realização efetiva da sua natureza divina e, daí, para a consciência da sua associação íntima com o Pai Universal, para dirigir um universo. Ele progrediu do status humilde, de dependência mortal, que o levou espontaneamente a dizer àquele que o chamou de Bom Mestre: “Por que me chamais de bom? Ninguém é bom a não ser Deus”, até aquele estado sublime de consciência, da divindade realizada que o levou a exclamar: “Qual dentre vós me sentencia de ter pecado?” E essa ascensão progressiva, do humano ao divino, foi uma realização exclusivamente mortal. E quando ele tinha alcançado a divindade, assim, ele era ainda o mesmo Jesus humano, o Filho do Homem, tanto quanto o Filho de Deus.

196:2:3 20921 Marcos, Mateus e Lucas guardam alguma coisa do quadro do Jesus humano lançando-se na luta magnífica para determinar a vontade divina e para cumprir essa vontade. João apresenta um quadro do Jesus triunfante, caminhando na Terra, na consciência plena da divindade. O grande erro, cometido por aqueles que estudaram a vida do Mestre, é que alguns o conceberam como inteiramente humano, enquanto outros o consideraram apenas como divino. Durante toda a sua experiência ele foi, em verdade, tanto humano quanto divino; como ele é ainda agora.

196:2:4 20922 Mas o maior erro cometido consta de que, enquanto ficou reconhecido que o Jesus humano tinha uma religião, o Jesus divino (Cristo) transformou-se em uma religião, quase que da noite para o dia. O cristianismo, de Paulo, assegurou a adoração do Cristo divino, mas quase totalmente perdeu de vista o valente Jesus da Galiléia, humano, que lutou pelo valor da sua fé religiosa pessoal, e o heroísmo do seu Ajustador residente, que ascendeu do nível inferior da humanidade para tornar-se um com a divindade, transfornando-se, assim, no novo caminho vivo pelo qual todos os mortais podem ascender, dessa forma, da humanidade à divindade. Os mortais, em todos os estágios de espiritualidade e em todos os mundos, podem encontrar na vida pessoal de Jesus aquilo que os fortalecerá e inspirará, no seu progresso desde o nível espiritual mais baixo, até os valores divinos mais elevados, do começo ao fim de toda a experiência religiosa pessoal.

196:2:5 20923 Na época em que foi escrito o Novo Testamento, os autores não apenas acreditavam muito profundamente na divindade do Cristo ressuscitado, também acreditavam, devota e sinceramente, no seu retorno imediato à Terra, para consumar o Reino celeste. Essa fé fortalecida no retorno imediato do Senhor teve muito a ver com a tendência de omitir, dos registros, aquelas referências que retratavam as experiências e os atributos puramente humanos do Mestre. Todo o movimento cristão teve a tendência de afastar-se do retrato humano de Jesus de Nazaré, orientando-se para a exaltação do Cristo ressuscitado, o Senhor Jesus Cristo glorificado, e que em breve retornaria.

196:2:6 20924 Jesus fundou a religião da experiência pessoal, ao fazer a vontade de Deus e ao servir à irmandade humana; Paulo fundou uma religião, na qual o Jesus glorificado tornou-se o objeto da adoração e a irmandade consistiu dos irmãos que eram crentes do Cristo divino. Na dádiva outorgada por Jesus, esses dois conceitos eram potenciais na sua vida divina-humana e, em verdade, é uma pena que os seus seguidores não tivessem conseguido criar uma religião unificada, que poderia ter dado um reconhecimento próprio a ambas, à natureza humana e à natureza divina do Mestre, tal como estavam inseparavelmente ligadas na sua vida terrena e tão gloriosamente expostas no evangelho original do Reino.

196:2:7 20931 Vós não ficaríeis, nem chocados, nem perturbados pelos fortes pronunciamentos de Jesus, e para isso basta que vos lembreis de que ele era o religioso mais devotado, e de todo o seu coração, em todo o mundo. Ele era um mortal totalmente consagrado, dedicado, sem reservas, a fazer a vontade do seu Pai. Muitas das suas afirmações, aparentemente duras, eram mais como uma confissão pessoal de fé e uma promessa de devoção, do que comandos dados para os seus seguidores. E foi essa mesma singularidade de propósito, e de devoção não egoísta, que o capacitou a efetivar um progresso, tão extraordinário, na conquista da mente humana, em uma vida tão curta. Muitas das suas declarações deveriam ser consideradas como confissões do que ele exigia de si próprio, em vez de uma exigência para todos os seus seguidores. Na sua devoção à causa do Reino, Jesus queimou todas as pontes atrás de si; ele sacrificou tudo o que pudesse ser um obstáculo para a realização da vontade do seu Pai.

196:2:8 20932 Jesus abençoava os pobres, porque em geral eles eram sinceros e pios; ele condenava os ricos, porque em geral eram devassos e irreligiosos. Ele condenaria igualmente os pobres irreligiosos e louvaria os ricos consagrados e pios.

196:2:9 20933 Jesus fazia os homens sentirem-se, no mundo, como se estivessem em casa; ele os libertava do tabu escravizador e ensinava a eles que o mundo não era fundamentalmente mau. Ele não almejava escapar da sua vida terrestre; ele dominou uma técnica de fazer a vontade do Pai de um modo aceitável, enquanto na carne. Ele atingiu uma vida religiosa idealista, em meio, mesmo, de um mundo realista. Jesus não partilhava da visão pessimista que Paulo tinha da humanidade. O Mestre via os homens como filhos de Deus e anteviu um futuro magnífico e eterno para aqueles que escolhiam sobreviver. Ele não era um cético moral; ele via o homem positivamente, não negativamente. Ele via a maioria dos homens como fracos, mais do que como perversos, mais como perturbados do que depravados. Mas, não importando o status deles, eram todos filhos de Deus e irmãos seus.

196:2:10 20934 Ele ensinou os homens a dar um elevado valor a si próprios, no tempo e na eternidade. Por causa dessa estima elevada, que Jesus tinha pelos homens, ele estava disposto a dedicar-se ao serviço ininterrupto da humanidade. E foi esse infinito apreço ao finito, o que fez da regra de ouro um fator vital na sua religião. Que mortal deixaria de se elevar pela fé extraordinária que Jesus tinha nele?

196:2:11 20935 Jesus não propôs regras para o avanço social; a sua missão era religiosa, e a religião é uma experiência exclusivamente individual. A última meta e de realização mais avançada da sociedade não pode esperar nunca transcender a fraternidade que Jesus ofereceu aos homens, baseada no reconhecimento da paternidade de Deus. O ideal de toda a realização social apenas pode ser cumprido com a vinda deste Reino divino.

3. A SUPREMACIA DA RELIGIÃO


196:3:1 20936 A experiência espiritual religiosa, pessoal, é uma solução eficiente para a maior parte das dificuldades mortais; ela seleciona, avalia e ajusta eficazmente todos os problemas humanos. A religião não remove, nem destrói os problemas humanos, mas dissolve-os, absorve-os, ilumina-os e transcende-os. A verdadeira religião unifica a personalidade, preparando-a para ajustar efetivamente todas as exigências mortais. A fé religiosa – o guiamento efetivo da presença divina residente – capacita, infalivelmente, o homem sabedor de Deus a lançar uma ponte sobre o abismo existente entre a lógica intelectual que reconhece a Primeira Causa Universal como sendo um Isso, de um lado, e aquelas afirmações efetivas da alma que declaram que essa Primeira Causa é Ele, o Pai Universal do evangelho de Jesus, o Deus pessoal da salvação humana.

196:3:2 20941 Há apenas três elementos na realidade universal: o fato, a idéia e a relação. A consciência religiosa identifica essas realidades como ciência, filosofia e verdade. A consciência filosófica estaria inclinada a ver essas atividades como razão, sabedoria e fé – a realidade física, a realidade intelectual e a realidade espiritual. O nosso hábito é designar essas realidades como coisa, significado e valor.

196:3:3 20942 A compreensão progressiva da realidade é equivalente a uma aproximação de Deus. A descoberta de Deus, a consciência da identidade com a realidade, é equivalente à experiência do eu completo, da inteireza do eu, da totalidade do eu. O experienciar da realidade total é a compreensão-realização plena de Deus, a finalidade da experiência de conhecer a Deus.

196:3:4 20943 A somatória total da vida humana é o conhecimento de que o homem é educado pelo fato, enobrecido pela sabedoria e salvo – justificado – pela fé religiosa.

196:3:5 20944 A certeza física consiste na lógica da ciência; a certeza moral, na sabedoria da filosofia; a certeza espiritual, na verdade da experiência religiosa autêntica.

196:3:6 20945 A mente do homem pode alcançar altos níveis de discernimento espiritual, e esferas correspondentes de divindade de valores, porque ela não é totalmente material. Há um núcleo espiritual na mente do homem – o Ajustador, de presença divina. Há três evidências distintas de que esse espírito reside na mente humana:

196:3:7 20946 1. A comunhão humanitária – o amor. A mente puramente animal pode ser gregária por autoproteção, mas apenas o intelecto residido pelo espírito é altruísta de um modo não egoísta e ama incondicionalmente.

196:3:8 20947 2. A interpretação do universo – a sabedoria. Apenas a mente residida pelo espírito pode compreender que o universo é amigável para com o indivíduo.

196:3:9 20948 3. A avaliação espiritual da vida – a adoração. Apenas o homem residido pelo espírito pode compreender-realizar a presença divina e buscar atingir uma experiência mais plena a partir desse gosto antecipado de divindade.

196:3:10 20949 A mente humana não cria valores reais; a experiência humana não gera o discernimento universal. Quanto a esse discernimento, o reconhecimento dos valores morais e o discernimento dos significados espirituais, tudo o que a mente humana pode fazer é descobrir, reconhecer, interpretar e escolher.

196:3:11 209410 Os valores morais do universo tornam-se uma posse intelectual, pelo exercício dos três julgamentos básicos, ou escolhas, da mente mortal:

209411 1. O autojulgamento – a escolha moral.

209412 2. O julgamento social – a escolha ética.

209413 3. O julgamento de Deus – a escolha religiosa.

196:3:12 209414 Assim, parece que todo o progresso é efetuado por uma técnica conjunta de evolução revelacional.

196:3:13 209415 Se um amante divino não vivesse no homem, ele não poderia amar generosa e espiritualmente. Se um intérprete não vivesse na mente do homem, ele não poderia verdadeiramente compenetrar-se da unidade do universo. Se um bom avaliador não residisse dentro do homem, ele possivelmente não poderia apreciar os valores morais e reconhecer os significados espirituais. E esse amante provém da fonte mesma do amor infinito; aquele intérprete é uma parte da Unidade Universal; e o avaliador é filho do Centro e Fonte de todos os valores absolutos da realidade divina e eterna.

196:3:14 20951 A avaliação moral, com um significado religioso – o discernimento espiritual –, denota a escolha do indivíduo entre o bem e o mal, a verdade e o erro, o material e o espiritual, o humano e o divino, o tempo e a eternidade. A sobrevivência humana é, em uma grande medida, dependente da consagração da vontade humana à escolha daqueles valores destacados por esse selecionador-de-valores-espirituais – o intérprete e unificador residente. A experiência religiosa pessoal consiste de duas fases: a descoberta, na mente humana, e a revelação do espírito divino residente. Por meio de uma super-sofisticação ou como resultado da conduta irreligiosa de pretensos religiosos, um homem, ou mesmo uma geração de homens, pode escolher suspender os seus esforços para descobrir o Deus que reside neles; eles podem deixar de progredir e de alcançar a revelação divina. Mas tais atitudes, de não progressão espiritual, não podem perdurar por muito tempo, por causa da presença e da influência do Ajustador do Pensamento residente.

196:3:15 20952 Essa experiência profunda, com a realidade do residente divino, transcende, para sempre, a rude técnica materialista das ciências físicas. Vós não podeis colocar a alegria espiritual sob a observação de um microscópio; vós não podeis pesar o amor em uma balança; vós não podeis medir os valores morais; nem podeis vós estimar a qualidade da adoração espiritual.

196:3:16 20953 Os hebreus tinham uma religião de sublimidade moral; os gregos fizeram evoluir uma religião da beleza; Paulo e os seus confrades fundaram uma religião de fé, de esperança e de caridade. Jesus revelou e exemplificou uma religião de amor: a segurança no amor do Pai, com alegria e satisfação conseqüentes de compartilhar esse amor no serviço da fraternidade humana.

196:3:17 20954 Toda vez que o homem faz uma escolha moral de reflexão, ele experiencia imediatamente uma nova invasão divina na sua alma. A escolha moral é parte da religião, como motivo de resposta interna às condições externas. Mas essa religião real não é uma experiência puramente subjetiva. Ela significa o conjunto da subjetividade do indivíduo, empenhado em uma resposta significativa e inteligente à objetividade total – o universo e o seu Criador.

196:3:18 20955 A experiência extraordinária e transcendente de amar e de ser amado não é apenas uma ilusão psíquica, porque é tão puramente subjetiva. A única realidade verdadeiramente divina e objetiva, que é associada aos seres mortais, o Ajustador do Pensamento, funciona para a observação humana, aparentemente, como um fenômeno exclusivamente subjetivo. O contato do homem com a realidade objetiva mais elevada, Deus, dá-se apenas por intermédio da experiência puramente subjetiva de conhecê-Lo, de adorá-Lo, de realizar a filiação a Ele.

196:3:19 20956 A verdadeira adoração religiosa não é um monólogo fútil de auto-enganação. A adoração é uma comunicação pessoal com o que é divinamente real, com aquilo que é a fonte mesma da realidade. Por intermédio da adoração, o homem aspira a ser melhor e por meio dela finalmente ele alcança o melhor.

196:3:20 20957 A idealização da verdade, da beleza e da bondade, e o serviço prestado a elas, não é um substituto para a experiência religiosa genuína – a realidade espiritual. A psicologia e o idealismo não equivalem à realidade religiosa. As projeções feitas pelo intelecto humano podem de fato originar deuses falsos – deuses à imagem do homem –, mas a verdadeira consciência de Deus não tem tal origem. A consciência de Deus habita em nós, na presença do espírito residente. Muitos dos sistemas religiosos do homem vêm de formulações do intelecto humano, mas a consciência de Deus não vem necessariamente como uma parte de sistemas grotescos de escravidão religiosa.

196:3:21 20958 Deus não é uma mera invenção do idealismo do homem; ele é a fonte mesma de todos os discernimentos e valores supra-animais. Deus não é uma hipótese formulada para unificar os conceitos humanos da verdade, da beleza e da bondade; ele é a personalidade de amor, de Quem se derivam todas essas manifestações do universo. A verdade, a beleza e a bondade no mundo do homem são unificadas pela espiritualidade crescente da experiência dos mortais que ascendem às realidades do Paraíso. A unidade na verdade, na beleza e na bondade só pode ser realizada na experiência espiritual da personalidade conhecedora de Deus.

196:3:22 20961 A moralidade é o solo preexistente essencial, de consciência pessoal de Deus, é a realização pessoal da presença interna do Ajustador, mas essa moralidade não é, nem a fonte da experiência religiosa, nem o discernimento espiritual resultante. A natureza moral é supra-animal, mas é subespiritual. A moralidade é equivalente ao reconhecimento do dever, à compreensão-realização da existência do certo e do errado. A zona moral que se interpõe entre o tipo de mente animal e os tipos humanos de mente, como a moroncial, funciona entre a esfera material e a espiritual de realização da personalidade.

196:3:23 20962 A mente evolucionária é capaz de descobrir a lei, a moral e a ética; mas o espírito outorgado, o Ajustador residente, revela, à mente humana em evolução, o provedor da lei, o Pai-fonte de tudo o que é verdadeiro, belo e bom; e um homem, assim iluminado, tem uma religião e está espiritualmente equipado para começar a longa e aventurosa busca de Deus.

196:3:24 20963 A moralidade não é necessariamente espiritual; ela pode ser integral e puramente humana, se bem que a verdadeira religião acentue todos os valores morais, tornando-os mais significativos. A moralidade sem religião não consegue revelar a bondade última, e também não consegue assegurar a sobrevivência, nem dos seus próprios valores morais. A religião assegura a elevação, a glorificação, e a sobrevivência de tudo o que a moralidade reconhece e aprova.

196:3:25 20964 A religião está acima da ciência, da arte, da filosofia, da ética e da moral, mas sem ser independente delas. Elas estão, todas, indissoluvelmente inter-relacionadas na experiência humana, pessoal e social. A religião é a suprema experiência do homem, enquanto ele está na sua natureza mortal; mas a língua finita torna, para sempre, impossível à teologia retratar adequadamente a experiência religiosa verdadeira.

196:3:26 20965 O discernimento religioso possui o poder de transformar a derrota em desejos mais elevados e em novas determinações. O amor é a mais elevada motivação que o homem pode utilizar na sua ascensão no universo. Mas o amor, despojado de verdade, de beleza e de bondade, é um sentimento apenas, uma distorção filosófica, uma ilusão psíquica, um engano espiritual. O amor deve sempre ser redefinido em níveis sucessivos de progressão moroncial e de progressão espiritual.

196:3:27 20966 A arte resulta da tentativa do homem de escapar da falta de beleza no seu meio ambiente material; é um gesto na direção do nível moroncial. A ciência é o esforço do homem para resolver os enigmas aparentes do universo material. A filosofia é uma tentativa do homem de unificar a experiência humana. A religião é o gesto supremo do homem, o seu magnífico movimento, na tentativa de alcançar a realidade final, na sua determinação de encontrar Deus e de ser como Ele.

196:3:28 20967 No domínio da experiência religiosa, a possibilidade espiritual é uma realidade potencial. O impulso espiritual que o homem tem de avançar não é uma ilusão psíquica. Pode ser que nem toda a fantasia do homem sobre o universo seja um fato, mas muito nela é verdadeiro.

196:3:29 20968 A vida de alguns homens é grande e nobre demasiadamente para se abaixar ao nível de um sucesso conquistado. O animal deve adaptar-se ao meio ambiente, mas o homem religioso transcende o seu ambiente e, desse modo, escapa das limitações do mundo material presente, por meio desse discernimento de amor divino. Esse conceito de amor gera, na alma do homem, aquele esforço supra-animal para encontrar a verdade, a beleza e a bondade; e quando ele as encontra, ele é glorificado no abraço delas; ele é consumido pelo desejo de vivê-las e cumpri-las segundo a retidão.

196:3:30 20971 Não vos desencorajeis; a evolução humana ainda está em progresso, e a revelação de Deus ao mundo, em Jesus e através de Jesus, não deixará de acontecer.

196:3:31 20972 O grande desafio ao homem moderno é realizar uma comunicação melhor com o Monitor divino que reside dentro da mente humana. A maior aventura do homem na carne consiste no esforço, bem equilibrado e sadio, de ultrapassar as fronteiras da autoconsciência penetrando nos domínios imprecisos da consciência embrionária da alma, em um esforço, de todo o seu coração, para alcançar a região fronteiriça da consciência do espírito – o contato com a divina presença. Essa experiência constitui a consciência de Deus, uma experiência que confirma, de um modo poderoso, a verdade preexistente da experiência religiosa de conhecer a Deus. Uma consciência tal, do espírito, é equivalente ao conhecimento da factualidade da filiação a Deus. De qualquer outro modo, a certeza da filiação é uma experiência de fé.

196:3:32 20973 E a consciência de Deus é equivalente à integração do eu com o universo, nos seus níveis mais elevados de realidade espiritual. Apenas o conteúdo espiritual, de qualquer valor, é imperecível. Aquilo que é mesmo verdadeiro, belo e bom não pode perecer, pois, na experiência humana. Se o homem escolher a não-sobrevivência, então o Ajustador sobrevivente conservará, consigo, aquelas realidades nascidas do amor e nutridas pelo serviço. E todas essas coisas são uma parte do Pai Universal. O Pai é amor vivo, e essa vida do Pai está nos seus Filhos. E o espírito do Pai está nos filhos dos seus Filhos – os homens mortais. Quando tudo estiver dito e feito, a idéia de um Pai será ainda o conceito humano mais elevado de Deus.

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