segunda-feira, 23 de agosto de 2010

GOVERNO MUNDIAL I

O Clube do governo mundial na sombra decide, numa reunião anual secreta, como devem ser realizados seus projetos diabólicos. Quando se celebram essas reuniões, não por acaso seguem-se guerras, a fome, a pobreza, a derrubada de governos e abruptas e surpreendentes mudanças políticas, sociais e monetárias.
Skinner – Burrhus Frederic Skinner -, cientista do comportamento e do aprendizado, colaborador do Instituto Tavistock – organização de pesquisa no campo da psicologia social aplicada – que, por sua vez, é colaboradora do Clube Bilderberg, considera a população em geral incompetente para educar seus filhos e propõe como sociedade ideal aquela em que os filhos são separados das famílias por ocasião do nascimento e educados pelo Estado, que paga aos pais por seus filhos uma determinada quantia, em centros onde passam a viver.
Outra forma de manipulação de conduta utilizada pelo Clube Bilderberg é conseguir que as pessoas obtenham algo que desejam em troca da renúncia de outra coisa, principalmente a liberdade.
Se bem que o Clube Bilderberg, a Comissão Trilateral, a Mesa-Redonda, o Conselho de Relações Internacionais(CFR), as Nações Unidas, o Fundo Monetário Internacional, o Clube de Roma e algumas outras organizações realizem seus planejamentos e suas gestões em particular; a imprensa, as rádios e as cadeias de TV se negam a cobrir o tema e não se atrevem a falar dele. Isso mantém a maioria da população num estado contínuo de ansiedade interior porque as pessoas estão demasiado ocupadas garantindo sua própria sobrevivência ou lutando por ela.
A técnica do Clube Bilderberg consiste em submeter a população e levar a sociedade a uma forte situação de insegurança, angústia e terror, de maneira que as pessoas cheguem a sentir-se tão exaltadas que peçam, aos gritos, uma solução, qualquer que seja. Essa técnica tem sido aplicada às gangues de rua, às crises financeiras, às drogas e ao actual sistema educacional e prisional.
Com relação ao sistema educacional é necessário dar a conhecer que os estudos realizados pelo Clube Bilderberg demonstram que conseguiram diminuir o coeficiente intelectual médio da população. Para conseguir isso não só manipulam as escolas e as empresas, mas também têm se apoiado na arma mais letal que possuem: a televisão e seus programas de baixo nível, para afastar a população de situações estimulantes e conseguir assim entorpecê-la.
O objetivo final desse pesadelo – ou dessa "confusão dos diabos"... - é um futuro que transformará a Terra num planeta-prisão por meio de um Mercado Globalizado Único – que tornou o mundo plano -, vigiado por um Exército Mundial Único, regulado economicamente por um Banco Mundial e habitado por uma população controlada por microchips cujas necessidades vitais terão sido reduzidas ao materialismo e à sobrevivência: trabalhar, comprar, procriar, dormir, tudo conectado a um computador global que supervisionará cada um de nossos movimentos.
Os membros do Bilderberg "possuem" os bancos centrais e, portanto, estão em condições de determinar os tipos de interesses, a disponibilidade de dinheiro, o preço do ouro e quais os países que devem receber quais empréstimos. Ao movimentar divisas, os membros do Bilderberg ganham milhares de dólares.
Desde 1954, os sócios do Bilderberg representam a elite das nações ocidentais - financistas, industriais, banqueiros, políticos, líderes de corporações multinacionais, presidentes, primeiros-ministros, ministros das Finanças, secretários de Estado, representantes do Banco Mundial, OMC, FMI, executivos dos meios de comunicação e lideranças militares -, um governo nas sombras que se reúne em segredo para debater e conseguir um consenso sobre a estratégia global. Todos os presidentes dos EUA, desde Eisenhower, pertenceram ao Clube. Também Tony Blair, assim como Lionel Jospin, Romano Prodi, ex-presidente da Comissão Européia, Mario Monti, comissário europeu para a Concorrência, Pascal Lamy, comissário do Comércio, José Manuel Durão Barroso, atual presidente da Comissão Européia, Alan Greenspan, chefe do FED (o Banco Central dos EUA), Hillary Clinton, John Kerry, a ministra de Assuntos Internacionais da Suécia, assassinada, Anna Lindh, Melinda e Bill Gates, Henry Kissinger, a dinastia Rothschild, Jean-Claude Trichet, cabeça visível do Banco Central Europeu, James Wolfenson, presidente do Banco Mundial, Javier Solana, ex-Secretário Geral do Conselho da Comunidade Européia, o financista George Soros, um especulador capaz de derrubar moedas nacionais em proveito próprio, e todas as famílias reais da Europa. Juntamente com eles sentam-se os grandes proprietários dos meios de comunicação, pessoas que controlam tudo o que se lê e assiste.
Em 2004, no Grande Hotel des Iles Borromées, em Stresa, Itália, em mais um Encontro, celebrou-se o 50º aniversário do Grupo, que foi constituído entre os dias 29 e 31 de maio de 1954 no hotel Bilderberg (daí o nome de Grupo Bilderberg), na localidade holandesa de Oosterbeckl em um evento organizado pelo príncipe Bernard, da Holanda.
Vivemos hoje num mundo em que o acesso à informação é quase instantâneo e a sua
quantidade em circulação nunca foi tão grande como agora. Vivemos num mundo em
que o que acontece do outro lado do globo entra imediatamente nas nossas casas e
influencia as nossas vidas. Vivemos num mundo em constante mutação política,
económica, cultural, cientifica, desportiva e social, com diversos fenómenos até aqui
desconhecidos. Vivemos num mundo de novos actores, com papéis diversos. Vivemos
num mundo em que o espaço e o tempo são cada vez menores.
Vivemos nesta imensa “Aldeia Global”, em que os exemplos mais marcantes são os
recentes acontecimentos trágicos do 11 de Setembro de 2001 em Nova Iorque e
Washington, o tsunami no Sudeste Asiático e porque não referir também o efeito
mediático, nos quatro cantos do mundo, da publicação das caricaturas do profeta
Maomé num jornal dinamarquês1. As novas tecnologias passaram a influenciar a vida
de todos nós. Estamos em permanente actualização e a par dos últimos acontecimentos.
O objectivo deste trabalho passa por fazer uma breve análise deste fenómeno a que se
chama Globalização e as suas consequências na forma como os Estados actuam
politicamente e na mudança de participação política dos cidadãos nesta Nova Ordem
Internacional caracterizada pelo aumento da interdependência, multilateralismo e
partilha de soberania. Numa primeira fase iremos abordar a definição e as diferentes
vertentes do fenómeno Globalização, numa segunda etapa questionámos, a emergência
de um governo mundial, dadas as novas formas de participação dos cidadãos e o surgir
de uma cidadania global.
1 A polémica surgiu no mundo islâmico após a publicação de caricaturas do profeta Maomé no jornal
dinamarquês «Jyllands-Posten» e estão, ainda, a provocar uma onda de reacções de hostilidade às
embaixadas da Dinamarca em países árabes, assim como aos seus produtos e cidadãos. Ao mesmo tempo
que em vários jornais ocidentais é abordado o tema e republicadas as caricaturas em defesa da liberdade
de expressão, tendo sido criado um blog com todos os cartoons (http://www.face-ofmuhammed.
blogspot.com ). Um exemplo do poder e efeito dos media nos cidadãos de todo o mundo
(islâmico).
Globalização – rumo a um governo mundial ou uma nova forma de cidadania?
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1. GLOBALIZAÇÃO: AS DEFINIÇÕES POSSÍVEIS
A globalização como fenómeno à escala mundial teve na sua génese dois
acontecimentos fundamentais: o aparecimento e a rápida expansão das novas
tecnologias de informação e, na esfera política, a queda do muro de Berlim, que
acabando com a Guerra Fria e o mundo bipolar (dominado pelos EUA e URSS),
transformou o mundo num espaço único, sem fronteiras físicas, em que o capitalismo se
espalhou comandado pelas empresas multinacionais.
De facto, este fenómeno atravessa a sociedade em todas as suas vertentes (económica,
política, cultural, social, entre outras) dificultando a sua definição. Se recorrermos ao
meio de informação global por excelência que é a Internet, obtemos a seguinte
definição: “Many see it as a primarily economic phenomenon, involving the increasing
interaction, or integration, of national economic systems through the growth in
international trade, investment and capital flows. However, one can also point to a rapid
increase in cross-border social, cultural and technological exchange as part of the
phenomenon of globalisation. The sociologist, Anthony Giddens, defines globalisation
as a decoupling of space and time, emphasising that with instantaneous
communications, knowledge and culture can be shared around the world
simultaneously.” (Globalization Guide.org)
Já os professores de Harvard, Keohane e Nye, preferem o termo “globalism” a
globalização: “When people speak colloquially about globalization, they typically refer
to recent increases in globalism. Comments such as "globalization is fundamentally
new," only make sense in this context; but are nevertheless misleading. We prefer to
speak of globalism as a phenomenon with ancient roots, and of globalization as the
process of increasing globalism, now or in the past.” (Keohane e Nye, 2006: 5) “...we
define globalism as a state of the world involving networks of interdependence at multicontinental
distances. These networks can be linked through flows and influences of
capital and goods, information and ideas, people and force, as well as environmentally
and biologically relevant substances (such as acid rain or pathogens). Globalization and
deglobalization refer to the increase or decline of globalism.” (idem, 2006: 1)
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Entre nós, o Dicionário de Relações Internacionais esclarece que a globalização tem
origem anglo-saxónica e está associada ao rápido desenvolvimento das diversas relações
a nível mundial (económicas, sociais, culturais e políticas) desde o desmoronamento do
bloco soviético. Deste modo “a globalização constitui, uma nova etapa na evolução do
capitalismo industrial, sucedendo à internacionalização das firmas e capitais. (...)
Segundo a OCDE, a mundialização desenvolveu-se em várias fases, a última das quais,
a da globalização (anos 1980), corresponde à instalação de verdadeiras redes
planetárias, graças aos progressos da tecnologia e dos serviços. Os Estados tornaram-se
cada vez mais interdependentes, prisioneiros do «sistema-mundo». Falar de
globalização é evocar a dominação do sistema capitalista sobre o espaço mundial. (...)
Um aspecto crucial no estudo da globalização é a emergência de um sistema mundialou
seja, há razões para se olhar o mundo como uma única ordem social.” (Sousa, 2005:
91)
O Professor Boaventura de Sousa Santos2 defende que há duas formas de globalização,
“a globalização neoliberal e aquilo a que eu chamo de globalização contra-hegemónica,
que desde há algum tempo se vem opondo à primeira. Designo por globalização contrahegemónica
o conjunto vasto de redes, iniciativas, organizações e movimentos que
lutam contra as consequências económicas, sociais e políticas da globalização
hegemónica. (...) A globalização contra-hegemónica centra-se nas lutas contra a
exclusão social.” (Santos, 2005: 1)
Quer se fale em globalização, mundialização ou internacionalização, em todas as
definições as características comuns são: a cada vez maior interdependência das
economias com o domínio do capitalismo, a redução das distâncias quer em espaço,
como em tempo em consequência do rápido desenvolvimento das novas tecnologias de
informação e comunicação, o aparecimento de novos actores na cena internacional que
traduzem uma nova forma de participação cívica dos cidadãos nas questões diárias
2 O Professor Boaventura de Sousa Santos é Professor Catedrático de Sociologia na Faculdade de
Economia da Universidade de Coimbra, sendo também Director do Centro de Estudos Sociais da mesma
universidade. Tem trabalhos publicados, em diversas línguas, sobre globalização, sociologia,
epistemologia, democracia e direitos humanos. Tem sido uma voz sempre activa e participativa no Fórum
Social Mundial na luta, entre outras, contra as desigualdades sociais. O Fórum Social Mundial é um
contraponto ao Fórum Económico Mundial de líderes empresariais e ministros das Finanças que se
encontram anualmente em Davos na Suíça.
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mundiais. A todos é unânime a ideia que o mundo, que é único, está a ficar cada vez
mais pequeno.
A globalização, como fenómeno pós Guerra Fria, está intimamente ligada ao poder
político-económico alcançado pelos EUA. A capacidade de concretizar políticas
económicas diferentes e autónomas num determinado país ficou seriamente
comprometida com a hegemonia norte-americana na segunda metade do século XX. O
mundo unipolar trouxe consigo o desaparecimento da vertente territorial da soberania
dos estados e de forma mais subtil a adulteração cultural dos povos pela massificação
dos estereótipos sociais do primeiro mundo a todo o planeta, imposta pelos mass media
e pela forte pressão da sociedade de consumo.
Os acordos comerciais assinados a nível global trouxeram novas realidades a nível
social, como a procura de mão de obra qualificada de países do leste europeu, dando
origem a maior circulação de pessoas com surtos de emigração massiva para certos
países da União Europeia e da América do Norte.
Estes movimentos populacionais e esta convivência pacífica entre os povos foi abalada
pelos acontecimentos trágicos do 11 de Setembro de 2001. Emergiu uma menor
tolerância entre povos de culturas diferentes dando origem a um certo choque
civilizacional3. O mundo ficou, então dividido entre o eixo do mal (apelidados pelo
presidente George W. Bush os países que apoiam grupos terroristas) e um eixo do bem
que sob a égide de uma super-potência decidiu actuar à margem das organizações
internacionais a quem cabe zelar pela defesa dos direitos humanos e pela ordem jurídica
internacional, nomeadamente a Organização das Nações Unidas (ONU) e o Tribunal
Penal Internacional (TPI).
É neste contexto que surgem os movimentos políticos e sociais anti-globalização
capitalista liberal. Como, por exemplo, o Fórum Social Mundial que é “o conjunto de
iniciativas de troca transnacional entre movimentos sociais e ONGs onde se articulam
lutas sociais de âmbito local, nacional ou global travadas (de acordo com a Carta de
3 Samuel P. Huntington é autor do famoso livro O Choque das Civilizações e a Mudança na Ordem
Mundial, publicado primeiramente em forma de artigo em 1993 na revista Foreign Affairs e mais tarde
sob forma de livro, publicado em 1999 pela Gradiva, no qual expõe a teoria do choque de civilizações,
afirmando que no futuro os confrontos seriam entre civilizações, nomeadamente o Islão e o Ocidente.
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Princípios de Porto Alegre) contra todas as formas de opressão geradas ou agravadas
pela globalização neoliberal.” (Santos, 2005: 17)
2. AS DIFERENTES VERTENTES DA GLOBALIZAÇÃO
2.1. GLOBALIZAÇÃO ECONÓMICA
A Globalização aparece quase sempre, e em primeiro lugar, associada a questões
económicas e ao sistema económico dominante - o sistema de mercado capitalista, mas
a globalização, como iremos apresentar de seguida, tem variados contextos.
Desde a última metade do século XX que se assiste a uma supremacia do poder
económico sob o poder político. A globalização “avançou rapidamente com a
internacionalização das produções, dos bens, dos mercados, dos capitais, o movimento
de desregulamentação desencadeado nos EUA e no Reino Unido, as privatizações, a
intervenção das empresas multinacionais e a multiplicação das trocas internacionais. A
corrida às exportações e o apelo aos investimentos estrangeiros como factores de
crescimento, originaram uma espécie de ultraliberalismo doutrinário.” (Gonçalves,
2003: 608)
Com o final da Segunda Guerra Mundial, o comércio mundial estava em baixa e então
“foram criadas as instituições de Bretton Woods – o Fundo Monetário Internacional e o
Banco Mundial – para tornar possível o comércio internacional num mundo desprovido
de movimentos internacionais de capital.” (Soros, 2004, 84)
Mas afinal quando começou a actual fase do capitalismo? George Soros propõe duas
hipóteses: terá sido quando Margaret Thatcher, no Reino Unido, e Ronald Reagan nos
EUA subiram ao poder na década de 80 com programas destinados a retirar o Estado da
economia e permitir que os mecanismos de mercado fizessem o seu trabalho com a
decadência das teorias keynesianas na economia ou terá culminado com o colapso do
império soviético em 1989? Soros defende 1980, porque “a globalização foi uma
realização dos fundamentalistas de mercado”. E como afirma, “o objectivo da
administração Reagan e do governo Thatcher era reduzir a capacidade do Estado para
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interferir na economia, e a globalização ajustava-se bem aos seus objectivos.” (Soros,
2004, 87). Para além disso os dois países detinham “a vantagem conferida pelo facto de
os principais centros financeiros do mundo se localizarem em Nova Iorque e Londres”
(idem)
Como refere Wolton (2004), a globalização é caracterizada por três pilares, sendo que o
primeiro é o pilar político, com a ONU e as Declarações dos Direitos do Homem após a
Segunda Guerra Mundial; o segundo pilar é caracterizado pela globalização económica
que “foi apresentada sobretudo no Norte, como um «ideal» ao mesmo nível da ONU”
(Wolton, 2004, 74), mas que necessita de uma regulação, apesar de, para este autor, a
globalização económica “continuar a ser uma forte realidade” (idem). De referir ainda,
que o terceiro pilar “diz respeito à emergência da cultura e da comunicação como
questão política mundial” (idem), uma vez que a globalização económica desvaloriza a
questão da diversidade cultural, enaltecida nos Direitos do Homem e tão em voga nos
dias de hoje.
Na esfera económica, este processo, acelerado após a Segunda Guerra Mundial, tem
sido pautado “por uma forte expansão dos fluxos de comércio internacional e de
capitais.” (DGEP, 2005). Os factores que mais contribuíram para este crescimento
foram, segundo a mesma fonte, “o progresso tecnológico, a diminuição das restrições
quantitativas e de tarifas aduaneiras no comércio global e a crescente liberalização do
movimento de capitais.”
Devemos ter em conta que o aumento do peso das exportações da China, Polónia,
República Checa e Hungria nas exportações mundiais se relaciona com a sua crescente
integração na economia mundial e com a cada vez maior abertura ao exterior de alguns
países do leste da Europa, fruto da desintegração do bloco soviético resultante do fim da
Guerra Fria.
Portugal é dos países da UE que mais sofrem com a globalização e a deslocalização de
empresas para a República Checa, Hungria e Eslováquia. De acordo com o European
Restructuring Monitor, entidade que monitoriza todas as mudanças registadas em
empresas que criem ou destruam empregos, as transferências de unidades de produção
para o estrangeiro anunciadas desde o início de 2002 provocaram ou irão provocar em
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Portugal a perda de um número de postos de trabalho equivalente a 0,11% do total da
população empregada, sendo que este valor é o terceiro mais alto entre todos os
membros da UE, ultrapassado apenas na Finlândia e Eslováquia.
O sector em que o emprego foi mais afectado em Portugal foi o automóvel, com dois
terços de novos desempregados. Uma das causas deste fenómeno é a saída para outros
países de empresas que desenvolviam a sua actividade em torno da Autoeuropa e que,
como se sabe, tem nos últimos anos vindo a diminuir progressivamente a sua produção.
O sector dos têxteis e calçado aparece com uma importância bastante mais reduzida nas
deslocalizações detectadas, embora os responsáveis por este estudo admitam a
existência de casos classificados como fecho da empresa, mas que na realidade são
deslocalizações ainda por confirmar.
Os têxteis, vestuário e calçado e o sector automóvel representam cerca de 45% das
exportações portuguesas, o que aumenta a gravidade deste fenómeno que tem vindo a
acentuar-se nos últimos anos.
A fragilidade de Portugal face ao fenómeno da globalização tem tido como prova mais
clara a dificuldade de a economia acompanhar a retoma já iniciada por outros países
europeus. Uma das formas de modificar este cenário passa por aproveitar a própria
globalização como solução para o desenvolvimento.
Globalização foi a palavra de ordem na 4ª Conferência de Economia e Gestão sobre o
tema «Debater Davos em Lisboa» em que o exemplo de expansão e crescimento em
cenário de globalização foi dado pelo administrador da Jerónimo Martins, José Soares
dos Santos, que afirmou “Portugal tem de perder o complexo da periferia e aceitar o
sentimento de globalização, da não existência de fronteiras”.
Segundo o administrador, “não é preciso ser-se gigante para construir multinacionais e a
Jerónimo Martins não é excepção”, numa alusão ao plano de expansão do grupo a
países do leste europeu, nomeadamente a Polónia. Esta ligação ao exterior como forma
de atrair novas oportunidades, é uma das características do grupo Jerónimo Martins que
“exporta para a Europa inteira com preços competitivos e com salários menores que os
dos restantes países”. (Agencia Financeira, 2006)
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E um dos factores apontado por vários economistas para que muitas empresas estejam a
deixar o território luso tem a ver com a elevada carga fiscal praticada em Portugal.
Como defende Soros (2004), a característica do actual sistema capitalista mundial
centra-se na livre circulação do capital financeiro e sendo este um factor central na
produção, os países têm de concorrer entre si para o atrair, reduzindo a sua capacidade
de o tributarem e regulamentarem, como forma de “segurar” o capital no seu território.
Este autor afirma que, “o capital é atraído para os maiores centros de actividade
financeira e distribuído a partir deles” (Soros, 2004, 83). Apesar de as grandes
multinacionais deterem um grande poder negocial com os governos anfitriões e através
disso determinarem os custos de transferência e futuros investimentos, estas estão
sempre disponíveis a rumarem a países que lhes proporcionem facilidades de
desenvolverem a sua actividade.
Mas quando se fala de globalização económica devemos ter em conta que esta teve
também o seu mérito e produziu os seus benefícios positivos como seja “um
nivelamento ou equiparação parcial das relações Norte-Sul e a melhoria dos padrões de
vida de várias centenas de milhão de pessoas na Ásia, o que significou salvar vários
milhões da pobreza.” (Falk, 2001, 219), estando a proporção global de pobres a
diminuir nos últimos anos.
2.2. GLOBALIZAÇÃO POLÍTICA
Ora, como afirma Mendo Castro Henriques, à medida que cresce a globalização
económica entre os Estados, aumenta também a necessidade de compensar os efeitos
negativos do globalismo. “A globalização tem, pois, que ser governada” (Henriques,
1998, 8) e é neste contexto que se pode referir uma das formas que os estados têm de
enfrentar as dificuldades deste sistema capitalista global - através da união de interesses
regional. E é assim que o primeiro bloco económico regional aparece na Europa, com a
criação em 1957 da Comunidade Económica Europeia (embrião da actual UE). “O
regionalismo contribuiu para que a Europa agregasse capital e mantivesse a paridade
tecnológica com os Estados Unidos e o Japão, permitindo-lhe evitar a perspectiva de
marginalização moderada em relação ao mercado globalizado.” (Falk, 2001, 130)
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Actualmente, os blocos mais importantes nesta área são: a UE, a NAFTA (North
American Free Trade Agreement), o MERCOSUL (Mercado Comum do Sul), a APEC
(Asia- Pacific Economic Cooperation) e a ALCA (Área de Livre Comércio das
Américas). No plano mundial, as relações comerciais são reguladas pela Organização
Mundial do Comércio – OMC, que substituiu o GATT (Acordo Geral de Tarifas e
Comércio).
Segundo Daniel Bell, “o Estado-nação está a tornar-se pequeno demais para os grandes
problemas e grande demais para os pequenos problemas”. E como “nenhum Estado
consegue resolver isoladamente os problemas globais: a degradação ambiental; a
vulnerabilidade dos mercados internacionalizados; as ameaças à segurança colectiva; a
violação dos direitos humanos...” (Henriques, 1998, 9) torna-se urgente encontrar
formas de solucionar os novos desafios colocados pela crescente interdependência dos
Estados. Como?
À medida que o mundo se globaliza e crescem as interdependências, o Estado revela-se
“demasiado pequeno” para assegurar eficazmente funções que o transcendem no espaço
e no tempo. “Quando o Estado é grande demais para exercer directamente todas as
tarefas que lhe incubem, a resposta chama-se localização e proximidade ao cidadão”
(idem), devolvendo poderes aos cidadãos, ás regiões, aos municípios, aos privados. Só
desta forma o Estado manterá, o que Mendo Castro Henriques chama, “os princípios de
bom governo”, isto é, as reformas na administração pública, a educação, a saúde e
segurança social, a defesa dos direitos de propriedade.
Mas as insuficiências do Estado verificadas em áreas como: a segurança colectiva, a
economia, os direitos humanos e o ambiente, entre outros, tornam inevitáveis a partilha
da governação à escala internacional (Henriques, 2004). Para isso, existem organizações
como as Nações Unidas (ONU), a Organização Mundial de Comércio (OMC), a UE, o
Conselho da Europa, o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial, a
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), entre muitos
outros novos actores político-económicos regionais e globais, que nos fazem acreditar
que “há razões para se olhar o mundo como uma única ordem social.” (Sousa, 2005, 91)
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Com o fim da Guerra Fria e a emergência da globalização surgiram três tendências
principais no poder global: “dos países ocidentais para os orientais; de uma ordem
organizada em torno dos direitos dos Estados para uma ordem que abrange a protecção
dos indivíduos de ameaças globais como o genocídio, o terrorismo e o efeito de estufa;
(...) e de um sistema cada vez mais definido pela integração regional.” (Leonard, 2005,
136)
Os efeitos da globalização estão a mudar o centro de gravidade do norte para o sul e do
ocidente para oriente, permitindo que dessa forma a China, a Índia e a Rússia apareçam
na cena internacional como as grandes potências no novo século, deixando assim que
“90% da população mundial seja governada por sistema concebido para servir os
interesses da Europa e da América.”(idem, 137)
Não podemos esquecer que economia, política, meios militares, cultura estão
intimamente ligados e que uns sem os outros não funcionam e à medida que os “novos
tigres do Sul e do Oriente” se desenvolvem, todas as instituições criadas sob a égide
americana – FMI, NATO, Conselho de Segurança das Nações Unidas – terão de se abrir
se não quiserem perder a sua legitimidade neste mundo cada vez mais multipolar e
interdependente (Leonard, 2005)
2.3. GLOBALIZAÇÃO CULTURAL
Globalização tornou-se um termo bastante comum a partir da década de 90, geralmente
associado às grandes mudanças ocorridas no sistema económico internacional,
resultantes do aprofundamento das relações de interdependência entre os diversos
actores internacionais, quer estes sejam Estados, organizações internacionais, ou grupos
de cidadãos. Embora o impacto económico tenha sido o mais evidente, como se disse
anteriormente, os efeitos da globalização estendem-se a todos os sectores da sociedade,
incluindo a cultura. E mais veloz que a globalização económica, pensámos que é a
globalização cultural.
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E quando se fala de cultura, pensa-se imediatamente em americanização, isto é, em tudo
que se relacione com a cultura e identidade norte-americanas. É o efeito dos mass
media, dos filmes de Hollywood, das campanhas publicitárias, das multinacionais
americanas e das suas marcas: Levis, Coca-cola, McDonalds, Microsoft, CNN. E
porque não referir também a própria língua – o Inglês, considerada a língua universal.
Nas palavras do Professor Villaverde Cabral, “trata-se de um veículo de dominação
cognitiva ao qual é obrigado a submeter-se quem, oriundo de outro universo linguístico,
pretenda fazer carreira...” (Cabral, 2004, 2)
Mas será que globalização ao nível cultural se refere a tudo o que é norte-americano?
Dominique Wolton pensa que não. Para este escritor francês, “já nenhuma potência
pode almejar o domínio cultural. Os Estados Unidos são a primeira potência económica
e militar, mas não a primeira potência cultural.” (Wolton, 2004, 74) Isto sucede, porque
como refere “quanto mais os cidadãos do mundo estiverem expostos a um número
crescente de informações, mais reagirão e se expressarão”(idem) e assim reafirmarão a
sua identidade.
Uma língua, mesmo que falada por um número reduzido de pessoas, contém uma parte
do património da humanidade, uma visão da sociedade, uma identidade que tem de
coabitar com outras identidades e ser preservada. É esta coabitação cultural que é
necessária promover e que Wolton designa por «a outra globalização». É neste sentido
que esta «outra globalização» se torna uma nova questão política mundial, é o terceiro
pilar. Um desafio a pensar.
Contrariando a posição dos movimentos anti-globalização, comungamos da opinião de
Wolton no que se refere às vantagens da globalização neste domínio. Quanto mais
globalização houver, mais indispensáveis são as ciências sociais e humanas e maior
diversidade cultural existirá.
Foi neste sentido que os países membros da Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO, reunidos em 20 de Outubro de 2005 em
Conferência Geral, adoptaram uma Convenção sobre a Protecção e a Promoção da
Diversidade Cultural. Esta Convenção procurou autonomizar o sector cultural nas suas
diferentes expressões face às regras aprovadas para o comércio internacional e definidas
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pela OMC. A Convenção garante às autoridades nacionais “o direito soberano de
adoptar medidas e políticas para proteger e promover a diversidade das expressões
culturais no seu território”.4
Esta posição por parte da UNESCO surge num contexto de consciência crescente sobre
os problemas da globalização e as suas repercussões na área cultural. Com efeito, este
sector viu as suas fronteiras alargarem-se exponencialmente, passando a abranger a
gastronomia, o turismo, a literatura, o cinema, a música, entre muitos outros,
envolvendo um cada vez maior número de profissionais e especialidades, sendo motor
de criação de riqueza e tendo um peso cada vez maior nos PIB nacionais.
Como advertiu Wolton “com a coabitação cultural, estamos face à história”, pois esta
“condensa todas as mutações políticas que aconteceram desde os anos 50. Pressupõe o
fim do conflito Leste-Oeste e uma capacidade de resolução das desigualdades Norte-
Sul”. (Wolton, 2004, 77)
Ao encontro da posição de Dominique Wolton, está também a de Mark Leonard, inglês
e autor de Século XXI – A Europa em Mudança (2005), obra que merece a atenção de
todos quantos se interessam pelo futuro da Europa. Este autor afirma de forma bastante
clara, que o século XXI será protagonizado pela Europa e já não pelos EUA. Chegou o
fim da ordem mundial americana. “A América não se retirou do mundo – a sua
economia e a sua segurança é muito dependente dos acontecimentos globais – mas
tentou ver-se livre da ordem mundial que ela própria criou.” (Leonard, 2005, 136)
Esta posição, tal como a de Wolton e de muitos outros, vem na sequência da análise
muito crítica do desempenho da administração Bush em matéria de política externa.
Segundo estas críticas ferozes, “Washington iniciou uma fogueira destinada a queimar
acordos internacionais, pondo em perigo Quioto, o Tribunal Penal Internacional e os
tratados ABM e sobre Armas Biológicas.” (idem) Esta posição de superpotência,
prejudicou a posição dos Estados Unidos no mundo e enfraqueceu o seu poder. Poder
entendido não só como político–económico, mas também poder cultural.
4 Convenção sobre a Protecção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, 2005:
http://unesdoc.unesco.org/images/0014/001429/142919e.pdf
Globalização – rumo a um governo mundial ou uma nova forma de cidadania?
Ana Cristina Ferreira - Maio 2006 16
Não podemos pensar que perpetuamos a nossa identidade cultural se colocarmos
barreiras contra as influências estrangeiras. Bem pelo contrário. “Não se pode ser
diferente sozinho. É a livre circulação das obras e dos talentos que permite a
perpetuação das culturas pelo acto da renovação.” (Revel, 2002, 134)
“A globalização não uniformiza, diversifica. A reclusão esgota a inspiração.” (idem,
135)
3. RUMO A UM GOVERNO MUNDIAL?
Observámos, anteriormente, que à medida que o mundo se globaliza e crescem as
interdependências, o Estado mostra-se “demasiado pequeno” para assegurar todas as
suas funções, dada a velocidade a que os acontecimentos se realizam. Daí a necessidade
de o Estado delegar funções quer aos próprios cidadãos, quer ao poder local ou regional,
quer ainda a organizações não-governamentais que podem aproximar os cidadãos ao
poder político. (Henriques, 2004)
A definição clássica de cidadania, identificada com a aquisição de nacionalidade,
evoluiu para um conceito mais abrangente, por forma a reflectir as novas pertenças
deste mundo globalizado que não apenas a questão da nacionalidade. As transformações
da cidadania global resultam “do desenvolvimento da democracia.” No século XXI os
direitos dos cidadãos não se ficam apenas na sua vertente política e cívica, mas “vieram
juntar-se os direitos da natureza social, económica e cultural e os direitos das gerações
futuras ao ambiente, à paz e ao desenvolvimento sustentável.” (idem, pp.6)
Esta evolução resulta do facto de o “Estado somos nós, a comunidade de cidadãos”.
Apesar de o Estado continuar a ser o agente central da governação, não é o único, não
está sozinho nessa caminhada. As migrações, a crescente diversidade étnica e cultural, a
participação do Estado em organismos supranacionais, o comércio internacional, as
novas tecnologias de informação colocam novos desafios ao poder político. (Cardoso,
s.d.)
Desde logo, porque a par das cidadanias nacionais emergem novas formas de identidade
e participação que não se restringem ao território dos Estados, mas são muito mais
Globalização – rumo a um governo mundial ou uma nova forma de cidadania?
Ana Cristina Ferreira - Maio 2006 17
amplas e com localização em diversos espaços. Daí o surgir, para além da cidadania
nacional, uma cidadania global. (idem)
“A perspectiva de democracia global continua a ser o objectivo geral primordial de
todos aqueles que se encontram empenhados em construir uma governação humanista
para todos os povos do planeta.” O exemplo mais próximo no caminho desta
democracia global foi dado pela Europa, sendo neste momento “um palco de ensaio
para o alargamento de formas democráticas ao nível regional”. (Falk, 2001, 300) Prova
disso, é a entrada de mais 10 novos Estados-membros vindos do Leste e a maioria deles
pertencentes ao espaço da antiga URSS.
O objectivo da democracia global está a tomar várias formas, desde o activismo
participativo de grupos de cidadãos transnacionais de todo o mundo até conferências
globais sob os auspícios da ONU que serviram de palcos de divergência e de
cooperação a nível das relações entre povos e governos. As propostas para a criação de
uma Assembleia Popular Global no âmbito do sistema das Nações Unidas constituem
um elemento da tentativa por parte das forças democráticas transnacionais de
maximizarem o seu papel na estrutura global de autoridade. (Falk, 2001)
Os Estados entendidos, no modelo vestefaliano de 1648, como os únicos detentores de
autoridade interna de governo e em que nas relações de política internacional não existe
um poder acima do Estado (Sousa, 2005, 202), têm necessariamente de repensar este
modelo que dura há mais de 350 anos por força do processo de globalização. Será muito
“difícil sustentar que se possa compreender a distribuição e o exercício do poder
internacional contemporâneo com recurso a este modelo desenvolvido no século
XVII...”(Cravinho, 2002, 292)
Defendemos, pois, a participação e a inclusão dos cidadãos nos processos de decisão
das grandes questões mundiais que nos afectam a todos nós. E a pergunta que se coloca
é saber se os principais decisores políticos mundiais partilham desta visão e se terão
vontade e capacidade para pôr em curso novas formas de governação que não passem
apenas pelos modelos tradicionais competitivos inter-estaduais, que como vimos estão
saturados dadas as novas preocupações mundiais: terrorismo, aquecimento global,
distribuição da riqueza,... (Fernandes, 2004)
Globalização – rumo a um governo mundial ou uma nova forma de cidadania?
Ana Cristina Ferreira - Maio 2006 18
“O futuro permanece aberto a um amplo espectro de possibilidades, incluindo as
directamente relacionadas com a governação humanista global. A história internacional
recente, associada ao final pacífico da Guerra Fria e a luta bem sucedida contra o
colonialismo, confirmou que os desfechos positivos ou desejáveis ocorrem mesmo
quando a maioria dos instrumentos de análise nos fazem crer que esses resultados são
praticamente impossíveis.” (Falk, 2001, 302) Neste sentido, os milagres políticos e
sociais de facto acontecem, não por nos resignarmos a esperá-los, mas sim em
consequência de um compromisso, de um empenho e de uma luta dedicada à
concretização desses objectivos.
CONCLUSÕES
Vivemos hoje uma nova realidade. Cada vez mais o mundo “é um só mundo”5, sendo
que os acontecimentos do outro lado do globo não nos devem nem podem deixar
indiferentes. Tudo está interrelacionado e interdependente na era da globalização.
Muito mais haveria a dizer e a esclarecer sobre este tema tão vasto e atraente que é a
globalização. Desde logo, o primeiro desafio com que nos deparámos foi com a
multiplicidade de perspectivas acerca de uma definição mais clara sobre este tema. Fica
a certeza que em globalização a política não pode estar dissociada da economia, nem da
cultura, muito menos dos aspectos sociais. Por outro lado, a perspectiva do surgimento
de um governo à escala mundial é também bastante aliciante, colocando-nos novos
desafios de relacionamento com outros povos e culturas.
Como em tudo na vida há sempre o lado bom e o lado mau, na globalização sucede o
mesmo e como cidadãos do mundo é nosso dever diminuir os efeitos negativos e
perpetuar e alargar o lado positivo desta sã convivência a todos os povos. A esperança
numa equitativa distribuição da riqueza, na diminuição das diferenças entre o Norte e o
Sul, no fim do terrorismo, no encontrar de formas para controlar o aquecimento do
5 Peter Singer, australiano, é professor de Bioética na Universidade de Princeton. É conhecido pelo seu
pensamento original e corajoso sobre matérias que vão desde o tratamento dos animais à manipulação
genética. Em “Um Só Mundo – a ética da globalização”, Singer desafia-nos a considerar o possível
significado de uma ética global no mundo actual.
Globalização – rumo a um governo mundial ou uma nova forma de cidadania?
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planeta,... faz com que continuemos a lutar e a acreditar nos efeitos da globalização e no
progresso do nosso mundo.


Dentro de pouco tempo, um governo cruel, perverso e totalitário, mas com um discurso impecável de paz, amor e fraternidade, tomará conta do planeta Terra. Nada pode impedir que isso aconteça. Os Estados Unidos, depois de um colapso repentino e misterioso, serão impotentes, um mero peão no desenrolar dos acontecimentos. Mas será que essa transformação será provocada pelos lendários Trilateralistas? Não! A conspiração é muito maior do que isso e poderosa demais para ser controlada pelos Trilateralistas.

Há muitos rumores alarmistas de que importantes líderes políticos de Washington estariam envolvidos numa conspiração para trair os interesses nacionais dos Estados Unidos. Esses homens, todos membros ou ex-membros da Comissão Trilateral e/ou do Conselho de Relações Exteriores (CFR, em inglês), estariam trabalhando lado a lado com certos líderes comunistas importantes numa conspiração internacional para estabelecer um governo mundial [...]. Não há dúvida de que esses relatos têm um fundo de verdade. Mas as pessoas invariavelmente exageram quando se referem aos Trilateralistas e ao pessoal do CFR, parecendo atribuir onisciência e onipotência aos “internacionalistas”.

De fato, membros de várias organizações políticas importantes, tanto nos EUA como no exterior, fazem parte de uma conspiração internacional para estabelecer um governo mundial. Mas será que isso é tão ruim assim? De que outra forma pode haver uma paz mundial justa e duradoura? Com certeza, um governo mundial não seria considerado algo ruim, mas sim a maior esperança de se evitar um holocausto nuclear. Porém, muitos argumentam que esse governo só poderia ser estabelecido através do sacrifício de liberdades preciosas para o Ocidente [...].

Em vários de seus livros, H. G. Wells parece ter previsto com precisão assustadora os passos que levarão ao surgimento do futuro governo mundial. Embora defendesse um socialismo internacional benevolente, ele não tinha ilusões com relação ao Comunismo, que rejeitou com estas palavras:

Na prática, vemos que o Marxismo [...] recorre a atividades perniciosamente destrutivas e [...] é praticamente impotente diante de dificuldades materiais. Na Rússia, onde [...] o Marxismo foi testado [...] a cada ano fica mais claro que o Marxismo e o Comunismo são desvios que se afastam do caminho do progresso humano [...]. O principal erro dessa teoria é a suposição simplista de que pessoas em situação de desvantagem se sentirão compelidas a fazer algo mais do que a mera manifestação caótica e destrutiva de seu ressentimento [...]. Nós rejeitamos [...] a fé ilusória nesse gigante mágico, o Proletariado, que irá ditar, organizar, restaurar e criar [...].

Em vez disso, Wells previu que a nova ordem mundial estaria nas mãos de “uma elite de pessoas inteligentes e com um pensamento religioso”. A religião desses conspiradores sinceros, que Wells explicou e confessou seguir, é exatamente o que a Bíblia descreve como a religião do futuro Anticristo! Mas poucas pessoas perceberão isso, pois todos estarão muito empenhados em salvar o mundo do holocausto nuclear. Seus objetivos serão tão sinceros e parecerão tão lógicos: uma paz genuína e duradoura só pode ser obtida através do controle mundial sobre os interesses nacionalistas que, de outra forma, geram disputas por territórios, recursos, riqueza e poder, provocando guerras para atingir seus objetivos [...].

Criado pela mãe para ser evangélico, Wells tornou-se um apóstata inimigo de Cristo. Amigo íntimo de T. H. Huxley, Wells era ateu e ávido evolucionista. Porém, tinha uma religião, uma crença de que uma elite de homens-deuses evoluiria no tempo oportuno, “tomaria o mundo em suas mãos e criaria uma ordem racional”. O mundo seria transformado através dessa religião apóstata. Duvido que Wells soubesse que estava profetizando o cumprimento de uma profecia bíblica: “Ninguém, de nenhum modo, vos engane, porque isto não acontecerá sem que primeiro venha a apostasia e seja revelado o homem da iniqüidade, o filho da perdição”. Entretanto, Wells parecia saber que isso não aconteceria em sua geração, mas ocorreria provavelmente na seguinte:


Alguma coisa importante está tomando forma – um imenso e crescente movimento popular cujo caráter é mais religioso do que político, embora não no sentido comum da palavra.



Para a minha geração, desempenhar o papel de João Batista deve ser a maior ambição. Podemos proclamar e revelar o advento de uma nova fase da fé e do esforço humano. Podemos indicar o caminho cuja descoberta tem sido o trabalho de nossa vida [...]. Aqui – dizemos – está a base para um mundo novo.

A idéia de um governo mundial está em circulação há muito tempo. A novidade hoje é o fato de que quase todo mundo está chegando à mesma conclusão e, no desespero do momento, milhões de pessoas estão fazendo algo a respeito [...]. Como H. G. Wells previu, a “conspiração” agora se tornou um movimento evidente que envolve centenas de milhões de “crentes”. A maioria desses “conspiradores declarados”, como Wells profetizou, tem em mente uma unidade mundial baseada mais no relacionamento interpessoal do que propriamente num governo, como querem os internacionalistas. A maior demonstração de que isso já é totalmente possível são as redes formadas por milhares de grupos de cidadãos comuns trabalhando em conjunto, no mundo inteiro, no novo e poderoso movimento pela paz. Isso também parece ter sido previsto por Wells, que escreveu: “O que estamos procurando alcançar é a síntese, e esse esforço comunal é a aventura da humanidade”.

Alguma coisa importante está tomando forma – um imenso e crescente movimento popular cujo caráter é mais religioso do que político, embora não no sentido comum da palavra. É uma nova espiritualidade, um misticismo grande demais para ser confinado nos limites estreitos de qualquer religião.

O Dr. Fritjov Capra, brilhante físico-pesquisador da Universidade da Califórnia em Berkeley, declarou:

Vivemos hoje num mundo interconectado globalmente [...] que requer uma perspectiva ecológica [...] uma nova visão da realidade, uma transformação fundamental das nossas idéias, percepções e valores [...].

É interessante o que H. G. Wells declarou, ao escrever sobre a “conspiração declarada” que acabaria por estabelecer a nova ordem mundial: “Esta é a minha religião [...] a verdade e o caminho da salvação [...]. Ela já está se desenvolvendo em muitas mentes [...] uma imensa e esperançosa revolução na vida humana [...]”.

Existem evidências suficientes de que o que Wells previu está finalmente acontecendo. Isso não é obra do acaso e já está grande demais para ser controlado pelos Trilateralistas [...].

Estamos diante não só de um futuro governo mundial, mas também de uma futura religião mundial. Na era espacial, ela precisará ter o aval da ciência. Mas que religião seria essa? Não é preciso ser nenhum gênio para perceber que, se a Bíblia chama seu líder de Anticristo, então ela tem que ser anticristã. Entretanto, o próprio Senhor Jesus avisou que esse homem fingiria ser o Cristo e que seu disfarce seria tão astuto e convincente que enganaria “se possível, os próprios eleitos”.
Alguns Excertos da Obra

I - Nota Prévia de Esclarecimento
(páginas 18 a 25)



Este comentário quere ser, apenas, uma modesta contribuição para este esclarecimento. Nada mais. E o que mais importa nele, é, a nosso ver, chamar a atenção da juventude para o fenómeno, de que não só Portugal está a ser vítima, representado pela existência desse projecto utópico do Governo Mundial.

Embora sendo ainda apenas um projecto, os seus promotores, como veremos, detém já um Poder que lhes permite reduzir a soberania de numerosos Estados em todo o mundo, apenas àquilo que não contraria o seu projecto, actuando através da arma mais poderosa, a financeira.

Naturalmente que um tal projecto só poderá ser contrariado e vencido quando os cidadãos se aperceberem de que esse Poder existe e pretende impôr-lhes um sistema em que, como em todos os sistemas socialistas, os seus dirigentes têm a pretensão de que sabem melhor do que os próprios, o que os faz felizes.

O 25 de Abril não poderá ser verdadeiramente compreendido senão através das exigências daquele projecto.

No fundo, não passou de um pequeno episódio num percurso que se pretende que conduza à formação de um Governo Mundial, que já tem no seu activo um número elevado de vitórias e de vítimas.

Como todas as utopias, o seu percurso ficará assinalado com um rasto de ruínas e de lágrimas até que os cidadãos se decidam a pôr-lhe um ponto final.

Quem sabe se o seu fim não será idêntico ao da passagem do Poder das mãos da aristocracia de sangue para as da burguesia, com a Revolução Francesa e das mãos desta, por incapacidade de o deterem nas suas mãos, para as da aristocracia do dinheiro.

A burguesia, ao entregar o Poder de que se apossara, ao voto anónimo das massas, criara um vazio de Poder que veio a ser ocupado pela aristocracia do dinheiro.

Caberia agora à comunidade arrancá-lo das mãos da aristocracia do dinheiro para o utilizar apenas para o seu próprio bem.

Uma coisa, porém, é certa: uma situação em que um Poder como aquele de que actualmente dispõe a moderna aristocracia do dinheiro, sem qualquer fiscalização efectiva dos cidadãos, sem mesmo ser do seu conhecimento uma tal realidade e muito menos a utilização que dele fazem para dominar os governos e as consciências desprevenidas dos cidadãos, não pode durar senão enquanto esta ignorância se mantiver.

A dificuldade está, porém, em que esta ignorância é fruto desse mesmo Poder, por este cuidadosamente alimentada e defendida. Sendo, no entanto, limitado, como tudo neste mundo, embora imenso, é sempre possível lutar contra ele aproveitando a margem de manobra que a sua limitação comporta.

Na América do Norte têm sido numerosos os cidadãos que se têm dedicado com notável persistência a denunciar a existência, objectivos e manobras deste Poder, tanto no domínio da política interna como no da externa.

É certo que estes autores têm sido ajudados na sua luta contra este Poder pelo facto de a população americana ser muito sensível à existência de qualquer Poder que não seja efectivamente fiscalizado pelos cidadãos.

Saídos da Inglaterra como vítimas de um Poder político que consideravam arbitrário, contra o qual lutaram sem tréguas, procuraram, uma vez instalados na América do Norte, organizar-se social e politicamente de maneira a evitar a existência de qualquer forma de Poder não fiscalizado.

Até certo momento da sua evolução social e política o sistema implantado resultou, mas com o aumento da população, o crescimento económico e a diversificação social, para o que muito contribuiu a emigração, o sistema foi ultrapassado, abrindo-se caminho ao aparecimento de poderes, os chamados grupos de pressão, que escapam inteiramente a qualquer tipo de fiscalização dos cidadãos. Segundo Von Mises: "Um grupo de pressão é um grupo de pessoas desejosas de obter um privilégio à custa do restante da nação. Esse privilégio pode consistir numa tarifa sobre importações competitivas, pode consistir em leis que impeçam a concorrência de outros. Seja como for, confere aos membros de um grupo uma posição especial. Dá-lhes algo que é negado, ou deve ser negado — segundo os desígnios do grupo de pressão — a outros grupos.

Nos Estados Unidos, o sistema bipartidário dos velhos tempos aparentemente ainda se conserva. Mas isso é apenas uma camuflagem da situação real. Na verdade, a vida política desse país — bem como a de todos os demais — é determinada pela luta e pelas aspirações de grupos de pressão.

Nos Estados Unidos, continuam a existir um Partido Republicano e o Partido Democrata, mas cada um deles abriga representantes dos mesmos grupos de pressão. Estes representantes estão mais interessados em cooperar com outros representantes do mesmo grupo, mesmo que sejam filiados ao partido adversário, que com os esforços dos próprios companheiros de partido.

Assim, por exemplo, se conversarmos nos Estados Unidos com pessoas que efetivamente conheçam as atividades do Congresso, elas nos dirão: Tal político, tal membro do Congresso representa os interesses dos grupos ligados à prata. Ou dirão que tal outro político representa os plantadores de trigo.

Como é óbvio, cada um desses grupos de pressão constitui, necessariamente, uma minoria. Num sistema baseado na divisão do trabalho, todo grupo especial que almeja privilégios não pode deixar de ser uma minoria. E as minorias não têm qualquer possibilidade de êxito, senão pela colaboração com outras minorias congêneres, ou seja, com outros grupos de pressão semelhantes. Nas assembléias legislativas, procura-se compor uma coalização entre vários grupos de pressão, de tal modo que possam vir a se converter em maioria. Mas, passado algum tempo, essa coalização pode se desintegrar, uma vez que há questões que tornam impossível o acordo entre vários grupos. Novas coalizações, então, se formam".

O grupo liderado pela aristocracia do dinheiro é, sem dúvida um grupo de pressão, certamente o mais influente e poderoso, como veremos.

Na América do Norte a denúncia da existência deste poder foi feita por um historiador, Professor Carrol Quigley, antigo Professor de Havard e durante dezenas de anos, até à sua morte, em 1971, Professor da Universidade de Georgetown, autor, entre muitas outras obras, de uma em que denuncia aquele poder, os seus métodos e os seus objectivos, obra intitulada Tragedy and Hope, que vamos ter ocasião de citar numerosas vezes.

Uma outra obra também notável e que teve enorme repercussão na opinião pública americana, é a de W. Cleon Skousen, intitulada The Naked Capitalism, que citaremos também com frequência.

Não surpreende que as denúnicas feitas por estes e outros autores da existência de um tal poder encontre uma fácil receptividade por parte dos leitores americanos, ao contrário do que acontece entre os europeus.

Na Europa, a generalidade dos cidadãos tem uma grande relutância em acreditar na existência de poderes ocultos, considerando que se trata de fantasias e não de realidades, o que os leva, naturalmente, a uma atitude de generalizada indiferença.

É certo que, contrariamente ao que acontece com o povo americano, a tradição herdada é de um sistema caracterizado pela concentração do poder político e administrativo num número reduzido de cidadãos, numa estrutura hierarquizada. Deste facto resulta uma insuficiente fiscalização pelos cidadãos dos actos praticados pelos detentores do Poder.

Naturalmente que também entre os europeus a arbitrariedade é por todos repudiada, mas os que são investidos no Poder não têm as mesmas limitações na sua utilização que têm os políticos americanos.

Daí que entre os europeus as obras publicadas, aliás em reduzido número, sobre este tema, não despertem o interesse público, encontrando as maiores dificuldades para a sua difusão. Boicotadas pelas livrarias, desconhecidas da comuncação social, escrita e falada, acabam por chegar apenas a um escasso público incapaz, pelo seu reduzido número, de causar problemas aos detentores daquele Poder.

Numerosos acontecimentos de que o público mundial tem tido conhecimento não podem ser, porém, compreendidos sem se entrar em conta com a existência daquele Poder pois é ele que define os objectivos e a interpretação que a opinião pública lhes deve dar através das notícias que lhes chegam difundidas pelas suas agências notíciosas e pelos principais órgãos de informação que lhe pertencem.

Teremos ocasião de nos referir a alguns destes acontecimentos e à interpretação generalizada que lhes deu a opinião pública manipulada de acordo com os interesses daquele Poder pela comunicação social, comentaristas políticos ao seu serviço, livros e publicações várias que pela sua variedade e dimensões abafam, sem dificuldade, uma ou outra voz desinteressada que os denúncia.

A um tal Poder não é difícil mobilizar inteligências e vontades, numa palavra, comprar consciências para defender e servir os seus objectivos.

Um desses acontecimentos a que vamos dar um relevo particular por se tratar, apenas, de um facto que nos diz respeito, a nós portugueses, foi o 25 de Abril, que embora não passando no plano da política internacional de um modesto episódio, pode, porém, servir para ajudar o hipotético leitor a suspeitar da sua existência e compreender os objectivos e os métodos utilizados por aquele Poder na sua caminhada para o Governo Mundial.



II - Como Nasceu o Projecto Global
(páginas 68 a 94)



Para melhor se compreender a importância destas adesões, torna-se indispensável fazer algumas considerações sobre o poder, não só financeiro como político, que os grandes banqueiros tinham adquirido especialmente a partir da Revolução Francesa.

O papel desempenhado pelos banqueiros, desde tempos remotos, tem sido estudado por numerosos autores, sabendo-se pelos seus estudos que confo rme as épocas e países, a sua influência na vida polí tica foi sempre grande e nalguns casos até decisiva. Bastará apresentar o exemplo da eleição do imperador Carlos V. Esta eleição (1519) "tomou, na prática, o carácter de uma questão vulgar de corrupção em que a fraqueza das instituições foi desvendada abertamente. Os sete eleitores estavam 'à venda' e os dois candidatos mostraram-se logo dispostos a pagar. O banqueiro Jacob Fugger escreveu a Carlos V em 1523: 'É de notoriedade pública e claro como o dia que Vossa Magestade Imperial não teria conseguido obter, sem mim, a coroa romana'. De facto, os Eleitores só confiavam na casa Fugger, qualquer que fosse o mandatário. A eleição custou a Carlos V cerca de 1 milhão de florins, verba enorme para a época. Representava, então, um orçamento anual da Áustria em tempo de guerra ou seis anos de rendimento das minas do Tirol. Carlos obteve um primeiro apoio financeiro na praça de Antuérpia, graças à mediação da sua tia. Mas foram os banqueiros de Augsburgo (Fugger e Welser) que financiaram a operação à escala de 80%, Génova com 15% e Florença com 5%. Para comprar os votos dos sete eleitores houve que gastar meio milhão de florins, segundo contas feitas em 1520. Só o Eleitor de Brandeburgo, que negociara com a França, não recebeu nada. E os dois votos mais dispendiosos foram os do arcebispo de Mogúncia, Alberto de Brandeburgo, que custou 113.000 florins, e, sobretudo, o do Eleitor palatino, que recebeu 184 000 florins. Foi preciso pagar aos príncipes e também aos seus conselheiros. Além disso, a Liga Suábia cobrou 171 000 florins para se dissociar do duque Ulrich de Wurtemberga e reconhecer a soberania do príncipe Habsburgo".

Houve naturalmente, muitas outras intervenções da banca em acontecimentos políticos de grande relevância na história europeia e não só.

Foi só porém em época relativamente recente que, acompanhando o desenvolvimento acelarado da economia, o seu número e influência assumiu proporções que importa pôr em relevo.

Não é de surpreender que os banqueiros sempre tenham estado atentos à evolução da vida política nos diferentes Estados ligados aos seus interesses, dada a íntima relação entre a vida política e a financeira. Daí o não ser igualmente surpreendente que se tenham apercebido, especialmente a partir da Revolução Francesa, da ameaça que pesava sobre o seu poder com a passagem do poder político das mãos da aristocracia de sangue, para o poder anónimo das massas populares, eufemisticamente representadas pelos partidos.

Resultado este, pensavam, que traduzia o fracasso da burguesia que tendo-se revelado capaz de substituir o poder da aristocracia de sangue pelo seu próprio poder, não tinha conseguido mantê-lo ao entregá-lo ao voto anónimo das massas populares.

Ora, esta demissão da burguesia perante as massas populares, criara um vazio de poder que importava urgentemente preencher. As massas populares eram incapazes, por definição, de tomarem decisões sobre o que interessa à humanidade quando, de maneira tão evidente, se revelam incapazes de se aperceberem onde está o seu próprio interesse para além do imediato.

Daí a ideia surgida entre os banqueiros, para o bem próprio e o da humanidade, de preencher esse vazio deixado pela incapacidade da burguesia para assumir a chefia dos acontecimentos, já que o poder de que cada banqueiro dispunha uma vez articulado com os demais, constituiria uma força verdadeiramente embatível. Consideravam como tal que as condições fundamentais para se constituirem em classe dirigente já existiam, bastando apenas para se transformarem num poder efectivo à escala mundial, concertarem as suas acções.

Para dar uma maior solidez à força que representavam, consideraram como muito importante, seguindo aliás na esteira da antiga aristocracia, que promovessem os casamentos entre os membros das suas respectivas famílias, o que não representaria dificuldade de maior dado serem em número reduzido e até haver já uma certa tradição nestas ligações.

Assim se constituíria uma nova aristocracia, com um poder e um nível cultural que nenhuma outra em qualquer tempo teria tido.

Como se sabe, os mais destacados elementos destas autênticas dinastias de banqueiros no mundo europeu, descendem de Mayer Amschel Rothschild (1743-1812) de Frankfurt. Dos seus cinco filhos um ficou a dirigir o banco em Frankfurt e os outros quatro representavam o banco em Viena, Londres, Nápoles e Paris, representando o conjunto um poder financeiro que nenhuma das outras grandes famílias de banqueiros tinham até então atingido. Entre estas destacavam-se os Baring, os Lazard, os Erlanger, os Warburg, os Schroder, os Selingman, os Spreyers, os Mirabaud, os Mallet, os Fould e numa escala superior Rothschild e Morgan.

Desde o tempo, porém, do primeiro Rothschild até aos nossos dias e mercê da crescente complexidade da vida económica, deu-se uma modificação de alta importância no domínio das actividades bancárias.

Surgiram, na verdade, por exigências daquela crescente complexidade, ao lado dos simples banqueiros, os chamados, por alguns autores, banqueiros internacionais, isto é, os grandes da finança internacional que constituem como que uma sociedade unida por altos interesses comuns e secretos em que as decisões são tomadas de maneira concertada.

O que os distingue dos banqueiros comuns é, em primeiro lugar, o tremendo poder de que dispõem.

Cosmopolitas internacionais, estão em estreito relacionamento, directo ou indirecto, com os governos que frequentes vezes deles dependem, através sobretudo de empréstimos, mas não só, para se manterem no Poder.

Por outro lado, estes banqueiros internacionais não dirigem propriamente bancos, mas sociedades que englobam por vezes dezenas de bancos.

Sendo, só por si, como banqueiros uma força considerável, agora unidos e concertados numa estratégia comum, passaram a representar uma força poderosissima que foi aumentando continuamente à medida que nela foram incorporados bancos comercais e bancos de poupança, bem como companhias de seguros e empresas multinacionais de maior envergadura, formando um todo verdadeiramente fabuloso.

Pode dizer-se que formam um verdadeiro sistema financeiro internacional que pela sua dimensão e o seu poder tem capacidade de manipular a quantidade e o fluxo de dinheiro onde quer que lhes convenha e, como tal, dominar os governos através da capacidade de que dispõem para interferir na vida financeira e económica de qualquer país.

O economista Christopher Tugendhat, no seu livro As Empresas multinacionais, afirma que: "A natureza da empresa internacional tem implicações de grande alcance para os homens que as dirigem. O Presidente da filial britânica da Ronson estado-unidense W. J. Kenyon Jones, define o dever de um executivo por estas palavras: 'Tem que pôr de parte qualquer atitude nacionalista e ter em conta que, em última instância, deve lealdade aos accionistas da sociedade mãe, tendo que proteger os interesses destes, ainda que pareça que porventura não coincidam com o interesse nacional do país em que trabalha.

Podem surgir conflitos aparentes em assuntos tais como a transferência de fundos em períodos de crise nacional, transferência de produção de uma a outra filial, ou transferência de operações de exportação". Noutro passo afirma: "O movimento de fundos dentro dos grupos multinacionais, quando vários de entre eles seguem a mesma política, pode ameaçar e algumas vezes destruir as políticas nacionais no que se refere ao câmbio exterior, à balança de pagamentos e à disponibilidade de crédito".

As actividades destes banqueiros internacionais é extremamente discreta apresentando-se como firmas privadas, sob a forma de sociedades, o que lhes assegura o máximo de anónimato, indispensável para encobrir aos olhos do público o grande poder de que dispõem.

Dominando quase todos os órgãos de comunicação social, não lhes é difícil manter este anónimato, pelo que é quase impossível, mesmo aos mais interessados nestes problemas, associar aos seus nomes, personalidades destacadas da vida dos seus respectivos países.

Poucos serão nos E.U.A. os que associam o nome de Morgan à de personalidades de vida política como Walter Burns, Clinton Dawkins, Eduard Grenfell, Willard Straight, Thomas Lamont, Dwight Morrow, Nelson Perkins, Russel Leffingwell, Elihu Root, John Davis, John Foster Dulles e Parker Gilbert, etc, quando todos eles se encontram associados às suas actividades no campo dos seus interesses económicos e políticos.

Apresentamos apenas estes exemplos pela importância que os E.U.A. têm na vida política financeira internacional, o que não significa que seja uma situação isolada, pois nos outros países europeus se encontra igualmente o poder financeiro intimamente implicado nos fenómenos políticos, implicação esta de que se apercebem perfeitamente as pessoas mais cultas nos seus respectivos países.

Nos Estados de menor dimensão e poder financeiro, o domínio dos banqueiros internacionais é na ordem prática absoluto, pelo menos no que diz respeito às actividades financeiras e económicas de maior importância.

Nos sistemas democráticos os politícos dependem dos votos das massas populares e para influenciarem estas a seu favor, necessitam não só de meios financeiros substânciais de que não dispõe, nem eles, nem os partidos a que pertencem, bem como necessitam dos meios de comunicação social. Ora uns e outros estão sob o poder directo ou indirecto da força financeira internacional.

Por outro lado estes países de fraco peso na vida internacional estão, mercê da sua própria fraqueza, sujeitos a seguir uma linha de actuação que é traçada por um conjunto de personalidades pertencentes aos países mais poderosos, ficando apenas com o escasso poder de decisão interna que não colida com aquela.

Os meios utilizados para levar à obediência à linha traçada pelos centros de decisão internacional, são raramente directos, mas nem por isso menos eficazes. Na verdade, todos os governos tem necessidade de recorrer a financiamentos para resolver problemas urgentes de ordem financeira. Ora só a banca internacional está em condições de resolver estes problemas. É geralmente através de empréstimos que a banca internacional actua na via política, dominando os governos e os leaders políticos, obtendo concessões para o aumento do seu poder, influenciando nomeações para os altos cargos em todos os domínios, numa palavra, influênciando de maneira decisiva o curso dos acontecimentos.

"Em Portugal, a venda de coca-cola esteve proibida, em virtude do seu possível risco para a saúde, até Janeiro de 1977, quando a interdição foi levantada, com naturalidade, pouco depois de a Administração americana negar um empréstimo de 300 milhões de dólares que o Governo português necessitava com urgência. A 4 de Janeiro de 1977 surgia o seguinte artigo no Wall Street Journal:

'O Governo português esperou ansiosamente durante semanas a confirmação de que Washington deferira o seu pedido de um empréstimo de emergência de 300 milhões de dólares e o dinheiro se achava a caminho. O empréstimo, finalmente concedido no último fim-de-semana, era aguardado há algum tempo. Os responsáveis do Tesouro americano atribuíam a demora a razões exclusivamente técnicas e asseguravam, quando interrogados, que os fundos estavam prestes a chegar. Talvez não passe de coincidência, mas dá-se a circunstância de que, pouco antes da aprovação do empréstimo em causa, Portugal pôs termo ao seus cinquenta anos de proibição da coca-cola. Uma empresa mista helvético-portuguesa iniciará, dentro de menos de seis meses, o engarrafamento da bebida, que até agora tem entrado de contrabando, procedente de Espanha, à razão de cerca de 12 dólares a garrafa grande'.

Os membros desta aristocracia eram declaradamente internacionalistas partidários de regimes ditatoriais por consideraram que os regimes democráticos eram os responsáveis dos males que afligiam a humanidade. Conscientes da sua superioridade, do poder esmagador de que dispunham, pretendiam como uma obrigação de ordem moral colocar ao serviço de uma causa que outra coisa não pretendia do que superar os malefícios do sistema implantado e sustentado pela burguesia. Dela, afirmavam tinham saído guerras, o nacionalismo, o comunismo, uma sociedade injusta apenas empenhada na defesa dos seus privilégios, indiferente às carências e dificuldades de toda a ordem da maioria esmagadora dos cidadãos em todo o mundo.

A solução para estes problemas viam-na, na esteira de Ruskin, na organização da sociedade numa base socialista.

O historiador inglês, conhecido mundialmente, Arnold J. Toynbee, ao longo de toda a sua obra, interpreta a evolução histórica sempre à luz dos princípios básicos do ideário de John Ruskin, pondo sistematicamente em relevo a necessidade de ultrapassar a concepção particularista que tem dominado a vida dos povos através do nacionalismo e concomitantemente a exaltação das virtudes militares, para uma concepção universalista que gere a paz e o pão para todos os herdeiros da terra.

Toynbee ao longo de toda a sua obra não se cansa de pôr em relevo as consequências a que tem levado ao longo da história, desde as épocas mais remotas, o uso da espada, mãe de glórias efémeras e de calamidades sem conta, sempre em constante aperfeiçoamento até chegar aos nossos dias a pôr em risco a sobrevivência de toda a humanidade.

Um numeroso grupo de pensadores, de jornalistas, de escritores, de professores, de artistas, etc., tem estado ao serviço destes ideais, procurando através dos seus escritos, da sua palavra e da sua acção, criar na opinião pública uma mentalidade desfavorável aos ideais, aos privilégios da classe pequeno-burguesa. Esta, entretanto está preocupada apenas com a preservação dos seus direitos de propriedade e outros privilégios garantidos pelas leis, num feroz egoísmo que a impede de cumprir com o seu dever de solidariedade com os outros povos a cuja exploração, segundo Toynbee, deve o seu escandaloso nível de vida.

É de crer, segundo o mesmo autor, que um poderoso e reduzido número de individualidades, conscientes do seu poder e das flagrantes injustiças resultantes de um sistema político idealmente concebido como um sistema revolucionário mas que, mercê da incapacidade da burguesia se transformou, na ordem prática, num sistema protector de egoísmos, conservador e explorador despudorado da miséria de outros povos, se sintam como uma aristocracia cujo dever moral é pôr o seu poder ao serviço do bem da humanidade, segundo o ideário de John Ruskin.

A filosofia política de John Ruskin e o projecto de Rhodes nele inspirado, deram assim origem ao projecto global capaz de criar uma nova ordem mundial em que ficasse assegurada uma linha de evolução que garantisse os progressos de ordem moral e material alcançados pelas nações mais avançadas e desde a Revolução Francesa ameaçadas pelo sistema político democrático e pela falsa liderança da burguesia.

Como Jonh Ruskin afirmou era imperioso que esta preciosa herança de "educação, beleza, império da lei, liberdade, decência, e auto-disciplina" que caracterizava a classe superior inglesa fosse salva mas que "esta tradição podia vir a não ser salva nem mereceria sê-lo, a não ser que pudesse vir a ser incorporada nas classes baixas inglesas e nas não inglesas do resto do mundo" e que "se esta preciosa tradição não fosse extensiva a estas duas grandes maiorias, a minoria da classe alta inglesa acabaria finalmente por ser submergida por estas maiorias e a sua tradição perdida".

Como é natural, uma vez conscientes do seu tremendo poder e da oportunidade que este lhes dava de assumirem o papel de uma verdadeira aristocracia, isto é, o de responsáveis pela condução dos negócios do mundo, logo o assumiram como um dever moral.

Como já tivemos ocasião de o dizer, uma vez levada a cabo a tarefa de organização das Round Table, na Inglaterra, nos Domínios e, em menor escala, por mais tardia, nos E.U.A., impos-se a criação de outros organismos, sem carácter secreto, embora muito discretos quanto à sua finalidade e actuações. Surgiu assim, pelo final da guerra de catorze, a rede dos Royal Institute of Internacional Affairs implantados em todos os pontos em que já existiam os Round Table Groups, organismos secretos através dos quais actuava a sociedade secreta criada por Rhodes e Milner. Aqueles institutos eram, digamos, a face visível, embora dificilmente penetrável dos Round Table Groups, sendo deles naturalmente que saíam as instruções sobre a actuação que deviam seguir no seu trabalho conspiratório.

Na América do Norte, embora com uma designação distinta e por essa época em muito menor número, mas já apoiado por Morgan e pelos Rockefeller, surgiu o Council of Foreign Relations, desempenhando junto dos Round Table Groups o mesmo papel que o Institute of International Affairs nos territórios de lingua inglesa.

Esta estrutura foi organizada por individualidades ao serviço de Morgan, encontrando-se entre elas, Lamont e Beer que tinham estado integrados na comissão americana à Conferência de Paz em Paris. Durante a sua estadia tinham aproveitado para entrar em íntimo contacto com os elementos ingleses recrutados por Lord Milner, como delegados à mesma Conferência de Paz. Foi nessa ocasião que os planos originais do Royal Institute of International Affairs e o Council of Foreign Relations foram elaborados e em seguida postos em prática.

Embora sendo do conhecimento do público a existência destes organismos, pouco ou nada se sabe das suas actividades, a não ser de maneira indirecta, a maior parte das vezes deduzida das posições políticas e actividades dos membros chamados a desempenhar altas funções na finança, na política e na administração.

O jornal Christian Science Monitor, um entre muitos, dos órgãos de comunicação social ligados ao C.F.R. , deu no seu número de 1 de Setembro de 1961, um relato que se pode considerar como uma informação oficiosa acerca do papel que o Council desempenha na sociedade americana. Esta informação surgiu para satisfazer ou acalmar um surto de curiosidade pública suscitada por acusações que surgiram em alguns orgãos menores da comunicação social, acerca das suas actividades secretas.

A sede do Council está situada na Park Avenue, encontrando-se quase em frente à embaixada da Rússia. O Christian classificou o Council como "provavelmente uma das mais influentes organizações semi-públicas no campo das relações exteriores". O edifício em que se encontra instalado foi oferta dos Rockefeller.

Quanto à sua constituição, o referido artigo afirma que dele faziam parte "nomes de pessoas que se distinguiram no campo da diplomacia, governo, finanças, ciências, no trabalho, no jornalismo, no campo jurídico e na educação. O que reunia representantes tão numerosos e de proveniência tão variada como seus membros, foi o apaixonado propósito de reflectirem sobre a orientação da política externa norte-americana"

Naturalmente que os membros desta organização são cuidadosamente seleccionados, sendo os escolhidos, apoiados com tudo o que necessitam para influenciar o meio em que desenvolvem a sua actividade profissional e naturalmente treinados para o desempenho da missão ou missões que lhe forem confiadas. O artigo do Christian afirma que dos mil e novecentos membros "cerca de metade dos seus membros foi convidada a assumir cargos oficiais no governo ou a intervir como consultores em numerosas ocasiões".

Por sua vez no Harpers de Julho de 1958, encontra-se também um artigo intitulado Escola de Estadistas escrito por Joseph Kraft, membro da organização, que a "descreve como tendo sido o lugar privilegiado de decisões básicas do governo, como tendo determinado o contexto de muitas mais decisões e como tendo servido repetidamente de campo de recrutamento de funcionários superiores da administração".

Nesta exposição o autor revelou como "o C.F.R. fornece aos seus membros o treino que lhes permite actuar de acordo com a linha estratégica a ser levada a cabo". Joseph Kraft esclarece ainda que a criação do C.F.R. dentro da rede da Casa Branca se deve ao Colonel Mandell House, ajudante e confidente do Presidente Wilson e intimamente relacionado com James Green. O Colonel House revelou a criação de um organismo internacional, apoiado em poderosas forças, tendo como objectivo a implantação do Socialismo como foi sonhado por Karl Marx, O quadro cuidadosamente selecionado de apoiantes do C.F.R. para apoiarem o Colonel House na sua acção junto do Presidente e através deste na Administração, foram Walter Lippman, John Foster Dulles, Allen Dulles e Christian Herter.

Todos eles estiveram com o Colonel House na Conferência de Paz, em Paris, hóspedes dos grupos ingleses e americanos dos Round Table tendo-se reunido em 19 de Maio de 1919 no Hotel Magestic de Paris com House, para organizarem as diferentes frentes de actuação em vários pontos do mundo.

Sobre a influência do C.F.R. nas tomadas de posição do Departamento de Estado na política externa dos E.U.A., depois da guerra de 1914, bastará citar o seguinte documento inserto no State Department Publications, 2349, intitulado Report to the President on the results of the San Francisco Conference, da autoria de Eduward Stettinius, Secretário de Estado: "Com a erupção da guerra na Europa era claro que os Estados Unidos seriam confrontados depois da guerra com novos e excepcionais problemas … Consequentemente foi criada uma comissão por sugestão do C.F.R. antes do final de 1939, para tratar dos problemas do pós-guerra (como tal 2 anos antes do E. U. terem entrado na guerra). Esta comissão foi assistida por um grupo de investigadores que em Fevereiro de 1941 deu origem a uma classificação de Investigação Especial no Departamento de Estado, (todos menos um eram membros do C.F.R.), passando os seus membros da lista de pagamento do C.F.R. para a lista de pagamentos do mesmo Departamento de Estado".

Foi este grupo que criou as estruturas básicas das Nações Unidas e definiu as políticas de post-guerra que levaram à entrega ao bloco comunista, de milhões de cidadãos livres, durante os sete anos que se seguiram ao final da guerra.

Em 1945, a delegação americana à conferência das Nações Unidas compreendia nada menos de 74 membros pertencentes ao C. F. R., estando entre eles Alger Hiss, mais tarde condenado como espião da U.R.S.S., Harry Dexter White também agente soviético, Owen Saltimor, descrito pela Comissão do Congresso como um "consciente, articulado instrumento da conspiração internacional soviética", John J. Mc Cloy, antigo membro da direcção do Rockefeller Chase Manhattan Bank, Harold Strassen, Nelson Rockefeller, John Foster Dulles, Philip Yesrap e Dean Acheson. Estes e 38 membros do C. F. R. ocuparam as posições chave mais importantes, ao nível em que as decisões eram tomadas para a constituição da organização das Nações Unidas.

No eixo Morgan — Rockefeller, a família dos Lamont, cujos membros eram personalidades de relevo nos círculos do C.F.R. e que representavam os principais banqueiros de Wall Street, desempenharam um importante e activo papel na promoção das políticas pró-soviéticas. Corliss Lamont, membro do C.F.R., foi classificado pelo House Commitee on Un-American Activities, como sendo "provavelmente o mais persistente propagandísta da União Soviética que se possa encontrar em qualquer parte dos E. U. A."

Os Lamont e outros membros do escol do C.F.R. estavam em estreita ligação com muitos outros programas financiados por Wall Street, naturalmente por incumbência do C. F. R., todos orientados no sentido de criar um clima favorável aos interesses da União Soviética. Entre os que se salientaram pela acção desenvolvida neste sentido, podem citar-se os seguintes: American Association for the United Nations, Council Affairs, Commitee for Economic Development, Business Advisory Council, Commision on National Goals, American Assembly, National Planning Association, Americans for Democratic Action.

No plano internacional, o C.F.R. está ligado a numerosas organizações quer directa quer indirectamente, como por exemplo, às Conferências de Bilderberg, às Pugwash Conferences, à English Speaking Union, às Pilgrims Society, todas elas controladas pelas Round Table.

É nestas reuniões de nível internacional, que se traçam as linhas de orientação a ser inseridas na política internacional. O número dos que participam nestas reuniões, naturalmente varíavel, corresponde à representação mais altamente classificada dos sectores mais relevantes da vida das nações representadas: os banqueiros internacionais, as corporações que englobam as maiores empresas internacionais, as fundações isentas de taxas e as personalidades mais representativas pertencentes à organização. Estas reuniões, geralmente anuais e sem local fixo, são secretas, sabendo-se apenas sobre eles e nem sempre se sabe, o local da reunião e o nome dos participantes.

Raymond B. Fosdick, assíduo membro destas reuniões, classificou o grupo de Bilderberg como um conjunto de individualidades que tecem "a infinidade de fios económicos e políticos que preservam a paz".

O próprio Congresso dos Estados Unidos tentou várias vezes tomar conhecimento das actividades destes grupos, promovendo investigações em que estiveram envolvidos altos funcionários governamentais, colocados sob juramento e interrogados, não tendo conseguido obter deles informações com algum significado.

As conferências de Pugwash estão intimamente relacionadas com o multi-milionário Cyrus Eaton que as criou. Eaton foi ajudado por John Rockefeller, tendo-se transformado num grande magnata no domínio industrial e dos serviços, tanto no Canadá como nos E.U. A.. A empresa Tower International, Inc., propriedade de seu filho, juntou-se à International Basic Corporation dos irmãos Rockefeller, com a finalidade de promoverem o comércio entre o bloco comunista e os E.U., o Canadá e a América Latina.

Eaton declarou repetidas vezes ser partidário da tese de que a União Soviética e os E. U. deviam estar intimamente relacionados, não só no campo económico, como no da política internacional. Nas suas frequentes visitas aos países do Leste e à União Soviética foi sempre considerado como um hóspede de honra e sempre que individualidades de destaque daqueles países visitavam o Canadá ou os Estados Unidos, Eaton foi sempre o seu hospedeiro.

Em 1954 ofereceu a sua casa em Pugwash na Nova Escócia, sua terra natal, para servir de retiro a intelectuais ligados ao Establishement. Poucos anos depois, em 1957 deu início à realização da primeira conferência de Pugwash em que estiveram presentes cerca de 20 dos mais destacados cientistas nucleares, oriundos dos E.U., Canadá, Austrália, França, Japão, Grã-Bretanha, Aústria, Polónia comunista, China comunista e da União Soviética.

Que se passou?

Nada se soube, nem certamente se saberá o que, só por si, não deixa de ser significativo. Se nada de condenável, à luz do pensamento oficial, se tivesse passado e dadas as suspeitas que estas reuniões sempre levantaram, seria compreensível que sobre ela se não tivesse abatido um silêncio total, como aconteceu.

A partir desta primeira reunião muitas outras foram realizadas até aos nossos dias e, com certa frequência em países do Leste, tendo em todas elas participado altos funcionários das administrações americanas.

Julga-se que nestas conferências devem ter sido discutidos os processos e os meios a utilizar para influenciar a opinião pública e pressionar a administração no sentido do desarmamento, baseando-se em pretensas intenções pacíficas do governo soviético, que outra coisa não desejaria, senão a paz. Os serviços prestados por Cyrus Eaton aos interesses soviéticos devem ser sido de tal maneira elevados, que lhe foi concedido o Prémio Lenine da Paz.

As outras organizações citadas, não passam de outras tantas formas de actuação subordinadas ao mesmo objectivo: preparar, cuidadosamente e sem pressas, o caminho que há-de levar à implantação de um governo mundial de base socialista, como o recomendara John Ruskin. Esta seria a única estrutura de poder que podia salvar as mais altas aquisições da civilização do império das massas e permitir que essas conquistas da civilização pudessem ser transmitidas progressivamente a todas as classes sociais, primeiro aos povos da língua inglesa e depois a todos os povos do mundo.

Pensa-se que a influência do C.F.R. em Washington tem sido muito elevada dado que, em todos os governos desde a sua criação em 1913, participaram numerosos elementos desta organização.

Quando da subida ao poder de Nixon, muitos foram os americanos que tiveram esperança numa quebra de influência do C.F.R.. Se é certo que ela se deu em certos sectores da administração, noutros, e os mais importantes, ela manteve-se como nos governos anteriores. É mesmo muito possível que a sua saída forçada da presidência tenha sido o resultado da sua tentativa de quebrar a influência do C.F.R., tanto a nivel interno, como internacional.

Nos nossos dias, a subida ao poder de Reagan foi tomada como uma vitória dos opositores à linha de actuação política e influência nos negócios públicos do C.F.R., mas também Reagan foi posto perante a ameaça do impeachment sendo forçado a fazer marcha atrás e a aceitar a orientação do C.F.R., bem visível na substiuição a que procedeu do secretário de Estado, pelo embaixador Carlucci, membro destacado de C.F.R..

A mudança brusca de atitude de Reagan em relação à União Soviética só pode ter esta explicação. De império do mal, como a classificou pouco tempo antes da cimeira e do que nesta se passou, não se pode deixar de admitir que cedeu às pressões do C.F.R. para salvar a sua posição ameaçada.

É evidente que os promotores do Projecto do Governo Mundial, que visa alterar tão profundamente a vida do mundo, não podem deixar de actuar de maneira extremamente directa e de lançar mão de todos os meios que possam servir o objectivo que se propõem.

Pelo que se disse do projecto teórico delineado por John Ruskin, este baseava-se numa filosofia que nada tinha a ver com a prevalecente no seu e no nosso tempo, de base religiosa cristã e concepção moral que lhe corresponde, que impõem naturalmente à acção política e ao comportamento dos indivíduos na sociedade civil, barreiras que não podem transpor sem traírem aquela concepção do mundo e da vida.

A posição de John Ruskin e dos seus seguidores nada tem a ver com esta concepção, como vimos, pelo que é um erro que tem sido cometido por muitos dos seus opositores, ao expor, critícar e julgar as suas actividades e o seu objectivo apresentando-os como traidores a uma concepção do mundo e da vida que nunca aceitaram.

A sua posição é completamente coerente. A filosofia do seu projecto admite sem contradições que os fins justificam os meios, pelo que utilizam sempre os que lhe são úteis, sem qualquer espécie de contradição com os princípios que aceitaram.

Do lado dos seus opositores é que podem encontrar-se numerosas contradições que resultam sempre do facto de defenderem uma concepção do mundo e da vida, uma concepção cristã esvaziada do seu conteúdo fundamental, do seu fundamento, do ponto de partida, do que justifica a sua existência: a subordinação da vida terrena à vida sobrenatural. Há pois, a nosso ver, mais razão em chamar traidores aos seus opositores, do que estes aos que pertendem conduzir o mundo a partir de uma concepção que nada tem a ver com a degenerada pseudo-concepção cristã que dizem defender mas que na verdade apenas lhes serve para satisfazerem as suas ambições e os seus interesses na ordem prática.

Pode dizer-se, embora com alguma simplificação, que os opositores ao projecto global defendem aquilo a que Quilgley chamou os valores da classe média.

Quando se procura porém aprofundar o significado desta expressão verifica-se que apenas pertendem perpetuar a situação pouco clara e incoerente, saída fundamentalmente da Revolução Francesa, em que uma concepção pagã e materialista pertendeu fundamentar-se em princípios e valores laicizados da concepção cristã. Os defensores desta, por sua vez, embora defendendo teoricamente os princípios e os valores cristãos, vivem segundo aqueles outros princípios e valores de onde resulta a perpetuação de contradições que levam muitos, que não aceitam viver com essas contradições a assumirem posições extremistas como a do Projecto Global.

Compreende-se que aqueles que combatem este projecto apenas com o objectivo de defenderem os seus interesses, acusem os seus promotores de pretenderem instaurar uma situação colectivista em que desapareceriam a liberdade democrática e a propriedade privada, os valores mais salientes da classe média a que se refere o Dr. Quigley. Não admitem que se possa pensar numa ordenação do mundo em novas bases em que sejam eliminados os evidentes e crúeis desequilíbrios entre nações e indivíduos, geradores de tantas vitímas inocentes. Não se pretende naturalmente, com estas observações aceitar como solução a que parece ser preconizada pelo Global Establishment mas apenas chamar a atenção do hipotético leitor para elementos que lhe permitam tomar conhecimento de um problema que também lhe diz respeito e de que possivelmente não está suficientemente informado, não podendo, como tal, tomar acerca dele uma opinião fundamentada.

Para este esclarecimento parece-me importante referirmo-nos, de maneira algo pormenorizada, ao papel que nesta conjura mundial têm desempenhado os banqueiros.



III - O Papel da Banca e das Fundações Isentas de Impostos
(páginas 95 a 99)



Os banqueiros ingleses há muitos anos já que dominavam a vida financeira da Inglaterra através da fundação, em 1694, por William Paterson, antigo pirata ao serviço da realeza, do Banco da Inglaterra. Paterson além de pirata bem sucedido, revelou-se um financeiro verdadeiramente genial. Se o crédito era já conhecido havia muitos séculos e as notas de crédito igualmente, para evitar os inconvenientes do transporte de moedas, Paterson descobriu que apenas haveria necessidade de ter nos cofres do banco a quantidade de ouro necessária para cobrir a fracção dos certificados que seriam apresentados para trocar por ouro. Desta forma o resto do ouro poderia ser utilizado pelo banco para negócios ou para passar certificados sem cobertura, isto é, que excediam a reserva de ouro comprometida com a passagem de certificados.

William Paterson dizia, por isso, que o banco tinha um benefício de juro em todos os dinheiros que se criam do nada. Outros processos dos bancos criarem dinheiro do nada foram mais tarde utilizados, proporcionando à comunidade bancária aumentar consideravelmente o seu poder e influência.

Os governos começaram a sentir o peso que o Banco da Inglaterra tinha nas suas decisões políticas, tentando em 1844 introduzir no alvará do banco alterações que limitassem o seu poder mas a tentativa não foi bem sucedida, porque o poder que o banco representava, já era suficiententemente forte para se lhe opôr com êxito.

O chanceler do Tesouro e mais tarde Primeiro Ministro Gladstone, em 1852, declarou que "o ponto fulcral da situação estava no seguinte: em matéria de Finanças o governo não podia actuar como um poder autónomo, mas teria de deixar ao poder do dinheiro um papel inquestionável e da maior importância".

Reginald Mckenna, antigo chanceler do Tesouro, em 1915/16 como Presidente do Midland Bank, não hesitou em declarar aos seus associados: "Receio que o cidadão comum não gostasse que lhe dissessem que os bancos podem e devem criar dinheiro… E que os que controlam o crédito da nação, dirigem a política dos governos e detêm nas palmas das suas mãos o destino do povo".

Por sua vez Sir Drumond Frazer, Vice-Presidente do Instituto dos Banqueiros, não teve também dúvidas em afirmar que "o Governador do Banco de Inglaterra deve ser o autócrata que dita os termos em que o governo pode obter dinheiro emprestado".

O governo trabalhista nacionalizou o Banco de Inglaterra em 1946, mas esse facto, contrariamente ao que se poderia esperar, não teve nenhum efeito significativo na limitação do poder que o dominava. No Gabinete de Directores que assistem o Governador do Banco, nomeado pelo Governo, encontram-se representados os grandes bancos e as grandes firmas por eles controladas.

A vida financeira britânica continuava controlada por uma escassa centena de firmas privadas de banqueiros onde se encontravam colossos como os Baring Brothers, os Rothshild, os Shroder, o Morgan Grenfell, os Hambros, os Lazard Brothers, etc.

A situação nos Estados Unidos evoluiu de maneira distinta da situação inglesa.

No período de 1880 a 1909 pode dizer-se que o controlo da estrutura financeira estava nas mãos dos grandes banqueiros e dos grandes negociantes, intimamente relacionados através de sociedades em que mutuamente participavam.

No topo desta complexa estrutura estavam duas entidades que sobressaíam pelo seu poder, tanto financeiro como económico, uma situada em Nova York, sob a chefia de J. P. Morgan e Companhia e a outra, no Ohio, chefiada pela família Rockefeller.

O poder destes dois colossos era já nessa época de tal dimensão que, ao menos ao nível federal, a sua posição era decisiva na condução da vida política e na vida financeira e económica, nada era possível contra eles. Só uma destas sociedades, controlada por J. P. Morgan e Companhia, a American Telephone and Telegraph, tinha maiores recursos financeiros do que a riqueza total de 21 Estados da União.

Em 1930 as duzentas maiores sociedades controladas por um e o outro grupo, J. P. Morgan e Companhia e a família Rockefeller, era detentoras de 49,2% dos bens das quarenta mil sociedades existentes, nada menos do que 81 biliões de dólares dos 161 biliões que representavam.

O controlo do sistema económico e financeiro estava praticamente nas mãos destas duas grandes sociedades.

O espantoso surto de desenvolvimento que a partir do final do século XIX, princípio do século XX, caracterizou a vida americana, veio criar aos grandes da economia problemas delicados, em relação ao controlo da vida financeira e económica.

A notoriedade de ostentação de riqueza em que viviam, despertava na opinião pública a curiosidade de conhecer o papel que desempenhavam na vida política do país.

O segredo que até aí tinham conseguido manter na construção dos seus impérios financeiros e económicos, não era mais possível manter a nível público, com as consequentes repercussões nas eleições nacionais.

Os grandes banqueiros americanos compreenderam que chegara o momento em que se impunha criarem um instrumento que lhes permitisse manter o controlo do poder de que dispunham de maneira tão discreta como os banqueiros ingleses tinham conseguido com a criação do Banco de Inglaterra e que fora seguido pelos banqueiros europeus com a criação dos bancos centrais em França, Alemanha, Itália e Suíça, para só citar os mais importantes.





IV - O 25 de Abril… o que foi? quem o promoveu? o que pretendia? em que resultou?
(páginas 159 a 160)



Não se aperceberam, como ainda não se apercebeu a maioria dos nacionais, que o problema fundamental não era, como o tinham proclamado os capitães que de início chefiaram o Movimento e que de maneira clarividente tinham interpretado a vontade nacional, uma mudança de regime político, necessária à resolução do problema do Ultramar, mas a entrega pura e simples deste aos interesses políticos e económicos da América do Norte e da então Rússia Soviética, tudo subordinado às exigências do Projecto Global.

A discreta mudança da chefia provocada pela resolução tomada em reunião do Conselho de Estado, que como, veremos, deu luz verde à descolonização, teve como consequência imediata a substituição daquele objectivo pela criação das condições objectivas que permitissem, através de fases bem determinadas, não só o abandono do Ultramar, como a saída, à força e em massa, dos residentes nos territórios, pelo perigo que para aqueles interesses representaria a sua permanência neles, o seu apego e amor à terra. Não eram, eles sabiam-no, colonos de ida e volta, mas gente que criava raizes, que fazia Pátria onde vivia. Por tudo isto, aqueles comentadores estrangeiros se não aperceberam que a desordem era a base em que assentavam as diferentes acções que, no plano secreto pré-estabelecido, permitiria chegar àquele resultado final.

Os altos e baixos por que a desordem ia passando, foram sempre cuidadosamente controlados e muitas vezes programados com antecedência, como aconteceu com o 28 de Setembro, que, por sua vez, foi preparação para o 11 de Março.

(páginas 182 a 190)



Obrigado, pela mesma altura, a exilar-me por me ter sido passado um mandato de captura por ser Secretário Geral do Partido do Progresso, só quando regressei, após a tomada de posse do Senhor General Ramalho Eanes como Presidente da República, altura em que me foi levantado o mandato de captura nas fronteiras, me foi possível informar-me sobre o que se tinha passado naquele período da vida nacional a partir da descolonização da Guiné.

A oportunidade surgiu quando tive a honra de conhecer e de contactar numerosas vezes com o Senhor Contra-Almirante Pinheiro de Azevedo. Tive então ocasião de perguntar ao Senhor Contra-Almirante a que tinha obedecido a alteração do programa das F.A. e da legislação então publicada, em relação ao Ultramar, isto é, porque não se tinha aguardado uma nova Constituição para então dar cumprimento às resoluções da ONU.

O Senhor Contra-Almirante informou-me então que o que levou a alterar o compromisso assumido pelo MFA perante a Nação, tinha sido uma resolução tomada em reunião do Conselho de Estado. Disse-me que estivera várias vezes para denunciar publicamente este facto, mas que sempre hesitara com o receio de aumentar ainda mais, com a sua revelação, a grande confusão então existente.

Que se passara em tão importante reunião do Conselho de Estado, mantida tão secreta pelos seus membros num País onde não é possível guardar segredos?

Logo me assaltou a suspeita de que só a má consciência dos seus membros poderia conseguir um tal milagre neste País de linguareiros.

O Senhor Contra-Almirante confirmou-me essa suspeita! Na verdade informou-me que em determinada reunião daquele órgão de soberania, o Prof. Freitas do Amaral defendera, numa extensa exposição, que não seria necessário esperar por uma nova Constituição para se dar início ao processo de descolonização, pois que a legisação em vigor permitia que se lhe desse início.

O Senhor Contra-Almirante, ainda a propósito do Prof. Freitas do Amaral, disse-me que após a sua exposição, os militares, embaraçados, se entreolharam, surpreendidos, mas naturalmente sem argumentos para combater os da tese apresentada e que, os restantes membros do Conselho que poderiam ter argumentado dada a sua formação académica, logo se manifestaram em calorosos elogios à proposta apresentada, tendo ficado desde logo decidido dar-se início à descolonização.

Estava dado o primeiro passo de uma grande tragédia.

Tendo, mais tarde, procurado informar-me de quem tinha acesso às actas do Conselho de Estado, para me certificar da exactidão da informação que o Senhor Contra-Almirante me tinha dado, constou-me que o Senhor General Eanes, logo após a tomada de posse da Presidência da República, tendo querido chamar a si aquelas actas e as da Comissão da Descolonização foi informado do seu desaparecimento. Será verdade? Não me surpreende que o seja. Haverá alguém que se surpreenda?

Há, felizmente, muitos membros vivos desse Conselho de Estado e estou certo de que se não tiverem a coragem de confirmar as afirmações do Senhor Contra-Almirante, o que me não surpreenderia, não deixarão de legar à posteridade o seu testemunho, tão importante ele é para o esclarecimento das trágicas consequências que dele resultaram e de que ainda continuam a ser vítimas, na Guiné, Angola, Moçambique e Timor, as respectivas populações.

Esta informação é, como se compreende facilmente, absolutamente fundamental para se poder entender não só o que se passou nos territórios ultramarinos, como o caos que se instalou duradoiramente na vida nacional.

Ludibriada a confiança pública nas legítimas esperanças que o Manifesto e a legislação transcrita lhe tinham dado, compreende-se que a decepção e o medo abrissem caminho ao verdadeiro caos e saque que se seguiu.

A segunda fase do plano estava em marcha e todos sabemos quanto custou ao País, em escudos, em lágrimas, em vidas e em dignidade.

Esta fase culminou com o Pacto MFA-Partidos, que acabou por denunciar a traição ao MFA cujo objectivo prioritário era o de instaurar uma democracia em Portugal.

O Pacto pôs fim a esta ilusão. Pode, na verdade, considerar-se o regime em que vivemos uma democracia?

Evidentemente que não, a não ser que se considere uma democracia uma situação em que os cidadãos vão depositar, de tempos a tempos, um papelinho em urnas espalhadas pelo País. Esquecem-se ou fingem esquecer-se os que afirmam que o regime político em que vivemos é uma democracia, que o MFA, escolheu, dos partidos em formação, uns tantos, excluindo outros, impondo aos eleitos um certo número de condições para que fossem admitidos como partidos. Eliminou, pura e simplesmente, o Partido do Progresso, o Partido Liberal, o Partido Trabalhista, etc., emitindo mandatos de captura para os seus dirigentes, sem culpa formada. Tentou eliminar o CDS, a quem tanto deviam segundo parece na pessoa do seu chefe, como vimos, partido que se salvou apenas porque no assalto que fizeram à sua sede no Porto, onde estavam reunidos em Congresso, salvo erro, se encontravam personalidades estrangeiras que acharam conveniente não molestar.

O leitor que queira refrescar a memória deve ler o chamado Relatório das Sevícias, publicação oficial onde se dá conta das arbitrariedades, agressões e vexames impostos a numerosos portugueses presos sem culpa formada e que da prisão foram libertados sem uma palavra de explicação.

Estes exemplares procedimentos democráticos foram muito aplaudidos pelos partidos escolhidos, o que lhes retirou qualquer autoridade moral para falarem de democracia.

Eu sei que às criaturas que entraram no jogo do Pacto pouco importavam as contradições, o que lhes importava era o que poderiam ganhar com elas. Segundo é voz corrente ganharam e ainda ganham muito, em honras, embora falsas, e em dinheiro, segundo dizem sujo.

É indesmentível que o regime político em que vivemos não nasceu da vontade popular livremente expressa, fundamento das verdadeiras democracias mas daquele Pacto, pelo que é mais correcto chamar-lhe regime militar, disfarçado de democrático.

Se o regime político em que vivemos é uma democracia, então teremos de aceitar que o regime político que vigorou a partir da Constituição de 1933, devidamente referendada, foi também uma democracia. Neste caso o M.F.A. não derrubou uma ditadura, como se pretende, mas uma democracia, tão democrática, como a que se arroga de ter instaurado, a que nem falta o Serviço Secreto.

A paupérrima classe política — paupérrima, entenda-se, sob o ponto de vista moral — que tem servido com interesseira dedicação este travesti de democracia, não deixará de argumentar, que, cumpridas as exigências da lei, qualquer grupo de cidadãos se pode constituir em partido e concorrer às eleições.

Simplesmente esquecem estas mentalidades falsamente ingénuas que não se pode concorrer em igualdade de circunstâncias, o que, em autêntica democracia, se exige.

O regime político saído do Pacto MFA-Partidos não tem legitimidade democrática. Tem apenas uma existência de facto apoiada em compromissos garantidos pela força das armas, mas naturalmente ilegitímas sob o ponto de vista democrático.

É evidente, para qualquer mentalidade não comprometida, que uma vez ocupado todo o espaço político pelos partidos admitidos no Pacto MFA-Partidos, é uma piada de mau gosto afirmar que é livre a ocupação de um espaço que não existe, ou que existe tão escassamente, que só dá para parir nados-mortos, como tem acontecido.

Não, ainda não foi desta que se instaurou em Portugal uma democracia! Pode o Senhor Doutor Mário Soares acerca deste regime político sui-generis falar da nossa democracia.

Faço-lhe justiça, embora com certa relutância, de não acreditar que esteja de tal convencido.

O Doutor Mário Soares sabe que não é uma democracia até porque foi com a sua colaboração que nasceu, no bas-fond político, este aborto de democracia.

Por isso, a cada passo das suas viagens, nunca se esquece de afirmar que o que importa no 25 de Abril foi ter-nos trazido a liberdade.

Que liberdade e a quem?

A todos não, como se viu: para uns foi a morte, a prisão e o exílio, pelo que podemos concluir sem receio de errar que ao Doutor Mário Soares, as mentiras, as provocações, as destruições, os sofrimentos, as fomes e as mortes de tantos portugueses de todas as cores e credos que se julgavam protegidos na terra que os tinha visto nascer, nada significam, não lhe perturbam o sono, não lhe tiram o apetite .



V - Últimas Palavras
(páginas 231 a 261)



Penso que o leitor que tenha tido a paciência de chegar a estas últimas palavras não terá dúvidas, se é que as tinha, de que existe de facto um plano, um projecto criado e sustentado por poderosas forças financeiras e políticas que pretendem impor à vida internacional, como vimos, um Governo Mundial numa estrutura socialista.

Procuramos pôr em relevo os aspectos que consideramos fundamentais deste plano, melhor, do que dele podemos conhecer, quase sempre de maneira indirecta, historiando a sua génese e evolução, procurando deduzir de certos factos e atitudes as intenções que devem mover os seus promotores. Se o conseguimos, estamos certos de que ao leitor interessado não será difícil avaliar pessoalmente o que se passa neste domínio da vida internacional, recorrendo às fontes que citei e a muitas outras que certamente existem capazes de o esclarecer.

É certo que o leitor nacional não encontrará muitas informações em fontes portuguesas. A bem dizer, fora uma série notável de artigos do Dr. Nuno Rogeiro, iniciada em 23 de Setembro de 1986 no Semanário "O Diabo" e da jornalista Lourdes Simões de Carvalho, no jornal "O Dia", que importa muito conhecer, série iniciada em 20 de Junho de 1980, pouco mais conheço.

O leitor terá de recorrer, para se esclarecer sobre esta matéria, a testemunhos de autores estrangeiros, especialmente americanos, que a este tema têm dedicado numerosas obras, numa acção de esclarecimento da opinião pública tão eficaz que conseguiu criar uma verdadeira frente de oposição a este poder encoberto, cujas acções escapam a qualquer tipo de fiscalização pública, o que, como se sabe, choca frontalmente com a tradição da vida política americana.

Não há dúvida de que importa muito que os cidadãos se esclareçam sobre este assunto porque é na falta de esclarecimento que está o melhor trunfo dos que pretendem impor-nos um regime e um sistema a nível mundial de base socialista.

Já vimos que a ideia surgiu na mente, aliás doentia, de John Ruskin, se transformou em projecto por iniciativa de Cecil Rhodes e entrou em acção com a criação de uma sociedade secreta donde vieram a sair numerosos clubes e organizações a que já fizemos pormenorizada referência.

Uma vez que a sociedade secreta passou da Inglaterra para a América do Norte, como vimos, creio bem que a intenção com que foi criada se transformou, passando a ser, talvez, o instrumento mais importante do alargamento e manutenção da hegemonia americana. Esta, naturalmente, deve ter passado a ser uma condição sine qua non de todo o projecto.

Importa, na verdade, não esquecer, que no percurso daquele projecto do Governo Mundial, está sempre presente a preocupação dos seus promotores em que aquela hegenomia se mantenha. Dominando a quase totalidade dos orgãos mais importantes da comunicação social, a que seria mais correcto, para a generalidade dos casos, chamar instrumentos de manipulação das massas, não lhes tem sido difícil manipular a opinião pública desses Estados, mesmo a dos meios mais dados à reflexão intelectual, que também são, geralmente, os mais permeáveis a honras e a dinheiro, através dos quais o sistema tem conseguido algumas das suas evidentes vitórias.

Bastará recordar o papel destes na glorificação do sistema soviético, tendo conhecimento da realidade que lá se vivia.

Não deixa de ser curioso e instrutivo chamar a atenção do leitor para alguns factos e situações que, tanto à mente de muitos intelectuais, dotados de vocação para interpretações de ordem política, como à mente do homem comum que os segue nessas aventuras interpretativas, factos e situações que se têm apresentado como contradições da política americana. Ideia esta, baseada na convicção bastante generalizada de que a América do Norte é um país dirigido politicamente por gente mediocre, incapaz de compreender os grandes problemas do mundo, especialmente do velho mundo por lhe faltar espessura histórica. Daí o praticarem uma política externa sem tradições, contraditória, sem sequência lógica, pensada e executada à medida que os acontecimentos surgem, indo sempre a reboque deles, e não, como se impunha, à sua frente.

Esta era, resumidamente, a ideia que prevalecia e prevalece em todo o Ocidente, da realidade política americana. A verdade, porém, é que, se assim fosse, não seria possível explicar o facto incontroverso de a América do Norte ser a maior potência mundial.

Não se trata, naturalmente, de contradições mas compreensivelmente de exigências da sua estratégia para a manutenção e consolidação da sua hegemonia mundial, não só pelos motivos de ordem politica que referimos mas também pelo motivo mais prosaico de manutenção de alto nível de vida de que goza a sua população.

Os seus dirigentes têm, com certeza, perfeita consciência que este alto nível de vida só pode manter-se enquanto conseguirem manter a hegemonia que duas grandes guerras, muito sagazmente aproveitadas, lhe permitiram conquistar.

Note, porém, que este aproveitamento só foi possível porque anteriormente se tinham levado a cabo uma série de acções, no campo político e financeiro mundial, que apontavam para a futura constituição de um Poder Mundial, inspirado nos ideais de Platão.

Destacarei de entre estas acções duas que me parecem fundamentais para uma rápida apreensão do meu esquema interpretativo: a Revolução Russa que, como se sabe em pormenor, foi decidida no escritório em New York do super-banqueiro Morgan e por ele e outros banqueiros financiada .

Esta Revolução foi levada a cabo em circunstâncias que os estudiosos e comentaristas não conseguiram totalmente esclarecer, recorrendo, por isso, a interpretações várias que não satisfazem, porém, o espírito crítico. Foi, como vamos ver, o resultado de uma longa preparação que começou com o ressurgimento público da teoria de Marx. Como se sabe, o sistema económico de Marx baseava-se na teoria objectiva do valor, de Ricardo, que a teoria subjectiva de Manger, Jevons e Walras, aparecida depois da publicação do primeiro volume do Capital, refutava cientificamente. Marx teve perfeita consciência da impossibilidade de refutar com argumentos científicos, a teoria subjectiva do valor, pois de outra maneira se não pode explicar que não tenha publicado em vida os restantes volumes da sua obra, já todos concluídos.

Só muitos anos depois do seu desaparecimento de entre os vivos, eles foram editados e seria interessante averiguar quem financiou a sua publicação e promoveu a sua difusão. Mas mesmo que se chegasse à conclusão de que foram os iluminados pela metafísica marxista que realizaram tal tarefa, ficaria por explicar como erros tão grosseiros foram tão serenamente adoptados por intelectuais devidamente esclarecidos, isto é, com conhecimentos científicos suficientes para se aperceberem das falácias da chamada teoria económica de Marx.

Penso que aquela publicação, e com ela a volta de Marx, terá sido um dos primeiros passos para a liquidação do liberalismo económico, a única realidade capaz de frustar as ambições dos políticos ao Poder pessoal, em que se integra o sonho de um Poder Mundial.

De todas as potências europeias, a Rússia dos Czares, era, sem dúvida, a mais vulnerável à ingestão do erro, além de representar o maior perigo potencial para o projecto de hegemonia mundial, possivelmente já ancorado na América do Norte, embora nascido na Inglaterra.

Na verdade, a política de abertura ao ocidente liberal, levada a cabo pelos dois últimos czares, começava a dar os seus frutos: a industrialização dava passos gigantescos, embora a imagem da Rússia imposta à opinião púbica mundial, a apresente sempre como retrógrada e feudal. Estava ainda, sem dúvida, em muitos aspectos da sua vida colectiva, mergulhada em flagrantes contrastes, contradições e desajustamentos, provenientes de uma entrada, talvez demasiado rápida, na vida moderna. Daí apresentar um clima propício à acção dos revolucionários de todas as tendências.

A sua entrada na guerra e as desastrosas consequências que dela resultaram, vieram proporcionar aos dirigentes da América do Norte uma oportunidade inesperada, e talvez não, de, por um lado, tirar à Rússia, já então em democracia, não se esqueça, a possibilidade de desenvolver as suas espantosas potencialidades dentro do quadro de uma economia de mercado, que a transformaria, a curto prazo, na maior potência mundial e, por outro lado, criar uma ameaça permanente e eficaz ao mundo europeu.

Dentro deste esquema já se compreende muito bem o que tem sido considerado como uma desastrosa intervenção do presidente Wilson na Conferência da Paz no final da Guerra de 14. A sua intervenção visou claramente a criação das condições de eclosão de uma nova guerra, como veio a acontecer e como foi previsto por numerosas personalidades.

É um facto incontroverso que a Europa, a partir da guerra de 1914, nunca mais soube o que era a paz, tanto interna, como externa. É igualmente incontroverso que só a América do Norte tem beneficiado com esta situação, aumentando continuamente a sua riqueza e o seu Poder.

Na Europa, devastada pela guerra e desequilibrada pelas alterações introduzidas pelo Tratado de Paz na sua geografia política tradicional, surgiram, em cadeia, tensões políticas e sociais, internas e externas, alicerçadas em doutrinas e teorias económicas — socialismo histórico, marxismo, anarquismo, sindicalismo, etc. — que, embora inteiramente rebatidas pela ciência económica, não deixaram de alastrar, alimentadas pelos erros de um crescente intervencionismo estatal, favorecido pela guerra e que, a pouco e pouco, se ía consolidando e progredindo, aumentando o poder dos políticos e diminuindo o dos cidadãos.

Assim se foi pondo fim, sem justificação racional, ao que restava dos princípios e das práticas em que se tinha baseado o espantoso progresso económico, e com ele o científico e o social, levado a cabo naquela época. Posto de parte o padrão-ouro e a liberdade do comércio internacional, os políticos tinham o caminho aberto a uma progressiva apropriação das liberdades de que os cidadãos tinham gozado naquele tempo.

Era o regresso, embora disfarçado, a um nacionalismo económico que necessariamente conduziria ao nacionalismo político que a economia de mercado viera tornar impossível.

Julgaram, ingenuamente, os economistas e os políticos liberais, que o seria para sempre, por confiarem demasiado na racionalidade dos homens, não suspeitando, sequer, a que ponto essa racionalidade podia ser substituída pelas paixões.

Aquela apropriação subreptícia de poder, por parte da aristocracia do dinheiro, através da possibilidade de intervenção no mercado, dominando através dos bancos a vida económica e financeira dos respectivos Estados retirou ao sistema democrático toda a sua essência, deixando-lhe apenas os rituais.

Na verdade, a liberdade que o sistema conferia aos cidadãos assentava, na sua essência, na liberdade fundamental que lhes era conferida pelo sistema económico do mercado livre. Daí a crise do sistema político democrático, de que tanto se fala, sem se descer às raízes profundas que a explicam.

A explicação, porém, é bem simples e compreensiva: intervencionismo e democracia são posições inconciliáveis. O avanço do intervencionismo estatal para o seu termo lógico, o socialismo, trará como consequência inevitável o desaparecimento da democracia.

Esta passagem do sistema de mercado livre, ao mercado intervencionado, do liberalismo económico e político, ao estatismo, da verdadeira democracia à demagogia dos partidos, que hoje afecta em maior ou menor grau todos os Estados do chamado, errada e propositadamente, mundo capitalista, tem servido, não por acaso, apenas a hegemonia norte-americana e o seu projecto de Governo Mundial.

A América do Norte é o único destes Estados, e não por acaso, também, em que a intervenção estatal é menor no que respeita às perturbações no mercado. Só por este facto é também aquele em que são menores a agitação política e social que caracteriza todos os outros.

Não é crível, no meu ponto de vista, que estes factos se devam ao alto nível de vida do povo americano, pois que também a Suécia, a Alemanha Federal, a Inglaterra, etc, gozam de idêntico nível de vida e a sua situação é bem diferente. Nestes últimos existem as divisões e os conflitos de todos bem conhecidos, porque eles representam um interesse vital para a manutenção da hegemonia americana.

Se se dispendessem nos Estados Unidos os capitais e os esforços que se dispendem — que a América do Norte dispende directa e indirectamente — nestes países para promover a subversão política e social, a América do Norte estaria sem dúvida em situação idêntica. O facto de não estar levanta suspeitas, mas fica-se com a certeza moral quando se verifica que só a sua hegemonia é beneficiada.

Concomitantemente desencadeou-se uma ofensiva geral contra a ciência económica, no plano filosófico e político. As suas descobertas vinham contrariar de maneira frontal, não só as ambições dos políticos, como a execução do plano de domínio mundial.

Velhas teorias, postas de parte há muito, ressurgem misteriosamente, em livros, revistas, artigos de jornais, declarações públicas dos fazedores de opinião para alimentarem através do desencadeamento das paixões o apoio das massas populares às ambições dos políticos ao poder pessoal. O crack da bolsa de N. Y. vem dar credibilidade a estes ataques, permitindo aos políticos não só na América do Norte, como na Europa, apoderarem-se de maneira confortável das alavancas do poder político, financeiro e económico.

Lord Kaynes venceu a disputa com os economistas da chamada Escola de Viena, não pelos méritos científicos da sua teoria, inteiramente rabatida, científicamente, por aqueles, mas porque ela, embora de maneira pseudo-científica, vinha justificar aquela tomada de Poder, vinha permitir que o intervencionismo estatal se institucionalizasse. A partir de então segundo Von Mises, assistiu-se, como se impunha, ao desterrar da autêntica ciência económica do ensino universitário, dos institutos científicos, dos orgãos de comunicação social, etc, a ponto de, nos nossos dias, a maioria dos professores e licenciados em economia só conhecerem da Escola de Viena, não os seus argumentos científicos, mas o labéu que lhes impuseram de defensores de teorias ultrapassadas de economia tradicional, etc. O facto das suas falácias pseudo-científicas, como lhes chama Von Mises, se terem imposto contra argumentos científicos irrefutáveis, é prova, para mim evidente, de que se trata de alta manobra internacional, manobra que só tem servido e de maneira eficaz, à progressiva implantação do intervencionismo estatal em todos os países do mundo, acompanhando, e intimamente ligado, à crescente hegemonia Americana e ao projecto do Governo Mundial.

É inegável que os autores desta manobra de alta política souberam aproveitar de maneira habilíssima, a oportunidade que lhes foi oferecida pela Guerra de 14.

Enquanto a vaga intervencionista, em parte sequela da guerra, criava crescentes dificuldades às economias dos Estados Europeus, a América do Norte encontrava-se na confortável posição de único Estado que ganhara com a guerra. A sua economia de mercado ainda intacta, era porém um obstáculo à prossecução do projecto de hegemonia mundial. O Poder dos seus dirigentes estava limitado pelo poder dos cidadãos, poder alicercado, como dissemos, na existência do mercado livre e na convicção profundamente arreigada na consciência dos cidadãos de que o Poder deve estar dividido sem o que a liberdade dos cidadãos estará em perigo.

Impunha-se, como tal, introduzir alterações susbstânciais no sistema financeiro, económico e político que permitissem aos seus dirigentes políticos uma maior capacidade de intervenção, indipensável para vencer as resistências que especialmente os cidadãos haveriam de impor à liquidação do liberalismo económico, à sombra do qual a América se formara como Estado.

Numa palavra: os políticos precisavam de limitar a liberdade dos cidadãos, para aumentar a sua própria, mas sem que esta mudança pusesse em risco os benefícios que resultam do funcionamento da iniciativa privada, ao menos nos seus aspectos fundamentais.

A primeira grande batalha que travaram, não sem tenaz e dramática resistência, foi, como vimos, a criação do F.R.B. (que mais tarde, creio que em 1935, se transformou no Federal Reserve System) passando a ser na América do Norte uma instituição correspondente à dos bancos centrais europeus. Através deste organismo teoricamente não estatal, os políticos passaram a ter o controlo da vida económica e financeira do país. Não foi certamente por acaso que este organismo na sua primeira intervenção importante, tenha provocado o crack da bolsa de N. Y..

Naturalmente que os estudiosos e comentaristas deste acontecimento, afirmam que a decisão tomada, embora errada, o fora de boa-fé. É legítimo, porém, supor de que o foi propositadamente, pois que a situação por ela criada foi que permitiu, por um lado, o New Deal, isto é, a entrada oficial na América do Norte do intervencionismo estatal, justificado pela incapacidade do sistema de mercado livre de evitar crises como a que estava com evidência dramática ante os olhos de todo o mundo, e por outro lado, veio justificar o progresso e a consolidação do intervencionismo já instalado na vida europeia.

O New Deal, porém, contrariamente ao que aconteceu na Europa, não provocou na vida americana as consequências que o intervencionismo estatal provocou nesta última, porque os dirigentes americanos tiveram o cuidado de manter, tão intacto quanto possível, em regime intervencionista, o funcionamento do mercado, servindo-se do aumento de Poder que o regime lhes proporcionava, para actuarem, no interior, mais no campo político e social, do que no económico e, no exterior, na consolidação da sua crescente hegemonia.

Esta, porém, só virá a afirmar-se de maneira insofismável, com a Segunda Guerra Mundial. Deixando primeiro que os contendores se esgotassem mútuamente, a sua entrada no momento oportuno, foi o passo decisivo que lhe entregou o comando da hegemonia mundial.

No espaço entre as duas guerras, a sua criação, a Rússia Soviética, peça mestra da sua estratégia, espalhara largamente o erro marxista um pouco por toda a parte do mundo, criando as tensões e os conflitos, especialmente na Europa, que a serviam duplamente: por outro lado o sistema marxista, pela sua ineficácia no plano económico, impedia a expansão das espantosas potencialidades da nação russa que em regime de mercado livre, pela sua riqueza em matéria cinzenta, em matérias-primas no seu próprio solo, em riqueza agrícola, em território e em população seria sem dúvida a primeira potência mundial; por outro lado, como exportadora activa de socialismo, enfraquecia a Europa, outra grande possível rival da hegemonia americana, dividindo-a e como tal mantendo-a em permanente insegurança.

Por isso a guerra a encontrou dividida e incapaz de se defender.

Medite agora na Conferência de Yalta, nas concessões americanas à Rússia Soviética, apresentadas pelos comentadores como contradições da política americana, infiltrada por marxistas e logo se verá que se não trata de contradições, nem de caprichos do homem que as impôs, mas de exigências da política de hegemonia da América do Norte.

Estas concessões estão intimamente relacionadas com a descolonização, naturalmente preconizada e apoiada, tanto pela Rússia Soviética, como pela América do Norte.

A descolonização foi outro grande passo dado, como tantos outros, de comum acordo entre a América e o seu robot soviético, para retirar à Europa a sua influência na África e na Ásia e com ela as possibilidades que a Europa teria, de se transformar em sério rival da hegemonia americana.

Ninguém de recto juízo pode acreditar que o processo de descolonização tenha sido levado a cabo por idealismo, etc. A sua acção, decisiva neste processo, visou apenas interesses profundos da hegemonia americana que se podem resumir nestas palavras: enfraquecer e dividir os possíveis candidatos à hegemonia mundial.

É este o motivo fundamental que tem levado a América do Norte a apoiar, sob diversas formas, a expansão controlada do socialismo em vários países do mundo, com relevância especial na Europa.

Manter esta dividida e em clima de conflito permanente, é a única forma de impedir que defina uma estratégia que a transforme numa força capaz de lhe fazer frente.

Paulo de Castro, em artigo no Diário de Notícias do dia 18 de Abril de 1992, pág. 9 (Opinião), revela-nos o conteúdo de um documento de 46 páginas do Departamento de Defesa dos E.U.A., tornado público antecipadamente pelo New York Times, onde se encontra o Conceito de que os Estados Unidos devem perservar o seu status de única e incontestada superpotência, tratando de convercer eventuais competidores na Europa, na Ásia e na antiga União Soviética de que não precisam aspirar a um papel mais destacado ou adoptar posturas mais agressivas para defender os seus ligítimos interesses. Num mundo em que os E.U. desempenham um papel de única superpotência, por seu poderio militar e seu 'comportamento construtivo' de 'dominação benevolente' do mais forte e melhor preparado para garantir 'a democracia e a estabilidade'.

Noutro passo o documento afirma que: Para manter a sua superioridade, os E.U., devem levar em consideração os interesses dos países industrializados avançados, mas dissuadi-los de tentar desafiar a nossa liderança ou subverter a actual ordem económica e política.

Em plano de muito menor importância, mas significativo até por isso, os portugueses tiveram ocasião de verificar o escandaloso apoio que a América do Norte, através do Embaixador Carlucci, deu ao partido socialista, para não falar já na pseudo-revolução de Abril.

Muitos são os que pensam que o golpe Norte-Americano falhou, porque Angola e Moçambique passaram para o lado russo.

Angola e Moçambique saíram da órbita europeia, porque esta saida era imperiosa para a política Norte-Americana.

Na verdade o desenvolvimento económico e social que a entrada em funcionamento de Cabora-Bassa e dos petróleos de Cabinda iriam proporcionar a Portugal um tal boom de desenvolvimento que seria impossível à América do Norte, dentro de alguns anos, controlar a África Austral, pelo reforço que aquele desenvolvimento iria dar à Rodésia e à África do Sul.

A passagem temporária para a órbita do seu instrumento, a União Soviética, em nada acrescentou à riqueza e ao poder desta, pelo contrário, veio enfraquecê-la, pois a obrigou a uma dispersão de matéria cinzenta — embora, segundo me conste, apenas mandassem para lá a acinzentada que caracteriza a nossa classe política — a preocupações e a encargos materiais sem contra-partida, pois o que pode tirar daqueles territórios nada representa para ela, pois tem tudo o que precisa no seu próprio solo e subsolo, em condições de muito mais vantajosa exploração. Só ganhou prestígio político, o que não interessa e nada incomoda a América do Norte, interessada apenas na manutenção e incremento da sua força.

Os dirigentes americanos sabiam que quando lhes conviesse aqueles territórios passariam para a sua órbita, como aconteceu com o Egipto para só citar este caso.

Se a América do Norte fosse, como era convicção geral, inimiga da Rússia Soviética e por esta se sentisse ameaçada, com toda a facilidade há muito a teria destruído. Bastava para tal que não lhe tivesse fornecido anualmente os milhões de toneladas de cereais que durante dezenas de anos evitaram a fome generalizada na pátria do socialismo.

O caso de Cuba é outro exemplo flagrante da capacidade dos políticos americanos na defesa da hegemonia do seu país.

O leitor lembra-se, certamente, da onda de isolacionismo que então alastrava na opinião pública Norte-Americana. Era então convicção generalizada que a América deveria retirar-se dos conflitos mundiais, convicção que contrariava os projectos dos políticos.

Para fazer parar aquela onda nada melhor do que pôr nas barbas do povo americano, uma ameaça como a de uma Cuba comunista. Não se esqueça que um dos conselheiros de Castro era um americano que com ele viveu na Sierra Maestra, americano que Castro, aliás, mandou fuzilar no dia da sua tomada do Poder, certamente porque sabia demais.

Cuba, porém, não serviu só este objectivo, mas também o de representar uma ameaça para as classes dirigentes dos países sul-americanos a fim de as manter dóceis às manobras da política americana nos seus países. Exportador-comissionista de comunismo e subversão, mal surgia em qualquer país da América do Sul a veleidade de se dibertarem do auxílio Norte-Americano logo surgiam guerrilheiros a impor-lhes juízo... Aí está porque Cuba é comunista.

Cuba e alguns países mais na Ásia, na África, no Médio Oriente, na América do Sul, todos eles desempenhando o mesmo papel: sinais de alarme nas áreas em que se encontram, em que só a América do Norte, com a sua protecção pode dar relativo sossêgo.

Veja o que se está a passar no Médio Oriente. Posto de parte o comunismo logo foi substituido pelo fundamentalismo.

A manutenção da hegemonia americana exige a existência destes dissuasores certamente bem mais eficazes do que a força bruta das armas.

Temos de reconhecer aos políticos americanos uma capacidade intelectual espantosa, um virtuosismo excepcional no aproveitamento de todas as oportunidades que podem servir à grandeza do seu país.

Naturalmente que a sua mão se há-de encontrar sempre por detrás de todos os movimentos políticos e sociais que têm convulsionado o nosso mundo desde a sua entrada na cena mundial.

Os dirigentes das nações europeias — dos outros nem vale a pena falar — não necessariamente os governantes mas os que detêm efectivamente o poder, isto é, os que acreditam que a solução está no Governo Mundial não podem deixar de estar na situação de dependentes tendo ao seu serviço outros dependentes de terceira categoria, na sua maioria ingénuos que se não chegam a aperceber do jogo em que estão metidos.

Muitos são, porém, os conscientes de que estão metidos num jogo sujo. Estão neste caso, em grande número, os chamados intelectuais, com relevância especial para os economistas, pela influência que as suas afirmações têm nas massas populares, condenadas pela ignorância, pelo egoísmo e pela inveja, a lutarem contra os seus verdadeiros interesses. Estes intelectuais, os conscientes do que estão a fazer, porque muitos são os que agem apenas sob o signo das paixões ideológicas, escudam-se na desculpa de que politicamente não é conveniente defender a verdade científica, opôr a razão, às paixões.

Assim escondem a defesa dos seus interesses pessoais.

Por isso fazem o jogo, quer do socialismo, embora sabendo que, como sistema económico, há muito está refutado pela ciência económica, quer do intervencionalismo estatal, forma larvada de socialismo que a ele conduz inexoravelmente.

O caso do Irão não deixa também de ser significativo.

Sabe-se o papel que nele desempenhou o C.F.R. Kissinger, essa tenebrosa figura de alemão desnacionalizado que se transformou na América, mercê de apoio do C.F.R. numa destacada figura política.

Haverá alguém que acredite que a C.I.A. não sabia o que se ia passar no Irão com a queda da Monarquia?

Creio bem que os promotores do Governo Mundial, uma vez que já estava certamente decidida a queda do sistema marxista na Rússia, precisavam, para manter na ordem, na sua ordem os países do Médio Oriente, do Norte de África, do Sul da Rússia, e da Índia, de um novo dissuasor, visto que o perigo do comunismo ia deixar de existir. Surgiu, assim, para o substituir o fundamentalismo, o novo papão que se encarregará de manter atentos e obrigados todos os que se sentem ameaçados pelos barbudos.

Era de esperar que um dia, o que conviesse aos promotores do Governo Mundial, o comunismo perderia na Rússia o Poder. O General Vareunikov, que foi vice-ministro da Defesa da U.R.S.S., participante do golpe falhado contra Gorbatchov, confirma o que acabamos de afirmar.

Ora vejamos. O jornal alemão Der Spigel afirma em entrevista que aquele general russo lhe concedeu que segundo a opinião deste, Mikhail Gorbatchov destruiu a U.R.S.S. para cumprir ordens dadas por Washington. Em que se baseia para defender essa sua tese?

"G.V. - O ex-chefe da CIA, Robert Gales, disse, em Dezembro de 1991, isto é, após a destruição definitiva da União Soviética que um sonho se tornaria realidade: a União Soviética não se poderia vencer nem política, em económica, nem militarmente.

Por isso, em Washington tinham decidido rebentá-la por dentro".

No mesmo jornal um outro russo, comandante-chefe do 14º Exército Russo, General Alexandre Lébed, afirmou que "em Agosto de 1991, não houve uma tentativa de golpe de Estado, mas sim uma 'provocação genial' que permitiu destruir um grande País, a U.R.S.S.." Lébed, segundo a notícia, "acaba de publicar um livro intitulado 'Um espectaculo chamado Golpe', em que assegura que não houve golpe, mas uma nova provocação genial, grandiosa, única no mundo, que foi levada a cabo de uma maneira brilhante e em que estavam distribuidos os papéis dos tontos e dos inteligentes. Todos eles consciente ou inconscientemente, cumpriram os seus papéis". Segundo o General, a referida 'provocação' permitiu resolver de uma vez uma série de problemas: acabar com o Partido Comunista da U.R.S.S. e liquidar, afinal, um grande país cuja população, em 73% se pronunciava a favor da sua conservação no referendo de Março de 1991

Creio bem que não conseguiram, porém, um resultado que certamente estaria nos seus calculos: o desmenbramento da União Soviética nos diferentes Estados que a compoêm.

Mas penso que não vão facilmente desistir. A Tchétchénia pode bem ter sido apenas um começo, um ensaio, talvez um modelo a seguir no futuro.

Outro caso flagrante que denuncia claramente a existência desse poder a que tenho vindo a fazer referência, é o da eleição do Presidente Clinton.

Foram muitos os comentaristas políticos, tanto nacionais, como estrangeiros, que manifestaram a sua surpresa com a vitória de Clinton e a não reeleição de Georges Bush. Não tive, porém, conhecimento de que algum destes analistas políticos tivesse chamado a atenção para o que, sem dúvida, conduziu aquele resultado. Que eu saiba, apenas o Embaixador José Calvet de Magalhães, em artigo publicado no Diário de Notícias (como é que lhes terá escapado?) em 10 de Janeiro de 1993, a ele se refere.

Transcrevo do artigo em questão estas palavras, Duas ou três semanas antes do acto leitoral, David Rockefeller, presidente do Chase Manhattan Bank, um dos maiores poderosos financeiros americanos e um republicano histórico publicou na página editorial do New York Times um artigo que intitulou 'Porque confio em Bill Clinton', no qual enumerava uma dúzia de razões que o levavam a confiar na candidatura democrática. E terminou o seu artigo dizendo: 'para mim a escolha é clara: Bill Clinton por uma avalanche em Novembro'. Era o descrédito da campanha republicana, devendo-se ainda observar que, com os poderosos meios da informação à sua disposição a posição assumida publicamente por Rockefeller, só podia anunciar a derrota de Bush. Um mês antes da eleição, a vitória de Clinton era, na verdade, favas contadas.

É claro que David Rockefeller teve de escolher entre duas lealdades: ao seu partido ou ao C.F.R.

É evidente que o C.F.R. venceu.

Deus queira que a vitória do partido democrático, que é tradicionalmente financiado pelos magnates dos armamentos, a aparente confusão na ex-Yugoslávia, onde as grandes potências se estão a afrontar, não estejam relacionadas e uma vez mais, a eclosão de uma nova grande guerra não venha a coincidir com a existência de um governo democrático na América do Norte, como aconteceu com as outras duas.

Para muitos povos tem sido muito elevado o preço que têm pago para que a América do Norte mantenha a sua hegemonia mundial.

Em escala menor, mas nem por isso, para nós, menos doloroso foi também o preço que pagamos e estamos a pagar: perdemos não só a parte mais extensa e mais rica do território nacional, nosso há cerca de 500 anos, mais do que tem de existência política a América do Norte — só porque não eliminamos os autóctones, como eles eliminaram os índios — ficando em situação de obedecer à sua política, se quisermos sobreviver, aceitando uma caridade ostensivamente proclamada.

Mas não é tudo.

Os dirigentes da política americana sabem muito bem que não seria suficiente a descolonização para nos reduzir à condição de pedintes em que nos encontramos. Era necessário também criar as condições para que fossem delapidados os bens de capital de que o país dispunha, em quantidade suficiente para arrancar em direcção a rumos nacionais.

A imposição do clima de agitação, o conluio entre alguns facções partidárias, socialistas e socialisantes, para ficarem sós na cena política, eliminando as rivais pela força das armas, em termos que nada têm a ver com a democracia, ou antes, que a tornaram impossível, como vimos. Uma crescente intervenção do Estado, colocando obstáculos à iniciativa privada, embora reconhecendo que é ao que dela existe que se deve ainda o não se ter caído na mais negra miséria, é prova para mim de que o que convém à estratégia Norte-Americana é manter-nos em estado de desequilíbrio permanente.

Penso que a manutenção deste desequilíbrio tem muito a ver com as possibilidades que um governo nacional teria ao seu dispor para influir na evolução dos seus ex-territórios ultramarinos. Daí o espectáculo degradante a que temos assistido desde o 25 de Abril, internacionalmente classificado e bem, de psicadélico.

Uma classe política clara e afrontosamente dependente de apoios estrangeiros, políticos e financeiros, tão medíocre e tão desprezadora dos sentimentos nacionais que nem tem tido a habilidade de os mascarar, antes despudoradamente os exibe nas suas feiras periódicas, assistida por uma legião de medíocres e frustados, à procura, em utopias delirantes, de uma justificação para as suas existências de cidadãos e homens públicos.

Assistimos, alguns estupefactos, ao deambular pela cena nacional de uns tantos que ninguém dúvida que traíram o seu país, cometeram crimes como os que vem relatados oficialmente no chamado Relatório das Sevícias, delapidaram o tesouro público, assumiram publicamente as mais degradantes atitudes, ofenderam de maneira clara e insosfismável os mais elementares princípios da vida nacional, da democracia de que se afirmam paladinos, e os deveres e responsabilidades de cargos públicos que ocuparam e ainda muito ocupam, tudo isto sem que se tenha desencadeado um movimento de reprovação colectiva, quer por uma explosão de cólera ou ao menos, dada a brandura dos nossos costumes, por uma enorme gargalhada nacional.

Como não aconteceu até hoje, nem uma coisa, nem outra, há quem pense que o burro está a ser albardado à vontade do dono.

Não o creio.

O povo português está, apenas, pelos motivos que apontei, à mercê de uma classe política ao serviço de interesses que nada têm a ver com os interesses nacionais.

É certo que, vindo das suas fileiras, se tem ouvido ultimamente preconizar a necessidade de definição de um projecto para Portugal, que segundo afirmam, sofre de uma crise de identidade.

Tanta subtileza, meu Deus, para encobrir aos olhos do homem da rua que deitaram abaixo o edifício nacional e que para o reconstruir é necessário um projecto, quem o execute e quem o pague. Mas, como dizerem agora ao homem da rua que o enganaram, se não falando suavemente de crise de identidade?

Penso, porém, que um tal projecto não é o princípio, mas o fim daquilo que há a fazer se os portugueses quiserem de facto readquirir uma consciência colectiva, indispensável à continuação de Portugal, como nação livre e independente. Refiro-me, naturalmente à criação das condições básicas para que um tal projecto possa ser definido e executado!

Varrer da cena política os péssimos actores que representam Portugal. A sua permanência no palco, além de inestética, não é susceptível de induzir os espectadores a comportarem-se como um público inteligente e civilizado. Impõe-se, como tal, primeiro nacionalizar o governo e a administração e desnacionalizar tudo o resto, castigar de maneira exemplar todos os que assumiram responsabilidades no descalabro nacional e mostrar com clareza aos portugueses que se querem beneficiar das vantagens de ordem moral e material, que resultam de se pertencer de maneira consciente a uma nação livre que luta pelo seu progresso e independência, terão de conformar o seu comportamento, individual e colectivo, à contrapartida dessas vantagens: preferir a verdade à demagogia, a cooperação consciente, às divisões artificiais criadas pelos políticos e intelectuais que pescam em águas revoltas, trabalho intenso e consciente que permita criar mais riqueza do que aquela que se consome, o único caminho que permitirá criar os capitais adicionais indispensáveis ao progresso económico da comunidade nacional.

Nada será possível, porém, senão em regime legitimado pela vontade popular livremente exrpessa, que permita ao escol nacional sair do silêncio a que se remeteu, agindo primeiro no campo do esclarecimento público, mostrando ao homem da rua que não é pela via socialista, nem intervencionista, que não é utilizando a paixão, mas a razão que poderá alcançar o nível de vida e a liberdade a que aspira, mas precisamente pela via contrária, a do sistema económico do mercado livre preconizado como o mais eficaz para a criação de riqueza. Provar-lhe, o que não é dificil, que o socialismo e o intervencionismo, amplamente refutados pela ciência, outra coisa não são senão instrumentos para aqueles que aspiram ao poder pessoal, para os que pretendem substituir a vontade, as preferências e as aspirações dos cidadãos, pelas suas próprias, pois são estas em tais regimes que necessariamente se imporão aos cidadãos, em nome de um bem comum de que eles tem o exclusivo

Será possível, com argumentos racionais apagar as paixões e os erros que os aspirantes ao poder pessoal atearam na mente desprevenida do homem da rua?

Se o não for, esperar-nos-á, a todos, ser um dia e um dia próximo apenas um número nos computadores dos que governarão as nossas vidas até ao pormenor, gozando, eles só, de todas as liberdades, em nome de um bem comum que só eles definirão.

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